A saga de Grace Lee Whitney é ao mesmo tempo uma lição de advertência e de renascimento para a vida. A bela Whitney, interpretou a ordenança Janice Yeoman Rand, em oito episódios da série original, antes de ser retirada da série e escorregar em um abismo de drogas e álcool. Finalmente conseguiu ajuda, recuperou sua vida e carreira. Ela falou ao Star Trek.com sobre seu trabalho em Jornada, sua autobiografia e as convenções. Hoje ela está com 81 anos.
Vamos percorrer todo o caminho de volta. Quando criança, o que você queria ser?
“Uma atriz.”
Você começou como cantora, trabalhando profissionalmente aos 14 anos. O que você lembra daquele período?
“Eu era uma adolescente e comecei na (rádio) WJR em Detroit, Michigan. Lembro-me do teste. Eu me lembro da emoção da adrenalina quando estava com o microfone na mão. Eu sabia que era o lugar certo. Eu estava cantando com uma banda na escola, mas esta foi a primeira vez que nada foi gravado. Eu peguei o trabalho imediatamente e trabalhei com um coro da cappela. Eles disseram que eu poderia cantar em todas as diferentes partes, e assim, se eles quisessem que eu cantasse soprano, eu faria isso. Se eles quisessem que eu a cantasse alto, eu faria. Em seguida, tenor, e tudo mais. Eu poderia preencher um monte de coisas, e é por isso que eu comecei o trabalho. Mais tarde, trabalhei em uma pequena banda em Chicago chamada PreVue. Estava em um trio, e o trio foi a minha primeira vez em um palco, e foi maravilhoso. Eu trabalhei lá por talvez um ano e depois fui onde estavam procurando uma cantora para abrir um show para Billie Holliday. E comecei o trabalho. Foi uma experiência e tanto.”
Ao longo do caminho, você também começou a interpretar. Foi difícil ou fácil os trabalhos virem para você? E quais são os projetos que considera favoritos, antes e depois de Jornada?
“Eu trabalhei muito duro. Comecei em shows na Broadway. Meu primeiro show na Broadway foi Top Banana, com Phil Silvers. Eu também estava na versão do filme. Fiz Lucy Brown, em Three Penny Opera, e eu tinha que pintar o meu cabelo de escuro e ganhar 20 quilos para isso. Quando cheguei no palco na abertura do show minha mãe não me reconheceu. Isso é o quanto eu tinha mudado para esse papel. Fui, então, para Hollywood e fiz Peter Gunn e tive um papel com Marilyn Monroe, Jack Lemmon e Tony Curtis em Billy Wilder’s Some Like It Hot. Eu fiz um episódio de The Outer Limits (“Experimento Controlado”) que me deixou muito orgulhosa. Eu fiz um monte de séries westerns, como o Death Valley Days e Bonanza. Eu estava no piloto de The Rifleman e fiz um episódio de A Feiticeira, que eu amava, e fiz o piloto de Police Story, com Gene Roddenberry, que é como eu cheguei a Jornada. DeForest Kelley estava no piloto também.”
Indo para Jornada, o que a intrigou mais a respeito de Janice Rand?
“Era para eu ser inocente, dedicada, excelente em meus motivos para querer estar na Enterprise, mas muito verde, sem experiência. Rand estava disposta a aprender a ser uma secretária com o capitão, a quem, naturalmente, imediatamente teve uma queda. Mas, era amor não correspondido, como Kitty e Matt em Gunsmoke. Não poderia ser consumado. Tinha que ser o amor de longe, um amor não correspondido entre o capitão e eu.”
Você, na época, acha que poderia ir a qualquer lugar como uma história?
“Bem, foi apresentado a mim que a nave era “the wagon train” (alusão a caravana de pioneiros) e que todos nós a bordo da nave iríamos ter essas experiências lá fora no espaço. Houve uma cena que Shatner e eu fizemos – e eu me lembro quando isso aconteceu – que assustou os produtores, porque eles disseram: – “Eles estão chegando perto demais. Isso está ficando muito quente. Temos que removê-la, porque vai dar a impressão de que ele a está traindo quando se apaixona por outras mulheres em outros planetas”. Então, se ela está esperando por ele na nave e ele está lá fora, enganando, Yeoman Rand seria a parte simpática e ele pareceria um cafajeste. Então eles disseram: – “Por que não simplesmente removemos a Yeoman”. Evidentemente, isso foi nos bastidores.”
Agora, não havia muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Eles não estavam fazendo muito mais com o personagem. Você vinha lutando há anos com o álcool. E, você escreveu no seu livro, The Longest Trek, que tinha sido agredida sexualmente por alguém envolvido com a produção, a quem você nunca revelou o nome. Isso não foi exatamente uma receita para a longevidade na série …
“Oh meu Deus. Bem, eu tive a violência sexual de alguém da Desilu, que eu descobri mais tarde era feito por um grande número de produtores (naquela época). Foi antes que a lei de violência sexual viesse a existir. Eu fui uma das vítimas. Fui demitida da série, mas eu descobri mais tarde que isso estava em preparação antes do assédio. Eu estava culpando o assédio pela maioria dos erros da minha vida, até aproximadamente 30 anos atrás, quando eu fiquei sóbria. Quando fiquei sóbria, eu tive que ir para a Paramount e fazer um monte de reparações e falar com um monte de gente, incluindo Gene Roddenberry. Eu tive que fazer as pazes com eles por causa da bebida. Eu não bebi muito (durante a série). Realmente, eu não fiz isso. Mas eu fiz isso (as pazes), porque eu precisava ficar sóbria e eu precisava para voltar a suas boas graças. E, claro, puseram-me em tudo depois que eu fui lá. Eu estava no cinema e na Voyager e Jornada estava de volta na minha vida.”
Para os nossos leitores que podem não ter lido a sua autobiografia, The Longest Trek: My Tour of the Galaxy, por favor nos leve até o que aconteceu depois que você saiu de Jornada.
“Bem, fora de Jornada houve um trauma emocional quando me foi dito, quando eu tinha sete anos, que eu era adotada e que meus pais não eram meus pais. Eu disse: – “Bem, quem são eles?” Eles disseram: – “Nós não sabemos quem são seus pais. Sabemos que sua mãe nos deu para adoção porque seu pai não iria se casar com ela”. E assim eu sentia rejeição a partir do momento que eu tinha sete anos, quando minha mãe adotiva me sentou no colo e me disse que eu era adotada. Ela pensou que estava fazendo a coisa certa. Mais tarde, um psiquiatra me disse que ela (realmente) me deixou à deriva. O que aconteceu a partir dos sete anos de idade até a chegada de Jornada, eu fui capaz de seguir em frente. Mas depois de ser rejeitada em Jornada e sendo jogada fora da série, me desliguei. Claro, essa foi a minha percepção. Foi assim que eu olhei para isso. E a minha percepção não estava correta. Eu estava fora por causa da série, por causa do personagem, não por minha causa. Comecei a beber muito depois disso. Eu costumava ir para um monte de aconselhamentos, e os conselheiros tentavam me fazer uma distinção entre o caráter de Janice Rand e de Grace Lee Whitney, e eu não conseguia fazê-lo. Eu não podia deixar de ser Janice Rand. Foi Grace Lee Whitney, que foi demitida. Janice Rand era apenas o personagem. Era eu de quem não gostavam. Eles me expulsaram. Blá, blá, blá.”
“E eu quase me matei após a rejeição. E quando eu ia nas entrevistas, gostava do cheiro de álcool. Fiquei muito Lindsay Lohan-ish, muito Charlie Sheen. Eu estava perdida. Eu estava perdida e comecei ir para o fundo. Levei cerca de 10 anos para recuperar os meus sentidos, quando eu estava no fundo do poço. E fundo do poço significa que eu estava doente e cansada de estar doente e tive de pedir ajuda. Muitos atores utilizavam as anfetaminas do Dr. Feelgood para ficarem magros. É insidioso. Uma vez que você entra para beber e usar droga, é quase impossível sair sem a graça de Deus, a quem eu dou o crédito. Leonard Nimoy (que também foi um alcoólatra em recuperação) ficou tão emocionado que ele (mais tarde) escreveu na frente do meu livro. Mas foi assim que eu comecei a minha recuperação e minha caminhada de volta ao estúdio para fazer as pazes, para fazer tudo o que eu tinha que fazer lá.”
Quem foi que disse realmente para você, “Grace, nós gostaríamos de recebê-la de volta à Jornada”?
“Gene Roddenberry. Eu tinha me desculpado com ele e ele por sua vez, disse-me: “Grace, eu nunca cometi um erro tão grande na minha vida, como esse de permitir que a NBC e Paramount afastassem você. Se eu tivesse visto meu caminho mais claro, eu poderia ter ficado com você a bordo. Você seria a única pessoa que, realmente, conhecia a história dentro do capitão Kirk, e você poderia ter sido aquela esperando por ele quando ele voltasse das escapadas. Teríamos um enfoque totalmente novo para a série e para o personagem”. Isso é o que ele me disse. Ele disse: – “Eu vou colocar você na série seguinte”, o que naturalmente acabou por estar em Star Trek I: The Motion Picture. Eu vim para o filme e, em seguida, fui em todos os filmes, exceto II e V.”
Quais os filmes que você mais gostou?
“Oh, o IV e o VI, mas eu também gostei do III. Leonard dirigiu o III e eu nunca tinha trabalhado com ele como diretor. E foi muito divertido vê-lo em cima de uma escada, dirigindo as gravações. Ele não se parecia com Spock. Ele parecia Leonard. E eu sempre acabava em gargalhadas. Eu olhava para ele e simplesmente não podia acreditar que ele estava nos dirigindo. Tivemos muita diversão nessa produção. E eu amei fazer os filmes, porque, naturalmente, eu estava limpa e sóbria.”
Alguns anos mais tarde você se reuniu com George Takei para o episódio de Voyager “Flashback”, que foi parte da celebração do 30 º aniversário de Jornada. O que você lembra dessa experiência?
“Foi uma história de Tuvok. Foi apenas um belo episódio. Kate (Mulgrew) foi incrível e Tim (Russ) me disse que me amava quando era criança, e aqui nós estávamos trabalhando juntos. Foi muito bom. Eles nos disseram que era um piloto para uma mini-série (sobre a Excelsior). Eu disse: – “Por que vocês não fazem essa série e nos tragam a cada três meses, em um episódio? Nós poderíamos trazer todas as pessoas, uma de cada vez, a partir da série original?”. Mas eles não conseguiram número suficiente de pessoas para apoiá-los.”
E uma década depois você fez Rand duas últimas vezes, em filmes de fãs World Enough and Time (Phase II) e depois na produção independente Of Gods And Men. Círculo completo. Como foi isso para você?
“Eram muito divertidos. Estava voltando às minhas raízes. Foi como voltar atrás com o uniforme. Estava voltando para o começo de tudo aquilo. Foi um déjà vu, muito déjà vu. Foi assustador, porque eu não sei se poderia lembrar as minhas falas. Eu estava afastada de atuar por um tempo, e você tem que continuar praticando e lembrando linhas e linhas. Então você não pode simplesmente parar e, de repente, ir para algo anos mais tarde e achar que vai ser tão bom quando você estava praticando. Então foi difícil para mim, mas eu gostei. Eu gostava de estar com todos. Tim dirigiu (Of Gods And Men). Foi de fãs para fãs.”
Vamos terminar a conversa falando sobre o que você está fazendo estes dias.
“Eu moro na Califórnia, em um terreno de 30 hectares perto de Yosemite National Park, com um riacho. É simplesmente lindo. Eu continuo a participar de convenções. Vou estar em Nova Jersey, em junho, e então eu vou a Vegas em agosto, e eu vou até Portland, no final de agosto. Eu continuo indo. Perguntaram-me se estava tudo bem comigo, se uma das minhas aparições foi gravada para DVD, e eu disse: – “Sim”, porque eu quero que as pessoas ouçam a minha história. Eu me dedico a ajudar as pessoas a não beber e a não usar dorga e não morrer. Então, eu me sinto completamente preenchida. Eu tenho dois filhos – Jonathan e Scott, ambos estavam no episódio “Miri”, roubando os comunicadores, Scott estava no filme, também – e Jonathan, construiu uma casa no final da minha propriedade, onde ele vive com a sua família, incluindo meus netos. Eles vão cuidar de mim quando eu passar a vida na minha casa no céu. Mas agora eu levo meus netos para a escola, e eu estou dando o máximo para eles. Eu também faço dança uma noite por semana e vou ao ginásio três vezes por semana. Por isso, minha vida é feliz, alegre, livre, sóbria e salva, e muito divertida, também.”