Trek
Brasilis - Você é um fã de Jornada desde a
infância. Como é de repente se ver envolvido com o seu seriado
favorito e com os atores que deram vida a esses queridos
personagens?
William Margol - Foi um acaso feliz, para ser
sincero. O trabalho no Sci-Fi veio na hora certa na minha
carreira. Sempre tive interesse em ficção científica, e isso
me ajudou bastante no serviço. Em 1996, o Sci-Fi comprou os
direitos da Série Clássica, e eu desenvolvi a idéia da
Edição Especial junto com o Leonard Nimoy. Realmente, foi uma
grande sorte ter acabado envolvido com tudo isso!
TB -
Durante a produção da Edição Especial, você teve a
oportunidade de trabalhar junto a vários atores de Jornada.
Entre eles estava DeForest Kelley. No entanto, pouco material
dele acabou indo para a tela... como ele estava?
Margol - De estava doente na época. Ele tinha
acabado de passar por uma cirurgia séria um mês atrás e
quando fizemos a entrevista, ele estava magro, frágil e com a
voz ainda mais suave do que seu estilo habitual. Na verdade, ele
nem ia fazer a entrevista, mas Leonard o convenceu de que era
importante para o projeto e importante para o legado de Jornada
nas Estrelas. Não tenho certeza, mas acho que foi sua última
entrevista -- definitivamente foi a sua última entrevista
extensa. Ele foi um dos destaques do projeto para mim, e um que
eu nunca esquecerei. Ele é era um homem doce, gentil e
inteligente e se dava bem com todo mundo.
TB - Ainda
sobre a Edição Especial, houve algum ator ou atriz que não
quis participar do projeto?
Margol - Bem, houve alguns atores convidados
que não quiseram ser entrevistados sobre isso. Você tem que
lembrar: como fãs, ainda os vemos naqueles papéis. Para eles,
foi uma ponta que eles fizeram há 30 anos. Eles preferem ser
lembrados pelo que fizeram desde então. Mas a maioria do
elenco, estrelas convidadas e pessoal da equipe técnica estavam
mais do que felizes em participar.
TB - Quanto
custou para o Sci-Fi Channel produzir a Edição Especial?
Margol - O projeto, incluindo todos os custos
de salários, produção e edição, gastou perto de US$ 1 milhão.
É lamentável que a maior parte do trabalho não tenha ido ao
ar. O projeto foi pego no meio da venda do USA Networks, a
companhia-mãe do Sci-Fi Channel.
TB
- Você trabalhou com as duas maiores lendas da Série
Clássica, William Shatner e Leonard Nimoy, na produção
dos roteiros para a apresentação da Edição Especial.
Como foi a experiência com os dois? Com qual deles é melhor
trabalhar?
Margol - Bem, para ser preciso,
trabalhei com Leonard na preparação dos roteiros para os
trechos dele. Quando eu terminei de pesquisar e escrever os 240
roteiros (3 para cada um dos 80 episódios) para as apresentações
do Leonard, eu achei que não poderia falar mais nada sobre Jornada,
então contratei um amigo para pesquisar e escrever os roteiros
do Shatner. Depois, revisei esses roteiros. A experiência toda
foi maravilhosa. Trocar idéias e pensamentos com eles foi uma
experiência realmente única. Leonard e Bill têm modos
particulares de trabalhar e foi um prazer trabalhar com eles,
cada um a seu modo. Eu não seria capaz de dizer qual foi o
"melhor".
TB -
William Shatner tenta transmitir uma imagem de que ele gosta do
franchise e dos fãs. É essa a impressão que ele passou ao
trabalhar nesse projeto?
Margol - Sim, eu acho que o Bill ainda tem uma
paixão por Jornada, embora eu ache que ele e o resto do
elenco, para todos os efeitos, vêem Jornada pelo que ela
é realmente -- um show de televisão. Eles não a idolatram
como os fãs ou as analisam como especialistas. Bill é o tipo
de ator que vê o que ele precisa fazer, aparece, faz direito e
recebe o pagamento. Ele fez isso pelo nosso projeto. Foi
divertido trabalhar com ele e ele trouxe elementos para o
projeto que eu nunca poderia ter imaginado. Ele também é de
deixar histérico. Ele tem um grande senso de humor e nos deixou
rindo a maior parte do tempo no estúdio.
TB -
Por que a sequência completa com Leonard Nimoy não foi
exibida? Eu sei que você não estava mais no Sci-Fi Channel,
mas você tem alguma idéia?
Margol - Bem, como disse antes, o projeto
estava bem no momento da tomada do USA Networks pelo Barry
Diller, um poderoso da mídia nos EUA. A nova administração
aparentemente não viu o valor que a antiga atribuía ao
projeto. Eu saí um pouco antes, e meu palpite é o de que eles
viram o projeto como "retrô", ou não visionário o
suficiente. Então eles tiraram o programa do ar antes de exibir
todas as apresentações do Nimoy.
TB -
Originalmente, a Edição Especial foi concebida como algo ainda
maior, até com novos efeitos especiais para a série. Quais
eram os planos exatos do projeto? Por que a idéia veio à
superfície?
Margol - Isso não é exatamente a verdade.
Nunca houve planos de refazer os efeitos especiais. Foi uma idéia
sugerida logo no início do projeto como uma possibilidade, mas
nós soubemos desde o comecinho que os custos seriam
proibitivos. Além disso, tínhamos outras preocupações em
fazer algo assim. Estávamos mais preocupados em mostrar a Série
Clássica da melhor maneira possível, com novas cópias
digitais e remixagem de áudio.
TB -
Os novos efeitos foram abandonados só por questões de orçamento?
Margol - Como já disse, eles foram abandonados
no comecinho do processo, principalmente por razões de custo.
TB -
Há uma companhia chamada Digital Stream, que tem um projeto de
refazer os efeitos de Jornada. O Sci-Fi Channel ou a
Paramount tiveram algum contato com esse pessoal na época? Vocês
viram o trabalho deles?
Margol - Não conheço essa companhia. Eu tive
várias conversas com o Gary Hudsel, que trabalha nos efeitos
nas séries atuais de Jornada. Ele trabalhou na recriação
dos efeitos e filme para o episódio "Trials and
Tribble-ations", de DS9. Gary propôs fazer a
mesma coisa com toda a Série Clássica, mas todos sabíamos
que seria muito caro. Não sei se o Gary está envolvido com a
companhia que você mencionou.
TB -
O que você acha de atualizar os efeitos da Série Clássica?
Margol - Acho que é um erro. Uma coisa é
voltar e limpar arranhões, tirar marcas de pó e os problemas
de contorno com fundo azul. Isso, eu vejo como restauração.
Mas se você volta e substitui cenas com novos efeitos, você
está mudando parte do que fez a série especial. A série, como
está agora, é um reflexo da era em que foi produzida. Os
efeitos, as roupas, a maquiagem, as histórias, tudo são reflexões
dos anos 60. Vamos dar um passo além -- você voltaria e
mudaria os roteiros sobre o Vietnã só porque a guerra do Vietnã
já acabou? Você apagaria alguma coisa só porque não está
mais na moda? Que tal assim -- esqueça sobre fazer isso em Jornada.
Vamos olhá-la como uma obra de arte. Você voltaria e mudaria
uma pintura de Picasso só porque hoje em dia há tintas
melhores do que as da época em que ele pintou? Não. Você
poderia limpar a pintura para trazer as cores que Picasso quis
para o quadro originalmente, mas não mudaria as cores ou
pintaria com guache em vez de óleo. Jornada é a mesma
coisa. Limpar, sim. Alterar, não.
TB -
Você acha que a Série Clássica ainda tem chance de
disputar com as novas séries de ficção científica?
Margol - Se você está falando de efeitos
especiais, claro que não. Mas se você está falando sobre o
que realmente importa, história e personagens, eu acho que a Série
Clássica poderia resistir a qualquer coisa que você jogue
em cima dela. Ela tem roteiros inteligentes e convincentes. Tem
personagens com os quais você se preocupa e que são bem
desenvolvidos. Aponte outra história com que as pessoas se
preocupam cerca de 30 anos depois que ela surgiu e acabou.
TB - Por
que você saiu do Sci-Fi Channel?
Margol - Nada além de ter visto uma
oportunidade melhor em outro lugar.
TB -
Você teve problemas com algum ator dizendo: "Se o sr. X
está envolvido, eu não estarei no programa", ou algo
assim?
Margol - Não, ninguém nos deu um ultimato, se
é o que quer dizer. Tivemos que ter cuidado para agendar
entrevistas de modo que pessoas que não exatamente se amavam não
se encontrassem acidentalmente no estúdio.
TB -
Qual dos atores do elenco são os mais entusiasmados com Jornada,
em sua opinião?
Margol - Eu acho que o Leonard ainda tem uma
grande paixão pelo trabalho e pela integridade da Série Clássica
e é muito defensor da série e do personagem Spock. Claro, eu
trabalhei mais com ele do que com os outros, então é difícil
de julgar. Mas eu não acho que nenhum deles tenha algum
entusiasmo ou amor pelas novas séries de Jornada.
TB - Você
é fã das novas séries (Nova Geração, Deep Space
Nine e Voyager)?
Margol - Eu fui um fã da Nova Geração.
Eu tentei DS9 e Voyager, mas eu acho que elas
nunca entregaram a promessa de Jornada nas Estrelas.
Havia muito pouco do "indo onde nenhum homem jamais
esteve". No entanto, DS9 ainda era melhor que Voyager.
Voyager é provavelmente uma das piores encarnações de Jornada
já feitas. É triste. Eles tinham uma grande premissa.
TB - O
que acha do Rick Berman?
Margol - Eu não conheço muito o Rick Berman.
Tive um contato breve com ele durante o planejamento da Edição
Especial. Diria que se eu fosse os executivos da Paramount e
estivesse vendo os decrescentes retornos no franchise, eu iria
primeiro olhar para a pessoa que está liderando. Rick fez um
grande trabalho pegando o batente após a morte de Gene
Roddenberry, mas talvez seja hora de injetar sangue novo em Jornada.
TB -
Você tem um projeto pessoal sobre uma possível série de Jornada,
"Star Trek - Legacy". Não parece um pouco com
"Andromeda", a nova série baseada em anotações de
Roddenberry, escrita por Robert Hewitt Wolfe (ex-DS9)?
Coincidência?
Margol - Desenvolvemos o conceito para
"Legacy" independentemente e sem qualquer conhecimento
do conceito de Gene Roddenberry. Eu não vi nada sobre
Andromeda, então não posso nem dizer quão perto está do
nosso.
TB - O
que você espera da próxima série, atualmente sendo
desenvolvida por Rick Berman e Brannon Braga?
Margol - Alguém me disse uma vez: "Sempre
torça pelo melhor, mas espere pelo pior". O que eu espero?
Infelizmente, mais do que eles já estão fazendo. Pelo que eu
torço? Bem, torço para que eles aproveitem a chance de
realmente colocar Jornada em um novo território, da
forma que fizeram quando A Nova Geração foi criada. Foi
o que tentamos fazer com o nosso conceito "Legacy".
TB -
O que você acha da campanha Excelsior, cujo objetivo é levar o
capitão Sulu para a cadeira de comando em uma série semanal?
Margol -
Acho que é um esforço nobre. Eu desejo que possamos ter
esperança de que a Paramount possa ser influenciada por ele,
mas Jornada é, antes de mais nada, um negócio. As decisões
são feitas com base no dinheiro, não nas vontades e desejos
dos fãs. Pessoalmente, eu não amo a idéia da Excelsior. Eu não
sou partidário da série com o Sulu, porque eu prefiria ver um
conceito novo, com novos personagens.
TB
- Há alguma coisa de Jornada que você gostaria
de fazer e ainda não fez? Alguma que você nunca fará?
Margol - Gostaria de ser chamado para criar a
próxima série! Mas acho que não vai acontecer. No entanto, eu
não me importaria de vender algumas idéias a eles! Falando sério,
estou sempre aberto a novas experiências e não iria descartar
algum futuro envolvimento.
TB -
Você conhece o Brasil? Alguma mensagem pro pessoal daqui?
Margol - Não, não conheço nada do Brasil,
mas não é de propósito! Acho que a única mensagem que
poderia ter é a de que é muito legal ter a chance de falar a
outras pessoas e de que é o apoio no mundo inteiro que manteve Jornada
viva por todos esses anos.
Entrevista realizada em 26 de julho de 2000.
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