MANCHETE
DO EPISÓDIO
História
dá verdadeira aula de ética
médica em show de Beverly Crusher
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episódio
Sinopse:
Data Estelar: 45587.3.
Worf é seriamente ferido quando um raio de fixação falha e faz
com que um conteiner pesado caia sobre ele. Quando ele acorda na
enfermaria, é recebido com uma notícia terrível --ele está
paraplégico da cintura para baixo. A dra. Crusher informa seu
paciente de que ela convocou uma especialista, a neurogeneticista
dra. Toby Russell, mas avisa a Worf que suas chances de recuperar
totalmente suas pernas são mínimas. A notícia afeta o orgulho
Klingon do tenente, e ele se recusa a permitir que qualquer um,
incluindo seu filho Alexander, visite-o.
Discutindo
o caso de Worf com a dra. Crusher, a dra. Russell propõe a
impementação de uma técnica médica radical, que ainda está em
estágio experimental. Beverly se recusa, indisposta a arriscar a
vida de Worf quando ele não corre risco de morte. Worf, entretanto,
acredita que sua vida já acabou. Ele pede a Riker que o ajude em
seu suicídio cerimonial, citando a crença de que nenhum Klingon
deveria viver como objeto de pena ou vergonha, mas o
primeiro-oficial reluta.
Mais tarde, a dra. Crusher e a dra. Russel visitam Worf para
discutir as opções. Elas apresentam implantes projetados para
restaurar parcialmente o movimento de suas pernas, mas Worf recusa,
dizendo preferir morrer a ser menos do que o homem que era antes.
Neste momento, a dra. Russell diz a Worf sobre a cirurgia
experimental que poderia restaurar totalmente sua mobilidade.
Este movimento enfurece Beverly Crusher, que acredita que a dra.
Russell está tentando usar Worf como cobaia para testar sua técnica.
Eles discutem fora do quarto de Worf até serem chamadas para
atender os sobreviventes da queda de uma outra nave estelar. Lá,
Beverly fica ainda mais enfurecida quando a dra. Russell usa outra técnica
experimental, que leva à morte um paciente. Incapaz de confiar em
sua colega, Crusher dispensa Russell do serviço.
Worf
continua se recusando a considerar os implantes e insiste em querer
morrer. Por causa disso, Picard tenta convencer a dra. Crusher a
permitir que a dra. Russell prossiga com a cirurgia experimental,
mas Beverly permanece firme. Ao mesmo tempo, Riker confronta Worf,
lembrando-o de que a lei Klingon dita que é o filho de Worf, e não
Riker, quem deve ajudá-lo a cometer o suicídio. Incapaz de negar
isso, Worf abandona a idéia de se matar e pede para tentar a
cirurgia da dra. Russell.
Relutantemente, a dra. Crusher concorda, e juntas, ela e a dra.
Russell conduzem a operação. A técnica parece inicialmente estar
funcionando, mas Worf repentinamente tem uma parada cardíaca e
morre na mesa de cirurgia. A dra. Crusher tenta desesperadamente
revivê-lo, mas no fim é obrigada a aceitar que ele se foi. Mas graças
a uma reação bioquímica Klingon misteriosa, Worf subitamente
revive alguns minutos depois e começa a se recuperar. A dra.
Crusher, entretanto, é incapaz de perdoar Russell por ter colocado
em risco a viad de seu colega e amigo.
Comentários:
"Ethics"
é um episódio que deveria ser de exibição obrigatória em
qualquer curso de medicina. O enredo toca em várias questões polêmicas
da profissão, todas extremamente efervescentes nos dias atuais, e a
presença marcante da dra. Crusher, em um dos poucos episódios em
que ela recebe um papel significativo, é um exemplo digno de nota
para qualquer médico ou aspirante.
Por
incrível que possa parecer, o episódio é extremamente verossímil,
do começo ao fim. Embora seja difícil, em princípio, acreditar
que a neurologia esteja tão pouco desenvolvida no século 24 a
ponto de permitir que um homem fique paraplégico após quebrar a
coluna, o fato de Worf ser Klingon salva a pátria da premissa. Graças
à cultura dos Klingons aplicada aos feridos, mas não mortos, é fácil
entender por que esta espécie não se preocupou muito em
desenvolver tratamentos para deficientes físicos. Seria muito mais
fácil --e honroso, do ponto de vista deles-- matar o doente do que
tratá-lo.
Com isso, o cenário está pronto para duas discussões centrais.
Primeiro, a eutanásia --polêmico procedimento médico em que se
exclui o suporte de vida de um paciente, com base no fato de que seu
sofrimento não seria justificável, uma vez que estaria apenas
adiando sua morte e ampliando uma sobrevida quase insuportável.
Claro, aqui a coisa fica mais interessante pois a eutanásia é
elevada a enésima potência --Worf está muito longe de uma condição
terminal.
Isso aproxima o Klingon muito mais do suicídio do que da eutanásia
--e permite a introdução de um fator muito interessante nos casos
suicidas: o egoísmo inerente ao ato. Worf, ao querer a própria
morte, está ignorando todos os seus amigos e familiares, inclusive
o filhinho Alexander, que querem que ele siga vivendo.
Por
esta razão, o diálogo de Riker com Worf é bastante tocante, assim
como a reação do Klingon de desistir do procedimento,
principalmente por seu filho. As cenas entre Worf e Alexander
funcionam de forma bonita e genuína. É impossível ficar alheio à
sequência em que Worf conta a Alexander que desistiu do suicídio e
irá tentar o procedimento médico experimental. Quando o menino, ao
sair, se volta para olhar para seu pai, é possível ver lágrimas
brotando dos olhos dos telespectadores mais sensíveis.
Tão pungente quanto é a cena em que Alexander confronta seu pai
morto. E a "ressurreição" de Worf, embora seja um pouco
forçada, funciona bem como um fechamento para o episódio, pois
demonstra o quanto estava errada a posição da dra. Russell, mas
ainda assim dá uma chance à série de não perder seu oficial de
segurança favorito.
O segundo tema médico do episódio, e o mais interessante e atual,
é o da chamada medicina experimental com seres humanos. Não
poderia haver momento mais propício para a exibição deste episódio:
vivemos numa época em que a efervescência da decodificação do
genoma humano e os primeiros passos da terapia genética estão
dando o que falar.
É óbvio que a única forma definitiva de confirmar a eficácia de
um tratamento é testando-o em seres humanos. Mas, antes disso, uma
longa jornada de testes de laboratório, in vitro e in vivo com
animais, precisa ser percorrida. A técnica da dra. Russell
claramente ainda tinha muitos passos a percorrer antes de chegar ao
ponto de ser testável em humanos.
Entretanto,
ela comete um erro que muitos cientistas correm o risco de cometer
(e alguns cometem com frequência): colocar a pesquisa à frente do
bem-estar dos pacientes. A dra. Crusher faz muito bem ao citar o
princípio de Hipócrates para a medicina, "não fazer
mal". Um médico jamais pode pregar qualquer tratamento que
possa colocar em risco a vida de um paciente sem antes ter a certeza
de que ele tem uma chance razoável de sucesso e de que ele é a
melhor opção viável. Claramente não era o caso, na técnica da
dra. Russell.
Nesse ponto, somos confrontados em uma posição estranha em Jornada
nas Estrelas: acabamos ficando mais do lado da dra. Crusher do
que do capitão Picard, que defende abertamente o modo de vida
Klingon como uma opção viável para Riker, e advoga que Beverly
devesse dar a Worf a chance de optar pelo tratamento experimental.
Claro que isso não faz com que Jean-Luc seja um "vilão"
da história (papel claramente atribuído à dra. Russell,
principalmente na cena em que ela "mata" um paciente ao
usar um tratamento experimental), mas nos deixa na cômoda situação
de vê-lo se equivocar --o que é muito raro ao longo da série.
Embora ele tome posições muito sensatas e aparentemente defensáveis,
é óbvio que ele desprezou dois fatores fundamentais. Com Beverly,
jogou a ética médica pela latrina, julgando-a flexível o
suficiente para adaptar-se ao modo de vida Klingon. Fosse isso
verdade, não seria necessário nenhum esforço para tratar Worf --Klingons
desprezam feridos como ele, e o procedimento correto seria ajudá-lo
a se matar.
Com Riker, colocou os direitos individuais de Worf à sua própria
morte acima dos interesses da nave e de sua tripulação, que
perderia um amigo querido, um colega e um oficial competente, que
poderia muito bem recuperar suas funções ao usar os implantes que
devolveriam 60% de sua mobilidade.
E se Picard teve a perder defendendo essas posições, quem saiu
ganhando mais, de longe, foi Beverly Crusher. Normalmente relegada a
um papel nulo ao longo dos episódios, "Ethics"
representou um momento especial para a doutora, que pôde mostrar
todos os seus princípios médicos, sua integridade de caráter e
sua competência. Gates McFadden não perde a oportunidade e nos dá
uma de suas melhores interpretações. A frustração de Beverly ao
perder Worf na sala de cirurgia é indescritível.
"Ethics" não tem os tiroteios de "The Best
of Both Worlds", as complexidades técnicas de "Yesterday's
Enterprise", a nostalgia de "Unification"
ou a trama política de "Redemption".
Mesmo assim, torna-se um episódio especialíssimo pela verdade das
questões que discute e a honestidade e o discernimento com que as
discute. Mais que uma hora de Jornada nas Estrelas, é um
aviso para médicos, cientistas e opinião pública. É o franchise
exercendo seu papel na sociedade, como idealizava seu criador, Gene
Roddenberry.
Citações:
Worf - "Doctor,
I will not attempt to leave sickbay without your approval. The
restraining field is not necessary."
("Doutora, eu não tentarei sair da enfermaria sem sua aprovação.
O campo de restrição não é necessário.")
Crusher - "Worf, there is no restraining field."
("Worf, não há campo de restrição.")
Crusher - "Be my guest. Just don't expect a lot of
conversation. He is in full Klingon-mode: honorable, strong and
closed-minded."
("Por favor. Só não espere muito papo. Ele está com sua
configuração Klingon ativada: honrado, forte e cabeça-dura.")
Trivia:
Os
uniformes cirúrgicos de cor vermelha voltam a aparecer nesse episódio.
Eles já haviam sido vistos em "Samaritan Snare",
do segundo ano.
Alexander (Brian Bonsall) volta a aparecer. Seu próximo episódio
será "Cost of Living", em
quatro semanas.
Outro personagem que reaparece é a enfermeira Ogawa. Ela estava
sumida desde o episódio "The
Game". Patty Yasutake volta como Ogawa no episódio "Cause
and Effect", em duas semanas.
Ficha
técnica:
História de Sara Charno &
Stuart Charno
Roteiro de Ronald D. Moore
Direção de Chip Chalmers
Exibido em 02/03/1992
Produção: 116
Elenco:
Patrick Stewart como
Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Gates McFadden como Beverly Crusher
Marina Sirtis como Deanna Troi
Elenco convidado:
Caroline Kava como
Dra. Toby Russell
Brian Bonsall como Alexander
Patty Yasutake como enfermeira Alyssa Ogawa
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