Rumo
à Terra Desconhecida
Faz mais de um ano que os fãs têm recebido avisos
--é difícil enxergar a realidade quando há paixão envolvida, e especialmente quando
esta paixão esteve sendo tão fortemente correspondida, ao longo das últimas duas
décadas. Até um dia antes do anúncio, havia gente na internet dizendo que, com
certeza absoluta, Enterprise seria renovada para a quinta temporada. Não
aconteceu. A rede de televisão UPN desistiu da série, sem choro nem vela.
Mais do que isso: a Paramount nem se esforçou por salvá-la
do cancelamento. Diante da insatisfação da UPN, em vez de tentar vender a série
para outra rede, para um canal a cabo ou mesmo para estações locais, no formato
de exibição por syndication, decidiu que era hora de Jornada nas Estrelas
descansar. Minha primeira reação diante
das notícias, admito, foi de tristeza. Justo agora que Enterprise estava
em sua melhor temporada! Havia encontrado sua vocação, os roteiros pareciam inspirados,
os elos com o resto da franquia haviam se fortalecido! Mas o público --não os
fãs, que respondem por um número ínfimo de pessoas diante do total da audiência--
não reagiu às descargas do desfibrilador ao longo do quarto ano. Apesar de uma
ameaça de melhora nos índices Nielsen, no início da temporada, a audiência voltou
a despencar. O coração de Jornada não pulsava mais. "She's dead,
Jim."
Rick Berman, produtor que tem chefiado a franquia
desde a morte do criador Gene Roddenberry (e até antes disso, para dizer a verdade),
também aceitou o fim. Ele escreverá com Brannon Braga o episódio final de Enterprise
e diz que a franquia terá uma parada de pelo menos três anos, antes que
alguma outra coisa volte a ser produzida. O
choque da perda, ao contrário do que possa parecer, frisa toda a força da franquia.
Ao longo das décadas, os fãs se acostumaram a tomar sua dose anual de Jornada
nas Estrelas como garantida. Nos últimos 18 anos, ninguém parou para pensar
que o mercado de televisão nos Estados Unidos é o pior ambiente que a selva de
pedras pôde produzir. Jornada adquiriu uma imunidade que tornou os fãs
insensíveis aos riscos. Mas os riscos sempre estiveram lá. Agora, eles finalmente
nos alcançaram. A força de Jornada
não caiu do céu, como uma bênção divina à obra de Roddenberry e seus sucessores.
Ela veio do poder que a idéia por trás de Jornada nas Estrelas possui.
Falem o que quiserem, mas foi esta a série que inaugurou o gênero da "ficção
científica séria" na televisão. Foi o paradigma de franquia de entretenimento
bem-sucedida. Assim como Kirk disse a Spock, ironicamente, que "todo mundo
era humano", eu não tenho medo de errar ao dizer que "todas as séries
sci-fi por aí são Jornada nas Estrelas". Se não houvesse um programa
chamado "Star Trek", nada de Babylon 5, Crusade, Farscape, Battlestar
Galactica, Stargate SG-1... Rick Berman
disse que a franquia dará uma parada, mas não é a última notícia que ouviremos
dela, "por que, Deus sabe, Jornada nas Estrelas vai voltar".
Eu não duvido nem um pouco das palavras dele. Pela
primeira vez em muitos anos, teremos uma temporada sem episódios inéditos. E sem
nenhuma garantia do que o futuro nos reserva. Nem um filme para esperar, nem uma
nova série sendo planejada... nada. É um momento de refletir e dar uma parada
para aproveitar os sucessos do passado. Cá para nós, estamos no lucro.
Nos últimos 18 anos, Jornada nas Estrelas
teve nada menos que 25 temporadas! Precisamos de sete anos de descanso para começar
a reclamar que a média de temporada televisiva por ano da franquia caiu para menos
de uma! Veja o poder que essa estatística tem! Se acordarmos em 2012 com uma nova
série, teremos mantido a média de uma temporada por ano desde 1986! Talvez seja
hora de apreciarmos com a devida calma tudo que conseguimos, antes de nos desesperarmos
à procura de material novo. E, devagar,
teremos novidades no horizonte. Numa coluna anterior, já mencionei o poder que
os filmes produzidos por fãs terão. Pois bem: aguardem para o segundo semestre
deste ano mais um episódio clássico da série New Voyages, com Kirk, Spock
e McCoy à bordo da Enterprise NCC-1701! Os livros também continuarão por aí, com
aventuras inéditas de todas as encarnações da franquia. E, lentamente, a fome
por novas aventuras de Jornada voltará a crescer no público em geral. Porque
o conceito desta série é INESGOTÁVEL. Com
o fim de Enterprise, fecha-se um capítulo na história da franquia. A partir
de maio, o território a ser explorado é, propriamente dizendo, "a terra desconhecida".
Não devemos temê-la. O espírito de exploração deve prevalecer. Vamos em frente,
meus amigos. Estou certo de que ainda não precisamos dizer adeus.
Até breve é suficiente. |