Trek
Brasilis - Dublar Jornada nas Estrelas é uma
grande responsabilidade. Dificilmente há telespectadores tão
atentos e críticos quanto os fãs do seriado e os roteiros são
tão complicados e cheios de textos técnicos que às vezes são
difíceis de ser interpretados. Como você encara essa
responsabilidade?
Ricardo Juarez - Quando o assunto é Jornada
nas Estrelas, é preciso atenção redobrada. Os textos de
ficção geralmente são mais complicados. Com a
responsabilidade para fazer um bom trabalho, a dificuldade
cresce bastante.
TB -
Você é conhecido como a voz de Johnny Bravo, um personagem de
desenho animado. Qual a diferença entre dublar um desenho e um
personagem de carne e osso? Qual dos dois você prefere e qual
deles é mais fácil?
Juarez - Gosto de dublar filmes e desenhos.
Gosto de ambos por motivos diferentes. No desenho é possível
desenvolver um trabalho mais solto, exercitar a "veia cômica".
No caso dos filmes, como Voyager por exemplo, tenho que
tomar mil cuidados para deixar o personagem "Paris" o
mais natural possível. O que, diga-se de passagem, não é fácil.
TB - Muitas
vezes, uma dublagem pode melhorar ou piorar a performance dos
atores vista na tela. Quanto do resultado final, após uma
dublagem, pode ser atribuído ao dublador e quanto ao ator?
Juarez - Olha, concordo que existam dublagens
boas e ruins, mas pra quem não acompanhou todo o processo, é
difícil dizer de quem foi a culpa pelo sucesso ou fracasso do
filme ou desenho. Às vezes o dublador é bom, mas não fica bem
naquele papel, tipo, a voz não combina com o personagem. Às
vezes é a tradução, e algumas vezes a direção não orienta
o dublador na hora de gravar. Um bom diretor pode fazer a
diferença no final. Mas esse conceito de dublagem boa ou
dublagem ruim termina sendo uma coisa pessoal. O que posso dizer
é que todos os profissionais envolvidos são altamente
treinados e competentes, mesmo não agradando muitos. Essa é a
verdade nua e crua.
TB - Dublagem
normalmente é um ponto de partida para atores de teatro e
televisão. Você tem alguma pretensão ou desenvolve alguma
atividade nesse sentido?
Juarez - Apesar de já ter feito alguma coisa
de teatro, não tenho vontade de entrar de cabeça nessa área.
Em termos de televisão, tenho vontade de fazer apresentação
de vídeo. Atualmente curso jornalismo, quem sabe posso até
tentar apresentar um telejornal... E existe uma possibilidade de
eu tentar fazer cinema, minha paixão. A pouco tempo fiz parte
do elenco de um curta-metragem, "Rodolfo o Medroso e o Temível
Monstro Dentro do Armário". No elenco estão João
Campelli (Rodolfo), Murillo Rosa (pai do Rodolfo) --esses dois
também fazem novela, estão no elenco da novela das seis,
"O Cravo e a Rosa", e, é claro, eu ..o Monstro que
mora dentro do Armário (risos). Apesar do título ter uma
conotação infantil, o curta é bem sombrio e "não"
tem final feliz.
TB -
Como no caso dos atores, os dubladores também levam um tempo
para entrar na "pele" dos personagens. Em função
disso, você acha que a dublagem de uma série permite uma
qualidade de dublagem maior do que de um filme, em função do
maior volume de material a que o dublador é submetido?
Juarez
- Sim. Com certeza, numa série, você conhece melhor o
ator e consegue pegar os trejeitos do personagem. O dublador não
tem muito tempo pra entrar na pele do personagem, tudo acontece
muito rápido em dublagem. A gente entra no estúdio, assiste à
cena e logo em seguida já grava, não tem muito tempo para
analisar a cara do personagem.
TB -
Você já conhecia Jornada nas Estrelas antes de ser
escalado para dublar Tom Paris?
Juarez - Já, sou fã desde a Série Clássica!
TB -
Nas equipes que dublam Jornada nas Estrelas na VTI Rio, há
algum dos dubladores que é trekker (fã do seriado)?
Juarez - Hummm, acho que só eu! Na verdade, eu
curto muito a série, mas não sei se me considero um trekker.
Acho que sou mais um fã...
TB -
Pelo que você viu, o que achou do personagem que está
dublando? Como é o Tom Paris, visto pelo "Tom Paris
Brasileiro"?
Juarez - O Tom é um cara muito simpático,
brincalhão... e sempre faz uma piadinha quando se sente
desconfortável com alguma situação. Ou seja, se der mole, ele
solta uma piada... sacaneando (risos). É difícil dublá-lo,
tento estudar seu rosto, quando o olhar muda, uma sombrancelha
levanta, ele faz aquele riso de canto de boca... é um motivo
pra uma interpretação, uma inflexão diferente. É preciso
ficar muito atento, porque se eu gravar de qualquer jeito, posso
estragar uma dessas piadinhas que falei. Estou adorando fazer o
Tom Paris.
TB -
Conte mais sobre o processo de dublagem. Como funciona esse
trabalho, desde a entrega dos episódios à VTI até o produto
final chegar ao telespectador?
Juarez - Quando o filme chega, ele é
traduzido, em seguida é mandado para o diretor, que fica
responsável pelo esquema de dublagem, ou seja, ele marca o
filme, escolhe os horários em que cada dublador vai gravar,
tudo isso tendo em vista que existe uma verba para fazer esse
filme, e com "essa" verba, ele precisa fechar o
filme... dentro de um prazo que é dado pela empresa onde está
sendo gravado.
TB -
Sabe-se que a Cristina Nastasi, uma das mais célebre trekkers
brasileiras, cuida das traduções dos episódios para a VTI.
Ela já sofreu várias críticas no passado, tanto por erros de
tradução, quanto pela tradução de termos como nomes de naves
e outras coisas. Ela demonstrou alguma preocupação com essas
críticas dos fãs na produção das novas traduções?
Juarez - Olha, a Cristina é uma das pessoas
que mais conhece o universo de Jornada na Estrelas. O
lance da tradução às vezes é levado para um lado pessoal. A
verdade é que, por melhor que seja o tradutor ou dublador,
sempre existirão críticas. Sei que ela se dedica muito ao
trabalho que faz e que tenta fazer o melhor possível. Ela é
apaixonada por Jornada.
TB -
Jornada nas Estrelas é uma série que requer da VTI Rio
um tipo de tradutor diferente: o tradutor
"especializado". Isso é muito comum? Você acha que
é importante que o material de tradução seja feito por alguém
que tenha um conhecimento mais profundo do seriado?
Juarez - Nem sempre uma série ou filme tem um
tradutor "especializado". No caso de Jornada,
fora a Cristina, tem também a Anna Luísa e a Isabel, que também
curtem a série. Mas como já disse, não é uma coisa comum...
TB -
Como é a relação entre os dubladores em um estúdio durante a
gravação? E fora? Há o mesmo tipo de "picuinhas" e
concorrência por determinados papéis que se ouve falar nos estúdios
de televisão, teatro e cinema?
Juarez - Olha, a concorrência sempre vai
existir, em todas as profissões. No caso da dublagem, não
poderia ser diferente. A relação no estúdio é super tranqüila,
ninguém é "estrela".
TB - Como
são escolhidos os papéis de um dublador?
Juarez - Normalmente são feitos testes para os
personagens ou então a emissora indica as vozes que quer.
TB -
O que há de melhor na profissão de dublador?
Juarez - Acho que o fato de, em um único dia,
poder viver vários personagens... e no caso do Johnny Bravo,
colocar um sorriso no rosto de muita gente.
TB -
O que há de pior na profissão?
Juarez - Fora o salário... o fato de sempre
gravar correndo, às pressas. Muitas vezes a qualidade fica
comprometida devido ao ritmo industrial.
TB - Você
costuma ser reconhecido pelo público como a voz deste ou
daquele personagem?
Juarez - É meio difícil... normalmente as
pessoas falam: "Acho que conheço você de algum
lugar..."
TB - Você
(ou alguém do elenco de dublagem) estaria disposto a participar
de uma convenção de Jornada nas Estrelas?
Juarez - Não sei quanto ao resto do elenco,
mas eu adoraria participar de uma convenção.
TB -
Você costuma assistir aos programas que dubla?
Juarez - Sim, sempre que posso. Sou meio chato
com meu próprio trabalho. Sempre que assisto, já fico
imaginando mil maneiras de melhorar... sempre melhorar. Nunca me
dou por satisfeito. Mas quando faço um trabalho, principalmente
quando é uma coisa que gosto, como Jornada nas Estrelas,
me esforço muito para fazer um bom trabalho.
TB
- Alguma mensagem especial aos trekkers brasileiros?
Juarez - Bom, espero que gostem do meu
trabalho, estou fazendo o máximo para deixar o
"Paris" o mais natural possível, sem fugir das
características originais.
TB -
Alguma outra coisa que gostaria de mencionar?
Juarez - See you around the galaxy! Paris out!
Entrevista realizada em duas etapas, em 20 de agosto e 5 de
novembro de 2000, para os sites Voyager Brasil e Trek
Brasilis.
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