MANCHETE
DO EPISÓDIO
História
bem executada mostra sistema
de justiça Cardassiano em operação
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episódio
Sinopse:
Data Estelar: 47944.2.
O'Brien está prestes a partir em
duas semanas de licença com Keiko quando encontra, no caminho
para o Explorador, um conhecido de nome Raymond Boone, dos tempos
em que o chefe serviu a bordo da Rutledge. Eles trocam gentilezas
e O'Brien parte sem perceber que Boone gravou a sua voz. Algum
tempo depois, o Explorador de O'Brien e Keiko é interceptado por
uma patrulha Cardassiana comandada por gul Evek. Sua carga é
confiscada e O'Brien é levado preso à capital Cardassiana,
acusado de um crime que Evek se recusa a dizer qual é. Keiko é
devolvida a DS9.
Na
capital Cardassiana, O'Brien é brutalmente despido e examinado no
bureau de investigação Cardassiano. A juíza de seu caso, de
nome Makbar, vai até ele e o informa de que seu advogado se chama
Kovat, mas se recusa em apresentar a natureza do crime
alegadamente cometido pelo chefe. Makbar contata Sisko e informa
que está retendo O'Brien para julgamento, e novamente se recusa a
dar mais detalhes sobre a acusação, porém garante que o
julgamento é meramente uma apresentação irrefutável da culpa
(préviamente estabelecida) do chefe. Diz também que a execução
de O'Brien está marcada para a semana que vem. Makbar permite a
ida de Keiko (esposa do réu) e Odo (como conselheiro do réu,
pois o comissário é um oficial da corte Cardassiana por ter
servido gul Dukat em Terok Nor) para o julgamento.
Na estação, descobertas levantam suspeitas sobre O'Brien, que já
admitiu diversas vezes publicamente o seu desgosto pelos
Cardassianos. Duas dúzias de ogivas fotônicas estão faltando e
uma identificação vocal de O'Brien é encontrada nos registros
de acesso ao depósito. Constitui-se um quadro em que O'Brien
poderia estar levando as ogivas no Explorador para os Maquis. Na
capital Cardassiana, Odo interroga O'Brien sobre o assunto e o
chefe nega qualquer envolvimento com o roubo das ogivas ou com os
Maquis.
Em
DS9, Dax demonstra que o registro vocal de O'Brien foi forjado e
baseado em amostras da voz do chefe em outro contexto. Kira
identifica Boone como tendo encontrado O'Brien no caminho para o
Explorador e Sisko o traz para interrogatório, suspeitando que
ele possa ser membro dos Maquis. Boone nega tudo. Quando a
investigação parece naufragar, um verdadeiro membro dos Maquis
contata Bashir e diz que Boone não tem nada a ver com eles. Sisko
novamente traz Boone, agora para que Bashir possa fazer um exame médico
completo nele.
No julgamento, Evek apresenta as ogivas apreendidas e a tese de
que O'Brien iria entregá-las aos Maquis, sobre os quais ele diz
que tornaram a situação na Zona Desmilitarizada completamente
insustentável. Makbar não permite que Odo apresente a evidência
da manipulação vocal que poderia inocentar o chefe. Posto no
banco das testemunhas, O'Brien é pressionado por Kovat e Makbar
para confessar o crime, o que ele não faz. Quando Makbar está
prestes a declarar a culpa de O'Brien, Sisko entra na sala com
Boone. O semblante de Makbar muda completamente e ela diz que
apesar de O'Brien ser culpado ela irá liberar o chefe sob a custódia
de Sisko "em prol das futuras relações entre a Federação
e Cardássia".
Na volta para estação no Explorador, Sisko explica que o real
Boone provavelmente morreu na prisão e foi subtituído por um
Cardassiano modificado cirurgicamente oito anos atrás, um espião.
A prisão de O'Brien nunca foi algo dirigido em particular ao
chefe mas sim uma estratégia Cardassiana para "provar"
que os Maquis são oficialmente sancionados pela Federação.
Quando Sisko chegou com Boone ao julgamento, ficou claro a Makbar
que ele tinha as provas para desacreditar o governo Cardassiano na
frente do planeta inteiro. Finalmente, um alividado casal O'Brien
pôde seguir com sua merecida licença.
Comentários:
Ainda que definitivamente não no nível dos seis últimos episódios,
"Tribunal" emerge como um vencedor por oferecer
um bom valor de entretenimento com sua descrição do bizarro
sistema judiciário Cardassiano e também ajudar a série a se
manter focada tematicamente, tratando do continuado conflito na
Zona Desmilitarizada. Porém, mesmo valores de produção de ótimo
gosto e algumas excelentes atuações (de Meaney e Auberjonois) não
conseguem fazer esquecer um final ridiculamente corrido, com um
fechamento extremamente expositivo. Saiba mais detalhes, sem
precisar doar um molar para o bureau de identificação
Cardassiano, nas próximas linhas.
"Tribunal"
é uma exposição do sistema judiciário Cardasiano baseado em
certas falas (maravilhosas por sinal) de gul Dukat em "The
Maquis, Part I". Daí quem assisitir a este episódio
esperando por um veículo focado e intenso sobre O'Brien lidando
com seus demônios da época das guerras de fronteira Cardassianas
vai se decepcionar. Porém, para os espectadores que levarem em
conta o que ele é, isto é, mais um capítulo dos continuados
conflitos na Zona Desmilitarizada, tendo como pano de fundo o
sistema judiciário Cardassiano e a história pregressa de O'Brien
com estes, pode gostar bastante da experiência.
O sistema de justiça Cardassiano é retratado da forma mais
simples possível, como uma deturpação das regras dos tribunais
da Federação (ou seja dos tribunais americanos). Isto acaba por
reduzir a intensidade do episódio como um todo, abrindo espaço
para um certo tom de sátira. Não há maiores problemas com isso.
A coisa mais forte sobre a sociedade Cardassiana apresentada é o
fato de que os seus julgamentos são essencialmente elaborados
shows transmitidos globalmente de forma a manter o status quo do
Estado, um tema recorrente desta raça. Um Cardassiano é o que
ele pode fazer pelo Estado, Daí não fazendo muito sentido
direitos individuais, daí tal sistema de justiça. Com estes
tribunais e com a Ordem Obsidiana (mencionada em "The
Wire"), não é a toa que os Cardassianos são o povo
mais paranóico do quadrante.
A
trama do episódio foi do tipo "receita de cozinha", bem
conhecida, mas bem executada. Quanto ao plano dos Cardassianos:
DS9 (uma estação Cardassiana) é o posto comandado pela Frota
mais próximo de Cardássia, daí a oportunidade; a atitude
anti-Cardassiana de O'Brien e os motivos por isto são bem
conhecidos e eles tinham o "falso Boone" (e
provavelmente outros "falsos alguéns"), um amigo de
O'Brien --o que é também bastante razoável visto o evento
importante que os relaciona.
(Não posso evitar de pensar: quantos espiões alterados
cirurgicamente a Federação e Cardássia têm de parte a parte?)
O que depõe contra o episódio é a cena final tão corrida e
expositiva que beira a arbitrariedade e mesmo faz por merecer um
certo sorriso cínico, por ser uma cena com ZERO valor dramático,
escrita somente para benefício da audiência. Não
necessariamente a pior escrita do mundo mas definitivamente também
não a mais sofisticada.
O'Brien, sempre "o homem comum com quem qualquer um pode se
identificar", traz algumas particularidades desta caracterização
ao episódio. Ele é claramente a melhor escolha (dentre os
regulares da série) para exemplificar o drama de um inocente
frente a uma sociedade totalitária e cruel; Nenhum outro
personagem do franchise de Jornada consegue dizer algo do
tipo "que nunca agiu de forma a perder o respeito de sua
filha" e fazer sentido no contexto deste mesmo franchise. Daí
vem um grande problema, nunca houve dúvidas da inocência de
O'Brien, o que tirou de saída grande parte da possível força do
episódio. Com esta escolha ficou claro para a audiência que
algum tipo de manipulação estava em andamento. Foi interessante
lembrar Setlik III, e o interrogatório de Makbar sobre os
preconceitos do chefe frente aos Cardassianos foi bem colocado.
Mas o episódio fica longe de ser uma bem-acabada obra para o
personagem.
Odo foi (surpreendentemente) o grande personagem do episódio e
continuou a nos brindar com uma grande presença e uma
incapacidade genuína em julgar as pessoas. A forma com que ele
sinceramente admite, mesmo diante das reservas dos demais, a
Keiko, que O'Brien deve estar sendo torturado e ao mesmo tempo
oferece uma grande simpatia à esposa do chefe é muito
interessante. Outro ponto digno de nota é a forma como ele aborda
O'Brien sobre um possível envolvimento dele com os Maquis, 100%
profissional e ainda assim gentil e respeitoso (o "Sim,
senhor" que O'Brien oferece a ele ao final da conversa é
devido a isto, nada tem a ver com hierarquia). É hilário como
Odo consegue emperrar o julgamento mentindo (infinitamente bem)
sobre a sua falta de conhecimento sobre o sistema de justiça
Cardassiano. Digno de nota é também o fato de que, apesar de Odo
afirmar que nos tempos em que os Cardassianos comandavam DS9, esta
era mais segura, ele de forma alguma estava satisfeito com o
sistema de justiça subjacente --ao qual ele servia. Tempos difíceis
para o comissário sem dúvida.
(Na cena em que Odo interroga O'Brien sobre o possível
envolvimento do chefe com os Maquis, Rene Auberjonois introduz um
bocado de sub-texto com sua postura. Podemos inferir disto que ele
poderia estar se referindo aos acontecimentos de "A
Man Alone" da primeira temporada, em que Odo também
é acusado injustamente de um crime que ele não cometeu e (ou)
dos acontecimentos de "Things Past", da quinta
temporada, em que descobrimos que, por um erro de Odo, três
Bajorianos inocentes foram executados.)
Dentre os demais regulares, Kira levantou suspeitas de uma forma
natural e consistente, porém Bashir pareceu por demais exagerado
na defesa do amigo. Sisko e Dax ajudaram a levar a trama, nada
mais.
Evek foi essencialmente um elemento de trama, não um personagem
(ainda que um belo elemento de continuidade). Boone entrou e saiu
de forma completamente indefinida do episódio e sua aura de
"eu estou sujo" só serviu para entregar ainda mais as
suas atividades (aparentemente o roteirista não achou que a cena
em que ele mostra a gravação da voz de O'Brien fora suficiente
para expressar esta idéia). Keiko foi bem usada a maior parte do
tempo, especialmente nas cenas na estação. Makbar esteve
razoavelmente bem na cenas no tribunal (ainda que uma presença
mais forte teria ajudado muito mais a vender a opressão do
sistema judiciário Cardassiano), porém muito fraca nas cenas
fora dele. Kovat, ainda que essencialmente um alívio cômico,
produziu bom valor de entretenimento e mesmo angariou alguma
simpatia.
A direção de estréia de Brooks foi excelente, com destaque para
a cena em que O'Brien foi "processado", inúmeros
detalhes de closes e diferentes tipos de iluminação mesclam
estilo e brutalidade de forma admirável. As pinturas da paisagem
da capital Cardassiana são maravilhosas e a composição dos
grandes visores públicos e dos espectadores sobre elas, foi de
muito bom gosto. O belíssimo cenário minimalista da corte
Cardassiana com múltiplos níveis e extremamente bem iluminado e
fotografado também foi um destaque. Pontos também para os
penteados e vestuários (até a roupa de Keiko estava ótima).
(A cena na cela entre Odo e O'Brien também é interessante, pois
em parte do diálogo vemos Odo interagindo com o reflexo de
O'Brien. Boa idéia de Brooks.)
Rene Auberjonois deu um verdadeiro show de presença e
sensibilidade. É incrível como ele consegue transmitir tanta
intensidade com uma simples cruzada de braços. Bravo! Colm Meaney
como sempre foi perfeito em fazer um homem comum que age e reaje
como tal (ao contrário do que alguns possam pensar, nada fácil
para um ator). Os demais regulares fizeram o "feijão com
arroz", ainda que talvez El Fadil tenha exagerado um pouco em
alguns trechos.
Somente
Weaver conseguiu ir além do material oferecido na pele do
subserviente e patético Kovat. Poe e Beck fizeram o possível com
papéis minúsculos e rotineiros. Lagerfelt seguiu os altos e
baixos do material recebido, longe de realmente ser a presença
incarnada do sistema de justiça de Cardássia, seja em termos de
poder, transcendência ou absoluta antipatia. Chao teve alguns
problemas no início do primeiro ato, nas cenas com Meaney no
Explorador: os dois pareciam muito desajeitados para um casal
realmente casado. Também foi dela a única cena completamente
inassistível do episódio, dando horríveis gritos choramingados
após os Cardassianos se transportarem do Explorador com O'Brien.
No restante do episódio até que ela se saiu bem.
(A brincadeira do "Workaholic O'Brien" funcionou bem,
quando do início do episódio com Kira, Dax e Sisko --o detalhe
do elevador foi bonitinho-- mas funcionou de forma grosseira e óbvia
com Keiko, logo depois.)
A cena em que os Maquis contatam Bashir foi ótima, não somente
para a trama do episódio em questão, mas por reforçar os Maquis
como um potencial adversário próximo e perigoso, que consegue
isolar completamente a enfermaria da estação com o oficial médico
chefe dentro.
"Tribunal", ainda que dificilmente revolucionário,
é uma bem produzida hora de entretenimento com algumas notáveis
virtudes nos temas revisitados referentes aos Cardassianos,
O'Brien e especialmente os Maquis. A fenomenal caracterização de
Odo é um bônus que por si só já vale a realização do
segmento.
Citações
Sisko - "Is he
gone?"
("Ele já foi?")
Kira - "Finally."
("Finalmente.")
Sisko - "Good. He's been driving me crazy all day."
("Bom. Ele esteve me deixando maluco o dia inteiro.")
O'Brien - "Must've been someone else in bed with us."
("Deve ter sido alguém que estava na cama junto com a
gente.")
Evek - "You have the right to refuse to answer questions.
However, such refusal may be construed as a sign of guilt."
("Você tem o direito de se recusar a responder perguntas.
Entretanto, uma recusa como essa pode ser interpretada como um
sinal de culpa.")
O'Brien - "I'm no angel --but I try to live each day as
the best human being I can be."
("Eu não sou u santo --mas tento viver cada dia como o
melhor ser humano que posso ser.")
Kovat - "Winning is not everything."
("Vencer não é tudo.")
Trivia:
Mais um episódio do tipo "vamos torturar o chefe
O'Brien".
Presença de Keiko e de Richard Poe, como Gul Evek.
Primeiro episódio dirigido por um ator da série, no caso Avery
Brooks.
O episódio foi feito tendo como inspiração as falas de Dukat
sobre o sistema de justiça Cardassiano em "The
Maquis, Part II".
Herman Zimmerman declarou que a arquitetura de Cardássia é
fortemente baseada na obra "1984", de George Orwell.
O cenário da corte Cardassiana foi uma rearrumação do cenário
da holosuíte. Este cenário serviu de inspiração para o
penteado de Makbar.
Foi a primeira cena de nudez de Colm Meaney. Existem paralelos
entre o tratamento recebido por O'Brien e o recebido por Picard no
clássico episódio da sexta temporada da Nova Geração, "The
Chain of Command". Outros bons pontos de continuidade são
a lembrança da Rutledge (a antiga nave de O'Brien) e do massacre
de Setlik III.
Ficha
técnica:
Escrito por Bill Dial
Direção de Avery Brooks
Exibido em 06/06/1994
Produção: 045
Elenco:
Avery Brooks como
Benjamin Lafayette Sisko
René Auberjonois como Odo
Nana Visitor como Kira Nerys
Colm Meaney como Miles Edward O'Brien
Siddig El Fadil como Julian Subatoi Bashir
Armin Shimerman como Quark
Terry Farrell como Jadzia Dax
Cirroc Lofton como Jake Sisko
Elenco convidado:
Rosalind Chao como Keiko O'Brien
Caroline Lagerfelt como Makbar
John Beck como Boone
Richard Poe como gul Evek
Julian Christopher como a voz Cardassiana
Fritz Weaver como Kovat
Majel Barrett-Roddenberry como a voz do computador