Destruído pelo passado, velho Jedi inicia sua própria “jornada do herói”
Sinopse
Data: 9 a.B.Y. (nove anos antes da Batalha de Yavin)
Dez anos atrás, um grupo de padawans treinava no Templo Jedi, em Coruscant, quando ele foi invadido por soldados clones, executando a Ordem 66 e tentando matar todos. Vários deles aparentemente conseguiram fugir.
Agora, passada uma década, uma nave imperial chega a Tatooine, trazendo um trio de inquisidores. Eles entram numa cantina e identificam um Jedi. Reva, a Terceira Irmã, tenta matá-lo, mas o Grande Inquisidor a impede, para que ele possa ser interrogado. O Jedi então foge. Reva está frustrada por caçar membros do terceiro escalão e quer ir atrás de Obi-Wan Kenobi. Mas o Grande Inquisidor a lembra de que não é essa a missão deles.
Enquanto isso, em outra parte de Tatooine, Obi-Wan, agora conhecido pelo nome de Ben, trabalha como açougueiro. Os trabalhadores são explorados, recebem metade do pagamento combinado, mas Obi-Wan resiste em interferir, para não ser descoberto como um Jedi.
Morando em uma caverna no meio do deserto, ele vive sozinho, em isolamento total. Um java chamado Teeka traz um brinquedo velho que ele havia encomendado, uma nave espacial, e Obi-Wan acaba comprando de volta peças que o próprio java havia roubado dele. À noite, Kenobi tem pesadelos com seu tempo como Jedi. Ele acorda assustado e tenta se comunicar com o espírito de seu antigo mestre, Qui-Gon Jinn, mas fracassa.
Quando tem chance, em suas andanças pelo deserto, o velho Jedi vê de longe o jovem Luke Skywalker, agora com dez anos, para se certificar de que está bem. O menino claramente tem muito do pai, e Obi-Wan acha que ele terá de ser treinado quando a hora chegar. À noite, ele se aproxima da fazenda de umidade da família Lars e deixa lá a espaçonave de brinquedo.
Na volta para sua caverna, na escuridão da noite, ele é abordado pelo Jedi fugitivo, Nari, que o identifica como Obi-Wan. Ele primeiro tenta negar, depois recomenda que o jovem enterre seu sabre de luz na areia e se esconda, levando uma vida normal.
Longe dali, em Alderaan, a jovem princesa Leia é preparada para uma ocasião social. Ou melhor, uma menina alienígena que se passa por Leia. A verdadeira foi brincar na floresta com sua pequena droide voadora, Lola. Do alto de uma árvore, ela vê as naves partindo do planeta, até ser encontrada pela mãe e levada de volta ao palácio. A menina é vigiada de longe por um sinistro observador.
Em Tatooine, Obi-Wan segue sua rotina de trabalho, sempre roubando um pedaço de carne para sua montaria. Ele é confrontado pelo tio de Luke, Owen Lars, que devolve a espaçonave de brinquedo e pede que ele fique longe. Obi-Wan diz que Luke terá de ser treinado, mas Owen o lembra do fracasso com Anakin. A conversa é interrompida quando os inquisidores surgem na rua. Eles interrogam os transeuntes, pedindo que entreguem a localização de um Jedi fugitivo. Uma mulher questiona a autoridade deles e tem a mão cortada por Reva. Em seguida, ela se fixa em Owen e ameaça matá-lo e à família, caso ninguém entregue um Jedi. Ele não entrega Obi-Wan. Um dos inquisidores questiona Reva pela impulsividade, mas ela insiste em continuar atrás de Kenobi e parte na nave. O velho mestre agradece Owen, que diz não ter feito por ele.
Em Alderaan, o senador Bail Organa e sua esposa recebem a comitiva da irmã dela. A reunião mistura política e boa comida, e Leia é confrontada por um primo, que diz que ela nem mesmo é uma verdadeira Organa. Ela diz poucas e boas de volta, mostrando ser mais perceptiva do que sua idade sugere. Bail compreende e admira a atitude rebelde da filha, mas, como bom político, lembra que, por ora, ela precisa seguir as regras e pedir desculpas ao primo. E claro que ela não faz nada disso, fugindo de novo para a floresta – onde é capturada por sequestradores e levada para fora de Alderaan.
Em Tatooine, Obi-Wan ouve seu velho comunicador holográfico tocando. É uma mensagem dos Organas, pedindo ajuda para o resgate da filha. Ele diz não ser mais quem foi um dia e se recusa a ir atrás de Leia. Sugere que encontrem outro para procurá-la e segue em sua rotina diária. O terror toma conta dos cidadãos de Tatooine. O jovem Jedi fora capturado pelos inquisidores, morto e pendurado sob um arco em praça pública.
De volta à sua caverna, ele nota um droide e sabe que alguém esteve lá. É Bail Organa, que diz que a nave dos sequestradores foi rastreada e Leia está sendo levada para o planeta Daiyu. Obi-Wan mais uma vez recusa a missão, mas Organa insiste que ele precisa superar o passado e se concentrar no presente. Kenobi então concorda com “uma última luta”. Em meio ao deserto, ele desenterra uma caixa, com dois sabres de luz, o dele e o de Anakin Skywalker. Hesitante, Obi-Wan parte de Tatooine em um transporte.
Enquanto isso, na nave dos sequestradores, Leia tenta escapar com a ajuda da pequena Lola, mas os criminosos a ouvem e quebram a droide. O plano deles, arquitetado por Reva, é justamente atrair Kenobi, para que ele possa ser capturado.
Comentários
Não é segredo que o modelo original para Star Wars, exposto em Uma Nova Esperança e focado em Luke Skywalker, é a famosa “jornada do herói”, um dos formatos mais clássicos e reprisados nas mitologias das mais variadas culturas. Modernamente analisado e popularizado pelo escritor americano Joseph Campbell, foi uma grande referência para George Lucas. E, com o capítulo de abertura de Obi-Wan Kenobi, essa ideia mais uma vez foi seguida à risca. O resultado não poderia ter sido melhor.
O princípio da história é conhecido e vem da trilogia prequela. (Aliás, para quem chegou na galáxia muito distante agora, o segmento abre com uma rápida recapitulação dos eventos vistos entre A Ameaça Fantasma e A Vingança dos Sith.) Após uma nova cena da execução da Ordem 66 para apresentar o fato de que ao menos alguns jovens padawans podem ter sobrevivido ao massacre dos Jedi, nos deparamos com Obi-Wan Kenobi vivendo uma vida discreta e tediosa em Tatooine. Mais do que um homem em fuga, Kenobi é um homem destruído. A perda de Anakin Skywalker, que a profecia reputava como O Escolhido para restaurar o equilíbrio à Força, ainda cala fundo, após o confronto decisivo dos dois em Mustafar. Obi-Wan leva o peso do mundo às costas, com a sensação de que a República caiu e o Império surgiu como fruto de seu próprio fracasso.
E então, após vivenciarmos a dolorosa vida sob o medo imposto pelas forças imperiais – que agora ousam se aventurar pelas terras ermas da Orla Exterior, como Tatooine –, Obi-Wan vivencia a primeira etapa da “jornada do herói”: o chamado da aventura.
Ele vem na forma do pedido de socorro de Bail Organa, após o sequestro da pequena Leia. Kenobi, que até então se reputava como responsável pelo bem-estar de Luke, é obrigado a se lembrar de que Anakin e Padmé Amidala tiveram dois filhos. Como Luke faz em seu chamado à aventura original, Obi-Wan primeiro hesita. Alega ter outras responsabilidades, teme pelos perigos e pela volta a uma vida que ele não reconhece mais como sua. Perturbado, Obi-Wan claramente perdeu contato com a Força. Em meio a pesadelos, é incapaz de estabelecer um elo com o espírito de seu antigo mestre Qui-Gon Jinn. (Depois da ênfase a isso neste episódio, se Liam Neeson não voltar ao papel ao longo da minissérie, deixará todo mundo surpreso – e frustrado.)
A ideia de promover a volta de Obi-Wan à vida galáctica por meio de um chamado de Bail Organa é muito boa. Ajuda a solidificar a ponte entre A Vingança dos Sith e Uma Nova Esperança, além de lembrar também à audiência que Leia tem uma importância maior na saga como um todo do que o Episódio IV parecia sugerir. Por sinal, temos pela primeira vez a chance de vivenciar Alderaan, planeta que até então teve apenas duas visitas “panorâmicas”, com apenas poucos segundos em tela: no Episódio III, quando a Leia bebê é levada aos Organas, e no Episódio IV, quando o mundo é destruído pela Estrela da Morte.
Pela primeira vez trafegando pela superfície, conhecemos a vida de luxo, riqueza e ritualismo da realeza de Alderaan. Bail Organa é um idealista, mas parece cercado de hipócritas. Seu cunhado, por sinal, parece muito satisfeito com a vida sob o Império Galáctico – o lucro está fluindo melhor que nunca, e temas como escravidão e impostos injustos são problemas que não lhe interessam. Nesse sentido, a série pega de onde A Vingança dos Sith entregou: normalmente uma ditadura gestada sob os escombros de uma democracia disfuncional se sustenta com o apoio das elites, que não estão preocupadas com temas como opressão e injustiça – até o dia em que a opressão chega para eles também. Sabendo do destino de Alderaan, toda a cena “política” do episódio serve como um conto cautelar que faria George Lucas orgulhoso. E o melhor de tudo: com diálogos mais efetivos e naturais do que os que o próprio criador de Star Wars engendrara para a trilogia prequela.
Do ponto de vista da execução da história, não há falhas dignas de nota. As atuações são todas excelentes, do deprimido Obi-Wan de Ewan McGregor à energética Reva, de Moses Ingram, passando pela incrível e brilhante pequena Leia de Vivien Lyra Blair. A direção de Deborah Chow é extremamente efetiva, produzindo angústia nos momentos certos enquanto vemos a opressão do que é viver sob o Império por meio do dia a dia de Obi-Wan. A potência da cena em que o Jedi Nari executado é visto exposto em praça pública é incrível, para citar um de vários momentos de destaque. Outro, nervoso e emblemático, é o encontro de Nari e Obi-Wan na noite desértica. São cenas como essas que tornam Star Wars uma experiência mais para ser sentida do que pensada, uma das marcas dos melhores momentos da saga.
Também vale um elogio ao design de produção, que consegue fazer uma ponte efetiva entre o visual das trilogias prequela e clássica. Nem tanto em Tatooine, que é sempre muito identificável em todas as (incontáveis) aparições, mas bastante em Alderaan, planeta cuja arquitetura só havíamos visto de cima até este momento. O design combina a ousadia da prequela com a praticidade e o “pé no chão” clássicos. O resultado final é uma harmonização na transição entre os dois períodos, algo que ajuda a contar a história. Afinal, para além da jornada pessoal de Obi-Wan, estamos testemunhando a gradual erosão da grandiosidade da velha República, substituída pelo aspecto estéril e militarista do Império.
Com o sucesso total desta Parte I, só resta a ansiedade de que a qualidade possa se sustentar ao longo de toda a produção.
Avaliação
Citações
“What about the people that need us? What about the fight?”
“The fight is done. We lost.”
“What happened to you? You were once a great Jedi.”
“The time of the Jedi is over. Go back to the town. Let it go.”
(E quanto às pessoas que precisam de nós? E quanto à luta?)
(A luta acabou. Nós perdemos.)
(O que aconteceu a você? Você já foi um grande Jedi.)
(O tempo dos Jedi acabou. Volte à cidade. Desista.)
Nari e Obi-Wan Kenobi
Trivia
- Originalmente planejada como um filme longa-metragem para cinema, a produção foi convertida em uma minissérie em seis partes para veiculação no serviço de streaming Disney+.
- A atração sofreu várias reescritas e trocas de roteiristas antes de ir diante das câmeras, o que aconteceu no fim de março de 2021. As gravações se estenderam até 19 de setembro.
- A canadense Deborah Chow dirigiu todas as seis partes de Obi-Wan Kenobi. Ela se tornou notória pela direção do filme O Preço da Vida (2010) e, mais tarde, por seu trabalho na série Jessica Jones, da Marvel, em 2018. Grande fã de Star Wars, dirigiu dois episódios de The Mandalorian antes de ser chamada para assumir Obi-Wan Kenobi.
- O tema principal de Obi-Wan Kenobi foi composto por John Williams, o principal músico da saga, mas o resto da trilha musical é assinado por Natalie Holt.
- Este episódio marca a primeira vez que vemos extensamente o planeta Alderaan a partir da superfície.
- Também temos a primeira aparição em live-action dos inquisidores, grupo de caçadores de Jedi introduzido na saga por meio da animação Star Wars: Rebels. Alguns fãs reclamaram que o design do Grande Inquisidor ficou muito diferente da versão animada.
- O brinquedo que Obi-Wan tenta dar a Luke neste episódio mais tarde acabaria indo mesmo parar com ele, e o vemos em Uma Nova Esperança.
- Amigo da diretora Deborah Chow, Flea, que aqui faz o sequestrador, é baixista da banda Red Hot Chili Peppers.
Ficha Técnica
História de Stuart Beattie e Hossein Amini
Roteiro de Joby Harold e Hossein Amini e Stuart Beattie
Dirigido por Deborah Chow
Exibido em 27 de maio de 2022
Título em português: “Parte I”
Elenco
Ewan McGregor como Obi-Wan Kenobi
Rupert Friend como Grande Inquisidor
Sung Kang como Quinto Irmão
Moses Ingram como Terceira Irmã (Reva)
Benny Safdie como Nari
Joel Edgerton como Owen Lars
Bonnie Piesse como Beru Lars
Simone Kessell como Breha Organa
Vivien Lyra Blair como Leia Organa
Flea como sequestrador
Jimmy Smits como Bail Organa
Podcast: Resenha Jedi
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Edição de Leandro Magalhães
Revisão de Salvador Nogueira