TNG 4×13: Devil’s Due

História discute altos e baixos da fé religiosa, mas não evita previsibilidade

Sinopse

Data estelar: 44474.5

Uma transmissão de emergência de uma estação científica da Federação leva a Enterprise ao planeta Ventax II, onde Picard e sua tripulação descobrem que os pacíficos habitantes estão para entregar o controle do planeta a Ardra, uma mulher que os habitantes locais acreditam ser o demônio.

Ardra é um ser mitológico que teria assinado um contrato com os ventaxianos, em que eles ganhariam mil anos de paz e prosperidade em troca de suas almas e seus pertences, incluindo todo o planeta, ao final desse período.

O governo de Ventax II está convencido de que Ardra realmente está de volta, mas Picard pretende provar que tudo não passa de uma fraude montada por uma alienígena para explorar a ingenuidade dos ventaxianos. Para isso, ele evoca um antigo precedente legal e pede por um árbitro.

Data é escolhido para a função. Ele deve presidir um julgamento e decidir se a mulher que diz ser Ardra realmente é a entidade mitológica.

Picard não se saía muito bem no julgamento, mas Geordi La Forge descobriu a fonte dos poderes de Ardra, uma nave camuflada em órbita, e tomou conta dela, permitindo a seu capitão que desmascarasse a fraude. A falsa Ardra retira seu pedido e abandona o planeta.

Comentários

“Devil’s Due” fez o que o ator e diretor William Shatner (James Kirk) queria com Jornada nas Estrelas V: A Última Fronteira, mas na ocasião não conseguiu: estabelecer uma visão crítica da fé religiosa. De forma inteligente, este episódio de A Nova Geração conseguiu apresentar a questão de modo a mostrar os dois lados – o que se ganha e o que se perde com as crenças.

Infelizmente, apesar do bom roteiro e dos argumentos inteligentes, o episódio deixa de ser um dos melhores da série por sua alta previsibilidade. Enquanto reflexão, é ótimo. Como aventura, deixa a desejar.

A partir do momento em que Picard decide apostar sua própria alma, temos a certeza de que Ardra de fato é uma impostora e será desmascarada ao final. Não fosse por isso, o mistério poderia ter se mantido e talvez os roteiristas pudessem optar por uma resolução menos óbvia para a trama.

Tirando esse importante senão, o episódio mantém as melhores tradições de Star Trek. Os personagens estão com o seu carisma habitual, e a química entre Ardra e Picard em particular funciona de forma interessante. Além do mais, o episódio serve para ativar os neurônios daqueles que preferem não ficar apenas na superfície da história que está sendo contada.

A fé opera de forma interessante. Em essência, o que ela faz é “desativar” o senso crítico das pessoas. Quando bem direcionada, ela é produtiva, fazendo com que se acredite na possibilidade de realizar tarefas cuja análise racional provavelmente indicaria pequena probabilidade de sucesso.

Foi por esse mecanismo que os ventaxianos obtiveram seus mil anos de paz e prosperidade, com a superação de problemas quase incontornáveis. A crença de que Ardra era a garantia de sucesso fez com que eles não se desanimassem na tarefa de recriar seu mundo.

Por outro lado, a “desativação” do lado racional pode ser muito perigosa. Fé sem um direcionamento correto pode ser usada por charlatães cuja única intenção é se aproveitar de crenças para delas obter algum benefício – exatamente como a falsa Ardra tenta neste episódio.

Aliás, estamos cansados de encontrar exemplos disso em nosso cotidiano. Inúmeras são as igrejas recém-fundadas que estão longe de ser guias genuínas para a fé das pessoas. Muito ao contrário, o objetivo quase sempre é levar vantagem sobre os pobres fiéis. E na vida real não há Enterprise, nem capitão Picard…

Avaliação

Citações

“Mr. La Forge, my reputation as a litigator, not to mention my immortal soul, is in serious jeopardy.”
(Sr. La Forge, minha reputação como advogado, para não falar na minha alma imortal, está em sério perigo.)
Jean-Luc Picard

Trivia

  • Algo parecido com essa história apareceu pela primeira vez na proposta original de Gene Roddenberry para a Série Clássica, em 1964. A trama depois foi desenvolvida em roteiro para a abortada série Phase II, nos anos 1970, e então resgatada, junto com “The Child”, para reciclagem para A Nova Geração, durante a segunda temporada. No roteiro da Phase II, escrito por William Douglas Lansford, o planeta se chamava Neuterra, e o diabo, masculino, era Komether. Kirk, naturalmente, fazia o papel de Picard.
  • A primeira tentativa de adaptar a história para A Nova Geração veio na terceira temporada, quando Melinda Snodgrass foi encarregada por Michael Piller de fazer uma reescrita leve, apenas trocando os personagens clássicos por seus equivalentes do século 24. “Não funcionou”, disse Piller, “e começamos a falar sobre o que poderíamos mudar para se encaixar melhor à nossa série”. Com isso, ele acabou não entrando no terceiro ano.
  • No hiato antes do quarto ano, Piller passou a tarefa a Philip LaZebnik, que reescreveu a história com ênfase em comédia. Piller adorou, mas nem todo mundo se sentiu assim. Muitas reescritas se seguiram, tentando torná-lo mais sério, e Piller deu o trato final, reintroduzindo tanto do humor de LaZebnik quanto possível. E uma alteração importante foi transformar Ardra em mulher, o que o produtor David Livingston descreveu como um “grande conserto”.
  • As atrizes Stella Stevens e Adrienne Barbeau disputaram o papel de Ardra, que acabou ficando com Marta Dubois, atriz que foi casada com Tom Selleck, do seriado Magnum. “Nós a trouxemos para várias audições e nunca achamos o papel certo para ela”, relembrou David Livingston. “Ela veio e arrebentou. Quer dizer, como poderia fazer melhor? Vamos começar a filmar. Cadê o figurino dela? Queremos mais disso. Estou sempre defendendo mais humor na série. Acho que ficamos um pouco sérios demais às vezes. É bom ser um pouco mais leve.
  • As cadeiras usadas na arbitragem eram adereços comuns e haviam sido usados no filme A Família Addams.
  • Não é a primeira aparição do que supostamente seria o Diabo em Star Trek. Antes desse episódio, tivemos Lucien, personagem que apareceu em “The Magicks of Megas-Tu”, da Série Animada original.
  • Michael Piller curtiu o resultado. “No final senti que o roteiro era muito engraçado e satisfatório. Era meio estranho para a nossa série e achei que suas origens ficaram aparentes, mas em última instância foi um episodiozinho engraçado e uma boa adição à nossa mistura.”
  • Jonathan Frakes (Riker) sentiu de onde a história vinha. “Era como um velho Star Trek. É irônico que fosse uma velha história de Star Trek, porque é realmente uma história do Kirk. Era tão anos 1960.”
  • “Devil’s Due” foi o episódio de maior audiência de A Nova Geração desde a estreia, com “Encounter at Farpoint”.
  • O episódio foi indicado a um Emmy de melhor figurino para uma série.
  • No começo, Data interpreta Scrooge para Picard em uma encenação de Um Conto de Natal, de Charles Dickens. Patrick Stewart viveria o próprio Scrooge em 1999, no filme para TV A Christmas Carol e, em seguida, ao vivo no teatro.

Ficha Técnica

História de Philip LaZebnik e William Douglas Lansford
Roteiro de Philip LaZebnik
Dirigido por Tom Benko

Exibido em 4 de fevereiro de 1991

Título em português: “O Pacto”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher

Elenco convidado

Marta Dubois como Ardra
Paul Lambert como Howard Clark
Marcelo Tubert como Acost Jared
Thad Lamey como Diabo
Tom Magee como monstro klingon

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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