Publicado originalmente
em 13 de dezembro de 2003


A Enterprise da tela grande
Bela e misteriosa, a nave da Série Clássica reformada apresenta
mais perguntas do que respostas para os fãs de Jornada


 









 

Dados técnicos da
USS Enterprise reformada
Dimensões
Comprimento: 304.8m
Envergadura: 141,7m
Altura máxima: 71.3m
Tripulação
Comporta 500 pessoas
Velocidade
Cruzeiro: Dobra 8
Máximo: Dobra 9,99
Aceleração de Dobra
Dobra 1-4: 0,78 seg

Dobra 4-8: 0,67 seg

Dobra 8-9,99: 2,13 seg
Duração
Missão Padrão: 5 anos
Manutenção em Doca: 22 anos
Sistemas de Propulsão
Dobra: (2) LN-64 Mod 3 Linear Warp Drive Units
Impulso: (2) RSM Subatomic Unifield Energy Impulse Units
Armamento
12 RIM-12C Independent Twin Mount Phaser Emplacements (6 bancos com 2 canhões cada)
6 RSM-14B Single Mount Phaser Emplacements
2 Mk 6 Mod 1 Direct-Fire Tubo de Torpedos Fotônicos
Sistemas de Computadores
Central: Processador Daystrom Duotronic III com suplemento Multitronic M-7
Naves Auxiliares
8 Work Bee para uso geral
4 Shuttlecrafts de várias classes
Fonte: Star Trek Starship Spotter - Pocket Books (2001)

 


Por Fernando Penteriche

É um pouco difícil acreditar cegamente que a USS Enterprise que vemos nos três primeiros filmes de cinema com o elenco clássico de Jornada nas Estrelas seja realmente a nave da Série Original, reformada. São tantas, mas tantas alterações, que seria como alguém pegar um Fiat 147 e transformá-lo em um Palio.

Mas, como é isso o que aprendemos em Jornada nas Estrelas - O Filme, e que serve perfeitamente aos propósitos da trama e da saga de Jornada, façamos um esforço para aceitar.

Quando estava cogitada a retornar para a mídia com algo inédito que não fossem desenhos animados, lá pelos idos de 1976, ficou decidido que uma nova nave Enterprise deveria ser criada, afinal, a dos anos 60 não traria a credibilidade necessária para uma provável nova produção, e ainda mais cinematográfica. Essa era a aposta de Gene Roddenberry na época, fazer um longa-metragem da série para as telonas.

Ralph McQuarrie, que se tornaria famoso por criar naves para "Star Wars", bolou uma nova nave que lembrava muito vagamente a Enterprise original. Como o filme acabou sendo cancelado antes mesmo da pré-produção se iniciar, a idéia de McQuarrie foi por água abaixo. E ainda bem, pois até hoje tendo alguns defensores, inclusive no Brasil, esta Enterprise era feia demais!


Quem acompanha o TB sabe tudo sobre a aposta seguinte para Jornada, a Fase II, conhecida como "A Série Que Nunca Existiu". Para essa idéia furada da Paramount, chegou-se a fazer uma boa pré-produção, que incluiu esboços, algum cenário, figurinos, maquiagens e uma nova USS Enterprise NCC 1701.

Ao invés de começar do zero, como queria fazer Ralph McQuarrie, os produtores decidiram apenas atualizar a nave, tendo como base o modelo original criado pelo lendário Matt Jefferies na década de 60. Desta vez, trabalhando com fibra de vidro em vez de madeira, alumínio e outros materiais utilizados na confecção da nave original, um modelo maior e mais detalhado pôde ser produzido. Ou, pelo menos, começado a ser.

A nova Enterprise, com design do mesmo Jefferies, traria como principais modificações sua naceles, agora chatas em vez de cilíndricas e sem os "coletores de Bussard", as "redomas vermelhas" que ficavam na frente das naceles. O defletor principal, aquela "antena" na proa do casco secundário, também seria substituído por algo mais "moderno", e as inscrições de identificação no casco da nave capitânea da Frota Estelar sofreriam modificações também.

Um modelo chegou a ser produzido, mas como o leitor já deve saber, a série foi cancelada antes mesmo das câmeras serem ligadas pela primeira vez no set de filmagem. O motivo foi a desistência da Paramount em lançar sua própria emissora de televisão em janeiro de 1978, o que tornou a produção de Jornada nas Estrelas: Fase II inviável, afinal, a nova série seria o carro-chefe da UPN (United Paramount Network). A emissora foi lançada e teve uma série de Jornada na linha de frente de sua programação. Isso em 1995 e com Jornada nas Estrelas: Voyager, ou seja, 17 anos depois.


"Admiral, this is an almost totally new Enterprise."
Willard Decker, Star Trek - The Motion Picture

Para não jogar no lixo todo o investimento na Fase II, toda a pré-produção, acertos com os atores, e aproveitando o embalo do sucesso de "Star Wars" em 1977, a Paramount resolveu lançar um longa-metragem para o cinema, repetindo a idéia que tivera, junto com Gene Roddenberry, em 1975. Mas agora, o projeto sairia do papel, com o veterano diretor Robert Wise no comando.

A tela do cinema é infinitamente maior do que a da televisão, e assim, uma USS Enterprise mais detalhada precisaria ser criada. O modelo criado para a Fase II foi colocado de lado, e um novo, com cerca de dois metros de comprimento, criado. Ainda usando como base o design criado e atualizado por Matt Jefferies com colaboração de Joe Jennings, a nova nave contou com idéias de uma variedade de designers das empresas Abel & Associates e Magicam, especialistas na construção de miniaturas para filmagens. Andrew Probert, artista já entrevistado pelo Trek Brasilis e que foi o responsável pelo desenho original da Enterprise-D de A Nova Geração, além de ser o criador do visual do carro-máquina do tempo DeLorean de "De Volta Para o Futuro", teve em suas mãos a responsabilidade maior na elaboração da novíssima Enterprise.

"Nós, da equipe de Jornada nas Estrelas - O Filme, assumimos o desafio de fornecer um visual que fosse além da concepção televisiva", contou Probert para o TB em 2001. "Quer dizer, a imagem iria ser tão maior que precisávamos de um visual à altura, e foi aí que eu entrei. Meu diretor de arte e efeitos, Richard Taylor, me passou a tarefa de projetar todos os equipamentos, inclusive a Enterprise. Sua única exigência foi a de nos atermos às proporções do projeto de Joe Jennings. Ele também influenciou bastante no projeto do novo motor de dobra da nave. Mas, fora isso, a nave foi totalmente uma concepção minha. Permanecemos fiéis a essa concepção, mas acabamos mudando a maior parte dos detalhes --quase todos os motores, tubos de torpedos fotônicos, o topo e a base do disco", conclui o designer.

Probert também teve a idéia de, aproveitando uma fala de Kirk a Scotty no episódio "The Apple" da Série Clássica, promover a separação da seção disco e do casco secundário. Mas, a seqüência não foi para frente, embora alguns esboços tenham sido feitos, já que outra maquete teria de ser construída para tal, e o orçamento do primeiro filme de Jornada não permitiria isso.

Além do visual externo, Andrew Probert trabalhou bastante nos cenários internos, como a área de carga da nave. Vendo em tela, fica mais difícil acreditar na versão da "atualização" da nave original. A área interna parece muito maior, sendo que a nave continua do mesmo tamanho.

"All right, let's see what she's got!"
James T.Kirk, Star Trek IV - The Voyage Home

Após a destruição da USS Enterprise, em Jornada nas Estrelas III, vemos em Jornada IV o surgimento da NCC 1701-A, nave da classe Constitution reformada, exatamente como a original. Controvérsias não faltam a respeito da origem dessa nave. Alguns livros dizem que ela é a USS Ti-Ho rebatizada, outros que é a USS Yorktown, e muitos nem nome trazem, dizendo apenas que é uma nave da classe Constitution que também sofreu a reforma pela qual passou a Enterprise. Talvez isso não seja importante afinal, já que sempre vale ressaltar que é oficial para a cronologia de Jornada apenas o que se vê em tela, seja no cinema ou TV (menos a Série Animada). Como nunca foi citado nada a respeito da origem desta NCC 1701-A, cabe aos fãs apenas especular, mesmo que tenha como base livros da editora oficial de Jornada, a Pocket Books.

A ponte de comando que vemos no primeiro filme de Jornada tem aqueles monótonos tons pastel. Ao final de Jornada IV, na rápida cena de Kirk e a tripulação a bordo da NCC 1701-A, quase não vemos a ponte, porém em Jornada nas Estrelas V - A Última Fronteira, Herman Zimmerman, designer de A Nova Geração, criou todo o cenário, que nos remete a um meio-termo entre o visual da nave anterior e da ponte de comando da Enterprise-D, criada pelo mesmo Zimmerman.

Embora seu exterior seja idêntico ao da nave destruída em Jornada III, a NCC 1701-A traz a óbvia letra "A" pintada nas identificações do casco. O interior é bem diferente, mas isso varia de filme para filme. Em Jornada nas Estrelas VI - A Terra Desconhecida, a ponte já é outra, bem diferente e mais moderna (e que serviu de base para a ponte da Enterprise-B em "Jornada nas Estrelas - Generations"), assim como os corredores ou quartos da tripulação. Tudo gira em torno da necessidade de enredo, e, ao contrário das séries de TV que têm seus cenários montados no estúdio durante anos a fio, os dos filmes costumam ser destruídos ou reciclados para outras produções, logo ao término das filmagens.

Manual Controverso do Sr. Scott

Assim como o material publicado pela FASA há muito tempo, o livro "Mr. Scott's Guide to Enterprise" não pode ter suas informações consideradas por completo. O livro, publicado em 1987 pela Pocket Books e em 1993 pela Editora Aleph no Brasil, traz controvérsias demais a respeito de datas relacionadas ao universo de Jornada.

Embora não seja canônico (oficial), como todo livro da série, seja manuais de referências, romances, ou guias de cartografia estelar, o Manual da Enterprise (como foi chamado no Brasil), exagera na dose de erros de informação. Publicado antes da Cronologia de Jornada compilada por Michael Okuda, traz alguns absurdos como a data 2216 para Jornada nas Estrelas - O Filme (o correto seria 2271). Porém, as ilustrações e informações técnicas devem ser apreciadas com carinho, já que é bem pouco o material de referência a respeito da classe Constitution reformada. Encare o livro como "ficção dentro da ficção" e divirta-se.

Pela cronologia dita "oficial", a Enterprise original sob comando de Robert April saiu das docas em 2245. Kirk a assumiu em 2264, sendo que a Série Clássica durou de 2266 a 2269. A reforma vista no primeiro filme de Jornada foi de 2269 a 2271. Houve uma obscura missão de cinco anos entre Jornada - O Filme e Jornada nas Estrelas II - A Ira de Khan, e em 2277 a nave foi retirada de serviço e colocada como nave-escola para cadetes. Em 2285 foi destruída na órbita do planeta Gênesis (Jornada nas Estrelas III).

Em 2286 a NCC 1701-A foi lançada sob o comando de Kirk e, ainda de acordo com o livro de Michael Okuda, em 2293, após os eventos mostrados em Jornada nas Estrelas VI - A Terra Desconhecida, foi enfim aposentada.

Nada desmente esse fato, afinal, após Jornada VI (1991) não vimos mais a Enterprise da tela grande, aquela que iniciou a Aventura Humana em 1979 e nos levou para lugares que a telinha da TV jamais teria condições. Sejam eles a Nebulosa de Mutara ou o Centro da Galáxia.

De todas as Enterprises que tiveram destaque, esta sempre foi a mais misteriosa. Melhor assim, pois os fãs podem preencher os capítulos da história da USS Enterprise NCC 1701 reformada com sua vasta, ilimitada e certamente não-canônica imaginação.

Fernando Penteriche é editor do Trek Brasilis