Série Clássica
Temporada 1

Análise do episódio por
Carlos Santos



 









 

MANCHETE DO EPISÓDIO
Segmento bizarro inaugura sem
qualidades o uso de tecnobaboseira

Episódio anterior  |  Próximo episódio

Sinopse:

Data Estelar: 3087.6.

Enquanto executa leituras em órbita de um planeta supostamente desabitado, a Enterprise é afetada por um fenômeno desconhecido, que Spock descreve como uma “piscadela no tecido da existência”. Em seguida a Frota Estelar emite um alerta geral e, quase ao mesmo tempo, Spock passa a receber leituras, de sinais de vida, vindas da superfície antes deserta. Kirk forma um grupo de descida e vai ao planeta em busca da origem do sinal de vida encontrado por Spock.

Uma vez na superfície eles encontram o que parece ser um tipo de veiculo de finalidade ignorada. Pouco depois um homem aparece, aparentemente em delírio, dizendo que precisava de ajuda, mas antes que pudesse dizer para que, cai do alto da elevação onde se encontrava.

De volta a nave, Kirk é informado que: o fenômeno afetou também o funcionamento dos cristais de dilitio, necessários para manter a nave em órbita. Spock não tem ainda nenhuma explicação sobre o a causa do fenômeno, apenas que o planeta o qual estão orbitando foi seu ponto de origem.

A Enterprise é informada que o comando da Frota Estelar acredita que o fenômeno possa ser o prenuncio de uma invasão e ordena a Kirk que descubra sua causa uma vez que os maiores efeitos foram sentidos justamente na área sob patrulha da Enterprise.

Kirk ordena a Spock que continue a investigação enquanto ele vai conversar com o homem trazido do planeta, que se diz chamar Lazarus e estar caçando algum tipo de criatura alienígena perigosa que teria aniquilado sua civilização e exige a ajuda de Kirk, que se nega e decide voltar ao planeta junto com Lazarus para investigar a sua história.

Na superfície do planeta, Kirk encontra Spock que está entre outras coisas examinando o veiculo de Lazarus, e que reafirma não haver mais ninguém no local. Ocorre então um novo fenômeno e Lazarus sai correndo e gritando do local, tendo Kirk em seu encalço. Com o fim do fenômeno, Kirk encontra Lazarus que diz mais uma vez ter sido atacado, e que aparenta estar fora de si.

Eles retornam a nave, levando Lazarus que se feriu na superfície a enfermaria para tratamento, entre eles um ferimento na testa que McCoy cobre com uma atadura. Lazarus agora mais calmo volta a conversar com Kirk e pedir sua ajuda, que ainda permanece reticente. Ao examinar de novo a Lazarus, McCoy não encontra o ferimento na testa, o qual havia tratado e coberto. Ele diz a isto a Kirk, mas quando encontram Lazarus novamente o ferimento havia voltado a testa de Lazarus, deixando McCoy sem ação e Kirk ainda mais irritado com o que julgou ser algum tipo de piada de seu médico.

Spock relata ter encontrado uma fonte de radiação no solo de origem não explicável, uma espécie de dobra física ou fenda, que somente com o uso dos cristais de dilitio da nave foi possível localizar. Lazarus pede os cristais a Kirk, pois diz que esta é a chave para encontrar e destruir seu oponente, mas este mais ume vez nega a ajuda.

Após deixar a ponte o fenômeno acontece novamente, afetando Lazarus de alguma forma. Este ruma então para a engenharia onde ataca a tripulação.  Após este ataque, dois cristais desaparecem. Lazarus é interrogado como suspeito do roubo, mas nega, acusando o seu “inimigo” de cometer o roubo. Kirk decide voltar de novo ao planeta levando Lazarus, por julgar haver alguma conexão do súbito aparecimento da fonte de radiação na superfície do planeta e roubo dos cristais.

Um novo exame do veiculo de Lazarus não mostra sinais dos cristais desaparecidos, mas Kirk está convencido de que existe alguma pista no planeta e ordena uma nova busca. Uma nova manifestação do fenômeno ocorre, e logo após Lazarus reaparece e salva Kirk de ser atingido por uma rocha que caiu de uma elevação, caindo desta logo em seguida.

De volta a enfermaria da Enterprise, Kirk diz que o planeta de onde Lazarus havia dito ter vindo jamais existiu, e exige a verdade de Lazarus.Este diz que seu planeta natal é o mesmo em volta do qual a Enterprise está orbitando, e que foi destruído há muito tempo. Diz ainda que sua nave é uma cápsula temporal e que ele é um viajante do tempo, procurando por seu inimigo através das eras. Lazarus tem um novo surto e desmaia sendo deixado na enfermaria.

De volta as suposições, Kirk e Spock começam a especular sobre uma suposta existência de um universo paralelo, de matéria negativa, e daí a existência de dois Lazarus, um de cada universo que estariam transitando por uma porta entre os dois universos, que estaria relacionada à fonte de energia do planeta. O inimigo é na verdade uma espécie de anti-Lazarus, seu gêmeo de tal universo.

A engenharia é atacada por Lazarus, que se aproveita da confusão para roubar mais cristais e descer com estes ao planeta. Kirk o segue e usando o veiculo na superfície chega ao universo paralelo onde encontra um Lazarus calmo e sereno. Este explica que a única motivação do “outro” Lazarus é destruí-lo, pois ele enlouqueceu ao saber que tinha um duplo negativo. Esta obsessão se concretizada levará a destruição de ambos os universos.

O Lazarus “negativo” afirma que pretende impedir o que o Lazarus “positivo” cause tal destruição, prendendo-o em uma espécie de corredor entre os dois universos. Kirk retorna para o seu próprio universo e força o Lazarus “positivo” para o corredor onde seu negativo o espera. Kirk e Spock retornam a Enterprise com os cristais roubados. Uma vez a bordo ele ordena a destruição do veiculo na superfície enclausurando ambos os “Lazarus” no “corredor”, segundo Kirk por toda a eternidade, porém mantendo os dois universos a salvo.


Comentários:

O “grande legado” de “The Alternative Factor” é inaugurar oficialmente a “tecnobaboseira” em Jornada nas Estrelas. É impressionante como vários dos termos utilizados aqui estariam doravante presentes, por diversas vezes, e repetidos a exaustão nas outras edições da franquia. Coisas como matéria e antimatéria, universos paralelos, fendas subespaciais, viagens temporais, todas envoltas em explicações longas, superficiais e inconsistentes.

Antes de entrarmos neste aspecto do episodio, uma observação torna-se necessária. Mais uma vez uma ação de origem desconhecida faz Kirk (e desta vez o comando da Frota Estelar) acreditar que a Federação pode sofrer uma invasão. Primeiro foi em “Balance of Terror”, depois em “Arena” e agora novamente vemos a Federação preocupada com possibilidade de sofrer algum tipo de ataque. Se em “Balance Of Terror” havia uma forte razão para justificar este tipo de paranóia, nos outros dois exemplos apenas um pouco de especulação serviu para colocar todo mundo em alerta “fator um”. Isto talvez reflita o clima existente na década de sessenta, com as lembranças da violenta tentativa de expansão da Alemanha nazista ainda recente, o recrudescimento da guerra fria e a escalada da violência no Vietnã.

Voltando ao episodio, o fenômeno inicialmente apresentado à tripulação da Enterprise e que coloca toda Frota Estelar em alerta, seguida da descoberta de um ser extremamente perturbado, no caso Lazarus, imprime ao segmento uma sensação de mistério e urgência em sua solução. Entretanto o que poderia render um bom episodio começa a se tornar cansativo, primeiro por que as constantes alternâncias de humor de Lazarus (“A” e “B”) são confusas, nunca deixando claro qual deles esta na Enterprise e qual não está. Na verdade, a mudança de comportamento de ambos é por demais superficial, e somente ao final é que estas personalidades distintas são definidas. Isto não seria um problema, se na grande parte das suspeitas de Kirk e Spock não se baseassem justamente nestas mudanças de comportamento de seu convidado.

O episodio é então inundado de uma overdose de “tecnobaboseira” que vai enchendo os diálogos de Kirk e Spock de um jargão impenetrável e monótono para quem não tem MUITO interesse em Pseudociência. Ele aposta tudo na idéia que o todo o universo conhecido está à beira da destruição, mas será que está mesmo? Embora muitos dos princípios abordados em “The Alternative Factor” sejam objetos de estudo de gente séria, é necessário bom senso e conhecimento de causa parta colocar as coisas em termos que o espectador possa entender e se divertir entre um saco de pipoca e outro. A possibilidade da existência de uma outra dimensão vem sendo admitida pelos teóricos da Física Quântica, mas não se acredita que haja comunicação possível entre estes universos, e mais, quem foi que disse que se existir, este seria um universo negativo? Não há base cientifica para isto.

E mesmo que assim o fosse, a noção de que seria necessário o encontro de um Lazarus positivo e outro negativo para criar o aniquilamento de matéria é uma fabula, visto que o conceito de matéria e antimatéria é definido ao nível das partículas elementares, ao nível dos prótons e antiprotons, elétrons e positrons, e etc., porém fossem realmente os dois universos integralmente de matéria e antimatéria bastaria a simples troca  de qualquer um elemento entre estes dois universos para causar a aniquilação da qual falam Kirk e Spock, e embora a energia liberada desta aniquilação seja de incrível poder (a base do funcionamento do motor de dobra da Enterprise) isto resultaria de forma alguma na destruição de todo o universo conhecido.

Outros conceitos apresentados durante o episodio são passíveis de algum tipo de reflexão sobre a forma e correção (ou não) de como foram usados, mas isto tornaria este artigo tão cansativo quanto o próprio segmente que ele pretende analisar. Além disto à questão aqui não é a correção ou não dos termos cunhados do jargão cientifico, pois o estranho seria se eles não aparecessem em uma serie de Ficção Cientifica, e mais ainda, se o que faz  que a “ficção” seja “cientifica” é justamente a condição dela estar intimamente ligada aos fatos científicos, mesmo teóricos. É fato também que estes nem sempre irão se confirmar da forma como se teoriza, portanto seria injusto cobra aulas (de verdade) de Física Quântica numa série de TV.

A coisa vira problema quando toda a trama depende desesperadamente de malabarismos técnicos que são usados em excesso sem nenhum bom senso para carregar um roteiro ineficiente. Tire todas as citações a nave do tempo, a fendas no espaço tempo, a antimateria etc, etc, etc, e o que sobra? Um passageiro paranóico que apesar de Spock ter informado antes mesmo dos créditos de abertura que este representava grande perigo para a nave passou a maior parte do tempo andando livremente pela Enterprise a ponto de conseguir por duas vezes (não importa se haviam dois deles) invadir a engenharia e roubar os cristais de dilitio da nave. Com base em que Spock concluiu que um ser que ele ainda nem conhecia era assim tão perigoso é algo que não se explica. Intuição? E depois de tão bombástica declaração este ser passou todo o tempo a bordo e na superfície andando sozinho e despreocupado. 

As seguidas quedas de Lazarus devem ter sido inspiradas nas famosas quedas do Coiote em sua tentativa de capturar o “papa-léguas” e o tratamento dúbio dado a este personagem, com objetivo de deixar a platéia no escuro sobre a existência dos dois seres, embora funcione neste aspecto, compromete a conclusão final baseada entre varias coisas (todas elas especulações) no fato de que o perfil psicológico dos dois seres é antagônico. Na verdade por quase todo o episodio quase não se nota tal diferença de comportamento, a não ser pelo efeito que parece sugerir algum tipo de transporte das duas entidades de um universo para o outro. Isto não acontece por culpa do ator Robert Brown, que esteve sempre altura do se esperou dele quando a situação de momento assim o permitiu, mas da condução da trama.

Segundo a explicação dada no episodio teriam sido as pessoas do universo negativo que teriam encontrado a maneira para viajar entre as duas dimensões, o que torna incompreensível o fato de ambos os Lazarus terem naves idênticas. Mais ainda, se os tais veículos eram responsáveis por abrir o tal corredor entre os dois universos, o tal fator alternativo, não seria mais simples destruir as naves, ou mesmo uma delas e deixar cada um de seu lado e o universo a salvo? A cena de Kirk empurrando Lazarus para a nave não poupa nem mesmo co clichê da luta corpo a corpo de Kirk, que inexplicavelmente pede a aos seguranças que observavam Lazarus para não se aproximarem enquanto o capitão quase tem suas costelas fraturadas, tudo isto quando um faser em tonteio resolveria o problema de forma mais simples.

Por não seguir uma linguagem simples e por depender extremamente da inclusão de termos técnicos onde eles se apliquem ou não, “The Alternative Factor” não consegue criar empatia com o publico, por isto não emplaca. Apesar de tudo duas coisas devem ser louvadas, a primeira é a aparição da atriz Janet MacLachien como tenente Charlene Master, uma oficial mulher e negra a bordo da Enterprise responsável pela engenharia, ou seja, fazendo algo realmente importante a bordo da nave (apesar disto nos fazer pensar: onde foi parar Scott? e onde foi para o cenário regular da engenharia?). Nada contra Nichelle Nichols, que fique bem claro. A outra é que apesar de toda forma artificial de como foi concebido a seqüência final dos Lazarus condenados a lutar eternamente presos em lugar nenhum, efeito amplificado pelo dialogo de Kirk e Spock nos deixa no mínimo, pensativos, mas de bom é só.


Citações:

Kirk - "I want facts, not poetry."

Spock - "I fail to comprehend your indignation, sir. I've simply made the logical deduction that you are a liar."

Lazarus - "That's hard to explain, Captain. I call it an alternative warp."

Kirk - "Sometimes pain can drive a man harder than pleasure."

Spock - "Madness has no purpose. Or reason. But it may have a goal."

Spock - "Possible existence of a parallel universe has been scientifically conceded."

Kirk - "But you'll be trapped as well, forever, at each others' throat, forever through time."
Lazarus - "Is it such a large price to pay for the safety of two universes."


Trivia:

Na versão original do roteiro, ocorria um bizarro “triângulo amoroso” entre a tenente Masters e os dois Lazarus.

Este é reconhecidamente o episódio pior editado de toda a Série Clássica e um dos que tiveram os maiores problemas em sua produção. O ator John Drew Barrymore iria viver Lazarus, até existindo material publicitário da época divulgando tal fato, mas ficou impossibilitado na última hora

O efeito de Lazarus entrando no corredor dimensional foi conseguido por um formato rotatório abstrato e duplamente exposto sobre uma imagem celeste combinada com a imagem de dois dublês lutando ao fundo. A sala em que se deu a luta (o “corredor na vida real”) era pequena e tinha paredes laranjas e vermelhas e um chão coberto de fumaça para esconder o colchão colocado como uma precaução de segurança para os dois.

 

Ficha técnica:

Escrito por Don Ingalls
Direção de Gerd Oswald
Exibido em 30/03/1967
Produção: 20

Elenco:

William Shatner
como James Tiberius Kirk
Leonard Nimoy
como Spock
DeForest Kelley
como Leonard H. McCoy
Nichelle Nichols como Uhura
George Takei como Hikaru Sulu



Elenco convidado:

Robert Brown como Lazarus A e B
Janet MacLachien como tenente Charlene Masters
Richard Derr como Comodoro Barstow


Episódio anterior  |  Próximo episódio