DSC 5×06: Whistlespeak

Visita a “planeta da semana” explora armadilhas e bênçãos da espiritualidade

Sinopse

Data estelar: desconhecida.

As análises do frasco obtido junto com a terceira pista só revelam água pura. Michael sugere que Stamets busque uma perspectiva xenoantropológica, em vez de química.

Michael então é convocada à Sala Infinita por Kovich. Ele diz que outra nave está no encalço de Moll e L’ak, e a Discovery deve se concentrar em achar a tecnologia dos Progenitores. Kovich revela que conseguiu levantar os nomes dos cinco cientistas envolvidos no projeto.

Em paralelo, Culber ainda tenta processar a experiência que teve em Trill. Para tanto, ele conversa com uma recriação holográfica de sua avó. O médico busca uma inspiração espiritual, mas ela sugere que ele deve primeiro analisar seu corpo.

Michael conta a Stamets que o doutor Kreel, um denobulano, foi o criador do frasco, e ele trabalhava com semeadura de nuvens de chuva há 800 anos. Correlacionando os dados, Adira indica que um planeta, Halem’no, tem uma torre meteorológica desenhada por Kreel. Mas trata-se de um planeta que abriga uma civilização pré-dobra, que se comunica por uma linguagem de assobios (felizmente o tradutor universal dá conta dela).

Michael e Tilly descem ao planeta numa missão de reconhecimento, disfarçadas como habitantes daquele mundo. Elas se misturam a um grupo e ajudam a salvar uma nativa que estava muito mal por conta do tempo que passou entre as tempestades de areia planetárias. As duas também conhecem a jovem Ravah e seu pai, o alto sacerdote Ohvahz. Eles estão numa peregrinação para “encontrar os deuses”, numa “jornada da mãe compar” até o “alto pico”. Estão há muito tempo sem chuva. O pai não deseja, mas Ravah está determinada a participar da provação. Michael e Tilly também se juntam aos peregrinos como forma de irem à torre em busca da pista.

A jornada consiste em consumir um tablete de poeira que deixa o peregrino com sede extrema e então caminhar um longo caminho até o alto pico, evitando a tentação de tomar água ao longo do caminho.

Na Discovery, Culber pede a Stamets que o ajude em um exame neurológico, para ver se há algum efeito duradouro do zhian’tara de que ele participara em Trill. Seu marido concorda em ajudar. A análise, feita no dia seguinte, mostra que Culber está totalmente saudável. O médico está perturbado, e Stamets sugere que ele apenas aprecie a experiência extraordinária que vivera.

Na ponte, Adira analisa a meteorologia do planeta e indica que já houve outras torres meteorológicas – todas falharam e só resta uma funcionando. Michael precisa consertar os defeitos da única que ainda resta. No meio da jornada, ela percebe musgos que sofreram mutação, indicativa de radioatividade do painel de controle da torre. Ela então ordena Tilly a continuar no caminho para o alto pico, enquanto fica para consertar o sistema.

Tilly e Ravah são as últimas a resistir, e a última etapa envolve carregar pratos com água sem bebê-la. Ravah derruba o seu e é desclassificada. Mas Tilly volta e divide a água com ela, para que ambas possam concluir o percurso.

Na ponte, Adira ajuda Michael a fazer a manutenção do painel passando instruções. Em meio à insegurança, recebe apoio de Rayner, como capitão interino. Michael consegue efetuar os reparos, e agora a torre voltará a funcionar, trazendo a chuva de volta.

Em paralelo, Ravah e Tilly são levadas ao templo do alto pico – onde a oficial descobre que farão parte de um sacrifício ritual aos deuses para que eles tragam a chuva de volta. Com pesar, Ohvahz as tranca no templo, onde ficarão sem oxigênio e morrerão. Michael contata a Discovery e pede que transportem Tilly, mas a cobertura de tritânio da torre impede o processo. A capitão então pede para ser transportada o mais próximo possível e decide quebrar a Primeira Diretriz, explicando a Ohvahz quem eles são, o que é a torre meteorológica e como ela é uma tecnologia, que precisa de manutenção, e não de sacrifício de fiéis. O alto sacerdote hesita, mas Michael o convence ao evocar uma canção que a mãe de Ravah cantava a ela quando criança. Quando ele reabre a porta, Ravah e Tilly já estão inconscientes, mas Culber e sua equipe conseguem reavivá-las.

Recuperada, Tilly nota marcas na rocha do “templo”, que indicam as cinco torres e a localização da pista – em uma das outras torres, atualmente não funcional. E a chuva retorna, confirmando a Ohvahz que Michael diz a verdade. Enquanto ele precisa pensar em como mudar a cultura de seu povo e abandonar os sacrifícios desnecessários, a tripulação da Discovery resgata a quarta pista da tecnologia dos Progenitores – com indicações de seu próximo destino.

De volta à nave, Culber se reencontra com Book e reflete sobre a sensação de que, desde Trill, ele entrou em contato com algo maior, que ele não sabe explicar e transcende sua experiência como ser humano – um despertar espiritual. E Michael fica sabendo que a Frota Estelar recuperou as novas coordenadas de L’ak e Moll, ordenando um alerta escuro para um salto até lá.

Comentários

Episódio delicado no tratamento de um tema idem, “Whistlespeak” traz ares de Série Clássica para uma clássica “aventura de planeta da semana”, com direito a grandes viradas e ameaças que, em vez de envolver a galáxia ou o Universo todo, afetam apenas um ou dois personagens.

Bem, que tema delicado foi esse? Essencialmente, a importância da espiritualidade e da fé. Duas histórias paralelas remam em direções opostas para debater essa questão: a de Michael e Tilly em Halem’no, e o arco de Culber a bordo da Discovery.

De novo, não resta qualquer dúvida de qual é a trama A e qual é a B. O mais interessante é como ambas se entrelaçam para oferecer diferentes pontos de vista sobre um assunto sempre difícil de abordar.

Com Michael e Tilly, a grande questão era quebrar a Primeira Diretriz e mostrar a um alto sacerdote de um planeta que era um tremendo equívoco o aspecto mais rude de sua religião – o literal sacrifício de vidas em troca de uma dádiva divina (no caso a chuva), evocando muitas religiões antigas da Terra, como a de grandes culturas da América pré-colombiana, como a maia, a asteca e a inca. Como convencer, em curto espaço de tempo, que uma crença central de um povo é uma mentira? Michael teve de gastar sua experiência como xenoantropóloga, além de usar seu acesso a alta tecnologia para demonstrar como os “milagres” são realizados.

E isso, claro, teve de vir acompanhado de um esforço de convencimento de que não, ela e seus colegas da Discovery não são deuses, a exemplo de um dilema que já vimos a tripulação da Enterprise-D encarar algumas vezes, como em “Justice” e “Who Watches the Watchers?”, da primeira e terceira temporadas de A Nova Geração. E nem cabe mencionar outras circunstâncias em que capitães se viram forçados a quebrar a Primeira Diretriz em Star Trek – são mais dos que se pode contar.

Costurada em uma história bem resolvida e ambientada, com um trabalho interessante na criação do planeta e da civilização alienígena (num esforço de maquiagem que lembra que, para enfatizar a dramaticidade, muitas vezes menos é mais), essa aventura traz uma mensagem que a própria Michael sintetiza ao conversar com Ohvahz (por sinal bem interpretado pelo ator convidado Alfredo Narciso), quando ela diz que “crenças podem evoluir”. De fato, é notório entre culturas humanas como religiões longevas necessariamente obrigam a reinterpretações periódicas de seus dogmas, para se manterem relevantes para sociedades em constante transformação. A deste planeta está para passar por uma grande mudança, ao compreender o que há de natural no “milagre” com que foram agraciados: é tecnologia alienígena, não intervenção divina, o que traz chuva e chance de vida a esse povo.

A propósito disso, é legal destacar a menção a técnicas reais de semeadura de nuvens verdadeiras – sim, hoje a humanidade já sabe como induzir a ocorrência de chuvas, ao menos em algumas circunstâncias, e há de se presumir que a tecnologia denobulana do século 24 é ainda mais sofisticada.

Depois de dois bottle shows, com toda a história praticamente ambientada em cenários fixos, é muito bem-vinda a volta a um “estranho novo mundo”, criado com filmagens em locação, num parque a cerca de duas horas de viagem de Toronto, Canadá, onde a produção está baseada.

E o coração dessa trama está com Tilly, que tem a primeira chance para ganhar destaque nessa temporada, já representando uma nova fase em sua vida, como professora da Academia da Frota Estelar e alguém preocupada em guiar jovens à procura de seu caminho no mundo. Mary Wiseman traz todas as facetas de sua personagem, realçadas pela relação instantânea e natural forjada entre ela e Ravah, vivida de forma sensível pela atriz June Laporte.

E as viradas na trama funcionam, sobretudo com a revelação tardia de que toda a “jornada” dos compares envolvia sacrifício ritual humano. É uma transição mais delicada, menos chocante, que a feita no episódio “Lift Us Where Suffering Cannot Reach”, da primeira temporada de Strange New Worlds, em que o capitão Pike faz uma descoberta terrível sobre a cultura daquele planeta e de sua “criança sagrada”. A abordagem mais suave feita aqui nasce da falta de malícia – da inocência – dessa cultura pré-dobra e ainda essencialmente não científica em suas crenças mais fundamentais, o que dá margem para que Michael possa agir e fazer as coisas se encaminharem numa direção mais agradável. Pike não teve a mesma sorte.

Em paralelo, temos Culber ainda tentando entender a experiência transcendente que teve em Trill, ao “receber” em seu corpo a mente de Jinaal, e aqui as coisas caminham na direção oposta. Ele parte da ciência, aconselhado por um holograma de sua avó (por si só uma inclusão que merece discussão, em razão da tendência recente no mundo real durante a produção do episódio de usar IA, inteligência artificial, para recriar por computador versões interativas de pessoas mortas para ajudar no processo de luto), e termina com a conclusão oposta à de Ohvahz. Se o alto sacerdote precisa se confrontar com fatos que desafiam imediatamente sua fé (ainda que Michael tente manter uma postura agnóstica diante dele), Culber vasculha seu cérebro em busca de uma explicação para o que está sentindo e nada encontra, restando apenas a constatação de que ele teve uma experiência espiritual, que transcende o alcance da própria ciência.

É um lembrete de que a espiritualidade pode ter tanto efeitos positivos quanto negativos, dependendo da forma como é encarada e dos pressupostos que carrega. Considerando que tudo isso está empacotado num episódio divertido, bem ritmado, bem filmado e bem produzido, não é pouca coisa. Depois do tropeço de “Mirrors”, é bom ver a série voltando a seus melhores momentos, adentrando a segunda metade desta última temporada.

Avaliação

Citações

“Beliefs can evolve. Denying that can cause almost as much chaos as the worst storm.”
(Crenças podem evoluir. Negar isso pode causar quase tanto caos quanto a pior tempestade.)
Michael Burnham, argumentando com Ohvahz

Trivia

  • Kenneth Lin faz sua segunda dupla com Brandon Schultz; juntos os dois assinaram “The Sanctuary”, da terceira temporada. Lin também escreveu “There Is A Tide”. Schultz está com a série desde a segunda temporada, quando escreveu “Perpetual Infinity”. Também é seu o episódio “Stormy Weather”, da quarta temporada. Além de Discovery, ele também escreveu o episódio animado de Short Treks “The Girl Who Made the Stars”.
  • Chris Byrne assume mais uma vez a direção de um episódio de Discovery. Tendo trabalhado em duas séries anteriores criadas por Bryan Fuller (Hannibal e American Gods), ele foi diretor de segunda unidade do piloto, “The Vulcan Hello”, dirigiu outros três episódios (“Into the Forest I Go”, “Choose to Live” e “All In”), além de “All Those Who Wander”, da primeira temporada de Strange New Worlds.
  • Pelo terceiro episódio seguido, Doug Jones (Saru) não aparece ou recebe créditos. Nas redes sociais, o ator explicou que sua saída temporária da série ocorreu em razão de compromissos com a filmagem de Hocus Pocus 2 (Abracadabra 2), da Disney.
  • A linguagem de assobios ouvida no episódio foi criada pela assobiadora profissional Molly Lewis.
  • Michael Burnham estudou xenolinguística em Vulcano com a dra. T’Prasi.
  • Denobulanos usam iodeto de prata para fazer chover em Denobula, composto que é usado em semeadura de nuvens atualmente na Terra.
  • O prato Mofongo con pollo al ajillo, apreciado por Culber, é típico de Porto Rico e leva frango, arroz e alho.
  • Os potes de “cura de som” usados pelos halem’nitas são como os chamados “potes cantantes” tibetanos, que já foram usados modernamente para musicoterapia.
  • A interface de controle do tempo estava em idioma denobulano, que apareceu primeiro em Enterprise.
  • A lista completa dos cientistas do século 24, em ordem de pistas, é:
    1) Vellek (romulano)
    2) Jinaal Bix (trill)
    3) Carmen Cho (terráquea)
    4) Hitoroshi Kreel (denobulano)
    5) Marina Derex (betazoide), no que parece ser uma homenagem a Marina Sirtis.

Ficha Técnica

Escrito por Kenneth Lin & Brandon Schultz
Dirigido por Chris Byrne

Exibido em 2 de maio de 2024

Título em português: “Compares”

Elenco

Sonequa Martin-Green como Michael Burnham
Anthony Rapp como Paul Stamets
Mary Wiseman como Sylvia Tilly
Wilson Cruz como Hugh Culber
Blu del Barrio como Adira Tal
Callum Keith Rennie como Rayner
David Ajala como Cleveland “Book” Booker

Elenco convidado

David Cronenberg como Kovich
Annabelle Wallis como Zora
Alfredo Narciso como Ohvahz
June Laporte como Ravah
Marium Carvell como Anorah
Maria del Mar como avó de Culber
Orville Cummings como Christopher
Natalie Liconti como Gallo
Christina Dixon como Asha
Molly Lewis como assobiadora

TB ao Vivo

Enquete

TS Poll - Loading poll ...

Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

Episódio anterior | Próximo episódio