Enquanto a Fase II
existiu como uma pré-produção, vários roteiristas estavam
trabalhando nas histórias dos primeiros episódios da nova série.
Mal sabiam eles que as aventuras de Kirk, McCoy, Xon e Ilia
existiriam apenas em suas mentes, já que, após sete meses de
idas-e-vindas, a série acabaria sendo abortada.
Menos
mal que se transformaria em um filme para o cinema. Logo, o episódio-piloto
"In Thy Image", de autoria de Alan Dean Foster (e
extensamente revisado e modificado por Gene Roddenberry),
sobreviveria como a base para a elaboração do roteiro do
longa-metragem. O diretor até o presente momento era Robert
Collins, originalmente contratado para ser o produtor da recém-falecida
Fase II. Decker, último personagem a ter seu nome
escolhido, estava confirmado no filme, assim como Ilia.
Em muitas revisões do
roteiro já estava definido que ambos seriam absorvidos por V'Ger
no decorrer da trama --os personagens que os roteiristas estavam
construindo teriam vida bem curta, pois não estariam em futuros
filmes de Jornada que porventura fossem produzidos após o
primeiro.
Com
o roteiro de Dean Foster reescrito pelo diretor Robert Collins (45
páginas já revisadas por Roddenberry...), já dava para ter uma
idéia do orçamento do filme. O produtor Robert Goodwin, em um
memorando para a Paramount, passou o valor já com o salário de
Leonard Nimoy, que estava acertando sua volta ao franchise. E
Goodwin frisou que Nimoy tinha de fazer parte do filme de qualquer
maneira, pois era o que os trekkers queriam. A Paramount já
sabia, claro.
O valor do orçamento ficou em US$ 18 milhões. Some-se a isso o
que o estúdio já havia gasto desde 1975, quando Gene estava
escrevendo "The God Thing", passando pela pré-produção
da Fase II, e chega-se ao impressionante valor de US$ 44
milhões. Porém o salário combinado de Shatner, Nimoy e De
Kelley para participar do filme seria apenas um pequeno percentual
dos novos US$ 18 milhões pedidos por Goodwin. E Robert Collins
ainda levaria, além do salário de diretor, mais US$ 10 mil por
ter reescrito o roteiro.
Só que o diretor não
seria mais ele. Embora os executivos da Paramount tivessem
assegurado a Collins o emprego, estavam em contato com o veterano
diretor Robert Wise para levar em frente o projeto. Wise fechou
com a Paramount em março de 1978 e Collins disse adeus ao sonho
da direção.
Robert
Wise era um dos mais conhecidos diretores de Hollywood, com filmes
como "A Noviça Rebelde" e "O Dia em que a Terra
Parou" no currículo. Embora Wise costumeiramente assumisse a
posição de produtor nos filmes que dirigia, aceitou que
Roddenberry continuasse como produtor dessa vez. Robert Goodwin
levaria o crédito de co-produtor, mas desistiu para abrir sua própria
companhia cinematográfica com Mark Tanz. Um dos motivos que o fez
largar o projeto do filme de Jornada foi que, se a
Paramount de fato lançasse uma rede de TV, ele seria o
encarregado de supervisionar a produção dos telefilmes da
emissora. Como a rede não existiria mesmo, Goodwin caiu fora.
Enquanto
isso Michael Eisner e Jeffrey Katzenberg, os chefões da Paramount
naquela época, saíram de Los Angeles e foram até Nova York,
para apresentar um polpudo cheque a Nimoy, que estava por lá
estrelando uma peça na Broadway. O tal cheque fez com que Nimoy
esquecesse todos os problemas que tinha com Roddenberry e o estúdio.
Ele a partir de agora estava confirmado no filme de Jornada
para o cinema, e ainda faria parte da equipe de elaboração do
projeto.
E Xon, o Vulcano que substituiria Spock? Ficou definido que ele
morreria em um acidente no teletransporte logo no início da história.
Como sabemos, no roteiro final o Vulcano que morre nessas circunstâncias
é o comandante Sonak. David Gautreaux, que interpretaria Xon,
ficou com uma ponta como o oficial da Frota a bordo da estação
espacial destruída por V'Ger no começo do filme.
Com Nimoy e Wise na produção, as pressões para que outro
escritor se juntasse a Roddenberry na elaboração da versão
final do roteiro cresciam. O tempo estava passando e Gene não
dava conta. Em abril de 1978, Gene entrou em contato com Harold
Livingston. Harold, que originalmente coordenaria os roteiristas
da Fase II, conta como recebeu o pedido do criador de Jornada.
"Logo que atendi o telefone percebi que Gene estava com
problemas. No dia seguinte ele me enviou o roteiro e, eu juro, não
sei dizer quantas vezes o haviam reescrito. Alguns dias depois
encontrei Bob [Wise] e Gene e disse: 'esse roteiro está terrível,
não dá para usar de maneira alguma'. Eles concordaram e me
chamaram de volta para colaborar."
Livingston prossegue. "Eu sabia como era trabalhar com Gene,
então coloquei algumas condições que ele não gostou, mas que
me preservariam de suas interferências. Reescrevi as primeiras 50
páginas do roteiro e enviamos para Paris, que é onde Katzenberg
e Eisner estavam. Eisner me ligou e disse 'que coisa é essa?'. Eu
não sabia do que ele estava falando até descobrir que Gene havia
reescrito minhas 50 páginas antes do envio!"
Isso acabou ocorrendo com frequência, e por quatro vezes
Livingston quis abandonar o barco, já que Gene sempre estava em
seu caminho. Mas era sempre convencido a voltar. Na quinta e última
vez ele não queria voltar de maneira alguma, mas Katzenberg se
trancou em seu escritório com Livingston e somente o deixaria
sair quando concordasse em, mais uma vez, reconsiderar a desistência.
No final, Harold Livingston aceitou retornar, mas somente se, após
o término do trabalho em Jornada, a Paramount o
contratasse para escrever um roteiro sobre qualquer projeto que
Livingston escolhesse. Katzenberg concordou. E após a estréia de
"Jornada nas Estrelas - O Filme" Livingston nunca
mais trabalhou ou falou com Gene Roddenberry.
Com o roteiro finalizado, Spock de volta, Stephen Collins no papel
de Willard Decker e Robert Wise na direção, as coisas começaram
a se arrumar. O processo de filmagem da primeira aventura de
Jornada para o cinema seguiu em frente, com acertos e erros,
tanto que somente nos dias de hoje Wise conseguiu lançar a versão
definitiva do filme como ele queria.
Todo o trabalho da elaboração da Fase II foi, segundo o
ex-produtor Robert Goodwin, "uma experiência terrível, mas
dá para entender tudo e até aceitar", ele explica,
"pois é assim que as coisas funcionam em Hollywood. É assim
que costuma ser..."
E com todos esses atropelos, a Fase II serviu de embrião
para o lançamento de Jornada no cinema, que por sua vez
iniciou a carreira cinematográfica do franchise. Às portas da
estréia do décimo filme para cinema, vale a pena lembrar que a
reinvenção de Jornada ocorreu naquela época, quando Xon
quase roubou o lugar de Spock.
Antes: Um
piloto para a série
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