Coluna do Alf: Balanço de 2006 na ficção científica


O futuro é agora!

Como já é hábito, começamos a fazer o balanço do ano que passou e com esta coluna não poderia ser diferente, principalmente porque este ano de 2006 marcou os quarenta anos do surgimento da cultura trek na FC produzida para a TV. Mas, apesar desse e outros feitos a serem comemorados, 2006 foi um ano um pouco mais complicado para a ficção científica televisiva, começando exatamente por Jornada nas Estrelas, duramente atingida pelo cancelamento de Enterprise, a única série de Jornada, produzida depois da série clássica, que não conseguiu completar sete temporadas.

Apesar da franquia anunciar um futuro filme para a telona, o cancelamento de Enterprise provocou efeitos que ainda serão sentidos por muito tempo no universo criativo de Jornada nas Estrelas. Muito se discutiu sobre as razões que levaram Enterprise ao cancelamento precoce. Talvez a razão principal para esse desfecho melancólico seja a já longa permanência de Rick Berman e Brannon Braga na condução dos rumos de Jornada nas Estrelas.

E a prova maior disso pode ser o fracasso do recente projeto de Braga, “Threshold”, ironicamente nome também de um dos episódios mais detestáveis de Voyager. Parece que Berman e Braga ficaram definitivamente com os respectivos nomes irremediavelmente sujos na FC da telinha. A impressão fica maior depois da péssima repercussão que o episódio final de Enterprise teve entre os fãs de Jornada e FC em geral.

Já fora do universo de Jornada, a FC da TV seguiu caminhos bastante diversos, mas este colunista pode afirmar com certa segurança que “Battlestar Galáctica” e “The 4400” são duas séries que já podem ser consideradas as mais influentes dentro da FC televisiva desde o surgimento de “Arquivo X”, nos anos 90. Em termos qualitativos isso já está mais que evidenciado, mas essas duas séries ainda não romperam “os limites do público de FC” como “Arquivo X” conseguiu fazer. É mais provável que “The 4400” tenha condições de “romper o limite” e conquistar um público maior já que seu formato e sua estrutura dramática lembram muito a criação dd Chris Carter.

O problema de “The 4400” é que os principais protagonistas da série não têm o mesmo carisma de Fox Mulder e Dana Scully, mas os bons roteiros ajudam a série a superar esse entrave, contando uma história cheia de reviravoltas e bem engendrada que consegue fazer a série escapar da armadilha do “4400 da semana”, coisa que rondou perigosamente a série em alguns episódios de sua primeira temporada.

Junto com “The 4400”, a aclamada “Battlestar Galactica” conseguiu revigorar a tradição da space opera adicionando uma forte dose de carga dramática na história que conta. Mas este colunista está cada vez mais convencido que a “matrix” da série de Ronald D. Moore sempre foi “Space Above And Bayond”, série criada nos anos 90, por uma estranha coincidência, por dois ex-membros da equipe criativa de “Arquivo X”, Glen Morgan e James Wong. As duas séries praticamente abordam o mesmo tema mas com tratamento e nuances diferentes, claro. Na prática, o que restou da “Battlestar Galáctica” de Glen A.Larson, na versão de Moore, foram mesmo apenas o nome da série, da nave e de alguns de seus personagens. Todo o resto é quase como um eco da série criada por Morgan e Wong, mas com tintas bem mais “carregadas”, digamos assim.

O ano de 2006 também deixou algumas boas idéias pelo caminho. Para mim, pelo menos, o maior desapontamento foi o cancelamento de “Surface”, o único projeto de FC marinha a aparecer na TV depois de “Seaquest’ sair do ar uma década atrás. “Surface” mostrou um bom potencial, com sua única primeira temporada contando uma história curiosa e com efeitos especiais na medida certa. Mas a série sofreu algumas criticas por ter certas características “spielberguianas” que acabaram irritando alguns fãs desse gênero de FC, geralmente muito tradicionalistas. A FC marinha não consegue se livrar da idéia de cientistas dentro de sublabs ou submarinos nucleares high-tech, o que torna difícil fazer algo diferente em torno dela. É pena, mas “Surface”, apesar do bom desempenho, não conseguiu trazer a FC marinha de volta para a TV.

Também vimos a confirmação do fim de “Stargate SG1”, depois de 10 temporadas e de ter se tornado a série de FC há mais tempo no ar na TV americana. O sucesso de “Stargate SG1” é inquestionável e sua popularidade é grande o suficiente para garantir um futuro promissor para sua spin-off, “Stargate Atlantis”, já em sua terceira temporada. Parece que uma nova franquia de FC está nascendo… mas espero que não cometa os erros que Jornada nas Estrelas cometeu ao longo de seus quarentas anos de existência.

O ano terminou com o anúncio da chegada do Sci-Fi Channel na América Latina. Sem dúvida uma grande notícia mas, como diz a velha frase, só vendo para acreditar. Como sabemos, trata-se de um canal a cabo voltado exclusivamente para a FC e que hoje é um dos canais fechados mais vistos nos EUA. Desde os anos 90, quando teve sua programação parcialmente exibida por aqui no antigo USA Channel, a chegada do Sci-Fi Channel é aguardada pelos fãs de séries e filmes de FC por essas bandas, mas a notícia parece ser para valer desta vez.

Vendo como foi este ano, podemos dizer que em 2007 a FC televisiva vai girar em torno basicamente dos projetos que o Sci-Fi Channel for soltando no ar. Um desses projetos que talvez agite o público é “The Lost Room”, cujos trailers já disponíveis no site da emissora ao menos mostram que esta será uma das produções mais inusitadas. “The Lost Room”, claro, é apenas uma das muitas idéias que andam rondando a FC feita para a TV que, quarenta anos depois da estréia de Jornada nas Estrelas, pode se orgulhar de hoje ser um dos poucos gêneros a ter um canal de TV exclusivamente voltado para suas criações e seu público, algo impensável na época em que Kirk e sua tripulação iniciaram sua jornada indo onde nenhuma série de TV, de ficção científica ou não, jamais esteve.

Vamos torcer para que, em dezembro de 2007, estejamos comemorando por aqui o êxito do Sci-Fi Channel na América Latina e, mais especificamente, no Brasil. Esse sucesso poderia ser coroado com um interesse maior pela FC na TV aberta brasileira… mas um passo por vez. Por enquanto todos os sonhos que a FC televisiva já foi capaz de produzir, demonstrando seu potencial e sua popularidade, vão chegando até nós apesar de todos os preconceitos que ainda sofre por aqui. Portanto, ser otimista em relação ao futuro da FC na telinha está longe de ser um exagero… e otimismo é uma das marcas da ficção científica em geral, sem esquecer que o pessimismo é apenas o ponto de equilíbrio do otimismo, como a ficção científica sempre demonstrou em várias de suas criações.

A jornada nunca vai terminar, felizmente.

Alfonso Moscato escreve com exclusividade para o TB