DSC 4×05: The Examples

Em meio a resgate, misterioso cientista empurra adiante investigação da anomalia

Sinopse

Data estelar: Desconhecida

A anomalia desaparece diante de três naves e reaparece após 4,2 segundos, a mil anos-luz de distância. A bordo da Discovery, todos concluem que isso indica uma origem artificial. Sua nova posição ameaça o cinturão de asteroides de Radvek, uma antiga colônia em território da Corrente Esmeralda povoada pelos akaalis. O almirante Vance ordena que Burnham proceda com a evacuação. Ao mesmo tempo, a nave recebe a visita de Ruon Tarka, grande cientista de Risa, com o objetivo de reforçar a equipe de investigação da anomalia. Stamets não gosta da ideia, mas recebe ordens de cooperar.

A Discovery salta para Radvek e constata que 1.206 pessoas aguardam evacuação na colônia composta por vários asteroides interligados. Seis indivíduos, contudo, estão isolados e bloqueados para teletransporte. O magistrado da colônia diz que eles são “os exemplos”, prisioneiros, e que podem ser deixados para morrer. Burnham não concorda e chama Book para ajudá-la a resgatá-los, enquanto Rhys se encarrega da evacuação dos colonos.

Tarka se reúne com Stamets, Reno e Saru, e o cientista recém-chegado sugere que a anomalia, de fato, é um buraco de minhoca, mas gerado por um dispositivo em seu centro. Ele propõe um experimento para replicar em miniatura o fenômeno, com um aparelho de seu próprio invento. Stamets se anima com a ideia, e a equipe passa a trabalhar nisso. Mas o sistema demanda mais energia do que a nave pode fornecer, ainda mais durante a operação de resgate. Stamets e Tarka levam o experimento ao limite, replicando em laboratório várias das características da anomalia, mas Saru decide encerrá-lo antes que eles coloquem a Discovery em risco.

Em Radvek, Burnham e Book chegam à prisão e, após lidar com falsos besouros que serviam como sistema de defesa e destruir o sistema que alimentava os campos de força das celas, libertam os seis detidos. Mas eles hesitam em acompanhá-los, cogitando em vez disso uma fuga. Burnham promete asilo e uma revisão da pena, depois que eles dizem ter cometido crimes menores. Mas um deles, Felix, admite que de fato merece a punição, por latrocínio, e decide não partir com os demais. Burnham tenta convencê-lo, mas ele apenas entrega a ela um orbe lalogi, que registra a árvore genealógica de uma família akaali, na esperança de que ela consiga devolver o artefato à filha de sua vítima. Book não gosta de deixar alguém para trás, mas Burnham argumenta que a escolha é de Felix.

Na Discovery, Culber tem uma conversa com Kovich (remotamente, por holograma) e é confrontado com o fato de que está se exaurindo no esforço de ajudar a todos por remorso, por tentar dar sentido a sua própria ressurreição em meio a tanto sofrimento e morte. Tarka, por sua vez, encontra Book no bar da Discovery e dá a entender que está perto de descobrir quem criou a anomalia, entidade que, neste momento, a Federação descreve apenas como “espécie desconhecida 10C”.

Comentários

Contrariando o que aconteceu nos primeiros episódios da temporada, “The Examples” é um segmento com duas tramas distintas sem muito tecido conectivo entre elas. Não há um tema claro que as permeie e, enquanto uma se mostra largamente episódica, a outra traz avanços consideráveis para o arco mais amplo, com relação à anomalia de matéria escura (AME).

Em ambos os casos, a premissa é boa. Começando por aquela que seria a história “A”, indicada até mesmo pelo título, temos a evacuação de uma colônia por conta de um movimento brusco e inexplicável da anomalia e a atitude dos governantes de deixar seus prisioneiros por lá, os tais “exemplos”, para morrer.

Por força do motivo da evacuação, podemos conectar a trama ao arco mais amplo da temporada, mas trata-se de elo tênue: se os roteiristas quisessem fazer a mesmíssima história, sem tirar nem pôr, lançando mão de outra justificativa para motivar a evacuação, teria sido possível.

De toda forma, estamos falando de uma clássica história de Star Trek, que aborda direitos humanos e compaixão, mesmo em face de criminosos (e, no fim, descobrimos que quase todos eles nem haviam cometido alguma ofensa séria). É difícil saber se a trama foi de algum modo inspirada pela pandemia da covid-19, mas no Brasil essa história ganhou contornos de sórdida realidade: basta lembrar que, no começo de 2021, o governo federal, num primeiro momento (e em meio a muitos erros na gestão da crise epidêmica), tentou tirar os detentos da lista de prioridades na vacinação. Não é a mesma atitude que vemos no magistrado de Radvek, considerando as vidas dos prisioneiros dispensáveis?

A despeito de suas boas intenções, a execução da trama deixa a desejar. Numa segunda olhada, parece até meio rocambolesco, com besouros falsos que lançam lâminas para atacar possíveis invasores (não é porque parece uma ideia divertida que faz algum sentido) e soluções simplistas, como detonar com um feiser a unidade que energiza os campos de força das celas. É puro suco de “falsa encrenca”, com diálogos estranhos e pouco inspirados. Dois estranhos aparecem para extrair os prisioneiros, depois que os próprios carcereiros fugiram, e eles agem com hostilidade e desconfiança. Tudo artificialmente colocado para que Burnham pudesse conquistá-los com algum discurso edificante.

Da mesma forma, a reviravolta de Felix parece artificial. Nada contra o desempenho de Michael Greyeyes, que faz um bom trabalho. Mas o roteiro parece não oferecer muito a ele. Alguém com tanto remorso quanto ele passaria 30 anos fingindo ser inocente para os colegas de prisão? Com que propósito, já que ele aceitava e desejava sua própria punição? Mesmo supondo que seu objetivo fosse se assegurar de que os outros fossem libertados, seu comportamento não sobrevive a escrutínio maior.

Os valores de produção também não ajudaram muito essa trama. Embora o design da colônia de asteroides tenha sido inspirado, o uso do AR Wall (cenário virtual) desta vez falhou em transmitir uma sensação maior de realidade. As rochas com as quais Burnham e Book têm interação direta parecem falsas e remetem às produções anteriores de Star Trek, que recriavam planetas e cavernas em estúdio. A fotografia também pareceu claustrofóbica, a despeito dos amplos horizontes artificiais do AR Wall. Claramente ainda há uma curva de aprendizagem com a nova tecnologia para a produção percorrer.

Deixando para trás o que não funcionou muito bem, cabe elogiar – e bastante – o que podemos rotular como a trama “B”. A adição do Ruon Tarka à série é extremamente bem-vinda, com uma atuação cativante de Shawn Doyle como o arrogante e misterioso cientista. Apresentado desde já como um antagonista, ele é “um Stamets para Stamets”, lembrando a atitude que Paul tinha com qualquer pessoa ao seu redor no começo da série, aquele ar de “todo mundo é idiota e não tenho paciência para explicar o que se passa na minha mente”. Mas, diferentemente de Stamets, que se mostrava um rabugento idealista, Tarka é mais perigoso e cínico: suas intenções claramente não estão todas postas à mesa, e a cena final dele com Book deixa isso claro de forma contundente, além de introduzir um mistério. Que cicatriz é aquela na nuca dele? Qual é seu interesse oculto na anomalia?

Praticamente tudo que foi feito aqui funcionou: o lance do experimento, com Saru contendo o processo antes que saísse do controle no último segundo, o entusiasmo genuíno de Stamets de se ver mais próximo de decifrar o mistério da anomalia, ainda que inspirado por um cientista rival, e até mesmo as tiradas de Jett Reno, com a volta de Tig Notaro à série nesta quarta temporada. Cada um desses momento está a serviço da trama mais ampla e nos motiva a querer saber mais, então, missão cumprida.

Dois outros momentos de personagem correram “por fora”, por assim dizer, sem grande conexão com as tramas em andamento, mas agregam de forma importante ao arco individual de seus protagonistas. O mais óbvio é o de Culber, que tem um confronto com Kovich (sempre brilhante como uma versão roteirizada de David Cronenberg) e lida com todo o peso que vem carregando ao dar suporte psicológico para a tripulação, em conexão com sua própria ressurreição. E se a trama dos “exemplos” não deixa claro seu paralelo com a pandemia, aqui não há dúvida: o discurso de Culber deve soar familiar para todos os profissionais de saúde que atuaram na linha de frente do combate ao coronavírus.

E o outro é o de Zora, o computador da nave, que dá mais um passo para se tornar um personagem completo (e complexo), ao revelar casualmente a Burnham, numa conversa de turboelevador, que passou a ter emoções. Embora o processo tenha sido “telegrafado” por “Calypso”, dos Short Treks, está claro que temos um desenvolvimento importante para a série. E é quase inacreditável que, em tantos anos, Star Trek jamais tenha explorado a ideia e as consequências de uma nave que é essencialmente um ser senciente. Já era hora.

No frigir dos ovos, entre o que funcionou ou não, “The Examples” é um bom episódio, que a um só tempo avança o arco da temporada e intriga o espectador a querer saber mais.

Avaliação

Citações

“Great science was never accomplished with caution.”
“I’m not sure that’s actually true.”
(Grande ciência nunca foi realizada com cautela.)
(Não estou certa de que isso seja verdade.)
Ruon Tarka e Jett Reno

Trivia

  • Este é o terceiro episódio dirigido por Lee Rose e o primeiro crédito de roteiro para Kyle Jarrow, que se juntou à série como coprodutor executivo na quarta temporada. Dramaturgo vencedor do prêmio Obie, Jarrow trabalhou no teatro até passar à televisão, em 2016. Ele é membro da banda Sky-Pony, ao lado da esposa.
  • Esta é a primeira vez que Mary Wiseman não é creditada na abertura da série. E Tig Notaro pela primeira vez é creditada na abertura. Blu del Barrio (Adira), Ian Alexander (Gray), Oyin Oladejo (Owosekun) e Emily Coutts (Detmer) não aparecem neste episódio.
  • Em lugar de Owo, na ponte, vemos um oficial shlerm, espécie alienígena originalmente criada para o filme Star Trek: Sem Fronteiras.
  • Na abertura do episódio, vemos a USS Janeway (presumivelmente homenagem a Kathryn Janeway) e a NSS T’Pau, nave de Ni’Var (que tem uma configuração de anel, como as naves vulcanas do passado, e presumivelmente homenageia a líder dos séculos 22 e 23, vista em Enterprise e na Série Clássica).
  • Os akaalis apareceram pela primeira vez como uma sociedade pré-dobra em “Civilization”, da primeira temporada de Enterprise.
  • Ruon Tarka protagoniza uma cena referenciando Contatos Imediatos do Terceiro Grau (quando usa o purê de batatas para representar a anomalia) e outra citando Tubarão (quando ele fala “vamos precisar de uma sala maior”).

Ficha Técnica

Escrito por Kyle Jarrow
Dirigido por Lee Rose

Exibido em 16 de dezembro de 2021

Título em português: “Os Exemplos”

Elenco

Sonequa Martin-Green como Michael Burnham
Doug Jones como Saru
Anthony Rapp como Paul Stamets
Wilson Cruz como Hugh Culber
Tig Notaro como Jett Reno
David Ajala como Cleveland “Book” Booker

Elenco convidado

Oded Fehr como Charles Vance
David Cronenberg como Kovich
Shawn Doyle como Ruon Tarka
Michael Greyeyes como Felix
Annabelle Wallis como Zora
Sarah Booth como Luda
Jonathan Goad como magistrado akaali
Patrick Kwok-Choon
como Gen Rhys
Sara Mitich como Nilsson
David Benjamin Tomlinson como Linus
Orville Cummings como Christopher
Sochi Fried como mulher akaali
Sima Sepehri como Adhar
Alireza Shojaei como detento 1
Aldrin Bundoc como detento 2

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Nívea Doria

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