Trek
Brasilis -
Você costuma mencionar que era fã de Jornada muitos
anos antes de se envolver com a série. Qual é o sentimento
quando um fã consegue executar a difícil tarefa que é fazer a
transição entre assistir ao show e participar dele?
Eric Stillwell - Foi incrível para mim quando me tornei um
assistente de produção de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração,
em 1987. No começo não parecia de verdade -- parecia um sonho.
E certamente era um sonho tornando-se realidade. Mas a natureza
do trabalho logo se fixa e algumas vezes diz às pessoas que
elas devem tomar cuidado para ter certeza de que seus sonhos não
vão virar pesadelos. A longo prazo, trabalhar com Jornada
não foi diferente de nenhum outro trabalho -- houve os bons e
os maus dias. Talvez, por ser um fã antes de mais nada, os dias
ruins tenham sido mais frustrantes do que eles seriam em um
trabalho "normal". De alguma forma eu esperava mais
das pessoas que faziam Jornada, e logo descobri que essas
pessoas não eram diferentes de qualquer outro grupo que está
trabalhando em qualquer tipo de coisa em qualquer parte do mundo
-- há as pessoas legais e as pessoas não tão legais, onde
quer que você vá. Ainda assim, como fã, foi incrível
trabalhar na série e uma experiência que nunca esquecerei.
TB - Você é creditado como
"pesquisador" para a segunda temporada de A Nova
Geração. Como você primeiro se envolveu com Jornada?
Stillwell - Eu conhecia algumas das pessoas do escritório
de Gene Roddenberry antes de trabalhar em Jornada --
especificamente, Susan Sackett. Eu sabia que seria difícil, mas
não impossível, arrumar um emprego em Jornada sem
nenhuma experiência trabalhando em TV ou filmes. Então, antes
de me mudar para a Califórnia, eu decidi fazer o que eu pudesse
para aprender mais sobre a indústria do entretenimento. Durante
meus tempos de faculdade, eu vivia em casa com meus pais em
Eugene, Oregon, e meu primeiro emprego foi em uma locadora de vídeo.
Enquanto trabalhei lá, assisti a tantos filmes quanto possível.
Um dia li no jornal que a Warner Bros. TV viria ao Oregon para
fazer um filme de TV chamado "Promise", estrelando
James Garner e James Woods. Eu imediatamente liguei para o
escritório de produção em Los Angeles a perguntei se poderia
trabalhar na produção enquanto eles tivessem filmando em locação
no Oregon. Eles não concordaram de cara, mas me convidaram a
visitar seus escritórios de produção no primeiro dia de
filmagem, e eu imediatamente me fiz indispensável, atendendo
telefonemas, fazendo fotocópias de roteiros e me oferecendo
para fazer o que pudesse para ser útil. No final da semana eu
estava ajudando o administrador de locação a preparar mapas
para as várias locações de filmagem na região. Porque eu
estava trabalhando como "voluntário", o pessoal do
escritório de produção ficou com dó de mim e arrumou uma
ponta como figurante do filme -- acabei aparecendo como uma
pessoa ao fundo em uma das cenas do James Garner. No dia
seguinte, um dos diretores assistentes foi demitido e mandado de
volta a Los Angeles. Então eles me contrataram para ser um
assistente de produção durante o restante das filmagens no
Oregon. Quando a filmagem terminou, pude voar com a equipe de
produção até Los Angeles para a festa de conclusão do filme.
Durante esta viagem a Los Angeles, descobri que a Paramount
estava planejando fazer uma nova série de Jornada.
Imediatamente enviei meu novo currículo (com todas as minhas
recém-obtidas experiências trabalhando em "Promise")
para a Susan Sackett. Ela entregou meu currículo para o
produtor Robert Justman. Alguns meses depois, voltei a Los
Angeles para fazer um teste de admissão para o Programa de
Treinamento de Assistente de Diretor oferecido pelo Sindicato
dos Diretores dos EUA. Embora eu não tenha entrado no programa,
consegui uma entrevista com Robert Justman. Eles estavam
procurando dois assistentes de produção para Jornada nas
Estrelas: A Nova Geração. Após a entrevista, voltei para
o Oregon e esperei para saber se o trabalho seria ou não meu.
Pouco tempo depois, recebi uma amável carta de Robert Justman
explicando que eu não fui escolhido porque eles decidiram optar
por duas pessoas que já trabalharam na Paramount e estavam
familiarizadas com o estúdio. Inabalado, decidi mudar para Los
Angeles mesmo assim. Logo que cheguei, decidi procurar um
emprego na Paramount -- para colocar o pé na porta, por assim
dizer. Em agosto de 1987, fui contratado como um "page"
para o setor de Relações Públicas de Convidados da Paramount.
Os "pages" são jovens que dão tours do estúdio e
providenciam coordenação de público para shows de auditório.
No fim de setembro, meu chefe perguntou se eu estaria
interessado em trabalhar em uma festa particular da primeira
exibição de A Nova Geração para o elenco e a equipe.
As produções freqüentemente contratam "pages" do
estúdio para trabalhar nas portas e listas de convidados para
as exibições dentro do estúdio. Naturalmente pulei sobre a
oportunidade. E nunca esquecerei que quando Rick Berman
apareceu, eu não encontrei o nome dele na lista e não ia deixá-lo
entrar na exibição! Quem podia imaginar? Mas também encontrei
Robert Justman naquela noite e ele se lembrou de mim, da
entrevista que eu tinha feito, e ficou surpreso ao descobrir que
eu agora estava trabalhando no estúdio. Alguns dias depois, um
dos assistentes de produção originais foi promovido e Justman
me chamou e ofereceu o trabalho. O resto, como dizem por aí, é
história.
TB - Seu primeiro trabalho
creditado como escritor em Jornada nas Estrelas é a história
de "Yesterday's Enterprise", um conceito
originalmente escrito e abandonado durante a segunda temporada
de A Nova Geração e resgatado durante a terceira
temporada. Há muitas diferenças entre a história original e a
que foi ao ar?
Stillwell - No final da segunda temporada, eu me ofereci
para fazer considerável pesquisa para o episódio final da
temporada, chamado "Shades of Gray". Por causa
de uma greve de roteiristas em Hollywood, e para economizar, o
estúdio decidiu fazer um "clip show" e passei 80
horas de uma semana compilando todas as informações sobre os
clipes de episódios anteriores que seriam necessárias para
produzir o episódio. Foi assim que consegui meu primeiro crédito
de tela como "pesquisador". Na época, eu já havia
sido promovido a Coordenador de Roteiros e estava trabalhando
diretamente para o líder do grupo de escritores da série. Um
dos roteiros especulativos que foi submetido durante a segunda
temporada foi de Trent Ganino, chamado "Yesterday's
Enterprise", onde a Enteprise-D encontra a Enterprise-C,
que chegou à nossa época por acidente e precisa ser mandada de
volta antes que mude a história. Era uma história que lidava
primariamente com o dilema de Picard de contar ou não a essas
pessoas que o retorno delas também resultaria em suas mortes, e
saber se esse conhecimento mudaria ou não o curso da história.
Imagem ciada para a capa da
revista Star Trek
Magazine para comemorar o 10º aniversário
do episódio "Yesterday's Enterprise" |
Após o lançamento de Jornada
V, Trent e eu começamos a colaborar em uma idéia diferente
que envolvia a morte acidental de Surak, o fundador da filosofia
Vulcana moderna, durante uma expedição arqueológica feita com
o Guardião da Eternidade (de "The City on the Edge of
Forever"). Como resultado da morte de Surak, os
Vulcanos nunca evoluíram como os conhecemos hoje e terminaram
formando uma aliança com os Romulanos para destruir os Klingons.
Na época em que os encontramos, eles resolvem se dedicar a
destruir a Federação. Estamos em guerra. E porque a linha do
tempo foi alterada e os Klingons se foram, Tasha Yar sobreviveu
para lutar mais uma vez. No final, o pai de Spock, Sarek, que
estava a bordo da Enterprise e inalterado pela mudança
temporal, convence Picard a deixá-lo retornar para o passado de
Vulcano via Guardião da Eternidade para corrigir o problema.
Com efeito, Sarek substitui Surak e se torna o fundador da
filosofia Vulcana moderna. Quando mostramos essa idéia aos
produtores, eles pediram para que tirássemos o Guardião da
Eternidade e Sarek, e de algum modo combinássemos o resto com o
conceito original de Trent para "Yesterday's Enterprise".
Eles queriam manter Tasha (porque eles sabiam que Denise Crosby
estava interessada em retornar) e queriam que usássemos Guinan
como a pessoa que convence Picard de que algo está
terrivelmente errado. E é assim que o episódio se desenvolveu.
TB - "Yesterday's
Enterprise" é tido como um dos melhores episódios de A
Nova Geração. Ele é também conhecido como um dos mais
confusos em termos do processo de roteirização. Você poderia
nos dar alguns insights sobre o que aconteceu na época?
Stillwell - O problema principar era a falta de tempo.
Para termos Denise Crosby e Whoopi Goldberg no mesmo episódio
ao mesmo tempo, a agenda de produção teve de ser adiantada em
mais de um mês. Como resultado, o roteiro precisava ser escrito
em quatro dias, o que aconteceu durante o fim de semana de Ação
de Graças. Para fazê-lo, cada membro da equipe de roteiristas
ficou de escrever um ato e quando eles voltaram do fim de
semana, juntaram tudo em questão de dias. Todo mundo estava
convencido de que seria um desastre, mas no final ficou
brilhante.
TB - O crédito de história para "Yesterday's
Enterprise" abriu portas para mais participações na série?
Stillwell - Nós podíamos bolar outras histórias, o que
fizemos por vários anos, mas eu não vendi outra história até
a primeira temporada de Jornada nas Estrelas: Voyager. Eu
co-escrevi a história para "Prime Factors".
TB - Você agora trabalha junto com
Michael Piller, na companhia de produção dele. Você o
conheceu durante os tempos de A Nova Geração?
Stillwell - Sim. Na verdade comecei a trabalhar na Nova
Geração em 1987. Michael entrou para o time e se tornou o
escritor principal em 1989. Eu já era o Coordenador de Roteiros
na época, e Michael passou a ser meu supervisor imediato.
TB - Embora você tenha alguns créditos
como criador de histórias, você nunca chegou a ponto de
escrever os roteiros. Por quê?
Stillwell - Acho que meus colegas e eu nunca tivemos a
experiência que os produtores estavam procurando para nos
confiar a tarefa de escrever um roteiro. Pagar alguém para
escrever um roteiro é caro, por isso talvez eles quisessem usar
roteiristas mais experientes. No caso de "Yesterday's
Enterprise", simplesmente não havia tempo suficiente
para nos deixar fazê-lo, mesmo que eles quisessem. Durante a
primeira temporada de A Nova Geração escrevi um roteiro
especulativo chamado "Shattered Time", que todo mundo
adorou. Quase todo mundo. Maurice Hurley, que era o
roteirista-chefe na época, amou o roteiro e queria comprá-lo.
O administrador da produção amou. Até os executivos do estúdio
amaram. Infelizmente, Gene Roddenberry preferiu passar, por isso
nunca aconteceu. Algumas vezes o sucesso em Hollywood é menos
uma questão de talento do que de sorte de estar no lugar certo,
na hora certa.
TB
- Você poderia falar mais dessa história perdida, "Shattered
Time"?
Stillwell - "Shattered
Time" era sobre a Enterprise descobrindo uma civilização
que se extinguiu centenas de anos atrás, mas estranhamente não
há nenhuma indicação do que teria acontecido com eles. Após
mais investigações, o grupo avançado descobre uma bonita
civilização que parecia fascinada por espelhos. Acontece que
os espelhos são passagens similares ao teletransporte feitas
para levar a abrigos anti-bombardeio, em caso de guerra. Em órbita,
a Enterprise encontra um desses objetos -- algo como um espelho
gigante no espaço -- mas antes que eles possam ajustar o curso,
a Enterprise passa pelo espelho e entra em outra dimensão cheia
de armas orbitais, como ogivas nucleares que ficaram presas ali.
Na superfície do planeta, o grupo avançado descobre que a
civilização inteira ainda está viva, mas presa no outro lado
dos espelhos em uma dimensão suspensa. Porque ninguém ficou do
lado de fora para libertá-los, eles ficaram presos para sempre.
Eventualmente nossos heróis descobrem um modo de reverter a
tecnologia (o "Shattered Time") e a população
retorna para seu mundo com uma nova perspectiva de um sistema de
defesa que supostamente teria sido desenvolvido para salvá-los
da guerra. A história era uma alegoria do sistema de defesa de
mísseis proposto pelos EUA, chamado "Guerra nas
Estrelas".
TB
- Você
teve a oportunidade de acompanhar Jornada nas Estrelas
desde os primeiros anos da Nova Geração, que trouxeram
o franchise a uma posição em que quase se tornou um programa
de massa, até a última produção para cinema, "Insurrection",
que não teve bom desempenho nas bilheterias norte-americanas.
Como você vê, da vantajosa perspectiva de quem olha pelo lado
de dentro, a evolução do franchise durante todos esses anos?
Stillwell - Essa é uma questão difícil. A Nova Geração
era muito popular e tinha uma enorme audiência de TV, comparada
às outras séries em syndication. Deep Space Nine e Voyager
eram menos populares e nunca tiveram a mesma sorte da Nova
Geração. Mesmo assim, os filmes da Nova Geração têm
obtido um sucesso moderado, com menor audiência recentemente
para "Insurrection". Eu não estou certo se há
uma única razão para o declínio em popularidade ou se é
apenas uma questão de química entre os personagens e sua audiência,
que mudou ao longo do tempo. Eu acho, dos filmes em particular,
que "Insurrection" estava competindo com a
crise nacional na televisão norte-americana -- o impeachment do
presidente Clinton, o bombardeamento do Iraque e outras distrações,
poucos dias antes do Natal. No mercado internacional, "Insurrection"
foi muito bem para um filme de Jornada. Eu acho que as
preocupações domésticas nos EUA podem ter prejudicado o
sucesso de bilheteria daquele filme. Eu ainda acredito que o "Insurrection"
irá sobreviver ao teste do tempo, porque é um filme muito bom
que permanece verdadeiro à visão de Gene Roddenberry para Jornada
nas Estrelas.
TB
- Além de seus créditos como escritor, você também teve a
oportunidade de ser um figurante (embora não-creditado) em "Jornada
nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida". Você era um
dos alienígenas presentes à conferência de Khitomer?
Stillwell - Na verdade, eu era um dos Klingons no
julgamento do capitão Kirk e do doutor McCoy em Kronos. Nós éramos
aqueles na platéia com as lanças que faziam um baita barulho.
Trent Ganino, meu colega de "Yesterday's Enterprise",
foi um dos juízes Klingons naquela mesma cena. Foi trabalho
duro. Levou dois dias inteiros para filmar aquela cena. Os
figurantes tinham que vestir essas horríveis máscaras de
borracha que dificultavam a respiração, e o jeito que as máscaras
se encaixavam nos figurinos nos faziam ficar presos com elas 12
horas por dia. Nós só podíamos remover as máscaras na hora
do almoço. Por causa da fumaça que era bombeada no set para
dar aquela atmosfera Klingon e dos brilhantes holofotes sobre nós,
era muito quente dentro das máscaras, e desconfortável. No
segundo dia, muitos dos figurantes não apareceram. Durante
nossa parada para o almoço no primeiro dia, Mark Lenard
apareceu para experimentar um figurino e acabou almoçando
conosco. Ele era uma pessoa muito legal. Pelo fato de as roupas
Klingons terem sido coletadas de uma porção de lojas de
figurinos em Hollywood, Mark pensou que a vestimenta de couro
que eu estava usando parecia muito com a roupa do general Urko
que ele usou uma vez na série de TV "Planeta dos
Macacos". Foi muito divertido!
TB - Como foi ter a chance de
falar, ou ao menos estar próximo a Bill Shatner, Leonard Nimoy
e todos os outros membros da série original -- pessoas que você
costumava ver viajando pelo espaço desde que você era criança?
Stillwell - Foi um sonho virando realidade encontrar
todos os meus heróis em pessoa! DeForest Kelley era meu
favorito. Ele era um homem muito bom e generoso. Leonard Nimoy
foi muito atencioso. Eu tive uma longa conversa com ele uma vez
em Indianapolis, Indiana, uma noite antes de uma aparição em
uma convenção em que ele iria anunciar sua decisão de não
aparecer em "Jornada nas Estrelas: Generations".
Ele estava muito preocupado em como os fãs iriam reagir. Minhas
experiências com William Shatner foram menos que memoráveis.
Ele não é particularmente afável. Não posso dizer que gostei
das vezes em que estive perto dele. Nichelle Nichols é uma
senhora adorável. Sempre gostei de trabalhar com ela, assim
como com Jimmy Doohan. Jimmy é muito generoso. Ele convidou
minha mãe e eu para jantar após uma convenção em Boise,
Idaho, e nos ofereceu uma elaborada refeição com vinho e
drinks. George Takei é também um de meus favoritos. George é
muito consciente política e socialmente. Ele pode falar sobre
praticamente qualquer assunto com grande autoridade. Minha
esposa e eu desfrutamos de sua companhia em várias viagens do
Cruise Trek. Ele pode entretê-lo por horas com histórias de
suas experiências e sua visão de situações sóciopolíticas
de todo lugar do mundo.
TB - Qual era o sentimento geral
nas filmagens daquele filme?
Stillwell - Se você pergunta do Jornada VI, foi
divertido. Todo mundo trabalhou duro, mas eles se divertiram
fazendo. Muitas pessoas acreditaram que seria o último filme
para o elenco original, e para mim era o primeiro. Porque
Michael Dorn também estava na mesma cena que eu, interpretando
seu próprio avô, pareceu para mim que Jornada havia
completado o círculo, com o passado encontrando o futuro.
TB
- Trocando para o outro filme com o qual você esteve envolvido,
vamos falar sobre a última produção cinematográfica de Jornada,
"Insurrection". Você foi creditado como
"Associado de Produção", mas você disse ter
trabalhado como coordenador de roteiros. Qual foi a sua
participação no filme?
Stillwell - Meu crédito oficial no filme foi
"Associado de Produção", que é um título genérico
para cobrir uma variedade de papéis sem ofender nenhum
sindicato. Embora eu tenha servido como Coordenador de Roteiro
para o filme, trabalhando primariamente para o escritor, Michael
Piller, já há um crédito oficial do sindicato dado ao
Supervisor de Roteiro, que é um trabalho de produção no set.
Meu trabalho acontece principalmente em um escritório, onde sou
responsável pela digitação, leitura de provas, impressão e
distribuição do roteiro e de todas as revisões. Eu também
era o assistente executivo de Michael Piller, o que continuo a
ser hoje.
TB - O que você achou do resultado
final obtido em "Insurrection"?
Stillwell - Eu acho que o filme acabou saindo muito bom.
É um filme divertido e que entretêm. Baseado em tudo que
ocorreu no planejamento e desenvolvimento do roteiro -- todas as
notas do estúdio, dos atores etc. -- acho que saiu exatamente
do jeito que deveria. Eles queriam que fosse diferente de "Primeiro
Contato" e penso que atingimos esse objetivo. Os
Romulanos deveriam ter sido os vilões principais na versão
original do roteiro, e acho que teria dado maior impacto dramático
do que introduzir um grupo inteiramente novo de malvados. Mas
certas pessoas não quiseram usar os Romulanos, então eles
foram retirados da versão final. Eu acho que foi um erro. Mas
baseado no que foi pedido ao escritor, ao diretor e aos
produtores, acho que o resultado final foi muito bom.
TB - Você também escreveu a história
para "Prime Factors", um dos primeiros episódios
de Voyager. A série mudou um pouco desde então. O que
você acha do atual estado de Voyager?
Stillwell - Para ser honesto, estou desapontado com o
fato de Voyager nunca ter capturado o senso de descoberta
que me atraiu para a série original, e algo que eu acho que
ajudou em parte a fazer da Nova Geração um sucesso.
Como fã, eu queria audaciosamente ir onde ninguém jamais
esteve, e Voyager teve essa oportunidade quando eles
foram para uma porção totalmente nova e inexplorada de nossa
galáxia. Mas acabou virando muito típico, muito rotineiro.
Toda semana encontramos novos alienígenas, mas nunca há um
senso de descoberta ou do Desconhecido. É como dirigir pela
cidade e visitar uma vizinhança diferente a cada semana, em vez
da sensação de pousar na Lua pela primeira vez. Eu espero que
agora, após todos esses anos, eles finalmente retornem à
Federação. Eu acho que seria um jeito interessante de terminar
a série.
TB - Muitas pessoas percebem a
atual equipe de produção de Jornada no meio de uma
guerra civil. Robert Beltran dispara sobre os roteiristas, os
produtores respondem fogo, acompanhados por Kate Mulgrew. A
personagem de Jeri Ryan, Seven of Nine, é acusada de ter muita
atenção e tempo de tela, a despeito de outros personagens, e
tivemos alguns eventos "estranhos", como a súbita ida
e vinda de Ronald D. Moore como roteirista para a série, após
o fim de Deep Space Nine. Jornada não é a mesma
que costumava ser ou esse tipo de conflito é realmente normal
durante uma grande produção de TV como Voyager?
Eric Stillwell com
Gene Roddenberry na
ponte da Enterprise (NCC-1701-D) |
Stillwell - Jornada
definitivamente não é a mesma que costumava ser. Para mim,
houve uma dramática mudança filosófica após a morte de Gene
Roddenberry. Gene era muito idealista. Ele era a alma de Jornada
nas Estrelas. Ele pode não ter sido tão pragmático como o
estúdio e a equipe de produção precisavam que ele fosse, mas
enquanto Gene esteve vivo, Jornada tinha um sentimento
lendário sobre ela. Quando Gene morreu, eu acho que uma parte
de Jornada morreu com ele. Em anos recentes, houve
definitivamente algumas mudanças infelizes nos relacionamentos
entre diferentes indivíduos envolvidos com as séries de Jornada
nas Estrelas. Algumas foram tristes e patéticas, algumas
simplesmente infantis. Eu não diria que isso é singular na
produção de Jornada, mas certamente não é algo que
deveria ser considerado "normal" em qualquer produção.
É provavelmente igual aos problemas que ocorrem em qualquer
grande organização de negócios. Apenas recebe mais
publicidade por causa da natureza do negócio e o ávido
interesse dos fãs.
TB
- Quais as diferenças entre trabalhar para Gene Roddenberry,
Rick Berman, Michael Piller e Jeri Taylor? Como você vê os
diferentes estilos de conduzir uma produção?
Stillwell - Gene Roddenberry sempre foi amistoso e
gracioso, fez uma porção de festas de aniversário em seu
escritório para a equipe, sempre fez festas de feriado. Quando
me tornei Coordenador de Roteiros, Gene estava passando as operações
do dia-a-dia para Rick Berman no escritório de produção e
para Michael Piller no departamento de roteirização. Trabalhei
supervisionado por Michael Piller. Ele era muito concentrado em
realizar o trabalho e levar as coisas de volta ao rumo certo após
uma temporada caótica causada pelas greves e pela rotatividade
da equipe de escritores durante o segundo ano de A Nova Geração.
Estávamos muito atrasados com os roteiros e essencialmente
escrevendo semana após semana com o que quer que pudéssemos
colocar no papel rápido o suficiente. Michael foi ótimo para
colocar ordem nas coisas, mas pelo fato de ter gasto tanto tempo
por trás de portas fechadas com os roteiros, ou em reuniões,
muitos de nós nunca tivemos uma chance real de conhecê-lo
pessoalmente. Ele estava sempre concentrado no trabalho, era difícil
saber o que ele estava pensando ou como estava se sentindo. Rick
Berman essencialmente se tornou o presidente da operação de Jornada
nas Estrelas após Gene ter se afastado da operação do
dia-a-dia. O estilo autoritário de Rick fez alguns de nós
temerosos de cometer erros. Ninguém queria cruzar com ele. Mas
uma vez que você passa do duro exterior, Rick é um cara do
tipo brincalhão que é muito sério quando se trata de fazer o
trabalho direito. Jeri Taylor, a primeira mulher a se tornar
produtora-executiva e co-criadora de uma série de Jornada,
era como a "mamãe" da equipe. Ela sempre era generosa
e reconfortante e sempre queria ajudar as pessoas. Todo mundo ia
até ela com seus problemas e ela sempre tornava as coisas
melhores. Conforme ela assumiu mais e mais responsabilidades,
especialmente com a criação de Voyager, acho que ela se
tornou mais séria, ou talvez o estresse e as exigências do
trabalho tenham simplesmente feito dela uma pessoa mais séria.
Acho que ela ficou bem feliz de se aposentar e deixar muito do
estresse e das exigências para trás.
Michael Piller, Rick
Berman, Sandra Piller, Debra Stillwell e
Eric Stillwell
TB
- Você
tem ainda algum envolvimento com Jornada?
Stillwell - Não exatamente. Mas como assistente de
Michael Piller, ocasionalmente digito suas notas de histórias e
roteiros. Como Consultor Criativo para a série, Michael
continua a fornecer retorno para todos os episódios de Voyager.
Fora do escritório, ainda estou envolvido com o Cruise Trek e
outros eventos relacionados a Jornada. Ainda sou
convidado para convenções de Jornada de tempos em
tempos. Gosto especialmente das viagens para fora do país.
TB - Além de histórias para episódios,
você também escreveu a história para "The 34th Rule",
um livro escrito por Armin Shimerman e David R. George III.
Quais foram as diferenças entre criar para um episódio e criar
para um livro?
Noite de
autógrafos de "The
34th Rule" em
Las Vegas com Eric Stillwell,
Max Grodenchik
(Rom), Lolita Fatjo, David R. George III e
Armin Shimerman (Quark) |
Stillwell - Quando David e eu começamos a trabalhar
com Armin, estávamos na verdade desenvolvendo várias histórias
para oferecer aos produtores de DS9 como episódios para
a série. De fato, nós oferecemos nossas histórias, mas eles não
estavam interessados. Em vez de simplesmente perdê-las,
pensamos que talvez pudéssemos vender uma delas como uma história
em quadrinhos ou então um livro. Os quadrinhos não deram
certo. Então mandamos várias histórias para a Pocket Books, e
“The 34th Rule” foi a que eles gostaram. Daquele ponto em
diante, era importante expandir a história para um livro, já
que uma novela é muito mais complexa e detalhada que um episódio
de uma hora. Dali pra frente, todo o trabalho foi feito por
David e Armin, já que eu não estava interessado em realmente
escrever o livro. Essa é a razão pela qual meu crédito é
apenas pela história. Após David e Armin expandirem a história
para o livro, David escreveu e Armin forneceu comentários
durante a fase de edição.
TB - Como foi trabalhar com
Shimerman neste projeto?
Stillwell - Armin Shimerman é uma das mais generosas e
criativas pessoas que já conheci. Foi muito fácil trabalhar
com ele. Foi 100% um prazer e uma honra trabalhar com ele.
TB - Nesses tempos incertos,
algumas questões são inevitáveis. Você sabe alguma coisa
sobre a próxima série de Jornada, atualmente sendo
desenvolvida por Rick Berman e Brannon Braga?
Stillwell - Honestamente, não. Eu apenas ouvi os rumores
sobre um show que seria anterior à série original -- sobre o
início da Federação. Eu não ouvi nada mais.
TB - E se a decisão estivesse em
suas mãos, o que você acha que daria uma grande série de Jornada?
Stillwell - Primeiro, acho que daria uma parada por
alguns anos. Exceto por filmes, acho que não deveria ter Jornada
após Voyager por pelo menos dois anos. Então, diria que
é hora de se aproveitar dos incríveis avanços tecnológicos
que ocorreram na produção de televisão e nos efeitos visuais.
Em vez de ir para trás, em uma época que deveria parecer
primitiva comparada à Jornada de hoje, eu iria para o
futuro --vamos fazer "Jornada nas Estrelas: No Século
25". Iria introduzir a próxima geração da nave estelar
Enterprise e tentaria recapturar o sentimento de descoberta e
exploração -- a busca pelo Desconhecido. Mande a nave através
do vasto desconhecido entre nossa galáxia e a galáxia de Andrômeda
(com nova e avançada tecnologia) e deixe a exploração começar
de novo na borda de uma galáxia inteiramente nova -- bem longe
de casa. Como a série original. Vá audaciosamente explorar
novos mundos e civilizações! Faça coisas novas e incomuns,
perigosas e diferentes. Novas aventuras empolgantes para uma
nova geração de exploradores.
TB - Sobre o próximo filme, você
sabe de alguma coisa?
Stillwell - Não sei nada sobre o novo filme, exceto que
um escritor chamado John Logan escreveu um roteiro. Ouvi um
rumor de que os Romulanos podem estar envolvidos, o que achei
estranho depois que pediram que os tirássemos da história
original de "Insurrection".
TB - Você está desenvolvendo algo
agora que gostaria de comentar?
Stillwell - No ano passado Michael Piller e sua companhia
produziram um piloto de ficção científica chamado “Day One”,
que era baseado em uma minissérie britânica chamada “The
Last Train”. Ela seguia as aventuras de várias pessoas que
sobreviveram à cataclísmica destruição da Terra após o
impacto de um asteróide, mas estão congeladas no tempo e
acordam 70 anos no futuro. Infelizmente a rede não encomendou a
série, então provavelmente nunca será feita. Este ano estamos
trabalhando em uma comédia de meia hora sobre fantasmas para a
rede da WB. E estamos também desenvolvendo uma série dramática
de uma hora para a UPN baseada em "The Dead Zone", de
Stephen King.
TB - Você gostaria de participar
de um evento de Jornada no Brasil?
Stillwell - Com certeza. Eu adoro encontrar fãs de Jornada
ao redor do mundo. No ano passado conheci vários fãs de um
clube de Jornada em Barcelona, Espanha. Fui convidado
para comparecer a uma convenção na Itália este ano. Minha
esposa e eu já estivemos em convenções no Reino Unido,
Alemanha, Canadá e Austrália. Cada ano viajamos com várias
centenas de fãs de Jornada no Cruise
Trek. Os fãs vêm de todos os cantos do mundo. Esse será
nosso sexto ano viajando com o Cruise Trek e gostamos de
encorajar outros fãs a se juntarem a nós. Sempre nos
divertimos bastante com maravilhosos atores de Jornada e
lugares exóticos.
Fileira de cima:
Debra Stillwell com os organizadores do Cruise Trek Charles
Datin e Linda Wolfe. Fileira de baixo: Eric
Stillwell, George Takei (Sulu), Jonathan del Arco ("I, Borg")
& Cecily Adams (Moogie, de DS9). A
foto foi tirada no Cruise Trek, no Canal do Panamá
TB - Alguma mensagem para os
trekkers brasileiros?
Stillwell - Felicidades e saudações de Los Angeles.
Minha esposa e eu esperamos que um dia possamos visitar seu país
e conhecê-los pessoalmente em uma convenção de Jornada!
Keep on trekkin’!
Entrevista realizada em janeiro de 2001.
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