Literatura

 









 

''STAR TREK - THE LOST ERA: 2311", SERPENTS AMONG THE RUINS


Escrito por:
David R. George III

Publicado por: Pocket Books

Lançamento Original: 2003

Formato: Paperback


Série: Filmes

Páginas: 371

 
Review por Leandro M. Pinto
 

Dois eventos muito mencionados do Cânone & Cronologia oficial de Jornada nas Estrelas são os chamados Tratado de Algeron e o Incidente de Tomed. Mas, embora haja muita falação a respeito destes dois eventos, poucos detalhes são realmente conhecidos a respeito de tais eventos. O Tratado de Algeron, primeiro mencionado em "The Defector" (TNG), é o acordo entre a Federação de Planetas Unidos e o Império Romulano, no qual entre supostas outras cláusulas, a Federação abre mão de utilizar tecnologia de camuflagem, como mencionado no episódio "The Pegasus" (TNG). Já o Incidente de Tomed, primeiro citado em "The Neutral Zone" (TNG), é conhecido como sendo o evento que serviu de catalisador para o Tratado de Algeron, e o que se sabe sobre tal incidente é apenas que foi alguma coisa que ocorreu entre a Federação e os Romulanos que custou a vida de milhares de cidadões federados.

Isto é o que se sabe no C&C oficial. Deste par de informações é que parte a premissa básica do segundo livro da série Lost Era de romances baseados em Jornada nas Estrelas, o volume Star Trek The Lost Era: 2311, Serpent Among the Ruins, de autoria de David R. George III, e o tema desta nossa mais nova revisão literária. A idéia básica da série Lost Era é de trazer contos em períodos da cronologia de Jornada os quais não foram muito englobados pelo material produzido para televisão e filmes. Entre eles, o início do século 24, e neste caso específico, o ano de 2311, quando ambos os eventos que inspiraram Serpent Among the Ruins ocorreram.

E para compor a trama em torno destes eventos, David George também fez largo uso de diversos outros elementos da franquia que ocorreram por volta da mesma época, apenas algumas décadas depois do fim das aventuras cinematográficas da tripulação da Enterprise original. Mais notadamente, a tripulação da vez em Serpent Among the Ruins é a da USS Enterprise NCC-1701B, classe Excelsior, sob comando do Capitão John Harriman. Ele e sua tripulação foram primeiro apresentados ao fandom em Jornada nas Estrelas: Generations, nos eventos que levaram James Kirk a se perder na anomalia conhecida como Nexus. Em 2311, Harriman está a dezoito anos em comando desta Enterprise, e pelo livro podemos acompanhar como este tempo terá moldado ele e sua tripulação, muitos ainda originais de quando esta unidade da classe Excelsior foi primeiro lançada, como Demora Sulu. Além disto, também teremos diversos outros elementos jogados na fogueira que se forma a frente, como eventos que ocorreram com os Klingons durante Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida.

Iniciando um estilo novo de revisão literária para o Trek Brasilis, vamos primeiro passar por um sumário comentado da trama de Serpent Among the Ruins, capítulo a capítulo, para depois termos uma análise geral sobre o conto e seus elementos. Nesta primeira parte, portanto, há as informações que se classifica como "spoilers" sobre detalhes do livro.

 

Prologue: Countdown

O conto abre em um estilo bastante jornadeiro, com a tripulação da Enterprise separada em dois grupos avançados misturados a população de um planeta em sociedade pré-dobra, os Koltaari. Contudo, o Capitão Harriman, liderando um dos grupos avançados, rapidamente se depara com uma situação extremamente crítica: fortes explosões ocorrem em algumas instalações industriais da capital do planeta, e no espaço aéreo desta, nada menos do que uma nave Romulana da classe Ivarix surge. Harriman procura contatar seus tripulantes no planeta e sua nave, mas sem sucesso: campos de interferência foram acionados pelos Romulanos para prevenir este movimento, uma vez que eles também sabem da presença federada no local. Desta forma, Harriman não tem como saber que o grupo liderado por Demora Sulu se encontrava no ponto zero de algumas das explosões, com ela liderando este pessoal para lugar seguro.

Não que ele também estivesse sem seus próprios problemas. Tão logo conseguem sair de dentro do envelope do campo de interferência, um grupamento de oficiais Romulanos se teleporta a sua volta e os rende, sendo seguido pelo comandante da Força-Tarefa Romulana no local, o Almirante Vokat. Velho conhecido de Harriman, como a narrativa nos demonstra, Vokat quer usar esta oportunidade não para colocar os federados sob custódia, mas sim para os informar que eles devem se retirar do local, pronto. Harriman se nega a fazer isto, e classifica a presença Romulana ali como um ato beliscoso desnecessário e uma invasão ilegal de território neutro. Vokat apenas responde que lhes está no direito, e que aquele é território clamado pelo Império. Sem poder forçar o tema muito mais, Harriman retorna desgostoso para a Enterprise, e depois de avaliar a situação com sua Primeira-Oficial, ordena o retorno da nave para uma Base Estelar federada nas proximidades.

O Prólogo foi bastante utilizado para já colocar em situação beligerante as forças tanto do Império Romulano quanto da Federação, e também foi onde fomos apresentados a diversos dos tripulantes principais de Harriman, como a sua XO, a agora Comandante Demora Sulu. Enquanto deliberava com Harriman sobre o que fazer, ela não se fez de rogada em advogar por intervir de alguma maneira contra a FT Romulana, senão por confronto direto, por alguma outra maneira. Harriman não invoca realmente a Primeira Diretriz diretamente, mas também não precisa: segundo a avaliação de Harriman, se uma intervenção federada ocorresse por iniciativa deles imediatamente, o conflito iria imediatamente escalar para hostilidade aberta, o que não ajudaria em nada a Federação e nem o povo de Koltaari.

 

Minus Ten: Foxtrot

Um capítulo leve é o que tivemos aqui, embora isto não significou falta de novas informações a respeito da trama. Tivemos muito disto, com duas seqüências básicas. Primeiro, podemos acompanhar Harriman e seu engenheiro-chefe, Tenente-Comandante Buonarroli, coordenarem as operações de desembarque e descarga de tripulantes e material para Foxtrot XIII, um dos postos-avançados da Federação ao longo da Zona Neutra Romulana. Outra nave da Federação, a USS Agamemnon, também participa das operações. Também aprendemos que já se passaram sete meses desde a investida Romulana em Koltaari, e desde então a crise tem sido uma presença constante nas operações da Frota Estelar ao longo da Zona Neutra, com a Federação, os Romulanos e os Klingons cada vez mais aumentando a já grande tensão geopolítica desta região do espaço.

Mas para Harriman, também havia um aspecto muito pessoal para si sobre a visita da Enterprise a Foxtrot XIII, pois a comandante do destacamento local do posto-avançado era nada menos do que sua namorada, uma humana descendente de africanos da Costa do Marfim, Comandante Sasine. Finda as operações de resuprimento de Foxtrot XIII, Harriman tem a oportunidade de ter um encontro romântico com Sasine, coisa que ele não havia tido chance de fazer há coisa de quase um ano, durante suas férias – apenas encontros formais pela Frota Estelar foi tudo o que ele conseguiu com ela nos últimos onze meses, mesmo com a Enterprise designada para patrulhar exatamente aquela área do setor Foxtrot do espaço federado perto das fronteiras. Harriman também se lembra da operação que precedeu as suas férias com Sasina, uma difícil operação em Devon II, dentro da Zona Neutra. Mas não seria apenas uma agradável noite que ambos teriam juntos. Sasine também estava terminando seu turno de serviço em Foxtrot XIII, e seria uma das oficiais da Frota a ser transportada pela Enterprise para a Estação Espacial KR-3, para remanejamento para outra missão.

Dois pequenos detalhes que me agradaram: Buonarroli é mencionado como sendo um ítalo-alfacentauriano, ou seja, um humano nascido em um outro mundo da Federação, mas o qual mantém tradições de seus antepassados italianos – um ótimo aspecto de diversidade que sempre me agrada. E fora isto, tivemos menção a Harriman ter passado suas férias em outro local que não Risa, o que ajuda a quebrar a mesmice de sempre ser Risa a ser mencionado como local para férias. Fora isto, parece que podemos também ver um padrão, aqui... pelo que Harriman citou, ele e Sulu participaram com alguns outros oficiais da Frota de uma operação especial dentro da Zona Neutra. Isto imediatamente me fez lembrar dos eventos que Picard passou no episódio "Chain of Command", de TNG, e me pareceu que isto até mesmo estabelece precedentes que indicam a extremamente questionável política da Frota Estelar de usar Capitães de naves estelares em operações que claramente pedem pelo envio de forças especiais dedicadas a tarefa...!

 

Minus Nine: Algeron

Neste ponto, já temos movimentações em escala mais ampla sobre a crise. Em uma estação espacial na região de Algeron, em espaço Romulano, está havendo as sessões de negociações diplomáticas entre a Federação, os Romulanos e os Klingons, e as quais estão se arrastando há meses. Da mesma forma que diversas outras sessões por este período, acompanhamos mais uma destas acabar em um recesso inconclusivo, depois de mais uma demonstração exasperada Klingon contra uma proposta Romulana, que pedia por inspeções regulares de instalações militares.

Tal demanda, como explicou a Embaixadora Romulana Kamemom, seria com o intuito de fiscalizar a proposta Romulana de banimento de criação daquilo que ela chamou de "metaarmas", ou armas de disrupção do subespaço – em outras palavras, armas de destruição em massa. Kamemom cita que bem ali, onde outrora existia um planeta romulano, Algeron III, foi o local onde anos antes uma arma destas teria sido detonada por Klingons durante uma batalha contra naves Romulanas; um dos efeitos colaterais da reação da arma teria provocado uma ruptura baseada no velho "tecnobable" de Jornada a qual destruiu o planeta. Os Klingons também negam a autoria de tal ataque, e embora todos ali concordaram que o uso de tais armas seria de fato inaceitável, ninguém realmente chegou a um consenso em como poderia ser possível se implantar tal proibição.

O interessante de ter acompanhado neste capítulo foi particularmente à interação Romulana-Klingon, com a Embaixadora Kamemom fazendo especulações sobre a interação que os representantes Klingons demonstravam ter entre si. A Romulana ponderou para si mesma que diversas facções Klingons deviam estar querendo impor suas próprias agendas de intenções nas negociações, incluindo aí a posição oficial do Alto Conselho Klingon, liderado pela Chanceler Atzebur, uma alumni de Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida – com isto, temos a informação que Atzebur ainda está no controle do Império a mais de duas décadas. Além disto, a romulana também ordenou diversos de seus adidos a providenciarem uma investigação sobre se a Federação estaria desenvolvendo metaarmas, pois ela tem fontes confiáveis, ainda que extra-oficiais, que tal programa poderia estar sendo feito pela Frota Estelar. E enquanto isto tudo, também acompanhamos o General Kage e seu lugar-tenente Ditagh, representantes Klingons, discutirem em privado, com Kage tendo que impor a seu assistente que este fique na linha e não se permita a questionar os métodos e posições dele, experiente diplomata Klingon. Ditagh acredita que Kage é contido demais, mas Kage ressalta a importância da posição Klingon no momento deve ser usada com diplomacia. Segundo Kage, embora as forças de defesa Klingon não estejam na sua melhor forma, elas ainda seriam um perfeito fiel da balança em uma eventual guerra Federação vs. Romulanos, como ele parece acreditar que é iminente. Portanto, os Klingons tem nisto uma boa massa de manobra para os ajudar nas negociações.

 

Minus 8: Universe

Após se despedir de Sasine, Harriman e a Enterprise partem para a operação a qual foram designados desta vez. Tanto a Enterprise como duas outras naves, a Canaveral e a Ad Astra, iriam servir de escolta para os testes de campo finais de uma experimental nave da frota, a USS Universe, NX-2999. A Universe não era apenas a detentora de diversas novas tecnologias corriqueiras, mas duas outras de grande importância. Primeiro, mais um sistema de dobra espacial experimental, chamado de hiperdobra, um programa da Frota intencionado repor o fracassado experimento de transdobra de vários anos antes. E além disto, a Universe também conta com seu próprio sistema de camuflagem, baseado em tecnologia romulana.

No caminho para esta sua próxima missão, o Capitão da Enterprise pondera a respeito de como será trabalhar de perto com um Almirante da Frota Estelar em particular, no caso, o Almirante John Harriman, seu pai. Harriman se lembra de sua infância pelas naves estelares nas quais seu pai serviu ao longo de sua carreira na Frota – ele nasceu dentro de uma, nada menos – e depois, como ele mesmo iniciou sua própria carreira na Frota Estelar. Contudo, um incidente cerca de um ano após ele assumir a cadeira de comando da Enterprise fez com que pai e filho ficassem de relações rompidas, e após todos estes anos, ambos mal se falaram, apenas em ocasiões oficiais, como esta missão viria a ser.

Todos os preparos feitos, a Universe ativa sua hiperdobra enquanto as outras três naves monitoram os progressos. Mas, momentos após a Universe atingir hiperdobra um, uma falha no sistema literalmente mandam a nave kaboom. A força da explosão gerou uma onda de choque concentrada que parte para engolfar a Ad Astra, e a Enterprise rapidamente procura restabelecer contato enquanto parte para o resgate. Mas desconhecido a todos ali, não apenas estas naves estavam monitorando as atividades da Frota e a explosão seguinte. Oculto por camuflagem, o Almirante romulano Vokat e sua tripulação detectam a detonação, e especulam sobre sua natureza. Forte demais para ser um mero sistema de dobra em colapso, embora a telemetria mostrasse tal tendência. Vokat assume que foi a detonação de teste de algum dispositivo metaarma, e desta forma, ordena o retorno para Romulus de modo a reportar tais descobertas. Assim, Vokat se retira do local com a sua nave, a capitânia romulana Tomed. Harriman foi de fato o personagem central da passagem, e tivemos bastante info de background sobre o Capitão da Enterprise, como este cresceu e entrou para a Frota, e sua relação com o pai.

 

Minus 7: Aftermatch

As primeiras ondas de choque pessoais e políticas devido aos eventos ocorridos com a Universe tomam forma neste capítulo. Em KR-3, Harriman acompanha por algum tempo sua oficial médica-chefe, Dra. Morel, continuar os tratamentos do Almirante Harriman, seriamente ferido quando a Ad Astra foi atingida pela força da explosão, embora ele foi um dos poucos feridos naquela nave. Após isto, Harriman conversa de maneira mais pessoal com sua XO, Demora Sulu, sobre a sua relação com seu pai e sobre como se sente no momento – ele confessa não gostar de seu pai, mas sinceramente gostaria de gostar dele. Sulu responde que já passou por situação semelhante, quando após a morte de sua mãe, foi morar com Hikaru Sulu. Ela não gostava das ausências dele e da distância, mas com o tempo aprendeu a ver o melhor em seu pai e a amá-lo.

Longe dali, outras deliberações também estavam ocorrendo, no Alto Conselho Klingon. Um adido Romulano reportou diretamente para o Alto Conselho as descobertas a respeito daquilo que eles acreditam ser um programa de armas de destruição em massa da Federação, e disto, a Chanceler Atzebur e os membros do Alto Conselho começam uma acalorada discussão. Diversos deles consideram que a Federação planeja substituir suas atitudes em relação aos Klingons, passando de ajuda para ataque. Atzebur e alguns outros afirma que não vêem sentido nisto, e não querem cair em conclusões precipitadas. Contudo, frente a evidências atuais, Atzebur garante ao Alto Conselho que irá pressionar na matéria, e que certamente irá fazer tudo o possível para garantir a sobrevivência do Império, quer isto signifique problemas com quem quer que seja.

Tivemos bom momento com outro rosto conhecido do fandom, a Chanceler Atzebur, com ela ponderando para si mesma diversos aspectos de seus 18 anos de liderança do Império, e os desafios que enfrentou neste período, internos e externos, pessoais e gerais. Tivemos também mais alguma coisa com Sulu e diversas referências ao ex-navegador da Enterprise original, e Capitão da Excelsior. Houve também uma menção a betazóides fazerem parte da Federação já nesta época, o que sugere que o Primeiro Contato com eles deve ter ocorrido pelo menos em algum momento do século anterior, portanto.

 

Minus 6: Smoke

Diversos pontos acontecendo simultaneamente. Após o Almirante Harriman recuperar alguma consciência, ele balbucia algumas fracas palavras enquanto conversava com um outro Almirante, amigo seu de longa data. "Funcionou", e "Os Romulanos...". O Almirante Mentir fica intrigado por isto, mas não consegue saber mais detalhes do ainda fraco Harriman. Entrementes, o General Kage pressiona fortemente os representantes federados em Algeron, praticamente esfregando um PADD na cara do Embaixador Endara e exigindo uma explicação da razão de a Federação estar desenvolvendo metaarmas. Endara fica na defensiva, e nega firmemente as acusações, enquanto a Embaixadora Kamemom assume uma posição de ceticismo mas não de pleno apoio a Federação.

Harriman recebe a bordo da Enterprise dois operativos da Federação, Drysi Gravenor e Elias Vaughn, que repassam a situação com o Capitão da Enterprise. Enquanto falam, o Conselho da Federação já se prepara para fazer declarações públicas a respeito da crise, uma vez que informações vagas e desconexas já estavam ao largo, de qualquer forma. A explicação consistiria em esclarecer que os testes da Universe resultaram em uma explosão a qual foi erroneamente interpretada por uma nave romulana como sendo de testes de uma arma. Após o briefing com os operativos, Harriman informa Sulu de que a missão deles no momento consiste em levar Gravenor e Vaughn até Algeron, onde eles entregariam as especificações de hiperdobra para os Romulanos e para os Klingons. Não surpreendentemente, Sulu quase pula no teto ao saber de uma decisão deste quilate, e do que representa. Harriman alega que a intenção da Federação é demonstrar boa vontade para com as outras potências, e procurar evitar o conflito, e que pela complexidade dos sistemas de hiperdobra, eles não conseguirão fazer uso prático das informações, de qualquer modo. Sulu não acredita nisto, e insiste que uma sandice destas enquanto uma escalada para guerra se inicia não é a melhor saída. Mas de uma maneira ou de outra, a Enterprise parte para Algeron.

Detalhe interessante foi estabelecer o Almirante Tirasol Mentir (um nome que soa ruim em Português, concordo) como membro de uma espécie aquática, a ponto de ele utilizar uma roupa de EVA ao estilo "mergulhador ao contrário", pois a roupa dele o mantinha um ambiente aquático. Bom para termos mais diversidade alien fora da mesmice do humanóide-testa-gozada. Já no momento que Harriman conversava com os operativos federados, diversas vezes se mencionou o "Conselho da Federação" e o "Presidente da Federação", mas sempre por estes títulos – em nenhum momento nomes foram mencionados; isto acontecia apenas para Almirantes. Mais uma vez, aqui está à tendência dos autores de Jornada de retratarem o governo civil federado como uma entidade sem rosto e indefinida. Sim, é importante manter a áurea das Instituições, mas o exagero desta tendência faz com que o governo federado pareça como algo distante e irrelevante nas tramas, sejam em páginas, sejam em telas de TV ou cinema.

 

Minus 5: History

Um capítulo em flashback, relatando os eventos do primeiro encontro entre Harriman e Vokat. Na ocasião, Harriman ainda era um jovem tenente no leme da Huntley, uma nave da Federação que acabou tendo que engajar uma nave romulana, quando a Huntley respondeu ao pedido de socorro de uma outra nave sofrendo ataque romulano, a Dakota, um pequeno cargueiro. O já Almirante Vokat atacou ambas as naves federadas considerando que elas se encontravam violando espaço romulano; o fato de aquela área em particular ter sido anexada pelo Império há pouquíssimo tempo e ainda sem o conhecimento da Federação não pareciam importar para Vokat.

Encontramos a Huntley em situação difícil. A nave foi sobrepujada pelo ataque romulano, e Harriman é um dos poucos sobreviventes de uma ruptura no casco da nave que matou praticamente todos os ocupantes da ponte de comando. A Huntley e a Dakota se encontram a deriva, e Vokat se prepara para despachar times de abordagem para a captura da nave federada, algo que sem dúvida irá ter grande reconhecimento para ele como uma presa ganha em combate. Contudo, Harriman, agora no comando, organiza com alguns engenheiros uma manobra para poderem se valer de os Romulanos abaixarem a guarda para transportar times para a Huntley. Harriman consegue uma maneira de habilmente se teleportar e a alguns outros para a ponte da nave romulana, onde rende Vokat e os demais oficiais dele. Com a mesa virada, Harriman se assegura que seus tripulantes consigam deixar a Huntley em condições de vôo para retornarem para a Federação com os sobreviventes de ambas as naves federadas. Vokat chega a exigir que Harriman o mate, para assim escapar da humilhação de ter deixado uma vitória lhe escapar pelos dedos, mas não tem muita sorte: Harriman apenas o tonteia, e a próxima coisa que Vokat se lembra é de constatar que acabou se tornando prisioneiro romulano prestes a enfrentar uma corte-marcial com a sua patente já rebaixada para Subtenente.

O capítulo claramente procura colocar em contexto uma rivalidade de longa data entre Harriman e Vokat, com este tendo caído em desgraça devido às ações do então jovem tenente. Não fica estabelecido quando teria sido o confronto, mas considerando as datas e postos dos personagens, deve ter ocorrido durante alguma época entre os primeiro filmes para cinema da Série Original.

 

Minus 4: Cloak

Após serem escoltados pela Tomed até Algeron, Harriman e os operativos da Frota fazem exatamente aquilo que haviam sido ordenados a fazerem: entregam os dados sobre a hiperdobra para as delegações Klingon e Romulana em Algeron. Os diplomatas ali reagem com diferentes níveis de ceticismo em relação aos dados, mas todos confirmam que vão os analisar, da mesma maneira que o Almirante Vokat também deseja fazer suas próprias análises, sem a objeção da Embaixadora romulana.

As horas que ainda iriam ser usadas para as partes fazerem seus estudos deram então a Harriman a chance de prosseguir com outra de suas intenções em Algeron. Ele contata a Embaixadora Kamemom, a qual já conhecia de diversas outras ocasiões diplomáticas antes. Harriman confidencia para Kamemom que os dados fornecidos pela Federação irão sem dúvida mostrar que os testes não eram de armas, mas sim de sistemas de propulsão; mas que isto talvez não seja o bastante para evitar o conflito que está surgindo daquela crise. Vokat, ele afirma, irá fazer de tudo para ter o conflito que deseja, e Harriman deseja a ajuda dela para impedirem qualquer ação de Vokat.

Algo fundamental a esta parte da trama foi estabelecer tanto para Kamemom quanto para Harriman que um podem confiar no outro, senão Harriman não poderia ter de maneira segura a iniciativa de procurar uma oficial Romulana em um plano para impedirem quaisquer ações por parte do Almirante Vokat. Isto é conseguido, com a interação entre o Capitão da Enterprise e a diplomata romulana.

 

Minus 3: Shadows

No que a Enterprise parte para retornar para o espaço da Federação, escoltada pela Tomed, a nave está sendo conduzida por Demora Sulu. Harriman transferiu temporariamente o comando da Enterprise para sua XO, e a ordenou levar a nave para a posição de patrulha ao longo da Zona Neutra para a qual o Comando da Frota a designou. Contudo, logo após a Enterprise deixar Algeron, Sulu e a tripulação detectaram uma falha no motor de impulso da Enterprise que, senão for contida, poderá resultar em explosão. A Tomed detecta em seus sensores a dificuldade, e a Subcomandante Linavil especula maneiras de ajudar a nave federada.

Não se pode deixar de pensar se tal falha foi deliberadamente provocada não por Romulanos, mas sim por ninguém menos que Harriman – o início do capítulo mostra ele em um tubo jefferies modificando exatamente os sistemas de impulso de sua nave. Entrementes, a Embaixadora Kamemom segue para uma seção específica da estação para colocar em prática as instruções que Harriman a passou, e furtivamente opera uma série de consoles. Momentos depois, a tripulação da Enterprise consegue isolar o problema em seu sistema de propulsão e informam um cético Vokat, na Tomed, que eles estão prontos para retomarem viagem para a Federação, e desta forma, o Almirante Romulano não pressiona o assunto. Mas não sem antes nós aprendermos que Harriman, Gravenor e Vaughn agora também se encontram a bordo da Tomed, que depois de algum tempo escoltando a Enterprise, aciona curso para Romulus. Aparentemente, o que se pode concluir da seqüência de eventos aqui neste capítulo é que Harriman arranjou um meio para que a Tomed abaixasse a guarda de modo a permitir Kamemom seguir as instruções de como e onde os teleportar para dentro da Tomed.

 

Minus 2: Singularity

Movimentações em altas cúpulas acontecem neste capítulo, com o Almirante Mentir assumindo as funções do ainda inabilitado Almirante Harriman. Enquanto retorna para a Federação, Sulu esbarra com várias discrepâncias em registros de pessoal da Frota Estelar, encontrando referências a tripulantes designados para a Universe e para a Agamemnom, mas os quais haviam morrido em uma operação secreta um ano antes – ela própria havia estado na operação, e pode constatar isto. Mentir ordena para ela trazer a Enterprise para KR-3 e reportar para ele. Assim que se encontram, Sulu reporta o que encontrou, e que desconfia que haja um espião romulano na Enterprise, pois isto explicaria algumas interferências que tem detectado vez e outra no disco defletor, o que poderiam ser transmissões escondidas. Mentir confirma para ela que de fato há um espião romulano a bordo, Alferes Travis, mas que Harriman já havia descoberto isto tão logo Travis havia entrado para a tripulação. A Frota Estelar optou por o vigiar com cautela para atividades de contra-espionagem, ao invés de apenas o prender. Contudo, Mentir confirmou a ela que a utilidade de Travis chegara ao fim, e que agora seria preso. Depois disto, ordenou a ela levar a Enterprise para Foxtrot XIII, e aguardar no local.

Enquanto isto, Atzebur é alertada por um dos comandantes regionais Klingon, General Kaarg, que há uma conspiração de um outro general, Gorak, para a eliminar, e que o lugar-tenente de seu enviado a Algeron está envolvido na operação. Atzebur pede a este seu comandante que destaque tropas leais para a escoltarem, e que investigue mais a matéria. Na Tomed, dois eventos em particular têm início. Primeiro, os sistemas de comunicação da nave são desativados, ao mesmo tempo em que um alerta geral soa pela nave toda, indicando que é iminente o colapso do sistema de contenção da singularidade quântica do motor da nave. Vokat inicializa os procedimentos de contingência para tal eventualidade, ao mesmo tempo em que assume certeza de ser uma sabotagem federada, dado o timing dos eventos. A tripulação da Tomed vai para os pods de fuga, e a nave é colocada em rota para uma região do espaço onde sua destruição não irá afetar nada ao redor.

 

Minus 1: Serpents

Para continuarem com o plano, Harriman e os dois operativos, ainda a bordo da condenada Tomed, trabalham furiosamente para reajustarem a nave em um curso em direção ao espaço da Federação, ao invés do curso original de emergência que a tripulação havia engajado. E estes procedimentos são largamente dificultados pelo fato de que Vokat, seu oficial de ciências e outros quatro tripulantes permanecem a bordo, para encontrar os intrusos os quais Vokat agora tem certeza de estarem ali. A caçada pela nave intercala os seis romulanos procurando os três federados enquanto estes se asseguram que a Tomed irá automaticamente para onde desejam que ela vá. Diversas lutas corpo-a-corpo ocorrem pela nave, até que finalmente Harriman e seus operativos se asseguram que a operação será um sucesso, e que Vokat fosse feito prisioneiro por eles. Tarefa pronta, Harriman e todos os outros deixam a Tomed. E a insurtida da Tomed no setor Foxtrot é monitorada pela Enterprise, de sua posição no setor Echo, que assiste a longa-distância a Agamenon engajar a nave intrusa, a atacando enquanto esta se dirige para Foxtrot XIII. Mas a Enterprise nada pode fazer quando a Tomed finalmente alcança Foxtrot XIII.

O capítulo sem dúvida é o mais longo, embora a sua seqüência de eventos se dê em um período curto na trama, estando apenas entre algumas horas depois da primeira falha na Tomed forçar a mudança de rota até que a nave finalmente alcançou o espaço da Federação. Mas suas conseqüências serão fundamentais para o desfecho da trama, isto sem dúvida alguma.

 

Zero: Tomed

Não havia mais nada que pudesse ser feito. O campo de contenção da singularidade quântica da Tomed entra em colapso, resultando em uma massiva explosão subsespacial que engloba a USS Agamenon, e os treze postos avançados do setor Foxtrot do território da Federação ao longo da Zona Neutra. A destruição é total.

 

Plus One: Ruins

Rapidamente encontrando Harriman e os dois operativos na sala de transporte da Enterprise para acompanharem o momento final do plano – a destruição do setor Foxtrot – Sulu a este momento já estava a par da intenção geral do plano preparado pela Frota Estelar, que se iniciou com o uso do espião romulano na Enterprise para que este providenciasse uma presença romulana nos "testes" da Universe e sua subseqüente destruição, algo que havia sido intencionado desde o início. Assim, a cadeia de eventos que levou a também destruição dos vazios postos avançados no setor Foxtrot teve início,

Uma transmissão é feita pela Enterprise, em freqüências federadas, romulanas e klingons, informando a todos na área que um ataque injustificado por parte dos Romulanos destruiu os postos avançados no setor Foxtrot juntamente com uma nave federada. Rapidamente, uma concentração de naves federadas se formou ao longo da Zona Neutra, em resposta ao ataque ao setor Foxtrot, e naves Romulanas e Klingons também iniciaram seus posicionamentos na fronteira. Capitães federados e klingons contatam a Enterprise para coordenarem seus esforços em um eventual, até mesmo iminente, confrontação, e naves Klingons cerram formação com naves federadas. Frente a isto, os comandantes Romulanos piscaram e ordenaram a retirada das forças extras ao longo da fronteira.

De volta a Algeron, Harriman pode discretamente retomar o local de onde supostamente não poderia ter saído, e as discussões prosseguem agora a luz destes novos eventos no setor Foxtrot. E para conveniência da Federação, a Embaixadora Kamemom não tinha real noção do que fora o plano federado. No seu ver, ela ajudara Harriman para que este tentasse impedir o ataque de Vokat, mas que Harriman não teria tido sucesso. E os Romulanos tem que se contentarem com o fato de que pelo menos, a Federação optou por não contra-atacar quando claramente esta seria uma opção legítima para ela realizar.

E após a Enterprise retornar para a estação KR-3, Harriman recebe a notícia da morte de seu pai, que não suportou os ferimentos. Ironicamente, ele então se tornou a única vítima fatal do plano que ele mesmo ajudou a conceber, desde a "explosão" da Universe até a detonação da Tomed no setor Foxtrot.

 

Epilogue: Designs

Os arcos se fecham no epílogo. O primeiro deles se refere a como no frigir dos ovos, tanto Gorak e a Chanceler Atzebur são sobrepujados por uma vendetta providenciada pelo próprio General Kaarg; Ditagh aproveita um encontro entre Gorak e Atzebur, e ataca ambos, criando assim uma história na qual ele matou Gorak após este supostamente ter atacado a Chanceler do Império Klingon. Com ambos fora do páreo, Kaarg tem caminho livre para se tornar o próximo Chanceler do Império.

Dois meses depois do Incidente de Tomed, o Tratado de Algeron é finalmente concluído, mas quando da apresentação final do tratado, a Embaixadora Kamemom declara que os Romulanos não irão assinar o tratado. Após o choque inicial das delegações, Kamemom apresenta uma versão simplificada do mesmo Tratado, o qual ela diz que é o que o Preator e o Senado romulano assinaram. Nele, nas palavras da própria Embaixadora, A atual Zona Neutra estabelecida entre o Império Romulano e o Império Klingon é reafirmada, e qualquer violação desta Zona Neutra será encarada como um ato de guerra. Uma reafirmação idêntica para com nossas fronteiras com a Federação também ocorre. Finalmente, a Federação irá aceitar desistir e banir qualquer desenvolvimento de tecnologia de camuflagem em troca do Império se retirar do planeta Koltaari. Este então foram os termos do Tratado de Algeron assinado pelas três potências.

E finalmente, Harriman e Sulu conversam a respeito do que irá acontecer assim que a Enterprise partir. Contudo, Harriman anuncia a sua XO que está deixando o comando da Enterprise, ainda que irá continuar como Capitão da Frota Estelar, mas seguirá para uma nova posição. E que agora, a Enterprise irá ficar sob os auspícios de sua nova Capitão, Demora Sulu. E despedindo-se de seu amigo, a nova Capitão da Enterprise parte com a nave para sua próxima missão.

 

Avaliação Geral

Bem, aqui em Serpent Among the Ruins tivemos um relato daquilo que teria ocorrido no tão falado "Incidente de Tomed" que teria resultado no tal "Tratado de Algeron", e sua muito comentada cláusula de proibição da Federação de utilizar tecnologia de camuflagem. Como eu havia especulado algum tempo atrás no fórum do Trek Brasilis, haveria três possíveis cenários para tal situação: os eventos terem sido culpa da Federação, ou dos Romulanos, ou culpa completa nem de uma parte, nem de outra.

Na verdade, David George nos deu um cenário que não se encaixa exatamente em nenhuma destas três possibilidades. Tivemos aqui a Federação armando um gigantesco e cínico teatro, com o único intuito de solenemente pousar de vítima. O governo federado propositalmente simulou um ataque inimigo a seu território que teria custado à vida de mais de quatro mil pessoas, para que isto servisse de catalisador para as negociações de paz em Algeron. Sim, há de se lembrar que "Ah, mas ninguém morreu". Verdade. Ainda assim, isto é o que eu chamo de se apegar ao conceito de "fins justificam os meios". Um choque emocional pela perda de quatro mil vidas em um ataque não provocado, tanto do lado federado (em lamentar por estas vidas) como do lado romulano (em seu povo considerar que romulanos teriam feito tal atrocidade), em nome de se manter a paz. A reputação de um povo, manchada e seu orgulho ferido, em nome de se manter a paz – sem dúvida, realpolitik no melhor estilo fins-justificam-os-meios. E com esta faca e queijo na mão, a Federação primeiro já rosna na fronteira da Zona Neutra com suas naves em resposta ao "ataque" romulano, para então depois poder posar de boazinha, de benevolente, de amigona, e declarar em Algeron que tudo bem, vai quebrar o galho dos Romulanos e não se lança contra eles juntamente com os Klingons. O cinismo federado é tão gritante que quase consegue por si mesmo amarelar as páginas do livro.

Claramente, a trama estabelece que nunca houve a perda de milhares de vidas federadas, como Picard afirma nos episódios que fazem menção ao incidente. Pode-se sempre dizer, "Ah, mas livros não são cânone" e coisa e tal. Sim, pode-se dizer isto. Mas seja por especulação do fandom, seja por livros oficiais da Paramount, parece que a Federação simplesmente não consegue sair desta trama sem alguma culpa no cartório.

E também muito interessante de se notar foi o que David George encontrou para justificar uma das maiores incoerências do Cânone & Cronologia de Jornada nas Estrelas. George tirou da cartola, no apagar das luzes, a cláusula do Tratado de Algeron que serve de compensação pelo fato de a Federação ter aberto mão de desenvolver tecnologia de camuflagem, com o compromisso Romulano de se retirar do planeta que invadira no começo da trama. Sem dúvida alguma, David George também claramente estava incomodado – como muitos outros no fandom – com o fato de que segundo os episódios de TNG que citam o Tratado de Algeron, sempre se menciona que a Federação teria aberto mão de camuflagem sem se mencionar em troca do quê eles teriam aceitado tal imposição. Não fazia o menor sentido ter sido a troco de nada, então George faz com que caia de pára-quedas na trama uma cláusula que justifica tal sandice existir no Cânone e Cronologia. Devo confessar que, embora faça sentido no contexto apresentado por Serpent Among the Ruins, não é algo que me convence totalmente; a Federação ainda estava em uma posição forte a qual ela mesma arranjou para que estivesse, e ainda assim teria aceitado tal acordo? Ela poderia ter incluído uma retirada de Koltaari logo após o Incidente de Tomed, quando estava em posição forte. Mas aceitou que os Romulanos aparecessem no frigir dos ovos com uma própria versão do tratado negociado...

Seja como for, ainda que tenha tido elementos com os quais eu claramente não concordei, sejam estes elementos da criação da trama em si como elementos dentro do contexto onde Jornada nas Estrelas se passa, devo dizer que foi uma história bastante interessante, e que manteve boa atenção. E não apenas pela trama em si, mas também pelo que os personagens principais passaram, mais notadamente John Harriman, Demora Sulu. Serpent Among the Ruins serve para esclarecer diversos pontos nebulosos no Cânone e Cronologia da franquia, da mesma maneira que possibilitou acompanharmos uma trama com uma das tripulações da Enterprise a qual tivemos menos chances de conhecermos mais a fundo. A obra fica com a avaliação final de três em quatro estrelas, bem colocadas.