Em 1996, a marca Jornada nas Estrelas
estava com grande popularidade, e parecia não haver fim para a
geração de spin-offs e produtos baseados na franquia. O furor em
torno do novo filme da Nova Geração, "Primeiro
Contato", somado à produção incessante de Deep
Space Nine e Voyager na televisão, parecia apontar uma
vida longa e próspera.
Foi nisso que apostou a Marvel Comics, ao
aproveitar a chance deixada por sua maior rival e adquirir
integralmente os direitos de publicação de quadrinhos de Jornada.
Antes pulverizados entre a DC (Série Clássica e Nova
Geração) e a Malibu (Deep Space Nine), eles agora
estariam centrados numa só editora.
Com a euforia reinante, a Marvel não poupou
a criação de títulos novos. Foram criadas as revistas mensais
de Deep Space Nine e Voyager, além de uma edição
mais polpuda e bimestral com histórias da Nova Geração e
da Série Clássica, chamada "Star Trek Unlimited".
Mas os grandes destaques acabaram sendo os títulos originais,
praticamente spin-offs novos de Jornada, só que em
quadrinhos. Surgiram "Starfleet Academy" e "Early
Voyages".
A primeira se concentrava nas aventuras de
um grupo de cadetes da Academia (entre eles Nog, o sobrinho de
Quark), e, apesar dos temores dos fãs, a publicação se saiu
muito bem. Mas nada conseguiu atingir a popularidade e a qualidade
de "Early Voyages".
Essa revista é basicamente a resposta à
pergunta que todos os fãs já fizeram um dia: e se o capitão
Christopher Pike acabasse sendo mantido como protagonista da
série, a exemplo do que acontece em "The Cage"?
Que tipo de Jornada nas Estrelas nós teríamos?
Os escritores Dan Abnett e Ian Edginton,
auxiliados por artistas espetaculares como Patrick Zircher e
Javier Pulido, deram vida às aventuras de Pike, que comandou a
Enterprise uma década antes de James T. Kirk se tornar uma lenda
viva por todo o quadrante.
A série trouxe todos os personagens vistos
em "The Cage", e a aparência da maioria deles
era exatamente a mesma vista no piloto. Apenas os atores que
interpretaram o navegador José Tyler e o doutor Philip Boyce não
puderam ser contatados para autorizar a reprodução de seus
rostos em desenho. Mas a Número Um (interpretada por Majel
Barrett), Chris Pike (Jeffrey Hunter) e todos os outros estão
lá.
Além deles, foram introduzidos novos
personagens, como o engenheiro-chefe indígena Grace, um
alienígena com poderes psicopirotécnicos, Nano, que servia como
oficial de comunicações, e a piloto, tenente Mohindas. Os
recém-chegados caíram como uma luva no formato da série e
trouxeram maior riqueza e opções aos roteiristas, sem a perda do
tom original.
Com roteiros criativos, histórias
compatíveis com a premissa "prequel" da série e a dose
certa de inovação e de saudosismo retrô, "Early Voyages"
possivelmente se tornou a mais memorável das séries em
quadrinhos ambientadas no universo de Jornada nas Estrelas.
Para muitos, acabou se tornando a série que Enterprise não
conseguiu ser.
Infelizmente, apesar do potencial
inesgotável e do sucesso junto aos exigentes fãs, as coisas
acabaram não saindo tão bem. A Marvel se viu surpreendida por
uma crise financeira sem precedentes, que obrigou a empresa a
pedir concordata e cortar abruptamente vários de seus títulos.
Um a um, todas as revistas de Jornada foram canceladas. "Early
Voyages" foi uma das últimas a cair, mas acabou sendo
também encerrada. Sua última edição, para que se tenha uma
idéia do estado em que as coisas terminaram, era um cliffhanger,
que obrigatoriamente pedia uma continuação.
Apesar do fim prematuro, a série segue
sendo um marco na história dos quadrinhos de Jornada. Para a
infelicidade dos fãs brasileiros, como a Marvel não detém mais
os direitos sobre Jornada nas Estrelas, esse material
existe hoje numa espécie de "purgatório editorial" e
não pode ser negociado para nenhuma editora nacional. Apenas 17
edições foram publicadas nos EUA, entre fevereiro de 1997 e
junho de 1998, mas foram suficientes para reservar um espaço
especial no coração (e na prateleira) de seus leitores.