Jornada nas Estrelas – O Guia da Saga, da Editora LeYa, está chegando nas livrarias em alguns dias, e o Trek Brasilis foi conversar com os autores do novo livro que promete ser uma das obras de referência mais completas sobre a série já lançadas. Com boa fartura de material inédito para o trekker brasileiro, e um miniguia com os mais de 700 episódios e 13 filmes de cinema da franquia, o livro está em pré-venda na Amazon.com.br aqui, e na Livraria da Travessa aqui. E você pode ler algumas páginas de O Guia da Saga visitando este link do TB, ou ver as primeiras 16 páginas aqui.
A dupla de autores é velha conhecida dos fãs de Star Trek do Brasil. Salvador Nogueira é o criador e um dos editores do Trek Brasilis, e Susana Alexandria atuou durante muitos anos na Frota Estelar Brasil, além de ser tradutora de diversos livros de ficção-científica. Ambos escreveram juntos o Almanaque de Jornada nas Estrelas, grande sucesso editorial lançado em 2009 pela Editora Aleph.
Trek Brasilis – No que esse novo livro difere do Almanaque de Jornada nas Estrelas?
Susana Alexandria – São várias as diferenças, além do formato (este livro é maior do que o Almanaque) e do número de páginas (o livro tem quase 50 páginas a mais que o Almanaque). O novo livro tem mais texto que o Almanaque, mais informação sobre todas as séries e filmes, e um guia de todos os mais de 700 episódios da saga de Star Trek (o Almanaque só trazia guias de episódios da Série Clássica). Em suma, o novo livro é totalmente diferente do Almanaque, é um trabalho mais robusto, mais jornalístico e mais completo.
Salvador Nogueira – Concordo com a Susana, são dois livros inteiramente diferentes, com propostas diferentes. O de 2009 pegou carona numa moda de almanaques que estava rolando naquela época e representou um estilo de texto blocado em pequenos núcleos de conteúdo. Aqui nós temos a oportunidade de contar a história que desde o início pretendíamos contar – a saga da produção de Jornada nas Estrelas, desde sua origem até o ponto atual, já vislumbrando o que está por vir na franquia que completa agora 50 anos.
TB – Você reassistiram todos os episódios e filmes para escrever O Guia da Saga?
Susana Alexandria – Sim! E essa foi a melhor parte (risos). Porém, se nós dois fôssemos rever todos os mais de 700 episódios, não daria tempo de produzir o livro para publicação ainda este ano, em que comemoramos os 50 anos de Jornada. Então, dividimos o trabalho mais ou menos meio a meio, e cada um se concentrou em determinadas séries/filmes para a produção dos capítulos. Aí, sim, cada um reviu TODOS os episódios/filmes dos respectivos capítulos.
Salvador Nogueira – Também tem o seguinte: acho que em nenhum momento deixamos realmente de ver Jornada nas Estrelas. Pelo menos por mim, o que o exercício de escrever o livro me trouxe foi uma abordagem mais sistemática – ver uma temporada inteira, em regime de maratona, e então escrever sobre ela, para só então proceder para a próxima.
TB – O fã brasileiro terá em mãos uma obra que não existe nem lá fora. Como surgiu a ideia de lançar um material tão completo assim nos 50 anos da série?
Susana Alexandria – Na verdade, esse projeto surgiu 10 anos atrás, nos 40 anos de Jornada. Naquela época, porém, a editora achou melhor investir num material mais pop, com textos curtos, humor e muitas imagens, no estilo de um almanaque. Embora o resultado do Almanaque Jornada nas Estrelas tenha nos agradado bastante (e acho que agradou os fãs também, pois as duas tiragens se esgotaram em poucos meses), nossa vontade de realizar um projeto mais robusto permaneceu. Quando surgiu a oportunidade de produzir um livro em homenagem aos 50 anos de Jornada, batemos o pé e conseguimos concretizar nosso sonho. “Jornada nas Estrelas – O Guia da Saga” é um livro que nós, autores, como fãs, gostaríamos de ter.
Salvador Nogueira – E não há dúvida de que foi melhor assim, com essa longa gestação de uma década. Pudemos retomar a proposta original de dez anos atrás, e desta vez ela foi beneficiada não só pela clareza de propósito que já tínhamos desde sempre, mas também pelo próprio aprendizado envolvido na confecção do Almanaque. O livro dos 40 anos era imaginado como uma obra literária sisuda, com poucas ilustrações e muito texto. O Almanaque foi para o extremo oposto – muita figurinha e pouca letrinha. Aqui acredito termos encontrado o equilíbrio ideal, com uma diagramação sedutora, cheia de referências e pequenos “easter eggs” que os fãs vão curtir, muitas fotos e a quantidade de texto que nós desejávamos desde o início. A propósito disso, temos uma dívida de gratidão enorme com a editora LeYa, que nos deixou cometer a loucura de escrever o livro do tamanho que a gente queria!
TB – Com a chegada das séries no Netflix, o lançamento deste novo livro, e os fãs de Star Trek novamente se reagrupando em eventos, podcasts e videocasts, uma nova era para o fandom começa agora no Brasil. Falem um pouco desse momento.
Susana Alexandria – Tem sido uma grata surpresa constatar o surgimento dessa nova geração de fãs. Entre o cancelamento de Enterprise, em 2005, e o lançamento do reboot de J.J. Abrams, o fandom brasileiro ficou “em hibernação” (risos). Com as duas sequências da cinessérie e as comemorações dos 50 anos, é natural que o interesse pela franquia ressurja. Mas o que mais tem empolgado os fãs, na minha opinião, é a nova série de Star Trek para a TV. O fandom sempre foi crucial na história da franquia. Foi a demanda dos fãs que propiciou a própria sobrevivência da Série Clássica. Aqui no Brasil, a atuação dos fãs também tem sido importante. Basta mencionar a pré-estreia do último filme para o cinema, Star Trek Sem Fronteiras, que se realizou graças ao apelo dos fãs.
Salvador Nogueira – É maravilhoso. Dá um senso de gratificação muito grande ver que a “jornada de Jornada”, por assim dizer, continua atravessando gerações com a mesma facilidade com que uma faca corta manteiga, a despeito das inúmeras vezes em que a franquia já foi dada como morta e enterrada. É uma sensação que tivemos também ao escrever o livro e revisitar cada momento em que a saga estava prestes a se encerrar de forma definitiva, apenas para renascer das cinzas no momento seguinte. De certa maneira, o livro celebra até mesmo na capa essa confiança no espírito imortal de Jornada, apostando não só nos capitães clássicos, reconhecíveis, Kirk e Picard, mas incluindo também Sisko, Janeway e Archer. Eles podem ser menos conhecidos do público, mas são parte integrante do fenômeno e estou certo de que, ao ler o livro, você terá vontade de revisitá-los.
TB – Star Trek Discovery promete resgatar o espírito da série original. Sei estão acompanhando as notícias da nova série. Falem um pouco sobre suas expectativas.
Susana Alexandria – Para mim, o espírito na Série Clássica era a visão otimista do futuro. No futuro, o homem terá superado seus problemas de fome, pobreza, racismo etc. e se dedicará a explorar as estrelas, numa missão pacífica. No futuro, não apenas a tecnologia terá evoluído, mas o homem em si terá evoluído. Era este o espírito que o criador de Star Trek, Gene Roddenberry, imprimiu à série – espírito que outros escritores e roteiristas procuraram respeitar (num percurso nem sempre sem atritos, conforme comentamos no livro). Minha expectativa é que esse espírito esteja de volta, especialmente nos dias de hoje, quando o que vemos na TV são muitas séries que enfatizam o lado sombrio do ser humano. Este lado sombrio existe, é claro, mas o outro lado também existe: altruísmo, amizade, honra, caráter e outras qualidade consideradas positivas também são partes constituintes do ser humano. Por que não uma série que ponha o foco nas qualidades, e não nos defeitos humanos? Minha expectativa, então, é ver na nova série de Star Trek essa esperança de que no futuro o homem terá evoluído o bastante para domar o seu lado sombrio e fazer aflorar seu lado “iluminado”.
Salvador Nogueira – Até agora, tudo que eu vi é bastante animador, e tenho muita confiança na equipe montada ao redor do projeto, capitaneada por Bryan Fuller. Nicholas Meyer, Joe Menosky… quem é fã sabe quem são esses caras e o que significa tê-los a bordo. Agora, é verdade que algumas das decisões são extremamente arriscadas: colocar a nova série praticamente na mesma época do show original vai abrir uma caixa de Pandora que às vezes tenho até medo de imaginar. Pode dar muito, muito certo, ou muito, muito errado. Mas estou cautelosamente otimista.
TB – Pra fechar, expliquem como Star Trek influenciou suas vidas.
Susana Alexandria – Comecei a ver a Série Clássica de Star Trek na adolescência, na mesma época em que assistia à série Cosmos, de Carl Sagan, e lia a revista Ciência Ilustrada (Ed. Abril), de divulgação científica. Eram coisas que se complementavam, e fiquei fascinada com aquela série de ficção que mencionava coisas que eu tinha acabado de ver em Cosmos ou na revista de ciência! Era uma série de alto nível, que não subestimava a inteligência do espectador. Desde então, tenho acompanhado todas as séries derivadas e filmes para o cinema. Ainda nos anos 90, passei a contribuir com o fã-clube Frota Estelar Brasil, onde fiz muitos amigos que mantenho até hoje. Minha paixão por Star Trek despertou meu gosto por ficção científica, o que acabou me levando à tradução de livros desse gênero (minha primeira tradução de ficção foi uma série de quatro livros de Star Trek que, infelizmente, acabou não sendo publicada). Enfim, Star Trek sempre teve uma influência positiva na minha vida, seja por meio dos temas abordados nos episódios, que me faziam aprender e refletir, seja nos desdobramentos exteriores, no contato com o fandom.
Salvador Nogueira – Acho que Star Trek, para mim, representa um ideal – é o que eu quero e espero para a humanidade. A ciência de verdade só agora começa a desvendar a real natureza do cosmos e, por incrível que pareça, tudo parece apontar na direção de algo parecido com a ficção científica de Jornada nas Estrelas: um universo cheio de possibilidades e com enorme potencial para vida e para exploração. Isso para mim tem um grande apelo e ao mesmo tempo traz uma grande inspiração. Eu quero ver a humanidade chegar lá, unida, em paz, para explorar todas as incríveis possibilidades que o cosmos oferece. O que posso fazer para ajudar? Não há dúvida de que os ideais expostos na série ajudaram a formar o meu caráter e a iluminar meus caminhos profissionais como jornalista científico. Sem falar no mais importante: ver Star Trek é legal pra caramba! 🙂