DSC 4×01: Kobayashi Maru

Capitão Michael na ponte da Discovery

Episódio de preparação explora o complexo messiânico de Michael Burnham

Sinopse

Data estelar: Desconhecida

Cinco meses após a descoberta do planeta de dilítio na nebulosa Verubin, a capitão Michael Burnham e Cleveland Booker realizam mais uma missão de boa-vontade de entrega de dilítio a um planeta isolado desde a Queima. Mas o imperador Lee’U, dos alshain, desconfia das intenções da Federação. Uma perseguição se desenrola e Michael está determinada a concluir a missão. A tripulação da Discovery detecta uma falha no sistema de satélites do planeta, Michael ordena os reparos e transporta o dilítio antes de partir. O imperador percebe finalmente a sinceridade e relações pacíficas são estabelecidas.

No Conselho Kelpiano-Ba’ul, em Kaminar, há uma discussão sobre o que fazer com o dilítio recebido da Federação. Saru, como um reverenciado ancião, defende que o planeta deve ter uma perspectiva menos isolacionista. Ele assegura, como diz Su’Kal, que não há risco de uma nova Queima. Mas está claro que Saru sente falta da Discovery. Su’Kal manifesta sua gratidão e diz a ele que está bem em Kaminar; Saru pode retornar à Frota Estelar.

Discovery em missão diplomática com os alshain

Enquanto isso, a Discovery retorna ao Quartel-General da Federação, onde a nova presidente, Laira Rillak, participa da reinauguração da Academia da Frota Estelar, após 125 anos. Celebrando a expansão recente da Federação de 38 para 59 membros, ela anuncia uma nova era de exploração para a Frota, com a inauguração da Doca Espacial Archer. Então, surge um pedido de socorro de emergência da Estação de Reparos de Espaço Profundo Beta-6, seriamente danificada, próxima ao sistema de Kwejian. A Discovery é ordenada a saltar imediatamente, e a presidente Rillak decide acompanhar a missão.

Ao chegar lá, a nave encontra a estação girando fora de controle. Uma análise do pedido de socorro revela a presença de uma poderosa lente gravitacional. Após alinhar movimento e atitude com a estação, um grupo de apoio, composto por Adira e Tilly, se transporta para lá, a fim de prestar suporte ao comandante Nalas. Contudo, a situação se deteriora com uma chuva de objetos da nuvem de Oort de um sistema próximo, teletransportes falham e a missão se converte de suporte a resgate. Michael decide deixar a ponte numa cápsula operária para permitir a evacuação da estação via módulo de fuga. Rillak questiona sua decisão, mas ela insiste. Prestes a chegar, a cápsula operária sofre uma colisão de um dos objetos. Burnham sobrevive e, com um traje espacial, conclui o procedimento. A estação é evacuada, mas o comandante Nalas, com outros dois, infelizmente não sobrevive. Mas nove são salvos.

Presidente Rillak fazendo discurso na reabertura da academia da Frota

Rillak conversa com Michael Burnham e critica a atitude da capitão. Admitindo estar lá para avaliar seu desempenho, a fim de selecionar quem comandará a Voyager-J, a presidente diz que Michael não consegue aceitar a inevitabilidade de algumas situações e tem um complexo de messias, que acabará levando-a a fazer escolhas erradas. Ela cita o aprendizado do ancestral teste do Kobayashi Maru, que Michael parece não absorver.

Enquanto isso, Book parte para Kwejian para acompanhar o ritmo de passagem à idade adulta de seu sobrinho, Leto. Book e o irmão, Kyheem, reparam no comportamento estranho de alguns pássaros, mas não sabem o que há de errado. Book persegue os pássaros com sua nave e acaba deixando a estratosfera, quando percebe uma distorção gravitacional devastando uma lua de Kwejian. Sua nave entra no piloto automático e se afasta do planeta, reencontrando-se com a Discovery no Quartel-General da Federação. Quando a Discovery observa Kwejian, descobre que o planeta foi destroçado.

Comentários

O tema de “Kobayashi Maru” é equilíbrio. Em todas as linhas de trama que desenvolve, a questão é a busca ou a restituição do balanço entre forças opostas. Saru tenta equalizar seu novo papel em Kaminar com seu anseio de retornar ao espaço e à Frota Estelar. Book reinveste em seu vínculo com Kwejian e sua família, mantendo ainda seu vínculo com Burnham e a Discovery. A própria Federação busca um novo estado de equilíbrio, retomando uma fase de exploração após anos de mera gestão de crise e inanição. Mas ninguém representa mais o tema que a nova capitão da USS Discovery, Michael Burnham. O episódio todo é, em essência, um teste para ela. E, sim, o teste é uma versão vida real do venerável programa de treinamento da Frota Estelar imortalizado em Jornada nas Estrelas II: A Ira de Khan. Nem sempre é possível salvar todo mundo e reconhecer situações sem vitória possível é dever do capitão.

A escolha não é acidental. Michael tem sido trabalhada como uma personagem psicologicamente similar a Kirk – marcada pelo excesso de confiança e a determinação de salvar a todos a qualquer custo, em qualquer circunstância. O grande capitão da Enterprise pôde se dar ao luxo de fraudar o teste do Kobayashi Maru para contornar uma situação sem vitória possível. Diante de desafios reais, Michael não tem esse luxo. E, ao longo de todo o segmento, diversos personagens vão telegrafando a ela que sua taxa de sucesso é mais fruto de sorte que de juízo. Um dia, as coisas andarão mal e o preço a pagar será alto.

Capitão Michael e Book fugindo dos alshains

É interessante que os roteiristas, por meio da recém-introduzida presidente da Federação, Laira Rillak, encarem de frente o complexo messiânico de Michael, apontando o que pode ser um “ponto cego” na recém-promovida capitão. Há aquele sabor clássico de burocrata contra pessoa de ação, que tantas vezes permeou a relação de Kirk com almirantes, embaixadores e comissários na Série Clássica, mas aqui também temos algo novo: Burnham se apresenta como falível e, em alguns momentos, soa como arrogante e autoconfiante demais. Decerto não é um acidente e o segmento telegrafa que Michael pagará um preço alto por isso ao longo da temporada.

Quem lê tudo isso pode pensar que tivemos, então, um episódio denso e tenso para a abertura deste quarto ano da série. E nada poderia estar mais longe da verdade. Ao contrário, “Kobayashi Maru” resgata um senso de aventura e camaradagem que não se via em Discovery desde o piloto, “The Vulcan Hello”, a bordo da USS Shenzhou. Naquela ocasião, o plano era apresentar a harmonia típica das séries de Star Trek e, então, fraturá-la, como ponto de partida para uma nova forma de abordar a fórmula da franquia, acompanhando uma comandante que caiu em desgraça e precisa se redescobrir e se reencontrar. Foram anos de traumas e desventuras, com tensão constante entre os personagens da série, até chegarmos aqui. Mas agora temos o círculo completo – Michael chegou à capitania e a tripulação da Discovery parece operar de forma leve, descontraída e integrada, como uma típica “família” da Frota Estelar. E todo mundo recebeu uma merecida promoção!

Capitão Michael conversando com o embaixador alshain

É muito bom ver as pequenas tarefas e resoluções serem irmãmente divididas entre os tripulantes da ponte, todo mundo agindo em sintonia, em sequências de ação divertidas como a que abre o episódio (com o “povo borboleta”) e a que envolve o resgate à estação espacial à deriva.

A propósito dessas sequências, vale destacar os incríveis valores de produção no episódio de abertura do quarto ano. É costumeiro gastar uma grana a mais nos segmentos que inauguram cada nova bateria de episódios, mas Discovery parece subir de nível a cada nova temporada. A nova tecnologia do cenário virtual (AR Wall) se faz sentir, e temos a oportunidade raríssima de visitar nada menos que três planetas, totalmente diferentes entre si, em um único episódio. Isso também representa um ganho narrativo, já que podemos acompanhar histórias diferentes dos personagens simultaneamente. Infelizmente, parece ter sido uma escolha de curto prazo, dados o que houve a Kwejian e a “pressa” de Saru de voltar à Frota Estelar. Ainda assim, saber que essa é uma possibilidade certamente alarga os horizontes dos roteiristas.

Conselho Kelpiano-Ba'ul em Kaminar

Também vale destacar a cadência de todo o episódio, adequada e criando uma sensação harmônica de ação-aventura, que se firmou como a principal característica de Discovery, sobretudo a partir do segundo ano.

E acaba que a crise da estação espacial nos introduz o grande desafio desta quarta temporada: uma anomalia gravitacional que não poupa nada e ninguém. A tragédia da estação espacial foi apenas o começo, e Kwejian foi o primeiro planeta a ser devastado, numa demonstração do que está em jogo diante desse mistério cósmico.

Book com o irmão Kyheem e o sobrinho Leto em Kwejian

Este é um bom ponto para elogiar o uso de ciência e mesmo de tecnoblablá neste primeiro episódio. A consultoria científica de Erin Macdonald está sendo bem utilizada e tivemos grande melhoria do linguajar técnico, bem como dos perigos enfrentados. Os objetos desgarrados de uma nuvem de Oort são mesmo candidatos preferenciais a perturbação por uma anomalia gravitacional (e teriam, de fato, gelo de metano em sua composição), para citar um exemplo. Muito bom ver astrofísica sendo bem tratada, ainda que para 99% da audiência isso faça pouca diferença.

No fim das contas, o episódio cumpre satisfatoriamente todas as suas missões: trazer uma leveza pós-aclimatação ao século 32, revelar o estado da Federação bem como dos principais personagens do elenco, iniciar a exploração das consequências da promoção de Michael a capitão e introduzir uma grande ameaça, que já chega chegando e destrói o planeta de Book pouco depois de o termos conhecido, na temporada passada. É bastante coisa, mas “Kobayashi Maru” dá bom encaminhamento a tudo isso, no que se revela um início bem promissor para esta quarta temporada.

Avaliação

Citações

“Did you know there are people out there that don’t have to put up with space-time shenanigans?”
(Você sabia que há pessoas lá fora que não precisam encarar zoeiras espaço-temporais?)
Tilly

“Your acts of bravery are irrefutable. They are also huge swings of the pendulum. And in a time of rebuilding, there is a very fine line between a pendulum and a wrecking ball.”
(Seus atos de bravura são irrefutáveis. Eles também são grandes oscilações do pêndulo. E, num tempo de reconstrução, há uma linha muito tênue entre um pêndulo e uma bola de demolição.)
Laira Rillak

Trivia

  • “Kobayashi Maru” foi lançado ao mesmo tempo que “Terror Firma” (Prodigy). Foi a primeira vez desde 12 de dezembro de 2019 que dois episódios foram lançados ao mesmo tempo, com os Short Treks “The Girl Who Made the Stars” e “Ephraim and Dot”. E foi a primeira vez também desde 26 de maio de 1999 que dois episódios de séries diferentes foram lançados, com “The Dogs of War” (Deep Space Nine) e “Equinox” (Voyager).
  • O contrato de exibição internacional de Discovery pela Netflix foi rescindido dois dias antes da estreia americana deste episódio. A série passaria ao serviço de streaming Paramount+ em 2022, mas este segmento foi o primeiro de Discovery a não ser exibido praticamente no mundo inteiro num período de apenas 24 horas.
  • Este episódio se passa cerca de cinco meses após “That Hope Is You, Part 2”, que fecha a terceira temporada.
  • Durante a apresentação oficial da Doca Espacial Archer, ouvimos o “Archer’s Theme”, composição de Dennis McCarthy feita para Star Trek: Enterprise.
  • A Federação agora tem 59 membros; eram 38 quando a Discovery chegou ao século 32.
  • Boa parte da tripulação da Discovery recebeu promoções. Stamets e Culber viraram comandantes; Rhys, Detmer, Owosekun, Nilsson e Bryce viraram tenentes-comandantes; e Tilly virou tenente.
  • Neste episódio, em duas ocasiões Rhys assumiu o comando quando Burnham deixou a ponte.
  • Burnham fala do famoso teste do Kobayashi Maru com Rillak, mas não está claro se ela pessoalmente passou por ele. Afinal, ela não é formada pela Academia da Frota Estelar, e sim pela Academia de Ciências de Vulcano.
  • Um dos tripulantes da Estação de Reparos de Espaço Profundo Beta-6 é um luriano, a mesma espécie de Morn, personagem de Deep Space Nine. É a primeira vez que vemos um luriano como oficial da Frota Estelar.
  • O comandante Nalas é um akoszonam, espécie alienígena vista pela primeira vez em “Children of Mars”, episódio de Short Treks que serviu de precursor da estreia de Picard.
  • Também vemos um pingo andando pelos corredores da Discovery.
  • Este segmento revela que a nave de Book tem uma cápsula de pequeno porte para dois, que ele chama de “the little guy” (“o carinha”).

Ficha Técnica

Escrito por Michelle Paradise & Jenny Lumet & Alex Kurtzman
Dirigido por Olatunde Osunsanmi

Exibido em 18 de novembro de 2021

Título em português: “Kobayashi Maru”

Elenco

Sonequa Martin-Green como Michael Burnham
Doug Jones como Saru
Anthony Rapp como Paul Stamets
Mary Wiseman como Sylvia Tilly
Wilson Cruz como Hugh Culber
Blu del Barrio as Adira Tal
David Ajala como Cleveland “Book” Booker

Elenco convidado

Oded Fehr como Charles Vance
Ian Alexander como Gray Tal
Chelah Horsdal como Laira Rillak
Bill Irwin como Su’Kal
Emily Coutts como Keyla Detmer
Patrick Kwok-Choon como  Gen Rhys
Oyin Oladejo como Joann Owosekun
Ronnie Rowe Jr. como R.A. Bryce
Sara Mitich como Nilsson
Raven Dauda como Tracy Pollard
David Benjamin Tomlinson como Linus
Orville Cummings como Christopher
Luca Dougleris como Leto
Rodrigo Fernandez-Stol como Nalas
Ache Hernandez como Kyheem
Vanessa Jackson como Audrey Willa
Jodi Jahnke como membro kelpiano do Conselho 1
Avaah Blackwell como membro kelpiano do Conselho 2
Alex McCooeye como Lee’u
David Sobolov como membro ba’ul do Conselho 1
Adrian Walters como Taahz Gorev

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Edição de Mariana Gamberger
Revisão de Nívea Doria

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