Brannon Braga começou sua carreira na redação em A Nova Geração, no início dos anos 90. Depois passou para produtor executivo das séries Voyager e Enterprise. Ele também co-escreveu dois filmes: Star Trek: Generations e Star Trek: First Contact.
O mais recente trabalho de Braga foi como produtor executivo do longa Books of Blood, uma adaptação da coletânea de histórias clássicas de terror, de Clive Barker. O filme foi lançado em outubro de 2020 pela Hulu.
Aproveitando o tema sobre terror, Braga conversou com o site TrekMovie a respeito das histórias fantasmagóricas que criou para a série A Nova Geração. Em outra parte da conversa, o produtor também falou quanto aos episódios de viagem temporal que escreveu para Voyager e Enterprise, além de um olhar sobre o trabalho de Jeri Ryan em Picard.
Braga sempre se revelou um fã do gênero terror e foi responsável por alguns dos episódios de suspense e terror de Star Trek. Ao TrekMovie, ele conta como foi passar essas histórias para a série A Nova Geração.
Tive muita sorte porque meu primeiro trabalho de escritor foi em um programa que poderia acomodar muitos tipos de histórias. Na verdade, sempre pensei em A Nova Geração como uma espécie de programa de antologia. Você nunca sabia realmente o que estava recebendo todas as semanas. Às vezes, seria uma saga política Klingon. Às vezes, seria uma história pessoal muito íntima. Às vezes, seria uma viagem no tempo. Às vezes, pode ser uma história de terror ou algo alucinante. Estávamos descobrindo muito disso. E o mesmo é verdade para a Série Clássica.
Para que eles pudessem acomodar minhas ideias – e minhas ideias eram um pouco mais tipo Twilight Zone e assustadoras – acho que a primeira coisa que fiz foi uma espécie de abordagem em Invasion of the Body Snatchers (Invasores de Corpos), que se chamava “The Game”, e acabou tudo bem. Eu acho que a partir daí eles pensaram: ‘Se ele pode fazer funcionar …’. A história de loop temporal “Cause and Effect” – que foi para mim, uma história de terror também – foi uma história de terror existencial sobre pessoas presas no mesmo dia. Parecia algo que Rod Serling (criador da série The Twilight Zone) faria. Então, se você puder puxá-lo, mesmo que soe maluco, pode funcionar.
Durante sua passagem em A Nova Geração, Braga não lembra de ter algumas de suas histórias de terror desaprovadas. Mas Michael Piller, Jeri Taylor e Rick Berman sempre ajudavam a moldá-las, a torná-las melhores. Com exemplo, ele cita o episódio que escreveu, “Cause and Effect”, que começou como uma ideia ligeiramente diferente envolvendo pessoas que viviam no mesmo dia, mas vendo o mesmo dia de perspectivas diferentes em uma coisa do tipo Rashomon (Às Portas do Inferno, filme japonês de 1950). No início, pareceu um pouco confuso, mas a equipe de redatores meio que reduziu para algo mais coerente.
Ao comentar sobre o episódio “Gênesis”, o roteirista brincou com a pergunta de quantos tripulantes Worf, transformado em criatura, devorou.
[Risos] Bem, sempre há essa pergunta. Toda vez que há uma batalha espacial, penso nas crianças na escola e outras coisas. Há mil pessoas na nave e suas famílias estão lá. Apenas imagine. Talvez algumas crianças pensem: “Legal, outra batalha espacial!” Mas a maioria delas ficou apavorada. Acho que a única vez que mostramos isso foi quando a nave caiu em Generations e cortamos para algumas famílias. É hora de mostrar o que está acontecendo! Mas quantos o Jurassic Worf comeu? Acho que treze pessoas, talvez. Não me lembro.
Um episódio escrito por Brannon Braga e que ganhou a antipatia dos fãs foi a história de fantasmas “Sub Rosa”. Foi comentado que Jonathan Frakes, que dirigiu o episódio, revelou que não foi seu melhor momento na direção.
No caso de “Sub Rosa”, você nunca se propõe a fazer um episódio ruim. Frakes não deveria estar se culpando. Está na página. Foi outra tentativa de uma peça de terror e uma peça para Beverly Crusher. Às vezes, gostaria de apresentar um personagem como Crusher ou Riker, que nem sempre tem seus próprios episódios. E eu queria fazer uma espécie de vibração Henry James em The Turn of the Screw, e fazer uma história de fantasmas de ficção científica. O episódio de Riker que escrevi “Frame of Mind”, foi uma história alucinante, o que é real / o que não é terror. Um funcionou e outro não por qualquer motivo.
“Sub Rosa” provavelmente parecia cafona e tinha uma vaidade que não era boa. Pelo que me lembro, havia uma colônia emulando a Irlanda ou algo assim. E é como, “O quê?” [risos] Mas, por outro lado, posso imaginar que, se você explorasse suficientemente nossa parte da galáxia, poderia haver coisas assim. Parecia legal na época. Mas há algumas coisas realmente ruins nesse episódio. A pior linha de diálogo que já escrevi está nesse episódio.
Ao ser perguntado a respeito da tal linha de diálogo ruim, Braga respondeu.
Eu teria que olhar de novo, mas a equipe de redação foi impiedosa em tirar sarro de mim sobre essa linha. René Echevarria, em particular, nunca me deixaria esquecer. Era algo sobre o fantasma dizendo a Beverly que ele pode viajar através de algum feixe de energia. [ Nota do editor: A linha é “O feixe de transferência de energia. Posso viajar ao longo dele”]. É simplesmente terrível. É terrível no contexto porque, nesse ponto, a história se desfez tanto que você pensa: “Jesus. O que estamos assistindo?” E é technobabble no seu pior. Você está tentando contar um tipo de história de fantasmas com nuances e aí vem alguma technobabble do fantasma e você fica meio sem entender.
Trabalhando em Voyager e Enterprise
Braga fala sobre o legado de Voyager para a franquia.
Os melhores personagens da série eram mulheres. Uma mulher era a líder. Não era algo para o qual estávamos chamando atenção, era apenas o que Star Trek fazia. E eu diria que Voyager é apenas parte do legado de Star Trek em sua totalidade, até agora. O que quer dizer que é apenas parte do conceito que as equipes eram diversas. Não era uma coisa, era parte do conceito do show de Gene [Roddenberry], começando com a série original. Acho que esse é o legado de Voyager, e acho que é uma parte importante do legado da franquia: a representação da diversidade e igualdade.
Um episódio que Braga considerava especial foi “Year of Hell”, exibido na quarta temporada, onde a tripulação se depara com uma nave temporal Krenim que está eliminando espécies inteiras ao mudar a linha do tempo existente.
Segundo o produtor, o desenvolvimento de “Year of Hell” era para ser um arco abrangente para uma temporada, mas o produtor executivo, na época, Rick Berman abortou a ideia e preferiu que fosse um arco duplo.
Não me lembro dos detalhes de por que isso não aconteceu, mas sei que meu conceito original era fazer “Year of Hell” como uma temporada. E eu sabia que provavelmente não aconteceria, porque na época não havia TV serializada rolando até onde eu sabia. Teria sido mais difícil de distribuir, e Star Trek foi uma peça especial de entretenimento e negócios para a Paramount. Teria sido uma venda difícil. Eu não sei quem disse não. Foi o Rick? Foi Jeri Taylor? Foi o estúdio? Eu não sei.
Para Braga a ideia era de uma história desafiadora e algo absolutamente maluco que a série já tivesse experimentado. Ele trabalhou no roteiro em parceria com Joe Menosky e lembra de ter assistido uma cena comovente do arco que se tornou duplo, com Janeway se despedindo de um Tuvok cego antes de afundar com a nave.
Mas o grande ponto de discussão na sala de roteiristas sobre essa história é que, se durasse uma temporada, no fim tudo terminaria num grande reset. E isso poderia desagradar e muito aos fãs.
Bem, o reset, eu entendo porque muitos fãs não gostaram disso. Mas fazia parte do conceito do vilão. Esse era o objetivo da Voyager. Vamos apagar este ano. Não fui eu dizendo: “Bem, temos que limpar a nave novamente”. Foi construído no DNA do conceito de que este é um ano que eles gostariam de esquecer. Então eu achei legal. E gosto da maneira como termina. E eu gosto da Janeway se sacrificar e afundar com a nave, o que é claro, não poderia acontecer! Há extremos que eu poderia aceitar que eu não poderia ter se o elemento de viagem no tempo não estivesse embutido nisso.
Embora reduzido em duas partes, o conceito temporal de “Year of Hell”, para uma temporada inteira, acabou ressurgindo na terceira temporada de Enterprise com a ajuda de uma série policial.
Eu estava sempre tentando fazer as melhores histórias que podíamos para Enterprise. Eu estava sempre pressionando o que a produção poderia fazer, fosse destruindo a nave ou colocando-a sob gelo e congelando a ponte. Algumas coisas malucas estavam sendo feitas porque eu queria realmente ultrapassar os limites do que era possível, mesmo apenas visualmente.
A série 24 Horas mudou tudo. Quando saiu (em 2001), foi um sucesso. E quando começamos a discutir a terceira temporada de Enterprise no final da segunda temporada, o estúdio sentiu que deveríamos agitar um pouco as coisas. Nosso conceito original da série era um pouco mais ousado. Dito isso, voltei a esse conceito de narrativa serializada. Vamos contar uma história ao longo da terceira temporada. E foi aceito. E eu realmente acredito que temos a série 24 Horas para agradecer. E eu acho que foi uma boa para Enterprise na terceira temporada.
Jeri Ryan em Picard
Braga opina sobre a nova performance de Ryan como Sete de Nove em Picard, num contexto diferente de Voyager.
Bem, eu não vi a série Picard inteira, mas obviamente, fiquei muito curioso. É emocionante ver um personagem ao vivo e estou muito feliz em ver Jeri voltar ao papel. E é divertido. E, obviamente, o personagem que eles estão retratando ainda está muito traumatizada com sua experiência. Eu estava pensando que ela não soa exatamente como Sete para mim, mas, novamente, este é um personagem que passou por muito anos seguintes. Há um pouco de mim que parece possessivo. Mas no final das contas, estou muito feliz que seu personagem continue, e as pessoas estejam interessadas nela. Ela é uma grande personagem, principalmente por causa de Jeri. Jeri trouxe aquela personagem à vida.