TNG 3×12: The High Ground

Episódio sobre terrorismo dá voz a Beverly Crusher, mas não tem muito o que dizer

Sinopse

Data estelar: 43510.7

Um grupo avançado vai ao planeta Rutia IV, enquanto a Enterprise entrega suprimentos médicos ao governo local, que enfrenta uma série de ataques terroristas. Um novo atentado acontece, e Beverly Crusher decide tratar os feridos. Nisso, acaba sequestrada pelos criminosos, que conseguem aparecer e desaparecer instantaneamente.

Capturada, Crusher é persuadida pelo líder terrorista Kyril Finn a tratar dos doentes de seu grupo, que travam uma batalha separatista por Ansata, um dos continentes do planeta. Seu estado, contudo, é irrecuperável, afetados que estão pela tecnologia de transporte dimensional.

Na Enterprise, Wesley trabalha com Data e Geordi para descobrir um meio de rastrear a tecnologia dos terroristas. No planeta, Riker acompanha prisões e interrogatórios de suspeitos de envolvimento no atentado. O primeiro oficial usa um dos suspeitos para levar um recado aos terroristas, solicitando termos para a soltura de Crusher. Em resposta, Finn decide promover um ataque para destruir a Enterprise. Uma bomba é plantada no núcleo de dobra, mas Geordi consegue extraí-la e transportá-la antes da detonação. Um segundo ataque, desta vez à ponte, acaba tendo sucesso em abduzir Picard.

Crusher conversa com o capitão sobre as motivações de Finn, que aparentemente está apaixonado por ela. Picard diz que isso pode ajudá-los numa tentativa de fuga, mas eles nem têm tempo de agir. A Enterprise conseguiu rastrear o transporte dimensional, e Riker e Worf, com apoio das autoridades locais, comandam uma ação contra a base dos separatistas. Finn é morto. Uma criança ansata ameaça atacar, mas é persuadida a baixar sua arma, quando Crusher pede o fim das mortes — uma esperança de que talvez seja possível um dia atingir a paz naquele planeta.

Comentários

 “The High Ground” é um episódio até que corajoso e justificado em sua inspiração, ao lidar com um tema controverso como o terrorismo. Porém, a trama por vezes se arrasta e no fim das contas é um pouco frustrante que ele meramente apresente a questão de forma exaustiva sem endereçá-la satisfatoriamente. Como diz a chefe de segurança de Rutia, Alexana Devos, terminamos com “uma solução imperfeita para um mundo imperfeito”.

Apesar disso, o episódio faz algumas coisas do jeito certo. Ele consegue conciliar no personagem de Finn uma mistura convincente de um líder terrorista capaz de atos medonhos com alguém dotado de sentimentos e motivações que podem ter alguma legitimidade. E tudo isso sem deixar de enfatizar, a cada ponto do caminho, o horror imperdoável do que o caminho escolhido por ele representa.

O segmento também é um ótimo veículo para Beverly Crusher, até então muito pouco servida na série. Seu idealismo e sua ética médica se encaixam perfeitamente à história, nos lembrando de que a função de um médico é salvar vidas, não importa de quem, não importa contra quem estejam lutando ou como. É por partir de um “lugar moral” que não comporta julgamentos que Beverly pode transitar com facilidade entre os dois lados, vendo a situação em suas múltiplas dimensões.

Também é importante destacar o serviço que o episódio faz em expor um pouco da hipocrisia, ainda que possivelmente bem intencionada, da Federação, que negocia e apoia um governo num mundo em que questões internas ainda estão longe de resolvidas. Em “The Hunted”, vimos um planeta que pretendia se juntar à Federação, mas claramente ainda não estava pronto. Aqui, trata-se de um mundo que nem sequer iniciou o processo de entrada, mas que decerto também está aquém dos padrões federados. E isso não impede a Federação de dar apoio humanitário, com suprimentos médicos. Parece razoável à primeira vista, mas não é difícil entender como isso poderia ser visto como um endosso ao governo local. Dá a impressão de que a Federação não investiga direito a situação interna de planetas antes de aprofundar sua diplomacia com eles.

O que falta ao enredo, além de drama mais convincente, é uma exploração mais ampla do que leva ao terrorismo e de quais alternativas adequadas poderiam ser exploradas em uma demanda justa contra um regime inflexível. Do jeito que ficou, acabamos com a sensação de que se trata de uma situação inevitável, algo como “fatos da vida”, e até mesmo ouvimos que a suposta sensibilidade evoluída dos federados teria sido construída sobre uma história cheia de revoluções violentas e atos terroristas — o que não deixa de ser verdade, mas não precisa representar uma relação de causalidade.

Para não terminar nesse tom fatalista, o que destoaria completamente do estilo de Star Trek, acabamos com uma criança se rendendo — optando pela razão, em vez da violência –, num sinal de que sim, talvez seja possível mudar. Talvez aquele pequeno gesto seja o começo de uma transformação social mais ampla. Mas é quase um remendo, diante da impotência que sentimos em meio a uma situação que, do começo ao fim, parece escapar ao controle dos nossos personagens.

Ainda assim, Gates McFadden entrega uma boa atuação, num episódio talhado para seu personagem, e Richard Cox faz um excelente trabalho ao humanizar o líder de um grupo que perpetrou diversos atos horrendos. Talvez a missão fosse impossível se tivéssemos visto mais dos atentados que são apenas descritos ao longo da trama. Mas as restrições do formato de série familiar para televisão aberta impediram qualquer possibilidade nesse sentido.

Avaliação

Citações

“As a prisoner, he would have been a focus for violence as his followers tried to free him. Now he’s a martyr. But the death toll might go down, at least in the short term. It’s an imperfect solution for an imperfect world.”
(Como prisioneiro, ele teria sido um foco para violência, enquanto seus seguidores tentassem libertá-lo. Agora ele é um mártir. Mas a taxa de mortes pode cair, pelo menos no curto prazo. É uma solução imperfeita para um mundo imperfeito.)
Alexana Devos

Trivia

  • Com título original de “Strenght and Justice”, o episódio foi concebido para atender a uma demanda de mais roteiros no formato ação-aventura. A premissa original havia sido pensada como uma alegoria da independência dos EUA. E então veio a ordem para a roteirista Melinda Snodgrass mudar para uma analogia com a Irlanda do Norte e o terrorismo do IRA.
  • Snodgrass ficou extremamente insatisfeita com a mudança. “Eu queria ter Picard como Cornwallis e os romulanos seriam os franceses, que estiveram em nossa revolução, tentando libertar esse planeta. De repente Picard perceberia que ele é um dos opressores. Em vez disso, fizemos ‘Café da Manhã em Belfast’, onde nosso pessoal decide que vai para a Irlanda do Norte.”
  • Além de Snodgrass, muitos roteiristas ficaram frustrados com o resultado. Ronald D. Moore o descreveu como “uma abominação”. “É o nosso episódio terrorista. Não tínhamos nada de interessante a dizer sobre terrorismo, exceto que era ruim e Beverly é sequestrada. Eles a levam para as cavernas e vemos ótimos, longos discursos de pregação sobre terrorismo e liberdade, luta e forças de segurança versus sociedade. É um episódio muito insatisfatório e a equipe não estava feliz com ele.”
  • O showrunner Michael Piller entrou na fila das lamentações também. “Outro episódio com o qual eu não fiquei particularmente feliz. Partimos de fazer um episódio sobre terroristas. Qual era a ideia que transmitimos sobre terrorismo no episódio? A ideia era a de quando o garoto baixa a arma e dizemos, ‘Talvez o fim do terrorismo venha quando a primeira criança baixa sua arma?’ Foi efetivo no contexto daquele episódio, mas certamente não é uma afirmação que fornece qualquer grande revelação. Você precisa estar preparado para dizer algo novo sobre questões sociais.”
  • O roteirista Brannon Braga, que se juntaria à equipe apenas na temporada seguinte, achou que o problema vinha da origem. “Muito raramente começamos pensando sobre um episódio em termos de uma questão. Vamos fazer um episódio sobre Aids, vamos fazer um episódio sobre terrorismo. Raramente pensamos assim. Nós normalmente pensamos em termos de sacadas legais de ficção científica e é isso que nos leva na direção de ‘o que é a história e quem está nela?’.”
  • A tecnologia do transporte dimensional foi criada para responder à preocupação de Gene Roddenberry de que os terroristas tivessem um método lógico para derrotar a tecnologia da Enterprise-D.
  • As filmagens desse episódio se deram em meados de novembro de 1989, e a praça de Rutia foi filmada no estúdio 9 da Paramount.
  • O episódio gerou controvérsia no Reino Unido e na Irlanda e não foi exibido com o resto da temporada por lá, em razão de suas referências à reunificação da Irlanda (que supostamente ocorreria em 2024 e guiada por terrorismo).

Ficha Técnica

Escrito por Melinda M. Snodgrass
Dirigido por Gabrielle Beaumont

Exibido em 29 de janeiro de 1990

Título em português: “Tudo Pela Causa”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher
Wil Wheaton como Wesley Crusher

Elenco convidado

Kerrie Keane como Alexana Devos
Richard Cox como Kyril Finn
Marc Buckland como garçom
Fred G. Smith como policial
Christopher Pettiet como menino

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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