“Broken Bow” (A.K.A. “A Nave e o Vento”)
Anteriormente em “Porthos’ Log”:
“A dupla B&B foi responsável por Voyager.”
[Porthos pediu para avisar.]
Dúvida da semana:
“As cuecas da Frota Estelar são anatômicas?”
[Uma pergunta recorrente entre os fãs de Jornada.]
Fala da semana:
“Não tenha medo do vento, alferes Mayweather.”
[Archer alertando o seu timoneiro sobre o seu… problema de saúde.]
Abanando o rabinho:
O piloto parece direcionado para audiências mais genéricas do que aquelas típicas de Jornada (ao menos Porthos não é um pitbull). Parece haver uma maior preocupação com os personagens e com arcos de história do que em Voyager, mas a estética da série (desenvolvida a toque de caixa) lembra um bocado a sua antecessora (doutor Neelix alguém?). Os conflitos são razoavelmente rasos e as motivações dos envolvidos, mal definidas.
Não se pode fazer uma série realmente sobre personagens sem o esforço consciente dos seus produtores de “entrar” na cabeça desses personagens semana após semana. No momento, B&B estão mantendo uma distância segura dos seus construtos mentais. Como aventura escapista “Broken Bow” funciona, mas vai pouco além disso.
Aparentemente o James Cromwell exigiu um “dispositivo de camuflagem” para aparecer no episódio, pois precisamos de uma lupa para vê-lo na imagem da gravação. O discurso de Cochrane e o lançamento da nave não abusaram da manipulação emocional do espectador (fomos poupados mesmo da fanfarra de Courage) e o resultado foi decente, além de explicar a origem do monólogo de Kirk. O que faltou foi ver a reação da humanidade como um todo quando do lançamento da Enterprise. Mas ao julgarmos pelo “espírito” da abertura, nada similar a isso vai acontecer durante a série.
Esse primeiro contato com os Klingons não viola continuidade estabelecida (juro!). Mas foi uma má escolha e uma precipitação dos produtores em usá-los tão cedo na série (devido à sua grande exposição em séries anteriores). Eventualmente a popular raça de guerreiros poderia aparecer em um encontro no espaço com a Enterprise, que poderia ser muito mais interessante do que a “trama de tarefa” (TM) que tivemos aqui. Talvez até em um final de temporada.
Tommy ‘Tiny’ Lister Jr. foi um hilário animal como Klaang. O visual retrô de Kronos foi à mosca. Tivemos boa “continuidade” com relação a “Drumhead”, da quarta temporada da Nova Geração. Mas a cena final em Kronos foi ridícula, deveríamos ter tido legendas naquele momento. Sem problemas quanto ao uso do visual “‘Jornada nas Estrelas: O Filme’ e além” para a raça de Worf.
A nave (Enterprise, NX-01) de fato pouco lembra uma Akira, a parte inferior do disco é “podre” (no bom sentido) e parece literalmente um disco voador, bastante retrô. O efeito de dobra foi muito bem bolado. O que não funciona é que a nave parece um pouco “desequilibrada”, com a linha de empuxo das naceles aparentemente passando acima do centro de gravidade da nave, dando a impressão de que ela iria girar para baixo e não ir para frente com os motores de dobra acionados (o problema não é bem “físico”, é estético com raiz em uma intuição física).
Outras “podreiras” que funcionaram: os comunicadores (com ruído característico da Série Clássica), as portas (também com ruído característico da Clássica), os torpedos que não acertam em nada, os cabos de tração (que milagrosamente conseguem acertar em alguma coisa mesmo numa atmosfera líquida — na próxima é melhor mandar um torpedo amarrado no cabo!), o visor “estilo Spock” de T’Pol, todas as armas portáteis, o núcleo de dobra horizontal etc. Temos um conjunto de belos detalhes como a estátua de Cochrane no quarto de Archer e as gravuras (feitas por Archer?) de “todas as naves Enterprise”.
Outros assuntos de continuidade relativos a visual e tecnologia (comparando as Enterprises de Archer e Kirk, por exemplo) parecem bastante justificáveis e claramente mereceram a atenção dos criadores da série. Falta apenas avisar a T’Pol que Vulcanos tocam a comida com as mãos — vide Spock em “The Enterprise Incident”. As citações à Série Clássica foram sutis e funcionaram bem. Infelizmente a citação a Ronald D. Moore foi infeliz.
Como uma raça tão atrasada, como a humana neste ponto da cronologia de Jornada, chegou a uma posição de destaque no cenário galáctico é a questão central que Enterprise enquanto série tem que responder.
Bilingsley é claramente o melhor nome do elenco e por isso o doutor saiu o melhor (ou único) atuado, com pausas e inflexões, apesar do material trivial fornecido. “Aquele” sorriso é que não pegou bem.
Armstrong é um favorito dos fãs que tem que aparecer mais vezes e a idéia de Porthos (ainda que absurda) foi uma das melhores da dupla B&B para a nova série.
Levantando a perninha:
A abertura inova (em termos de Jornada) ao trazer uma canção pop como tema e mostrar cenas não-pertencentes ao universo de Jornada (o nosso universo e o de Jornada não são os mesmos — o que alguns fãs parecem desconsiderar às vezes).
A canção é uma vergonha, aparentemente inspirada na atitude de séries da Warner como “Charmed”, “Smallville” e “Roswell”. O mal estar de ter uma canção escrita por Diane Warren em Jornada é indescritível. O engraçado é que a dupla B&B manteve as mesmas restrições para a música incidental do episódio e ficamos com mais “música de turbo-elevador” (TM).
A tentativa de capitalizar com o tema “exploração” junto à opinião pública é claramente infeliz. Jornada não tem nada a ver com real exploração (espacial, por exemplo). Se tivéssemos algo parecido com real exploração nos episódios, apenas uma meia dúzia de três ou quatro estaria interessada. Jornada é sobre a condição humana. E seus temas de pseudo-exploração são apenas um meio para um fim. A dupla B&B mostra não reconhecer isto.
A ausência das imagens do programa espacial russo (Gagarin, Laika, Sputnik, Tereshkova, Mir etc.) é a gota d’água. Dando ares de propaganda institucional da NASA às imagens de abertura, algo meio na contramão, para uma série que se diz tentando “recapturar” a “essência de Jornada nas Estrelas”. Um outro “cuidado” da dupla B&B foi utilizar imagens mais reconhecíveis pelo público, sem considerar muito a relevância histórica relativa entre as imagens.
Tal tema de “exploração” é (ironicamente) explorado de uma forma infantil nas imagens de abertura. E as imagens de diferentes fontes “brigam entre si” à medida que são exibidas. A abertura de Enterprise já nasce datada em som e imagem. Grande “inovação”, Braga e Berman. Não parece nem ao menos refletir a série em si.
Ficam poucas dúvidas que a abertura ideal seria mostrar as guerras da virada dos séculos (20 e 21), o fundo do poço a que chegou a Terra. Mostrar o governo mundial se formando, mostrar o primeiro contato com os Vulcanos e mostrar o progresso da humanidade nesse meio tempo até as vésperas do lançamento da nave. Tudo isto embalado pelo tema de “Primeiro Contato”.
Como uma triste surpresa temos alguns problemas iniciais nos valores de produção da nova série. A fotografia em certo sentido foi uma decepção, acabou lembrando mais um videoclipe (ou um comercial dirigido por um diretor de videoclipes) do que cinema (o que muitos esperavam), não chegando aos pés da fotografia (por exemplo) de “C.S.I”, ainda que acabe impondo um tom de “é diferente” para a série (juntamente com o formato widescreen, que não foi adotado na exibição brasileira pelo AXN). O que definitivamente não é uma verdade concreta. Os efeitos visuais não tiveram uma qualidade uniforme, a tomada da saída do shuttlepod, por exemplo, foi bem ruim. Não houve nenhum dramático salto de qualidade com relação ao que Voyager vinha fazendo na temporada anterior (o efeito tridimensional do transporte parece não virar nunca uma realidade).
A melhor colocação das câmeras nos cenários parece estar dando trabalho. A enfermaria parece ok (apesar de ter ficado muito parecida com a de Voyager), mas a ponte e principalmente a engenharia (com “cara de galpão”), ficaram com pouca vida no episódio. Outro grande problema foi a edição bastante confusa e atropelada, incluindo os cortes para os flashbacks. Aliás, com relação aos flashbacks, fica até difícil acreditar que foram esses mesmos James L. Conway direção) e Marvin Hush (fotografia) que executaram o clássico “Necessary Evil”, da segunda temporada de DS9, com direito a uma fotografia gótica inesquecível e uma magistral utilização de flashbacks.
Alguns imaginavam Enterprise utilizando um estilo de escrita e execução similar (digamos) a do episódio “Workforce”, da sétima temporada de Voyager: andamento frenético, cenas pequenas, uma edição nervosa, alguma sofisticação estilística etc. O que vimos aqui pareceu pouco confiante e embolado. Decepcionante em mais de um nível.
“Atores e personagens” representam usualmente o ponto que se desenvolve mais lentamente no começo de uma nova série e aqui em Enterprise não é diferente. Além da falta de originalidade dos personagens regulares, as caracterizações estão “meio” finas (os personagens parecem um pouco “genéricos” com interpretações meio “retas”, faltam atuações que, através de alguma forma de subtexto, “digam mais sem dizer” e também caracterizações mais afiadas e distintas).
Aparentemente os atores regulares receberam a diretiva de sub-atuarem, serem o mais natural possível (sub-atuar não é não-atuar). Infelizmente o resultado líquido até aqui é que eles parecem que NÃO estão atuando. Em primeiro lugar os Vulcanos tem que ser mais bem caracterizados, se continuarmos com esse paternalismo transparente de Soval e cia., vai ficar difícil de assistir. Algum esclarecimento sobre o “porquê” das decisões tomadas com relação à Terra, desde o primeiro contato, deve ser providenciado correndo. A questão dos Vulcanos não é de continuidade, diversidade cultural ou de que eles são de outra época. A caracterização dos Vulcanos é simplesmente intolerável com está. Arrumem uma opção melhor e fiquem com ela RÁPIDO! Simples assim.
Sato é a única personagem (além do doutor) com uma personalidade distinta (e lembra um bocado a Ezri Dax, em mais de um sentido). Ela é fundamental para a missão e possui claramente sentidos sobre-humanos (será que ela tem algum segredo?).
Reed e Mayweather (Montgomery é incapaz de sequer parece experiente em tela) parecem tremendamente acessórios. Eles soam extremamente “uma nota”. Faltou o “novo grande trio”: Tucker, T’Pol e Archer. Tucker também soa um pouco “uma nota”, mas sua amizade por Archer foi posta para bom uso — foi melhor “angariador de simpatia” para o bom capitão do que todos aqueles flashbacks juntos. Trineer é o segundo mais forte do elenco nesse ponto.
Blalock ainda tem muito que aprender. Ela tem dificuldade até de manter a caracterização Vulcana. Dando escorregadas de tempos em tempos. Seus olhos são completamente mortos. Dando muito mais a impressão de alguém sob o efeito de drogas pesadas do que alguém sob total controle de suas emoções. É constrangedor (em sua obviedade) termos outra “discípula da Mulher-Gato” (TM) em Enterprise, como foi Seven of Nine em Voyager.
Bakula ainda está brincando de capitão de Jornada e vai demorar um tempo para “achar Archer” e ainda mais tempo para “diferenciar Archer” dos outros capitães. Foi uma decepção a forma que o ator reagiu com relação ao tiro que Archer levou na perna. Canastrice clássica. E fez o mesmo quando se materializou na plataforma de transporte após ser resgatado. A caracterização de Archer é a de um “cowboy sensível”. É de se esperar que ele se mostre mais diferenciado nas próximas aventuras.
Sulibans, Silik, “Cara do Futuro” e “Guerra Fria Temporal:
Os Sulibans são uma bobagem, além de terem origem em um “gancho Sci-Fi” que se encontra completamente saturado no momento: engenharia genética. Um metamorfo (mesmo um relativamente inexperiente como Odo) vale mais que um destacamento deles. O melhor é que um metamorfo propicia um melhor uso de efeitos visuais, não “entorta bracinho” como desenho para criança de cinco anos e não fica andando pelas paredes (é engraçado ver o Suliban andando no chão tendo que esperar os Sulibans andando pelas paredes). Será que ninguém na produção teve o bom senso de dizer que uma raça de pele esverdeada (ou seria amarelada?) com indumentária vermelha, com direito a capa, “lembra um pouco” material de “Filme B”?
Fleck pode dar uma crescida como Silik, apesar de o que vimos aqui não ter sido tão bom. Archer (que arriscou muito, não levou informação nova nenhuma pra casa e quase morreu) nunca deveria ter saído vivo da “câmara temporal” — chega até a ser engraçado o fato de Archer conseguir usar as particularidades do ambiente melhor do que Silik. O arco temporal é uma total incógnita que se espera que seja uma forma de dar algum propósito à série e não simplesmente de promover “encontros entre tripulações de Jornada de diferentes eras” (TM) para ganhar audiência em episódios especiais.
Foi um erro puxar para o piloto toda esta história dos Sulibans e do seu “senhor do futuro”, poderia e deveria ter sido apresentada de forma mais gradual ao longo da temporada. Sarin deu as informações pertinentes a Archer, quase que em um “serviço de utilidade pública”. Mas o que está feito está feito.
Espera-se que a série Enterprise não indique ao seu final que a criação da Federação foi fruto do envio para o passado de tecnologia e informação do futuro. Seria inaceitável. De toda maneira, tal “arco temporal” é agora parte da série, apesar de ser muito menos interessante que as outras possibilidades de longo prazo da série, envolvendo conflitos entre humanos, Vulcanos, Andorianos e Klingons, a guerra Terra-Romulus e a Fundação da Federação.
Sexo, Orelhas e “Tuckers”:
A já famosa “cena da câmara de descontaminação entre T’Pol e Tucker” é um dos momentos mais constrangedores da recente memória de Jornada nas Estrelas. O procedimento em si é imbecil, ele é grosseiramente errado tecnicamente. Tal procedimento faz menos sentido do que Spock tentar impedir a entrada da criatura gasosa, pela grade de ventilação, com o uso das mãos, em “Obsession”. Quanto ao ângulo do apelo sexual, restam poucas dúvidas que se tal segmento fosse exibido alguns anos atrás em alguma convenção de Jornada, passaria fácil como uma paródia da série. Uma lástima!
Entretanto não existem problemas tão graves quanto às outras explorações desta “faceta” de Enterprise. As dançarinas/prostitutas comedoras de insetos (cujo cafetão era um sapo) foram ok: se você vai a um bordel alienígena, você vê uma prostituta alienígena. Sarin tendo que beijar Archer para saber se ele está dizendo a verdade foi algo meio bocó, no nível da Sato eventualmente (tentar) traduzir os latidos do Porthos. Quanto às “coxas de Bakula”, as duas cenas, na enfermaria e em seus aposentos, foram naturais, sem grosseria.
Entrevista da semana:
A nossa dupla de correspondentes internacionais (Nit & Picker) não conseguiu entrar em contato com ninguém da produção de Enterprise esta semana para uma entrevista, lamentamos o inconveniente. Entretanto a dupla de especialistas tem algo a acrescentar mesmo assim.
Nit: Fui só eu, ou eles colocaram Kronos “um pouco” perto demais da terra?
Picker: Isso é dificilmente novo em Jornada, mas é um óbvio problema. Também não tenho certeza se Rigel, a Terra e Kronos estão “aproximadamente alinhados”.
Picker: Como Sarin pôde “contaminar” Klaang com a informação sem ele perceber? Como o Alto Conselho Klingon sabia onde procurar e que tecnologia usar?
Nit: Fica também a dúvida se a morte de Sarin é o fim da resistência contra Silik e cia.
Nit: É curioso que o cara do futuro não forneceu tecnologia de transporte ao grupo de Silik.
Picker: Ele deve ter dado algum “Aspirador subespacial” (TM) no lugar, pois senão como eles teriam conseguido sumir com Klaang da enfermaria da Enterprise?
Nit: Curioso também que a “Hélice” não tenha nenhum tipo de artilharia pesada.
Picker: SE tivesse a Enterprise já era.
Nit: E sobre as nossas previsões?
Picker: Vejamos. Em um episódio já tivemos: Klingons, uma trama temporal, uma citação a hologramas e a formalização de toda a tecnologia (apesar de menos desenvolvida) que estamos acostumados em uma série típica de Jornada. Até mesmo o transporte funcionou quando foi preciso.
Nit: E pensar que a dupla B&B prometeu uma NOVA série.
Nit & Picker: Oh Boy!
Nit: Eu sou Nit.
Picker: E eu sou Picker.
Nit & Picker: Até a próxima semana.
Recomendação: 3 ossos
(Dedicado aos “melhores dentre os melhores”: os Beagles!)