Literatura

 









 

''STAR TREK: STARGAZER"

Book 1, Gauntlet


Escrito por:
Michael Jan Friedman

Publicado por: Pocket Books

Lançamento Original: maio/2002

Formato: Paperback


Série: A Nova Geração

Páginas: 288

 
Review por Leandro M. Pinto
 

Tempos antes de receber o comando da capitânia da Federação, Jean-Luc Picard também foi o Capitão de uma outra nave estelar, no caso, a USS Stargazer, uma nave de exploração da classe Constellation. Esta tarefa, como está estabelecido no Cânone & Cronologia da franquia, durou um bom tempo, pelo menos um par de décadas. Então, é de se imaginar que o jovem Capitão também teve sua dose de aventuras explorando a fronteira final antes que a Enterprise se tornasse sua nave. Nesta premissa é que se baseia o primeiro livro de uma das mais novas séries de livros sobre Jornada nas Estrelas, no caso, Star Trek: Stargazer - Book 1, Gauntlet. Tal qual a série de livros de Peter David, Star Trek: Excalibur, a série Stargazer tem a intenção de ser uma série contínua de livros sobre uma tripulação de nave da Frota, em particular, a nave e tripulação comandadas por Picard em seus primeiros dias como Capitão.

De autoria de Michael Friedman, um ativo autor de livros sobre Jornada nas Estrelas, Gauntlet é o primeiro livro desta nova série sobre a Stargazer, embora na verdade, não se pode dizer que é o primeiro livro dele sobre a premissa em si. Friedman já havia escrito um livro de A Nova Geração intitulado Valiant, onde ele relata o incidente o qual levou Picard primeiro a posição de comando na Stargazer, quando durante uma missão, tanto o Capitão da nave como o Primeiro-Oficial da Stargazer morreram, e Picard, então com meros 28 anos, assumiu o comando de uma nave em sérias situações. Sua conduta nesta missão lhe valeu uma rápida promoção a Capitão, e o comando definitivo da Stargazer logo em seguida. Como sabemos, todos estes eventos são informações estabelecidas em diversos episódios de A Nova Geração, como "The Battle", da primeira temporada, quando a Stargazer é introduzida, e aprendemos as circunstâncias nas quais Picard e sua tripulação tiveram que a abandonar -- uma situação razoavelmente forçada, no meu ver, pois Picard largou ao Khaless-dará uma nave razoavelmente inteira, ainda, com bastante informação sensível sobre a Federação a bordo. Mas enfim, não estamos aqui realmente para avaliarmos o episódio original em questão.

Gauntlet se inicia então com Picard já comissionado como o Capitão da Stargazer, e prestes a levantar ferros para seguir para sua primeira missão formal. E esta missão é o pano-de-fundo do livro, com Picard tendo que considerar dois desafios: primeiro, o de sua missão per se, que é a captura e/ou neutralização de um pirata em uma região nas fronteiras da Federação, e a recuperação da carga que ele leva. E segundo, ter que lidar com uma situação na qual o Almirante McAteer, que lhe passou a missão, aparentemente deu ao ainda inexperiente Capitão mais do que este pode mastigar. Picard se encontra na única posição de ter sido o mais jovem oficial a ser promovido a Capitão -- mais ainda do que James Kirk -- e isto não parece que passou em brancas nuvens por muitos na Frota Estelar, especialmente por alguns do Almirantado como McAteer.

Algo que vai chamando a atenção mais e mais à medida que a leitura avança, é um problema o qual se pode relevar apenas devido ao livro ser o piloto de uma série: a trama demora a engatar, e a história parece que não embala antes de nada menos do que mais da metade do livro já terem sido lidos. Até este ponto, tudo o que há é Picard recebendo sua missão, preparando sua tripulação e uma vez já em rota, diversas seqüências quase que estanques dos vários novos personagens interagindo entre si, ainda que é verdade que tal material serve de bom embasamento para começarmos a conhecer mais sobre esta tripulação da Stargazer, e os eventos em tais seqüências convergirem para um todo quando o livro se aproxima de seu desfecho.

E que tripulação, esta a de Picard. Não espere encontrar o melhor do melhor que a Academia já formou. Isto é algo interessante para também podermos considerar a Stargazer como aquilo que ela é, ou seja, apenas mais uma entre tantas naves da Federação, o que é de muitas maneiras algo até refrescante de se acompanhar, pois como fãs da franquia, muitas vezes tendemos demais a assumirmos as tripulações-protagonistas como particularmente especiais. Sim, elas o são, mas apenas por serem os protagonistas de nossas séries de TV: no contexto onde o universo da série existe, esta importância em particular não deve ser levada em conta.

E é isto o que temos em Gauntlet: a atual tripulação da Stargazer está longe de ser a melhor da Frota, pelo contrário: há problemas e ineficiência por toda a nave, e bastante do livro trata disto em particular. E nisto, acompanhamos como os diversos tripulantes vão lidando com seus problemas, procurando tornar a tripulação da nave um todo, ao invés de uma mera soma das partes. Alguns tripulantes conseguem isto com mais eficiência do que outros, incluindo o próprio Picard. Em Gauntlet vemos que embora ali está o material do qual será feito o futuro Capitão da Enterprise, este material ainda não assentou e ainda não se moldou totalmente, mas deu um bom e importante passo no caminho certo.

Então, à medida que o conto avança, acompanhamos Picard adquirindo uma atitude de maior confiança em si e em diversos membros de sua nova tripulação, mesmo alguns os quais ele teve que aceitar a contragosto, mediante o apontamento forçado pelo Almirante McAteer. Picard encara isto como mais um empecilho colocado pelo Almirante para o seu jogo de poder na alta cúpula da Frota Estelar. Sobre esta subtrama em particular, tenho minhas dúvidas sobre o julgamento de Friedman de ter estruturado a vendeta do Almirante McAteer da maneira que foi. Ao propositalmente escalar Picard para uma missão com a qual contava que o jovem Capitão falharia, o almirante colocou uma tripulação da Federação em risco letal apenas para satisfazer sua agenda pessoal -- uma atitude criminal que certamente não condiz com a honradez que se espera de um Almirante da Frota. Esta escolha faz com que Friedman alinhe seu Almirante com muitos outros já retratados na franquia. Da maneira que a coisa toda fica, dá a entender que o Almirantado da Frota Estelar parece que tem demais em seus quadros pessoas arrogantes, egocêntricas, desleais e birutas. Ter este estilo de Almirante é um recurso útil para algumas histórias, mas acredito que devia ser usado com menos freqüência do que tem sido nos últimos tempos.

No campo das cricas pequenas, uma me chamou a atenção. Em dado momento, para se passar um obstáculo espacial à frente, o sênior staff da Stargazer é reunido, e qual é a solução concordada? Se inverter a polaridade dos escudos. Até aí, tudo bem -- mesmo relutantemente, eu ainda posso aceitar mais um uso de um dos tecnobables mais clichês da franquia, pois isto não é necessariamente um problema, eu mesmo já fiz uso dele. Só que o que torna este ponto particularmente ruim foi que Friedman quis vender esta sua solução como se fosse a invenção da pólvora: os brilhantes personagens teriam tido um surto de inspiração o qual nenhuma outra tripulação da Federação teria tido antes deles, e houve várias outras na mesma situação com a mesma missão, como a própria trama relata. Considerando que se trata de uma passagem bastante específica, fica apenas como a minha crica do dia.

Mas sobre termos mais gerais da trama, embora eu admita que a situação final desta seja original e inesperada, eu também devo dizer que discordo consideravelmente do modo que Friedman optou por retratar o fim de seu conto. Não vou dar nenhum spoiler em particular, mas o que posso dizer é que, da maneira que o autor relatou, o desfecho da trama principal parece que foi a coisa mais honrada e correta de acontecer, seja por que ângulo se olhe. Mas ainda assim fica uma sensação de que existem considerações muito equivocadas sobre como a Federação exerce sua política interplanetária, e como esta é levada a cabo pelos Capitães em campo. Sempre se considerou que existe uma área cinzenta entre se seguir conceitos e regulamentos e se seguir instinto pessoal em comando de uma nave estelar, e em nome de apreciarmos Jornada nas Estrelas, sempre tendemos a considerar isto como algo romântico. Contudo, eu ainda acredito que ao final de Gauntlet, Michael Friedman não soube equilibrar estes dois conceitos de maneira totalmente apropriada.

Seja como for, ainda que não tenha me satisfeito totalmente em alguns aspectos, Gauntlet se mostrou um satisfatório começo de série literária de Jornada nas Estrelas, com seus pontos fortes sendo a sólida base para desenvolvimento de personagens que foi assegurada por Friedman, em cima da interessante premissa de acompanharmos as viagens do jovem Capitão Picard na Stargazer. O potencial é bom, e resta ver se Friedman vai conseguir manter uma boa e interessante seqüências de histórias... afinal de contas, Friedman está nas mãos com uma série que é uma prequel, e como sabemos, a franquia não tem tido muita sorte nesta área. Mas o potencial é bom, e o começo foi interessante, valendo três estrelas em quatro.