Voyager
Temporada 1

Análise do episódio por
Daniel Sasaki



 









 

MANCHETE DO EPISÓDIO
Debate sobre vida após a morte convida telespectador a manter a mente aberta

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Sinopse:

Data Estelar: 48623.5.

Investigando a possibilidade de ter encontrado um novo elemento em corpos rochosos que compunham os anéis de um planeta, um grupo avançado desce para um dos asteróides e encontra o solo coberto de cadáveres revestidos por cápsulas residuais.

Enquanto o grupo conduz uma sondagem visual, um fenômeno subespacial ocorre, o que os faz chamar por um transporte de emergência. Mas quando o grupo é transportado para a Voyager, Kim não retorna. Em seu lugar vai uma das cápsulas.

Harry se encontra entre pessoas de uma raça cheia de rituais e que acreditam que ele veio do além. Ele é frequentemente perguntado sobre uma "próxima emanação". Uma alienígena chamada Ptera, enquanto isso, é ressuscitada na Voyager. Ela perde sua fé na crença de uma próxima vida, enquanto Harry é objeto de intensa curiosidade e estudo pelo povo de Patera.

Ele só consegue retornar à Voyager substituindo um dos seres escalados para ir para a "próxima emanação" e sendo posteriormente ressuscitado por seus colegas tripulantes.

 

Comentários:

Há uma frase da capitã Janeway durante este episódio que explica por que "Emanations", apesar de seus problemas, é um segmento tão fascinante. "O que não sabemos sobre a morte é muito, muito maior do que o que sabemos", ela diz a Harry Kim.

Girando sobre as questões culturais que envolvem os mistérios da morte --incluindo a fé de uma continuação após o fim da vida biológica--, o episódio consegue trazer à tona vários questionamentos.

O mais forte deles é a demonstração da fragilidade da própria fé, quando exposta a fatos que desafiam as teorias sobrenaturais. Um exemplo clássico real é a derrocada da teoria criacionista (que interpreta a criação do Universo como descrita na Bíblia) após as irrefutáveis informações apresentadas por Charles Darwin em sua teoria da evolução, estabelecendo a natureza da origem das espécies biológicas e de seus parentescos entre si.

No episódio, Harry não precisa falar muito sobre a versão da "próxima emanação" que ele conheceu no campo de asteróides para ser considerado pelos religiosos como uma ameaça à crença local. Mais que isso, ele de fato desperta o ceticismo em um alienígena que já estava prontinho para deixar o mundo dos vivos.

Aliás, apesar de Harry mesmo lembrar que não pode interferir com a cultura e o modo de pensar dos alienígenas, na hora do aperto o alferes não hesita em usar sua lábia para convencer seu colega de quarto a desistir de bater as botas para ceder-lhe o lugar.

Quando o personagem descobriu estar diante de uma sociedade que valoriza o sacrifício de seres pela crença de que há uma vida após a morte, ele prontamente criticou o modo de vida dos extraterrestres, algo nada compatível com a Primeira Diretriz. A atitude de Harry foi eficiente para definir quem de fato ele é: um jovem impetuoso e idealista, e não um comandante experiente e consciente de seus atos. Ponto para o desenvolvimento do personagem.

Outro personagem que teve a chance de mostrar seus dotes foi o comandante Chakotay. O primeiro-oficial mostra alto conhecimento em antropologia e costumes ritualísticos, funcionando durante a missão de exploração do grupo avançado como uma mistura de Indiana Jones com Sherlock Holmes, deduzindo fatos sobre a cultura alienígena que depositava os corpos por lá.

Em compensação, a capitã Janeway não se saiu muito bem. No intuito de recuperar Harry, ela não hesitou em tentar mandar Ptera (a alienígena que foi despachada de seu mundo, mas, graças à Voyager, sobreviveu para contar a história) de volta a seu próprio mundo, a despeito do impacto que a ressurreição poderia causar na cultura alienígena. Ao contrário de Harry, a capitã nem ao menos se lembrou de que estava sob uma Primeira Diretriz. Felizmente, a capitã deu sorte: o procedimento falhou e Ptera morreu, como deveria ser.

Quem também deu uma pisada de bola foi Brannon Braga, o criador do episódio, e Andre Bormanis, o consultor científico da série. Ver um pequeno asteróide com atmosfera de oxigênio e nitrogênio e com gravidade equivalente à da Terra, apesar de sua massa infinitamente inferior e da ausência de formas de vida fotossintetizantes (ou seja, capazes de pegar luz e dióxido de carbono e converter em oxigênio), é difícil de engolir.

Mas o fato não surpreende: desde o começo Voyager já mostrou que ciência não é o seu forte. Além do mais, a opção "cientificamente incorreta" poderia se justificar pelo custo proibitivo de filmar cenas simulando baixa gravidade e exigindo roupas de astronauta para os tripulantes. Tudo isso nos obriga a fazer vista grossa.

Mesmo levando isso em conta, todos os problemas são facilmente superados pela fascinação exercida pelo tema abordado. Também foi muito feliz a escolha das crenças alienígenas, que em muito lembram os costumes dos antigos egípcios de mumificar seus mortos e esperar uma vida após a morte, propiciada pela ressurreição de seu corpo físico atual.

Mas a melhor qualidade do episódio foi a forma como ele concluiu a história, representando em grande estilo o que Jornada nas Estrelas há décadas tenta dizer ao mundo: devemos manter a mente aberta, livre de preconceitos.

Em vez de optar por um final claro e cristalino, do tipo "os alienígenas acham que vão a uma próxima emanação, mas na verdade só são levados para um asteróide, onde apodrecerão pelo resto da eternidade", o episódio termina com um tom de mistério, de falta de respostas, quando Janeway conta a Harry sobre a estranha forma de energia que sai dos corpos sem vida e é absorvida por um campo energético nos anéis do planeta.

Esse era o único modo de concluir o episódio satisfatoriamente: quando estão em pauta questões filosóficas e religiosas, o mistério sempre estará rondando, por mais que nos esforcemos para desvendá-lo. A história conseguiu abordar satisfatoriamente um tema delicado, e inexplorado em Jornada nas Estrelas, tornando-se um dos poucos segmentos realmente originais da primeira temporada de Voyager.

 

Citações:

Janeway - "What we don't know about death is far, far greater than what we do know."
("O que não sabemos sobre a morte é muito, muito maior do que o que sabemos.")

 

Trivia:

int.jpg (476 bytes) "Pensei que seria interessante fazer um episódio que mostrasse que a tripulação de Voyager tem um bocado de respeito pelas outras culturas.", disse Brannon Braga à revista Cinefantastique em 1995. "A sequência no asteróide, quando os corpos são descobertos", prossegue Braga, "é uma tentativa dar a Chakotay certa personalidade, mostrar que ele é um expert em coisas de paleontologia... e que ele é bem inteligente."

 

Ficha técnica:

Escrito por Brannon Braga
Dirigido por David Livingston
Exibido em 13/03/1995
Produção: 009

Elenco:

Kate Mulgrew como Kathryn Janeway
Robert Beltran como Chakotay
Roxann Biggs-Dawson como B'Elanna Torres
Robert Duncan McNeill como Tom Paris
Jennifer Lien como Kes
Ethan Phillips como Neelix
Robert Picardo como Doutor
Tim Russ como Tuvok
Garrett Wang como Harry Kim

Elenco convidado:

Martha Hackett como Seska
Jefrey Alan Chandler como Hatil
Jerry Hardin como dr. Neria
John Cirigliano como alienígena 1
Robin Groves como a esposa de Hatil
Cecile Callan como Ptera

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