A série animada Star Trek: Prodigy estreou com a promessa de levar a franquia ao público infantil. Em parceria com a Nickelodeon, a Paramount entregou não apenas uma excelente porta de entrada para novos fãs, como uma aventura poderosa, capaz de mobilizar os mais céticos fãs da velha guarda.
O Trek Brasilis conversou com Aaron J. Waltke, produtor de Prodigy, sobre os bastidores da série e o que esperar dos próximos episódios da 1ª temporada, que estreiam ainda este ano. Confira:
Trek Brasilis: Você é claramente um grande fã de Star Trek. É possível notar isso no Twitter, quando você publica algumas dicas e easter eggs dos episódios de Prodigy. Como é o equilíbrio entre os fãs e os não-fãs na sala de roteiristas da série?
Aaron J. Waltke: Você está absolutamente certo que eu sou um grande fã de Star Trek. Faz parte da minha vida praticamente desde que estou vivo. Literalmente, uma das minhas primeiras memórias é estar sentado no sofá com meu pai e assistir à estreia de A Nova Geração, em setembro de 1987, e eu nunca deixei de ser fã desde então.
Em relação à composição da sala de roteiristas… Todos são fãs de Star Trek em algum nível. Eu diria que provavelmente metade são fãs hardcore, como eu, e a outra metade é composta por pessoas que têm seus Star Treks favoritos. Eles talvez amem muito A Nova Geração, a Série Clássica, mas talvez eles não tenham visto todos os episódios de Enterprise, por exemplo. É como em escalas.
E eu acho que isso é importante porque às vezes eu e outros fãs hardcore mergulhamos como em uma toca de coelho, ficamos pensando como compensadores Heisenberg funcionam, e outros roteiristas reagem com um “wow, wow, mas como podemos introduzir isso para novas audiências?”. Então, é realmente muito bom ter esses contrapesos, especialmente para Prodigy.
Desde o começo, nós tínhamos uma diretriz para fazer da série um ponto de entrada para públicos novos e jovens, mas que também contemplasse os fãs antigos de Star Trek. Foi de muita ajuda ter diferentes perspectivas, com certeza.
TB: Você mencionou algo que eu ia te perguntar. A base da série. Como ela foi estabelecida. Como os irmãos Hageman se aproximaram de você para que você se juntasse a eles nessa jornada nas estrelas?
AJW: É engraçado porque eu venho trabalhando com os Hageman por quase uma década. Nós somos amigos e colegas, e confiamos uns nos outros quando o assunto é storytelling. Mas no embrião da série, nós estávamos trabalhando na Dreamworks Animation, tínhamos escritórios lá durante a produção executiva da série Magos: Contos de Arcadia e antes também, durante o trabalho em Caçadores de Trolls: Contos de Arcadia.
Os escritórios dele eram próximos ao meu. Eles estavam escrevendo o filme Caçadores de Trolls: A Ascensão dos Titãs e nós estávamos trabalhando juntos nesse projeto. Eu me lembro que um dia em 2018, eu acredito, os Hageman apareceram dizendo “Ei, nós acabamos de sair de uma reunião incrível com a Secret Hideout e eles parecem muito interessados em fazer uma série animada de Star Trek para jovens. Eles ficaram especificamente interessados no que estamos fazendo em Contos de Arcadia e sabemos que você é um grande fã de Star Trek.”
Então, algumas semanas depois eles me pediram para desenvolver um pitch e apareciam no meu escritório de vez em quando. Eles chegavam com ideias como “Olha, nós sentimos que deve haver uma presença da Frota Estelar na nave” e eu respondia com “E se esse personagem fosse um holograma?” (risos). Era uma troca amigável, eram colegas meio que cuspindo ideias aqui e ali. Eles levaram a ideia para a Secret Hideout e eles amaram.
Um pouco depois, houve uma festa de Natal ou algo do tipo onde Alex Kurtzman e os cabeças da Secret Hideout se encontraram com a Nickelodeon e mencionaram o interesse em uma parceria para produzir um novo Star Trek com os criadores de Caçadores de Trolls e Contos de Arcadia. Eles responderam “Oh, você quer fazer um Star Trek com os criadores de Contos de Arcadia? Ok, você tem uma série!” (risos).
Os Hageman vieram até mim dizendo “Você se lembra daquele projeto de Star Trek que estávamos falando? Vamos fazer”. Eles queriam logo um protótipo na época porque a Nickelodeon estava tão animada com a ideia e eles estavam tão ansiosos com Brian Robbins [presidente da Nickelodeon] tomando as rédeas e impulsionando a empresa a direções novas e audaciosas. E esse parecia exatamente o tipo de projeto que eles estavam interessados.
Eles pediram para desenvolver um episódio piloto baseado no conceito, nós os ajudamos nisso, e a série foi aprovada muito rapidamente. Os Hageman às vezes fazem piadas sobre eu ser o funcionário número 1 deles porque eu estava lá basicamente desde o início, antes mesmo de ser uma série, tendo conversas amigáveis.
Em minha perspectiva, como um fã de Star Trek, eu logo assinei para ser escritor e produtor de Prodigy enquanto eu estava finalizando Contos de Arcadia e então, uma vez que estávamos entrando na temporada 2, eles me convidaram para ser co-produtor executivo e roteirista-chefe. E eu aceitei!
TB: Prodigy está tentando se integrar ao cânone de Star Trek. Ao contrário de Lower Decks, que está fugindo de eventos como a supernova romulana e os flashbacks de Picard, vocês não estão fazendo isso. Podemos esperar que Prodigy nos dê mais detalhes desse período?
AJW: A resposta curta é sim. Os Hageman e eu estamos bem certos de que queremos preencher as lacunas de meados dos anos 2380 e além. Dependendo do quão longe a série for, podemos explorar 20 anos que estão completamente intocados na história de Star Trek.
Quando eu estava crescendo, Voyager terminou e eu fiquei me perguntando “mas… o que vem em seguida?!” (risos). Nós tivemos Nêmesis, mas era uma história bem contida em si. E então tivemos um pequeno vislumbre em Star Trek (2009). Mas além disso, é um grande quadro em branco. Acredito que Picard também contribui um pouco, mas é como se dissessem “esses anos estão antes de nós e então é isso o que fazemos agora em consequência do passado”.
Eu sempre fiquei muito ansioso para explorar [essa época]. 17 anos é um tempo longo. Há diversos personagens que estão em seu auge, ou ao menos estão em destaque naqueles anos como foi Kirk nos filmes da Série Clássica, como em A Ira de Khan, do tipo “sim, eu tive minhas aventuras, mas qual a próxima fase da minha vida e das minhas aventuras?”. E acho que é onde estamos para diversos personagens do século 24. Estou muito animado em continuar explorando isso.
TB: Vamos então falar sobre os personagens principais de Prodigy. Essa é uma pergunta difícil, mas… Tem algum que você gosta mais de escrever? E o quão claro você ouve as vozes deles na sua cabeça ao escrever?
AJW: Pode parecer manjado, mas é a verdade: eu não tenho um favorito porque há componentes diferentes de mim em cada um deles. Então, não é necessariamente difícil porque, uma vez que você conhece o ritmo dos personagens, ouvir suas vozes… Jankom é o “do contra”, Dal é o impulsivo, Gwyn é a determinada, Rok-tahk é a prodígio incompreendida. Eles têm funções bem específicas que funcionam para cada um deles.
Nós queríamos especificamente arquétipos de personagens que poderiam preencher os espaços um do outro. As fraquezas de um poderiam se tornar as forças do outro. Então, enquanto eles forem próximos para mim, eu consigo me sentir um pouco de cada um em tempos diferentes. Eu diria que, pensando no que passamos nos últimos anos, eu simpatizo muito com a Gwyn por conta dos receios em relação ao mundo lá fora. Eu também me sinto como Zero e Rok-tahk às vezes, Zero por gostar muito de coisas que podem facilmente dar errado, Rok pela curiosidade e pela crença no melhor nas pessoas.
E, ok, eu vou dizer o personagem que eu mais gosto de escrever. Talvez seja trapaça, mas a minha favorita é a capitã Janeway. Estabelecemos a Janeway holograma como uma personagem por si só, como uma figura mais materna, conselheira, onde sua função principal é instruir e ajudar. Mas conseguimos fazê-la evoluir e tornar a personagem mais tridimensional e isso tem sido muito divertido de explorar.
Do outro lado, nós vimos no último episódio [1×10] a própria Janeway e também Chakotay, como uma espécie de “pós-guerra”, uma era de prata, para eles. Eles tiveram sua grande aventura e agora estão tentando decidir o que vem a seguir e como resolver os problemas não solucionados do passado. É algo que eu sempre amei em A Ira de Khan e ter a chance de fazer isso nessa série é um presente memorável para mim, como um fã de Star Trek.
TB: Agora, uma pergunta final. Devemos esperar nos próximos episódios planetas familiares para os fãs de Star Trek, como os que vimos em Voyager, por exemplo?
AJW: Independente de serem de Voyager ou de outras séries de Star Trek, eu posso dizer que você verá alguns lugares familiares. É parte da diversão. E não é apenas na nossa série. Em todas as séries de Star Trek há uma missão longa e rica de revisitar o passado de alguma forma. Em A Nova Geração, nós vimos o que se tornou o Império Romulano, revemos Scotty… são alguns elementos que te fazem pensar “sim, eu quero ver o que está acontecendo nesse momento com esses personagens ou com esses planetas, 50 anos depois que os vimos.
Nós sempre tivemos muito cuidado em Prodigy de compreender que esse é um universo compartilhado – não é completamente divorciado dos eventos que vimos nos últimos 55 anos na televisão. Mas também, não é só apenas jogá-los em tela para satisfazer a nostalgia, e sim para fazer essas histórias avançarem. É sobre encontrar o que é válido explorar e revisitar. O que podemos aprender com esses personagens? Como isso abre porta para novas questões, novas ideias filosóficas e novas aventuras, que não poderiam ser contadas na era de A Nova Geração?
Então, sim, definitivamente veremos novos rostos e alguns antigos e familiares. Eu espero que todo mundo esteja ansioso para ver como nós misturamos esses elementos nessa terceira onda de Star Trek.
TB: Bom, não podemos falar por todos os fãs, mas mal podemos esperar para ver isso em tela. Com certeza, será uma aventura incrível. Muito obrigado pela entrevista!
AJW: Muito obrigado pelas palavras. Estou feliz que todos no Brasil podem assistir à série agora. Muito obrigado!
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