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A Insurreição que saiu pela culatra

Era uma vez um povo que vivia muito feliz, com 600 pessoas num planeta distante. Eles habitavam um povoado paradisíaco e rústico com os afazeres das vilas pré-industriais --não porque faltasse tecnologia, mas por que eles simplesmente não a apreciavam.

Um belo dia, sua vida é perturbada por um andróide desvairado e um monte de disparos de raios feiser. Depois disso, a vida virou um inferno, cujos demônios são alguns dos oficiais da Frota Estelar e um bando de gente malvada e desfigurada --os Son'a.

A Federação é passada para trás. Através de seu Conselho, ela aprovou um projeto de cooperação sem saber muito bem como e por que, num momento onde estava passando por sérios problemas com os Cardassianos, Romulanos e Dominion, conforme a série Deep Space Nine contou na televisão.

Este é o enredo de um samba tocado mais uma vez pela equipe de produção da Paramount para "Jornada Nas Estrelas - Insurreição". Patrick Stewart foi a estrela e um produtor associado. O roteiro foi de Michael Piller, com história criada por ele e Rick Berman, e remexida pelo próprio Stewart.

Herman Zimmerman trabalhou na cenografia e a trilha sonora foi composta por Jerry Goldsmith. A direção coube mais uma vez a Jonathan Frakes (William Riker). Na época de lançamento eles disseram ser o filme uma mistura de "Horizonte Perdido" com "O Morro dos Ventos Uivantes". A primeira proposta de título foi "Primeira Diretriz" ("Prime Directive"), nome mais adequado, só que menos comercial.

Picard e Data estão mais uma vez no centro da trama. A ação deles, para o bem ou para o mal, determina o rumo das coisas. É a tentativa de proteger os Baku, combater os Son'a e salvar a Federação das mãos dos aproveitadores e de um almirante ingênuo.

No meio de tudo isso, a tripulação da Enterprise-E experimenta o rejuvenescimento propiciado pela atmosfera do planeta Baku: a doutora Crusher sente os seios mais firmes, La Forge passa a enxergar normalmente, Worf retorna à puberdade, Troi e Riker se sentem novamente apaixonados e Picard se envolve com a nativa Anij de modo tão feliz que até dança um mambo (de forma meio "esquisita", diga-se de passagem).

As cenas são boas, engraçadas, mas há alguns absurdos e exageros como a nave que solta rastilho de pólvora à la versão original de "Flash Gordon" ou a cantoria de Picard e Data no "karaokê" de bolinhas saltitantes.

Pior ainda foi o "joystick" manipulado por Riker na ponte da nave para fazer uma perigosíssima manobra espacial. Não devemos esquecer também de Data no fundo de um lago cheio de peixinhos em busca da nave equipada com um holodeck.

Adiciona-se a isso o gritinho de raiva de Ru'afo, o líder dos Son'a, quando sentiu que estava perdendo a parada e a briga de família com os Baku. Pelo menos Picard deu a tônica na luta com o vilão: "estamos ficando velhos demais para isso". É uma boa sinalização de que a tripulação precisa da sombra e da água de coco fresca de Risa.

Acontece que a cena provavelmente mais representativa do título do filme só tem efeito dramático no trailer. Picard tirou suas divisas e o uniforme, junto com a parte da tripulação que desceu ao planeta e teve o apoio de Riker e dos demais.

Só que Kirk, Sisko, Janeway e seus comandados já fizeram mais do que isso, sem tanto alarde. Enfim, a produção poderia ser mais caprichada e não seguir o comportamento dos produtores de "Babylon 5" nos cenários das naves Son'a, quando usaram e abusaram do acrílico.

Mas alguns momentos se salvam --afinal, é um filme de Jornada nas Estrelas (ímpar, é claro)! Com todos os defeitos, ainda é melhor do que muito do que temos visto por aí.

Vemos o diálogo de Data com o menino Baku, assustado e fascinado pelo andróide. Eles conversam sobre a infância e a maturidade quando o garoto lhe dá um bom conselho: não se esquecer de brincar todos os dias. Como tudo deve acabar bem, há a reconciliação dos filhos não tão pródigos com seus pais.

De todo modo, os atores convidados funcionaram bem e não comprometeram. F. Murray Abraham na pele de Ru'afo se saiu bem de novo como vilão. Os coadjuvantes Gregg Henry (Gallatin), Daniel H. Kelly (Sojef), Anthony Zerbe (almirante Doughety) e Michael Welch (o menino Artim) se salvam. A oficial Trill na ponte da Enterprise-E não é das piores, mas me fez chorar de saudades da querida tenente Jadzia Dax. Assim mesmo, choveu bem na horta da tesouraria da Paramount.


Cláudio Silveira escreve regularmente sobre os filmes com exclusividade para o Trek Brasilis