O título "Where
Silence Has Lease" (que poderia ser traduzido como "Onde
o Silêncio Fez Morada") foi tirado de um poema escrito
por Robert W. Service (foto), o poeta canadense mais
popular do início do século 20. Nascido
na Inglaterra de pais escoceses, passou a infância na Escócia e
emigrou com a família para o Canadá em 1896.
Entre 1904 e 1912,
Robert Service trabalhou em um banco no territórrio de Yukon,
no Canadá. Lá, escreveu uma série de poemas sobre esse
"norte gelado", de um dos quais -- "A Magia de
Yukon" (The Spell of Yukon) -- foi tirado o título do
episódio da Nova Geração.
Robert Service
A
história de Yukon
Para entender o poema,
é preciso saber um pouco da história e das características do
lugar. Yukon fica no noroeste do Canadá, na divisa com o Alaska (veja
mapa abaixo). A região central do território é um platô
banhado pelo rio Yukon e cercado pelas montanhas mais altas
e espetaculares da América do Norte, incluindo o pico mais alto
do Canadá, o Monte Logan, com 5.951 metros de altitude. A
temperatura do lugar pode variar entre 35º C no verão e -51º
(isso mesmo, 51 graus negativos) no inverno.
O
primeiro europeu a visitar Yukon --originalmente habitado por índios
americanos-- foi Sir John Franklin, que chegou em 1825 em
busca de uma passagem para o Pacífico. Chegando lá, percebeu que
os índios utilizavam flechas com pontas de metal. Com base nessa
informação, a Companhia Hudson's Bay enviou John Bell
para explorar o local em busca de metais. Bell construiu dois
fortes, o comércio com os índios floresceu e foram surgindo vários
entrepostos.
Yukon faz divisa com o Alaska
A
corrida do ouro
Em
1870 foi descoberto ouro num dos afluentes do rio Yukon, o que
provocou a vinda de garimpeiros, comerciantes e de um destacamento
da Polícia Montada canadense. O auge dessa corrida do ouro foi em
1898, quando foram descobertos ricos depósitos do metal no riacho
Bonanza, afluente do Rio Klondike. O grande afluxo de pessoas para
aquela região fez surgir a cidade de Dawson, que chegou a
ter 30 mil habitantes na época. O Congresso canadense decidiu então
separar aquela região do restante do noroeste do país,
concedendo-lhe o status de território, com capital em Dawson.
Mas
a corrida do ouro durou pouco: em 1900 a maior parte dos
garimpeiros individuais já havia sido substituída por grandes
companhias mineradoras. A população caiu de 27 mil habitantes,
em 1901, para 5 mil em 1911. Foram extraídas enormes quantidades
de ouro, prata, chumbo e outros minerais no território de Yukon,
e ainda há vastas reservas não exploradas. Estimulada pelo
governo federal do Canadá, a indústria de minérios cresceu
muito a partir da década de 1950. Em 1953, a capital do território
mudou para Whitehorse, cidade surgida durante a II Guerra
Mundial em conseqüência de projetos militares, como a construção
de uma estrada para o Alaska.
A cidade de Dawson e o rio Yukon
Yukon
vive agora do turismo
A
indústria de minérios passou a declinar no final do século 20.
Apesar de todo o crescimento, boa parte do território permaneceu
intocada, com fauna abundante, pois a terra recoberta por gelo
permanente dificultou a exploração, tanto de minérios quanto da
agricultura. Toda essa área foi preservada e, hoje, o turismo é
o maior setor da economia local. Robert Service é sempre
associado a Yukon e existe até um camping com seu nome (foto
abaixo).
Camping Robert Service, em Whitehorse:
homenagem ao poeta
Turistas no rio Yukon congelado no
inverno
Lago Schwatka, em Whitehorse
A
magia de Yukon
No poema de onde foi
tirado o título do episódio, Robert Service fala sobre a magia,
a beleza e o silêncio dessa remota região de nosso planeta. Ele
fala na voz de um garimpeiro, como se fosse um daqueles
aventureiros que foi em busca do ouro e acabou se apaixonando pelo
lugar, pelas montanhas, pelas florestas "onde o silêncio fez
morada".
Vendo as fotos,
entende-se rapidamente por que o poeta dedicou tantos poemas a
esse belíssimo lugar. Obviamente,
o título do episódio da Nova Geração refere-se àquela
suposta região da galáxia (na verdade apenas um "laboratório",
onde aquele ser fazia experiências com a Enterprise), aquele espaço
vazio, em que não havia absolutamente nada, apenas o silêncio.
Leia abaixo o poema no original e uma
tradução livre. O verso "where silence has lease" está
na última estrofe.
Yukon: "onde o silêncio fez morada"
A Magia
de Yukon
Eu queria o ouro e o
procurei,
Arranhei o solo e me sujei feito um
escravo.
Lutei contra a fome e a doença;
Joguei minha juventude numa cova.
Eu queria o ouro e o consegui –
Ele surgiu com a sorte no último
outono, –
Ainda assim, a vida não é o que
pensava,
E, de alguma forma, o ouro não é
tudo.
Não! Há o lugar
(você viu?)
É o lugar mais amaldiçoado que
conheço,
Desde as grandes e estonteantes
montanhas que o protegem
Até os os vales lá embaixo,
profundos como a morte.
Alguns dizem que Deus estava cansado
quando o fez;
Outros dizem que é bom evitá-lo;
Talvez; mas há os que não o
trocariam
Por nenhum outro lugar na Terra – e
eu sou um deles.
Você vai para ficar
rico (um bom motivo);
No começo, você se sente exilado;
Você odeia o lugar por uma estação,
E depois fica ainda pior.
Mas ele prende você como alguns
pecados fazem
E, de inimigo, transforma você em
amigo;
Parece que foi assim desde o início;
Parece que será assim até o fim.
Já estive no topo de
abismos
Cheios de silêncio em toda a sua
verticalidade
Vi o Sol, grande e enérgico,
projetar-se
Em vermelho e dourado, e depois ir
sumindo
Até que a Lua surgisse, fazendo
brilhar os picos perolados,
E as estrelas deslizassem de corpo e
alma;
E pensei estar com certeza sonhando,
Com a paz do mundo reinando sobre
tudo.
O verão – nunca
houve tão doce;
Os bosques ensolarados, todos
impressionantes;
O peixe pulando no rio,
O veado dormindo na colina.
A vida forte, nunca domesticada;
A região inexplorada onde vivem os
alces;
O frescor, a liberdade, a distância
–
Oh, Deus, como estou apaixonado por
tudo isso!
O inverno! a
claridade ofuscante,
A terra branca e compacta, como um
tambor,
O frio temor que o persegue e o
encontra,
O silêncio que deixa você mudo.
A neve, mais antiga que a história,
Os bosques, onde estranhas sombras se
inclinam;
O silêncio, o luar, o mistério,
Já quis dizer-lhes adeus, mas não
posso.
Há um lugar onde as
montanhas não têm nome,
E os rios correm Deus sabe para onde;
E há vidas errantes, sem rumo
E mortes pendendo por um fio;
Há sofrimentos dos quais ninguém
sabe;
Há vales sem gente, silentes, tranqüilos;
Há um lugar – oh, ele chama, ele
acena,
E eu quero voltar e voltarei.
Estão acabando com o
meu dinheiro;
Estou cansado de tomar champagne.
Graças a Deus! quando eu estiver sem
um tostão
Subo de novo as montanhas de Yukon.
Lutarei – e pode apostar que não
será fingimento;
É o inferno! – mas já estive lá;
E é muito muito melhor que isto aqui
–
Então irei para Yukon mais uma vez.
Há ouro e ele está
me provocando,
Está me atraindo como outrora;
Mas não é bem o ouro que eu quero.
O que quero é ir lá encontrá-lo, o
que quero
É o lugar, grandioso, largo, lá em
cima, longínquo,
São as florestas onde o silêncio
fez morada;
É a beleza que me enche de assombro,
É o silêncio que me enche de paz.
The Spell
of the Yukon
I wanted the gold, and I
sought it,
I scrabbled and mucked like a slave.
Was it famine or scurvy -- I fought it;
I hurled my youth into a grave.
I wanted the gold, and I got it --
Came out with a fortune last fall, --
Yet somehow life's not what I thought it,
And somehow the gold isn't all.
No! There's the land.
(Have you seen it?)
It's the cussedest land that I know,
From the big, dizzy mountains that screen it
To the deep, deathlike valleys below.
Some say God was tired when He made it;
Some say it's a fine land to shun;
Maybe; but there's some as would trade it
For no land on earth -- and I'm one.
You come to get rich
(damned good reason);
You feel like an exile at first;
You hate it like hell for a season,
And then you are worse than the worst.
It grips you like some kinds of sinning;
It twists you from foe to a friend;
It seems it's been since the beginning;
It seems it will be to the end.
I've stood in some
mighty-mouthed hollow
That's plumb-full of hush to the brim;
I've watched the big, husky sun wallow
In crimson and gold, and grow dim,
Till the moon set the pearly peaks gleaming,
And the stars tumbled out, neck and crop;
And I've thought that I surely was dreaming,
With the peace o' the world piled on top.
The summer -- no sweeter
was ever;
The sunshiny woods all athrill;
The grayling aleap in the river,
The bighorn asleep on the hill.
The strong life that never knows harness;
The wilds where the caribou call;
The freshness, the freedom, the farness --
O God! how I'm stuck on it all.
The winter! the
brightness that blinds you,
The white land locked tight as a drum,
The cold fear that follows and finds you,
The silence that bludgeons you dumb.
The snows that are older than history,
The woods where the weird shadows slant;
The stillness, the moonlight, the mystery,
I've bade 'em good-by -- but I can't.
There's a land where the
mountains are nameless,
And the rivers all run God knows where;
There are lives that are erring and aimless,
And deaths that just hang by a hair;
There are hardships that nobody reckons;
There are valleys unpeopled and still;
There's a land -- oh, it beckons and beckons,
And I want to go back -- and I will.
They're making my money
diminish;
I'm sick of the taste of champagne.
Thank God! when I'm skinned to a finish
I'll pike to the Yukon again.
I'll fight -- and you bet it's no sham-fight;
It's hell! -- but I've been there before;
And it's better than this by a damsite --
So me for the Yukon once more.
There's gold, and it's
haunting and haunting;
It's luring me on as of old;
Yet it isn't the gold that I'm wanting
So much as just finding the gold.
It's the great, big, broad land 'way up yonder,
It's the forests where silence has lease;
It's the beauty that thrills me with wonder,
It's the stillness that fills me with peace.
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