Série Clássica
Temporada 1

Análise do episódio por
Carlos Santos



 









 

MANCHETE DO EPISÓDIO
Episódio oferece demonstração forte
do 'grande trio' da série original

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Sinopse:

Data Estelar: 3287.2.

A USS Enterprise segue em direção ao planeta Deneva, onde a população parece estar sofrendo de um tipo de epidemia de loucura. O planeta não responde a tentativas de comunicação. Durante a aproximação eles localizam uma nave vinda de Deneva seguindo em direção ao sol de seu sistema. A Enterprise tenta salvar o único tripulante a bordo, mas não consegue. Antes que sua nave fosse desintegrada a Enterprise ouve apenas o tripulante declarar que “estava livre” antes de morrer. A Enterprise volta ao curso para Deneva, onde entre seus habitantes estão o irmão de Kirk, Sam, sua cunhada Aurelan e seu sobrinho, David.

Após estabelecer órbita Uhura estabelece um breve contato com um transmissor particular operado por sua cunhada, tempo o suficiente para pedir ajuda, mas o sinal é cortado abruptamente. Kirk lidera um grupo de descida para investigar a pouca atividade do planeta. Eles encontram pouquíssimas pessoas nas ruas e quase ninguém em movimento. Os poucos encontrados tentam atacar o grupo ao mesmo tempo em que parecem querer avisá-los de algum perigo.

Um grito chama a atenção do grupo que encontra um grupo de pessoas dentro de um dos prédios. Entre estas pessoas está o irmão de Kirk, morto. O sobrinho e a cunhada também são encontrados, o primeiro desacordado e a outra em pânico. Ambos são levados a bordo da Enterprise. Kirk deixa o grupo de desembarque sob o comando de Spock e também retorna a nave.

Uma vez na enfermaria Aurelan recobra a consciência e apesar de sentir dor extrema consegue falar algo sobre criaturas que tomam conta dos corpos, usando-os como hospedeiros para sobreviver e para se espalhar por outros lugares. Ela diz a Kirk que este precisa impedir tais coisas de espalharem, entretanto ela não suporta a dor e morre.

Kirk volta ao planeta e pergunta a Spock pelas tais criaturas, mas o vulcano informa não ter visto nada de anormal, além da ausência de pessoas nas ruas e de um estranho som, o qual ele estava indo investigar. Kirk se une ao grupo de desembarque e entram em num prédio que parece ser a origem do som. Lá dentro eles as criaturas responsáveis pelos eventos no planeta.

Tal criatura se mostra uma forma de vida extremante resistente aos fasers, além de não serem registradas pelo tricorder. Kirk ordena a retirada, mas antes que isto possa ser feito um das criaturas ataca spock. Kirk remove a criatura, mas Spock já esta afetado. De volta a nave Mccoy constata que a criatura que atacou Spock de alguma forma se integrou ao organismo de Spock. McCoy tenta removê-la cirurgicamente mas não obtém sucesso.

O doutor diz a Kirk não saber se pode salvar Spock, ou seu sobrinho, deixando Kirk ainda mais frustrado. Enquanto isto, na enfermaria Spock tem um surto de fúria enquanto a criatura tenta dominá-lo e ataca a tripulação da ponte, numa tentativa de obrigar a Enterprise a descer em Deneva.

Spock é detido e levado de volta a enfermaria onde é amarrado ao leito. Uma vez lá ele tenta convencer a Kirk que pode controlar a dor e manter seu autocontrole, mas nem o capitão nem McCoy parecem acreditar no Vulcano e preferem deixá-lo preso por mais tempo. Angustiado com situação de seu amigo e seu sobrinho, mais uma vez Kirk pede a Mccoy que os ajude, mas este o lembra das responsabilidades com as pessoas em Deneva, que Kirk parece ter colocado em segundo plano.

Ambos deixam a enfermaria, sem perceber que Spock prosseguia em sua luta contra a criatura em seu corpo. Ele arrebenta as amarras e depois tenta a fazer com que Scotty o dessa a superfície, mas este o impede e chama Kirk. Quando o capitão chega a sala de transporte Spock tenta convencê-lo de que está sob controle de sua ações, e solicita que seu desembarque seja autorizado a fim de que ele possa recolher um espécime alienígena para analise, uma vez que ele já está afetado.

Ainda reticente, mas sem alternativas, Kirk concorda, sob os protestos de Spock, que desce executando sua missão com sucesso. Com o espécime em mãos McCoy e o próprio Spock passam a pesquisar formas de destruir o organismo sem matar seus hospedeiros. Kirk lembra que o piloto da nave que se jogou contra o sol de seu planeta gritou que estava livre. Ele orienta a equipe a trabalhar neste foco.

Seguindo a orientação de Kirk eles tentam diversas opções sem sucesso, deixando a Kirk somente a opção de destruir toda a vida em Deneva, incluindo seus habitantes, para impedir que as criaturas sigam para outro planeta. Imaginando que não há mais alternativas além da total destruição de Deneva e incerto a respeito da sua capacidade de continuar no controle de suas ações, Spock pede permissão para desembarcar levando com ele o sobrinho de Kirk.

Kirk não permite e exige de sua equipe uma opção que mate as criaturas e salve os colonos, e lembra do efeito do sol de Deneva no piloto da nave suicida. Ele lembra ainda que as criaturas na superfície estão sempre em locais escuros, o que pode ser um indicativo de que estas sejam sensíveis a luz.

Um primeiro teste é realizado mostrando que a teoria estava certa, entretanto, visando descobrir se ação pode livrar os indivíduos conectados de seus hospedeiros, Spock se oferece como voluntário e visando repetir as condições do planeta o vulcano é exposto a luz intensa sem proteção. A experiência livra Spock da criatura em seu organismo mas deixa-o cego. Somente após esta experiência McCoy recebe os resultados dos testes de laboratório, que mostram que podia haver solução que evitasse a cegueira de Spock.

Uma rede de satélites é montada em volta de Deneva com o objetivo de irradiar o tipo de luz que possa matar a criatura. Mais uma vez a experiência funciona e todas as criaturas são mortas deixando o planeta livre.

A bordo da Enterprise Spock volta ao serviço, enxergando, para espanto de todos. McCoy esclarece então uma que formação ocular incomum dos Vulcanos teria protegido o Vulcano durante a exposição a luz, algo que desconhecido de todos, até então. A Enterprise então deixa órbita e segue seu caminho.


Comentários:

Um dos maiores lugares comuns, senão o maior, da Série Clássica é a forma como esta é montada em torno do “grande trio” Kirk, Spock e McCoy, e como estes se relacionam dentro do contexto da série. Pois bem, neste segmento podemos observar com detalhes extremos com se dá esta relação entre estes personagens, uma vez que grande parte da trama de “Operation: Annihilate!” tira um raio X deste relacionamento. Em breve chegaremos neste ponto.

Antes de disto é obrigatório passarmos pela personagem James T. Kirk, que tem neste episodio elementos acrescentados a sua vida particular. Kirk, que começou como um destemido e aventureiro capitão da Frota Estelar teve ao longo da série Clássica poucos momentos onde precisou lidar com problemas tão pessoais. Nesta primeira temporada, somente em “The City on the Edge of Forever” ele tenha tido uma questão deste tipo nas mãos.

Para começar “Operation: Annihilate!” dá uma família a Kirk, e embora a maior parte desta não chegue a fim do episodio este é um acréscimo significativo ao seu histórico, e se não será algo explorado ao longo da Série Clássica pelo menos aqui se torna um diferencial importante, pois lhe dá uma face mais humana. Embora seja algo meio clichê (começo a me perguntar o que não é) criar uma encrenca qualquer e incluir dentro desta encrenca em ente querido a fim de proporcionar algum conflito, aqui este artifício tem sua utilidade. É a primeira vez que vemos Kirk tão perturbado e confuso. Ponto para a interpretação de Shatner que consegue descer do altar de herói inabalável com bastante eficiência.

Se a perda do irmão e da cunhada deixam Kirk abalado, a eminência de perder o sobrinho e depois Spock, seu primeiro oficial e amigo, o deixam ainda mais aflito, o que conforme dissemos antes, dá a Shatner uma boa oportunidade de atuar bem. Mas a contaminação de Spock também fornece um bom pretexto para que ele mostre com todas as letras o que é ser Vulcano, enquanto precisa se controlar para não ser dominado.

Nimoy consegue sucesso em passar para a audiência a dificuldade de vencer a criatura em seu corpo, e sua determinação em prosseguir com seu trabalho apesar da dor e da quase certeza de que estava condenado. Ele se oferece para ir a planeta, tirando de Kirk o fardo de arriscar mais alguém para executar uma tarefa que cedo ou tarde teria que ser feita, ou mais tarde, esclarecendo a todos que Kirk precisará, pela responsabilidade que tem, ordenar a morte de seu sobrinho, e dele mesmo. Spock faz isto para deixar claro a todos que não culpa Kirk pelo que ele terá que fazer, e que ninguém mais deverá fazê-lo, ou ainda se oferecendo de imediato como voluntário para a experiência. Estes momentos agregam ainda mais valor ao caráter deste personagem tão querido e tão respeitado pelos fãs, justamente por sua presença de espírito em situações como esta.

DeForest Kelley tem uma de suas atuações mais destacas da primeira temporada, não só pelo tempo em tela dedicado a seu personagem, como pela sua importância. Neste segmento ele tem a chance de mostrar sua competência e responsabilidade enquanto médico, sua sensibilidade quanto à situação de seus dois amigos. Ele está sempre presente, ora em sua preocupação quanto ao estado de saúde Spock, ora servindo como um conselheiro, ao lembrar a Kirk suas responsabilidades de comando, apesar de suas perdas e sua preocupação com seus amigos.

E é justamente da química entre os três personagens que surge a força motriz que faz as peças que movimentam o episodio se posicionarem. Spock sabe que Kirk precisa de seu melhor homem nesta hora, Kirk sabe que é a sobrevivência de seu amigo, (e conseqüentemente de seu sobrinho e da população de Deneva) dependem de sua competência de comando, assim como dependem também da competência de Mccoy, que precisa motivar Kirk a ajudá-lo a manter com o foco na questão principal. Um circulo, que se fecha em torno dos três, ou três linhas paralelas que no final acabarão por convergir.

Quando o círculo se fecha, Kirk retorna ao comando de suas ações, voltando a agir com firmeza e motivando seus homens a darem o melhor de si, ou seja, liderando. Embora a negativa de Kirk quanto a opção de eliminar toda a vida em Deneva tenha mais a ver com a aceitação da responsabilidade de ordenar a morte de um milhão de pessoas, o que é algo absolutamente compreensível e saudável, do que propriamente com uma decisão de comando. Mas em seguida ele dá uma contribuição significativa na busca da solução ao perceber um detalhe que seus amigos (e especialistas) não viram e engana-se quem pensa que este tipo de situação não acontece no mundo real.

Mais uma vez duelo lógica versus paixão se desenrola a bordo da Enterprise, tendo é claro Spock e McCoy como contendores, mas aqui o episódio deixa claro que quando ambos trabalham em conjunto, quando razão e emoção se equilibram através de um elemento catalisador (Kirk) e chegam a um meio termo, é que se obtém o melhor do dois mundos. Apesar das rusgas, o episodio deixa transparecer nas entrelinhas a admiração que ambos nutrem um pelo outro.

Com o termino da experiência e como resultado, a cegueira de Spock, abre-se uma nova janela dentro do episodio. Que ele ia recuperar a visão de alguma maneira, todo mundo já sabia, a questão é : Havia um propósito na cegueira de Spock ? Penso que sim. Apesar de tentar não demonstrar, Spock esta em choque com sua situação, mas mesmo assim ainda se sente que precisa proteger McCoy do sentimento de responsabilidade, agregando mais ainda a personagem. Ainda podemos observar a reação de McCoy e seu sentimento de falha, de fracasso, ao perceber que poderia ter evitado tal situação. Ele não culpa a pressa de Kirk, mas a si mesmo, assumindo para si tal responsabilidade.

É importante frisar que cada um dos três um forte momento emocional pelo menos ao longo do episodio. Kirk, ao encontrar o irmão morto, Spock, ao descobrir-se cego, e McCoy, ao perceber que podia ter evitado isto. No fim das contas, a falsa encrenca em Deneva serviu apenas para que pudéssemos saborear um legítimo episídio de Jornada nas Estrelas, com o melhor do grande trio em ação, tendo cada um deles conseguido deixar uma marca forte da Série Clássica.

O episódio não ganha nota máxima muito em função da falsa encrenca em Deneva.. Falsa por que parece estranho que todo um planeta tenha sido dominado pelas tais criaturas, uma vez que fica claro durante o episodio que estas não podem ter tomado o todo a colônia de uma única vez. Não dá para acreditar que ninguém tenha conseguido mandar uma mensagem ou que não houvesse naves disponíveis em Deneva que permitissem a alguém levar pessoas com algum aviso sobre o que estava acontecendo. Sem falar que não dá para entender por que uma colônia da Federação fica um ano sem fazer nenhum contato e se demora tanto para investigar, principalmente em se pensando em século 23. Para piorar, McCoy diz que não havia nenhuma razão médica que explicassem os fenômenos anteriores, que foram relacionados com a crise em Deneva. Quer dizer que ninguém em lugar nenhum pensou em fazer ao menos uma autopsia de algum pobre coitado dos planetas anteriormente atacados, pelo menos nos mais recentes, pois se tivesse teria chegado às mesmas conclusões de McCoy. Tais detalhes não derrubam o episodio, mas faz exigir uma boa dose de suspensão de descrença para que ele funcione.

Além disto o cenário das externas dá uma “cara” bem singular a este episodio, mas apesar da boa vontade da produção neste sentido ele é mal aproveitado. Há sempre uma impressão de “deslocamento” tanto da equipe da Enterprise quanto dos “nativos” Denevianos. Existe uma matéria no TB sobre os cenários artificiais da Série Clássica terem contribuído para manter sua “atualidade”. Este episódio é um perfeito exemplo disto, ao mostrar que as externas em ambiente urbano nem sempre são um cenário amigável para a Série Clássica.

No capítulo “criaturas da semana”, acho que não vale pena discutir a caracterização das mesmas, pois é chover no molhado falar sobre as dificuldades técnicas da época para executar tal tarefa, mas o que eu gostaria de saber que lugar seria este, “onde as nossas leis físicas não se aplicam”!? Uma bobagem desnecessária, mas de vez em quando repetida quando se quer justificar algo e não se sabe muito bem como em Jornada nas Estrelas.

De significativo, apenas a noção que a descrição das criaturas remete imediatamente à coletividade Borg, fazendo pensar se os parasitas de Deneva não teriam sido uma fonte de inspiração para os vilões da Nova Geração.

Mais ainda, apesar do aspecto marcadamente emocional do segmento, é estranho ver que Kirk tenha aceitado de forma tão serena, ao fim do episodio, a morte do irmão e da cunhada, conforme é demonstrado no tradicional momento de descontração na ponte. Pena, pois a condução do personagem no que diz respeito a esta perda, até então correta, foi muito importante para o contexto do episódio.

Por falar no final, com a crise resolvida, temos mais uma dose daquele velho e bem vindo bom humor da Série Clássica, e tiradas inesquecíveis como a fala sobre as orelhas de Spock, e seu olhar de contentamento ao ver McCoy embaraçado, mais uma vez.

Em resumo, se a Série Clássica é pautada nas relações de amizade e companheirismo do “grande trio”, permeadas com alguma dose de bom humor, “Operation: Annihilate!” é realização total deste relacionamento, uma amostra fiel de como as competências e características dos três personagens se unem de forma a montar um “todo” coerente e sólido. Um coquetel do que há de mais significativo nesta primeira edição da franquia.


Citações:

McCoy - "Spock, are you all right?"
("Spock, você está bem?")
Spock - "The creature within me is gone. I am free of it ... and the pain. And I'm also quite blind. An equitable trade, Doctor. Thank you."
("A criatura dentro de mim se foi. Estou livre dela... e da dor. Também estou cego. Foi uma troca justa, doutor. Obrigado.")

Trivia:

Steven W. Carabastos foi o responsável pelo roteiro de “Court Martial”.

Craig Hundley, o menino que faz o papel do sobrinho de Kirk, voltaria em “And the Children Shall Lead”, da terceira temporada.

O finado Samuel Kirk é obviamente “interpretado” pelo próprio Shatner.

O campus da UCLA foi usado como cenário de Deneva.

 

Ficha técnica:

Escrito por Steven W. Carabatsos
Direção de Herschel Daugherty
Exibido em 13/04/1967
Produção: 29

Elenco:

William Shatner
como James Tiberius Kirk
Leonard Nimoy
como Spock
DeForest Kelley
como Leonard H. McCoy
James Doohan como Montgomery Scott
Nichelle Nichols como Uhura



Elenco convidado:

Joan Swift como Aurelan
Maurishka Taliferro como ordenança Zahra
Majel Barrett como Christine Chapel
Craig Hundley como Peter
Fred Carson como Deneviano
Jerry Catron como Deneviano

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