Coluna do Alf: “Gênesis II, por Gene Roddenberry”

O Novo Gênesis de Roddenberry

Como estamos próximos do aniversário de 40 anos da estréia de Jornada na telinha, muita gente vai falar a respeito da maior criação de Gene Roddenberry, incluindo aí seus detratores que, evidentemente, não vão deixar passar a data em branco.

 

Brincadeiras à parte, a verdade é que Roddenberry foi um desses criadores da TV que nunca deixou de provocar polêmicas. É impossível negar que muitas das críticas que sofreu , justas ou não, veio do fenômeno que Jornada nas Estrelas acabou se tornando. Talvez seja por isso que muitas de suas idéias, fora do universo ficcional de Jornada, não conseguiram marcar a história da ficção científica televisiva de maneira tão forte como sua mais famosa criação.

Este colunista detesta ser repetitivo. Portanto não irei tratar, pela enésima vez, sobre a influência de Jornada na TV. Creio que Roddenberry foi um criador que poderia ter avançado em suas idéias para a FC moderna além de Jornada se tivesse tido as condições ideais para isso… e um pouco mais de sorte.

Uma prova disso foi o telefilme “Gênesis II”, que Roddenberry lançou em 1973 como um longa-metragem piloto para uma provável série de TV. O filme foi estrelado por Alex Cord e Mariette Hartley. Roddenberry já tinha cerca de 20 roteiros prontos para a nova série mas a rede CBS, que exibiu o filme, não topou encarar esse projeto e preferiu apostar suas fichas na versão televisiva de “O Planeta dos Macacos”. Pois é… foi a tal falta de sorte que falei anteriormente. É como se sua “velha criação” não permitisse que Roddenberry dedicasse sua atenção a um filho mais novo.

Escolhi comentar este filme por duas razões simples. Durante muitos anos “Gênesis II” foi uma atração relativamente corriqueira na programação das TVs no Brasil, primeiro nos “Corujões” e, depois, volta e meia era visto em uma Sessão da Tarde da vida. O canal pago Warner Channel também exibiu muito esse filme numa época em que ainda tinha um sessão de filmes de FC antigos.

A outra razão é que “Gênesis II” era uma boa amostra da FC de Roddenberry que podemos apreciar fora do contexto de Jornada, embora, é claro, seus valores artísticos sejam muito diferentes. “Gênesis II” nos mostra a saga do cientista Dylan Hunt (Alex Cord), que no futuro próximo (1979, no caso trabalhava no “Projeto Ganymede”, cujo objetivo era desenvolver uma tecnologia para manter astronautas em animação suspensa durante viagens espaciais de longa duração. Hunt, como chefe das pesquisas, decidiu ele mesmo testar um dos aparelhos de hibernação. Mas, enquanto os testes eram realizados, um terremoto de forte intensidade acaba soterrando o laboratório onde Hunt e sua equipe se encontravam. No exato instante do terremoto Hunt havia entrado em animação suspensa. Quando ele despertou, descobriu que havia sido resgatado por um grupo de cientistas no ano 2133. Nesse futuro a humanidade havia passado por uma guerra nuclear e o que sobrou da antiga civilização se espalhou pelo planeta em diversas comunidades, com graus diferentes de desenvolvimento, algumas mais avançadas, outras retornaram a um estágio pré-tecnológico de vida.

Hunt havia sido resgatado por um grupo que se auto denominava “Pax”… de Pax Romana. Seus membros eram descendentes de antigos colaboradores da NASA e sua comunidade ficava nas cercanias do local onde outrora era o laboratório de Hunt. Os “Pax” procuram preservar o conhecimento científico da espécie humana. Porém, como não poderia deixar de ser, existe uma ameaça rondando o trabalho dos cientistas da “Pax”. Um grupo de mutantes, vivendo numa área entre o Arizona e o Novo México, quer destruir seus inimigos e impor seu regime totalitário às outras comunidades. Graças aos colaboradores que possuem entre os Pax, os Tiranos (como são conhecidos esses mutantes) descobrem sobre Hunt e tentam persuadi-lo a trabalhar para eles, contando mentiras sobre os Pax. Porém, Hunt descobre o verdadeiro plano dos mutantes e consegue evitar que a Pax seja destruída.

Nessa história aparentemente simples podemos ver que uma das características básicas da ficção científica de Roddenberry está presente: seu forte caráter humanista. Embora histórias sobre um possível futuro pós-holocausto nuclear fossem corriqueiras na FC dos anos 60/70, Roddenberry procurava contá-las de uma maneira onde o pessimismo era substituído pelo desejo do ser humano de superar obstáculos. Encarando desse modo não deixa de ser uma ironia que “Gênesis II” não tenha vingado como série por causa de “O Planeta dos Macacos“, justamente uma história onde os humanos não apenas passaram por uma guerra nuclear mas também perderam seu status de raça dominante do planeta.

“Genesis II” não tinha uma produção espetacular e seus efeitos especiais eram modestos mesmo para os padrões da época em que foi feito. Suas virtudes estão mais na história curiosa que conta. E para não perder o hábito tio Gene conseguiu imprimir seu humanismo transformando Dylan Hunt em um membro valioso para os cientistas da Pax pois, afinal, ele era o representante vivo de um passado cujo o “lado bom”, segundo os membros da Pax, valia a pena ser recuperado.

Eu sei… nessa altura da coluna vocês já devem estar mordendo as costas de curiosidade sobre o nome Dylan Hunt ter sido usado neste filme. Acontece que, como “Genesis II” não vingou com série de TV, Roddenberry acabou reaproveitando o nome “Dylan Hunt” em outro projeto seu, a série “Andrômeda” que, como sabemos, só foi produzida após a morte de Roddenberry. Curiosamente, assim como seu xará em “Gênesis II”, o capitão Dylan Hunt da astronave Andrômeda também foi colocado acidentalmente em um estado de animação suspensa.

Falar um pouco sobre “Gênesis II” foi a maneira singela deste colunista de lembrar, de uma forma diferente, os quarenta anos de Jornada nas Estrelas, afinal, ambos podem se orgulhar de seu velho pai, cujas cinzas hoje vagueiam pelas estrelas, esperando, um dia, ter a humanidade como companhia em sua eterna jornada.

Alfonso Moscato escreve com exclusividade para o TB