ENT 1×15: Shuttlepod One

Reed e Tucker em Shuttlepod One

Episódio atípico oferece poderosa tridimensionalidade a Malcolm Reed

Sinopse

Data: 9 de novembro de 2151

Malcolm Reed e Charles Tucker estão em uma cápsula auxiliar, fazendo o reconhecimento de um campo de asteroides. Os sensores sofrem uma pane total, e a missão acaba se tornando inútil. A Enterprise só deve aparecer para buscar a dupla em três dias, e nada resta aos dois senão tentar efetuar os reparos nos sensores e jogar conversa fora.

Tudo muda, entretanto, quando Reed observa alguns destroços na superfície de um dos asteroides maiores. Eles chegam mais perto para tentar fazer alguma identificação visual, quando avistam uma placa entre os pedaços espalhados, com a inscrição “NX-01”. Logo concluem que a Enterprise foi destruída acidentalmente em um choque com um asteroide.

Shuttlepod One - Enterprise

Apenas com os motores de impulso da cápsula auxiliar, não há esperança de chegar a nenhum lugar que possa fornecer socorro. Reed começa a pensar que estão condenados à morte, que deve chegar assim que o ar da nave terminar, em nove dias. Tucker está mais otimista. Os dois têm um atrito quando o engenheiro ordena que Reed, sem sensores, marque um curso até Echo-3, o último satélite de comunicação subespacial que eles deixaram no espaço enquanto a bordo da Enterprise –mesmo que leve anos até que a nave sem propulsão de dobra chegue lá.

Abalado com a perspectiva de sua própria morte, Reed começa a fazer registros frenéticos em seu diário sobre os eventos que antecederam sua morte, para que as informações estivessem disponíveis às próximas gerações. Ele também passa a escrever cartas para seus entes queridos. Trip, que está tentando manter a calma e descansar, fica furioso com a atitude paranoica de Reed e ordena que ele pare –os dois quase saem no tapa.

Reed fazendo o diário em Shuttlepod One

O clima de tensão permanece conforme o tempo vai passando, e só piora após a nave sofrer nova avaria, com múltiplos furos no casco, que estão deixando a atmosfera escapar. Depois que os vazamentos são contidos, sobram apenas dois dias de ar. Diante da cada vez mais próxima perspectiva da morte, os dois começam a romper o clima de hostilidade e decidem beber juntos, depois de reduzirem a temperatura da nave ao máximo para conservar oxigênio.

Durante seus últimos momentos, Reed e Trip descobrem várias coisas um do outro. Por exemplo, eles já tiveram em comum a mesma namorada, Ruby, de San Francisco. Reed revela que considera a tripulação da Enterprise mais próxima dele que sua própria família, e conta que tem uma queda pela subcomandante T’Pol.

Reed em Shuttlepod One

Os dois já aceitam seu destino, quando, do nada, a Enterprise entra em contato. Eles são incapazes de responder, mas recebem a mensagem de Hoshi, indicando novo ponto de reencontro, em dois dias. Infelizmente, eles não têm oxigênio suficiente para esperar até lá.

Em uma atitude de desespero, Trip decide abandonar a nave e morrer, para que Malcolm tivesse mais chance de viver até a chegada da Enterprise, sendo o único ser a respirar a bordo. O oficial de armamentos, entretanto, não aceita o sacrifício do engenheiro, chegando até a ameaçá-lo com uma pistola de fase.

Reed apontando um phaser para Tucker

Por fim, os dois concordam que a única coisa a fazer é ejetar o motor e induzir uma sobrecarga, produzindo uma explosão que talvez chame a atenção da Enterprise, que então aumentaria sua velocidade para resgatá-los. O truque dá certo, e os dois são resgatados, inconscientes.

Na verdade, a Enterprise não havia sido destruída em nenhum momento, mas apenas danificada, após o choque de uma nave tesniana. O impacto arrancou a porta do hangar, que foi justamente o que Reed e Trip viram no asteroide. Os outros destroços eram da nave alienígena, que havia sido irremediavelmente danificada pelo mesmo fenômeno que causou a pane nos sensores e os vazamentos a bordo da Cápsula Auxiliar Um –microssingularidades (buracos negros do tamanho de átomos), um fenômeno nunca antes observado, mas firmemente sustentado por físicos teóricos vulcanos.

Comentários

Para um episódio escrito por Rick Berman e Brannon Braga, “Shuttlepod One” tem várias coisas impressionantes. Primeiro, é fortemente orientado a personagem, uma coisa que a dupla não costuma fazer muito. O enfoque da história, no caso, nem é um personagem do grande trio, mas o até então pouco conhecido tenente Reed.

Tucker até aparece um bocado, mas o drama e as revelações ficam majoritariamente por conta do oficial de armamentos, o grande beneficiado pelo segmento. Temos a chance de descobrir verdadeiramente a personalidade de Malcolm, de forma muito mais intensa do que a mera história secundária de “Silent Enemy” (“o que Malcolm gosta de comer?”).

Ttitle Card Enterprise Shuttlepod One

Vivemos aqui toda a angústia de Reed, sua tristeza, sua introversão, seus sentimentos para com a tripulação da Enterprise e seu lamento por nunca ter se aberto com seus entes queridos. Sem dúvida, estar à beira da morte inspirou o personagem, o que trouxe bons resultados ao episódio.

Claro, nem só de revelações viveu Malcolm. Todo o roteiro foi abrilhantado por uma espetacular atuação de Dominic Keating. Trinneer vai bem, mas Keating sem dúvida garante o centro do palco, não só pela natureza da história em si, mas por sua brilhante interpretação. O momento em que Reed tenta convencer Trip de que ele não está querendo morrer, mas está somente reagindo a tudo que está deixando para trás em sua vida, é bastante tocante.

De um lado mais cômico, mas igualmente interessante, é ver sua paixão enrustida pela subcomandante T’Pol. A frieza e a beleza da vulcana certamente tocam fundo no coração do tímido oficial de armamentos. O jogo entre a cena em que ele sonha ser beijado por T’Pol e a cena final, em que ele e Trip são resgatados e levados à enfermaria, é muito bem feito, um bom uso do desejo dos produtores de tornar a série mais “caliente”.

T'Pol beijando Reed em sonho dele

Aliás, por falar em paixão, é um grande alívio saber que o beijo de T’Pol em Reed (que nem chega a acontecer) não passou de uma fantasia do oficial de armamentos. Um envolvimento emocional por parte de T’Pol tão no início da série simplesmente destruiria toda a credibilidade da personagem.

Mas faltou dizer qual foi a segunda coisa incomum do episódio, por ser de autoria de Rick e Brannon –ele é fortemente inspirado pela Série Clássica!

Pois é, tem gente que acha que esses dois simplesmente não suportam o seriado original, mas a referência a “The Galileo Seven” é muito óbvia para ser mera coincidência. O isolamento na pequena nave, a perspectiva da morte certa e a ejeção do motor (ou do combustível, no episódio clássico) são muita coisa para que acreditemos não haver uma inspiração por trás da história.

Alguém pode reclamar que eles estão fazendo o que sempre fazem –reciclando velhas ideias. Nada estaria sendo mais injusto: o uso dos elementos aqui presta muito mais uma homenagem à Série Clássica do que se apropria de suas glórias. O mérito de “Shuttlepod One” está totalmente calcado em outros elementos (leia-se, o desenvolvimento de Malcolm Reed enquanto personagem tridimensional), e o uso das referências clássicas só serve para conquistar a simpatia da audiência. Boas escolhas, sem dúvida.

Tucker na enfermaria depois de resgatado

O episódio é recheado de diálogos bem escritos e não cansa a audiência, apesar de ser praticamente inteiro filmado em uma claustrofóbica cápsula auxiliar. Em certo momento, há uma pequena sensação de repetição exaustiva, com Reed ditando seus diários e Tucker reclamando, mas felizmente o episódio não chega a empacar e volta a fluir com suavidade, de forma agradável e interessante.

Algumas cenas chegam mesmo a se destacar, como Tucker e Reed, já de porre, comentando os dotes de T’Pol e ainda esvaziando a garrafa, ou a cena de abertura do episódio, com o britânico Reed mostrando uma certa rivalidade para com seus colegas americanos. Um lembrete interessante de que ainda estamos no século 22, e que a humanidade não é tão coesa quanto nos séculos seguintes.

Também devemos agradecer por termos sido poupados de uma anomalia temporal ou algum “braguete” do tipo. O enredo foi conduzido de maneira bem tradicional, o que ajudou o episódio a se manter sólido e se manter dentro da premissa de pré-sequência da série. Outro ponto positivo.

Reed e Tucker bebendo

Na verdade, só há uma coisa que realmente se pode criticar sobre esse episódio: ele de fato não tem história; é 100% interação de personagens. Se isso pode ser uma grande força à primeira vista, não parecerá do mesmo modo depois da terceira vez que alguém o vê. Por não ter uma história particularmente vibrante, logo que a audiência extrai o conteúdo sobre os personagens, não vale a pena revisitá-lo.

De toda forma, esse era o único modo de conceber essa história e foi válido os produtores a executarem. Apesar dos paralelos com “The Galileo Seven”, trata-se essencialmente de uma novidade em Jornada –e das boas.

Avaliação

Citações

“If only Dr. Cochrane had been a European. The Vulcans would’ve been far less reticent to help us. But, no… he had to be from Montana.”
(Se apenas o dr. Cochrane tivesse sido um europeu. Os vulcanos seriam bem menos relutantes em nos ajudar. Mas não… ele tinha de ser de Montana.)
Reed

“Does that sound modulated enough for you?”
“Modulated?”
“The radio. Or is it just the galaxy giggling at us again?”
“It can giggle all it wants, but the galaxy’s not getting any of our bourbon.”
(Isso parece modulado pra você?)
(Modulado?)
(O rádio. Ou é só a galáxia rindo de nós de novo?)
(Pode rir quanto quiser, mas a galáxia não vai ganhar nada do nosso bourbon.)
Reed e Tucker

“She’s got a nice bum.”
(Ela tem um belo traseiro.)
Reed

Trivia

  • Dominic Keating afirmou, à época: “Tem um episódio vindo aí chamado ‘Shuttlepod One’, e é uma de minhas mais empolgantes e memoráveis experiências de atuação, tanto em palco quanto em câmera. É entre mim e Trip, o engenheiro. Achamos que estamos abandonados sozinhos no espaço na Cápsula Auxiliar Um. Você poderia colocar isso em uma peça de fora da Broadway e interpretado como um ‘ato-único’. Rick está muito satisfeito e disse algumas coisas muito elogiosas sobre o episódio ontem.”
  • Não foi fácil filmar o segmento, segundo Keating. “Foi bem duro filmar, porque no episódio nós desligamos o termostato para conservar oxigênio, então a temperatura cai, e eles construíram um iglu para nós no palco oito e colocaram seis aparelhos de ar-condicionado lá com pacotes de gelo seco, e baixaram a temperatura para menos que zero, e fizemos três dias assim. Foi bem duro.”
  • O resultado, para o ator, valeu a pena. “Esse episódio é um dos melhores trabalhos que já fiz, se posso dizer. Estou realmente empolgado para ver como ficou. Acho que fizemos algo bem extraordinário.”
  • Sem atores convidados e filmado totalmente dentro do estúdio, “Shuttlepod One” foi um dos episódios que ajudou a equilibrar o orçamento da série durante a primeira temporada, que esbanjou dinheiro em seus primeiros episódios com efeitos especiais.

Ficha Técnica

Escrito por Rick Berman & Brannon Braga
Dirigido por David Livingston

Exibido em 13 de fevereiro de 2002

Títulos em português: “Cápsula Auxiliar Um”

Elenco

Scott Bakula como Jonathan Archer
Jolene Blalock como T’Pol
John Billingsley como Phlox
Anthony Montgomery como Travis Mayweather
Connor Trinneer como Charlie ‘Trip’ Tucker III
Dominic Keating como Malcolm Reed
Linda Park como Hoshi Sato

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Edição de Mariana Gamberger
Revisão de Susana Alexandria

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