Episódio ferengi escapa de polêmica e consegue ser bom entretenimento
Sinopse
Data: Desconhecida
A Enterprise é abordada por uma pequena nave ferengi. Todos os tripulantes estão inconscientes, graças a uma armadilha montada pelos alienígenas. Na última missão de exploração, um grupo da Enterprise havia trazido um estranho artefato a bordo. Quando ele foi ativado, na engenharia, disparou um gás pelos sistemas da nave, deixando toda a tripulação prostrada. O único que escapa do embuste é Tucker, que, por sorte, está passando por processo de esterilização na câmara de descontaminação.
Os ferengis passam a recolher tudo que parece ser de algum valor, mas estão mesmo à procura do cofre da nave. Quando a busca não tem sucesso, eles resolvem aprisionar e interrogar o capitão Archer. Ao ser questionado sobre o cofre, o capitão diz que a Enterprise não possui um. Mesmo apanhando, Archer mantém sua versão. Somente quando os ferengis ameaçam deixar a nave, levando as mulheres para vender como escravas, que Archer resolve dizer que há, sim, um cofre. Ele promete mostrar aos alienígenas onde ele fica, caso eles concordem em dividir as barras de ouro em partes iguais, metade para Archer, metade para eles.
Ulis, o líder do grupo, recusa a oferta, mas decide ficar a bordo para procurar mais o cofre. Ele ordena ao mais jovem dos quatro, Krem, que comece a levar o fruto do saque para a nave deles. Quando o rapaz, que é sobrinho de Ulis, protesta, o capitão ferengi sugere que ele obrigue Archer a fazer o trabalho, o que ele acaba achando uma boa ideia.
Os dois vão transportando coisas para a nave ferengi e o capitão da Enterprise começa a tentar se aproximar de Krem, para convencê-lo de que ele merece mais do que servir a seus outros três “colegas”. Enquanto isso, Tucker desiste de esperar a autorização do dr. Phlox para sair da câmara de descontaminação e já está perambulando pela nave. Ele vê seus colegas caídos e tenta descobrir o que aconteceu. Não demora a entender que a nave foi invadida por alienígenas.
O engenheiro se esconde, para evitar a captura. Não encontra nenhuma arma nos armários da nave, todas roubadas pelos ferengis. Mas segue monitorando o grupo pelos sistemas de câmeras. Ele descobre onde está Archer e vai ao encontro dele. O capitão, ao ver Tucker por perto, pede que Krem busque água para ele no refeitório. O ferengi o algema em uma barra no corredor e atende ao pedido. Quando ele se vai, Archer e Tucker têm a chance de conversar. O capitão diz que tem uma ideia, mas afirma que Tucker precisará de mais gente para executá-la. Ele pede que o engenheiro vá até a área de carga e use a hipospray deixada pelos ferengis para despertar outros tripulantes. Enquanto Krem está voltando, Tucker parte.
Chegando na área de carga, ele desperta T’Pol. Tenta também acordar Hoshi, mas a hipospray já está vazia. Com a ajuda da vulcana, ele começa a colocar o plano de Archer em prática. Enquanto os dois estão na área de carga, Archer e Krem entram em cena. T’Pol finge estar inconsciente e Tucker se esconde. O ferengi pergunta sobre a vulcana, claramente atraído, mas Archer diz que ela não é interessante. Os dois deixam o local e Tucker prepara-se para dar mais um passo no plano. Ele vai até uma região em um deque inferior da nave e coloca uma trava, para simular um cofre. Ao mesmo tempo, T’Pol está atuando silenciosamente para colocar os ferengis uns contra os outros, pegando bens de um e colocando nas coisas do outro.
Enquanto isso, Archer propõe a Krem que esqueça seus amigos e se alie a ele. Os dois poderiam dividir o ouro e o subordinado ferengi poderia chegar ao sonho de ter sua própria nave. Krem se recusa e o capitão vê que precisará de outro meio para retomar a Enterprise.
Tucker, andando pelos corredores, acaba sendo capturado por Ulis e os ferengis o levam para a área de carga, onde Archer está preso. O capitão demonstra surpresa com o fato de seu engenheiro estar acordado e diz que não sabia do fato. Os invasores finalmente decidem partir com o que já pegaram e com as mulheres, antes que outros também despertem. Tucker, entretanto, fica furioso e diz que não deixará que levem sua esposa, Hoshi. Ele propõe aos ferengis mostrar o cofre em troca de sua mulher, o que os alienígenas logo concordam. Archer, por sua vez, ordena que Tucker não faça isso. Os dois brigam e chegam a sair no braço, mas Archer acaba detido pelos alienígenas e Tucker os leva para onde seria o cofre.
O único que não acompanha o engenheiro é Krem, mais uma vez ordenado por Ulis. Mas, na nave ferengi, quando T’Pol finalmente mostra que já não está mais inconsciente, ele fica transtornado. Ela diz que é uma vítima dos humanos e que está lá contra sua vontade, seduzindo-o. Ele pede que ela acaricie seus lóbulos, o que serve como pretexto para que ela o renda, com um toque neural vulcano. Recuperando uma arma, ela segue para o deque inferior da nave.
Tucker leva uma eternidade para achar o “cofre”. Quando os três ferengis finalmente o encontram, descobrem apenas uma sala vazia e T’Pol, já os esperando, nocauteia-os com tiros de pistola de fase. Rendidos, os quatro invasores são obrigados a devolver tudo que roubaram e partir. Archer os instrui a ficar bem longe de qualquer nave humana ou vulcana, com o que eles concordam. A Enterprise, entretanto, nunca fica sabendo a que raça pertenciam os alienígenas invasores…
Comentários
Antes da exibição, a abordagem dos fãs para com “Acquisition” certamente era “torça pelo melhor, espere pelo pior”. Afinal de contas, tudo que Enterprise não precisava era da presença ferengi, que já não era tão apreciada nem onde ela cabia, no século 24. Mas a verdade é que, contrariando a lei das probabilidades, este episódio acaba se saindo como um bom esforço de comédia para a série, melhor que a tentativa anterior, com a gravidez de Tucker em “Unexpected”.
O fantasma da continuidade, a maior preocupação dos fãs, não foi definitivamente afastado, mas, dadas as condições do jogo, foi graciosamente colocado de lado. Archer nunca fica sabendo a que espécie pertencem os invasores de sua nave, deixando para Picard, dois séculos depois, a descoberta de quem são os ferengis. Essa estratégia, não mencionar a palavra “ferengi”, pode até funcionar para efeito de suspensão da descrença, mas é óbvio que não se sustenta em um contexto mais amplo.
Afinal, o grande problema não é que os ferengis sejam ou não reconhecidos aqui, mas sim que eles estejam longe da Terra o suficiente para somente serem encontrados no século 24. Olhando por essa perspectiva, ter uma aparição ferengi em Enterprise vai contra o bom senso, embora, em termos técnicos, esteja 100% de acordo com a cronologia. O que nos leva à segunda grande questão: por que diabos os produtores quiseram trazer os ferengis para a série, contrariando todas as recomendações?
Aparentemente, o episódio nos leva a crer que se trata de uma piada para a audiência. Lidar com um problema de continuidade de forma bem-humorada, lembrando que tudo é possível se a boa vontade for suficiente. Isso já foi feito antes, em Deep Space Nine, quando Worf faz um precioso comentário sobre a aparência dos klingons durante a Série Clássica (em “Trials and Tribble-ations”): “Não comentamos isso com forasteiros”. Em outras palavras — esqueça a coisa toda.
Da mesma forma, a aparição ferengi aqui faz questão de jogar com o desespero do fã. E deixar claro que os produtores estão de olho e atentos às questões de continuidade. Depois do susto de ver que os orelhudos baixinhos estão na série errada, acabamos obtendo algumas frases interessantes, escritas sob medida para os fãs. O maior exemplo disso é quando Archer está despachando os alienígenas subjugados e diz, enfaticamente, algo como “Se vocês aparecerem perto de naves da Terra ou de Vulcano, estão encrencados”, ao que os ferengis respondem, medrosamente, “Não se preocupe, você nunca vai nos ver de novo”.
É impossível não apreciar inside jokes como essa, porque elas demonstram uma das muitas diferenças que Jornada nas Estrelas tem com relação a outras séries de televisão: é possível partilhar as piadinhas com o público. Os produtores, roteiristas e fãs acabam alinhados do mesmo lado, apreciando a complexidade do franchise e a malandragem de quem o está fazendo. É como a frase de Worf, em Deep Space Nine: o subtexto fala muito mais do que as palavras em si.
Uma vez que você entra nesse clima e senta para acompanhar “Acquisition”, trata-se de um episódio bem divertido. Tudo bem, a tripulação da Enterprise foi rendida com um truque muito barato — um dispositivo misterioso trazido a bordo que, quando ativado, libera um gás por toda a nave e derruba todo mundo –, mas tudo em nome do show. Até isso lembra os velhos ferengis, que adoram geringonças e dispositivos para criar seus embustes (vide a tortura ao capitão Picard em “The Battle”, um dos primeiros episódios ferengis da história de Jornada).
Os elementos ferengis do episódio foram escolhidos de maneira bastante acertada, equilibrando a nostalgia dos primeiros orelhudos da Nova Geração e o caráter dos alienígenas que surgiria mais tarde, principalmente em Deep Space Nine. É um prazer rever o chicote ferengi, visto pela primeira vez em “The Last Outpost” e depois abandonado, mas, ainda assim, respirar aliviado pelo fato de os alienígenas não andarem pulando e se contorcendo como macacos, tal qual fizeram no tal episódio. Até em termos históricos a cultura ferengi é enriquecida: sabemos agora que, em 2151, só havia 173 Regras de Aquisição. O número subiria para 285 no século 24.
Agora, o que melhor funciona no episódio é que o destaque não é dado aos alienígenas em si, mas à interação deles com nosso trio principal, Archer, Tucker e T’Pol. Aliás, Archer se mostra muito mais rápido e astuto ao manipular os ferengi aqui do que para lidar com os klingons em episódios anteriores. O que não só joga a favor do nosso capitão, como também ajuda a mostrar a diferença que a premissa da série faz para a história.
Para Picard e sua trupe, os ferengis eram verdadeiramente alienígenas, uma cultura que em muito se afastava do que os humanos agora acreditavam como ideal de vida. Para a turma do século 24, era muito mais difícil entender como lidar com os baixinhos. Em compensação, Archer, muito mais próximo dos gananciosos humanos dos séculos 20 e 21, se adapta em questão de minutos ao modo de pensar ferengi. É uma presença sutil da premissa da série, mas ainda assim apreciável.
Outra coisa que brilha é a interação entre Archer e Tucker. De forma similar à que vimos em “The Andorian Incident“, parece que basta uma troca de olhares para que um saiba o que o outro está pensando e o que deve ser feito a seguir. É o tipo de relacionamento que brilha em uma série, como aconteceu com os inesquecíveis Kirk, Spock e McCoy.
O único momento de Archer em que o telespectador fica incomodado (e com razão) é quando os ferengis se prestam a surrar nosso capitão. Não sei de vocês, mas eu já estou cansado de ver Archer apanhar, apanhar e apanhar, sem razão ou reação por parte dele. Virou um clichê da série.
T’Pol ainda está um pouco afastada dos outros dois, no que diz respeito a essa química, mas ainda assim parece que está caminhando na direção certa. Ela me pareceu “engraçadinha” demais para uma vulcana, aplicando oo-mox em Krem antes de apagá-lo com o toque vulcano. Poderia ter dispensado o apelo sexual e teria tido sucesso da mesma forma. Só não vou reclamar da cena porque ficou engraçada. Mas que atentou contra a dignidade da personagem, atentou.
Em compensação, o diálogo dela com Archer ao final do episódio, quando o capitão ordena que ela o liberte, parece ter encontrado o equilíbrio certo. T’Pol está irônica como Spock, mas não chega a ser absurdamente emotiva, protegendo seu jeito vulcano de ser. E a troca de palavras e de olhares é hilariante. André e Maria Jacquemetton acertaram na mosca.
Outro atrativo do episódio é a presença dos convidados Ethan “Neelix” Phillips, Jeffrey “Weyoun” Combs e Clint “Balok” Howard. Desses, o que mais brilha sem dúvida é Combs, que está se mostrando cada vez mais uma das preciosidades de Enterprise. Ele foge perfeitamente a seus personagens anteriores, que incluem até mesmo um ferengi (Brunt, de DS9). Os outros não comprometem, mas a personalidade unidimensional de seus personagens não ajuda muito.
Finalmente, o elemento comédia. Na maior parte do tempo, funciona maravilhosamente. Os ferengis tentando estabelecer contato com Porthos são hilários, assim como a briga falsa entre Archer e Tucker e o verdadeiro tour que o engenheiro dá aos ladrões antes de chegar ao “cofre”. Genial.
No fim das contas, trata-se de um segmento competente de Enterprise. Apesar de todos os senões, “Acquisition”, sem dúvida, rendeu mais do que se poderia esperar dele. Os primeiros 15 minutos, em que a audiência só pode entender os diálogos se estiver diplomada na língua ferengi, não chegam a cansar e, depois que o tradutor universal começa a funcionar, a coisa realmente engrena. Não é um episódio brilhante, mas que sempre vai trazer lembranças agradáveis ao fã, servindo até como um tributo à neura da continuidade e da cumplicidade que pode existir entre quem faz a série e quem a vê.
Avaliação
Citações
“Just because a guy’s in his underwear, you assume the worst.”
(“Só porque um cara está de cuecas, você pensa no pior.”)
Tucker
“Not that interesting… no sense of humor… always complaining.”
“I’ll make it up to you.”
“How?”
(“Não tão interessante… sem senso de humor… sempre reclamando.”)
(“Eu vou te compensar.”)
(“Como?”)
T’Pol e Archer
“Five bars of gold?”
(“Cinco barras de ouro?”)
Archer
“You’ll never see us again.”
(“Vocês nunca vão nos ver de novo.”)
Ferengi
Trivia
- Embora o início do episódio seja todo falado em ferengi, foi possível conhecer o diálogo do prólogo graças a um trecho do roteiro que acabou chegando à internet. Confira a transcrição, traduzida para o português:
ULIS
(impaciente)
Kora noosa? Kora noosa?
[Alguma coisa? Alguma coisa?]MUK
(virando do console)
Irr zoun nagool ahsp.
[Não estão respondendo aos chamados.]ULIS [Bom.]
(para Grish)
Cucht eeta ekrajhn-voy?
[O que suas leituras dizem?]GRISH
(trabalhando, satisfeito)
Irr gnales. Nohm setron quetsiVoo!
[Eles estão vivos, mas inconscientes. Funcionou!]ULIS
NanDi!
[Excelente!](para Grish)
Vaneeday.
[Leve-nos para dentro.] - Este episódio é cheio de estrelas convidadas. Clint Howard já apareceu antes na Série Clássica (“The Corbomite Maneuver”), como Balok, e em Deep Space Nine (“Past Tense, Part II”), como Grady. Jeffrey Combs é bem conhecido do público como Weyoun (DS9), Brunt (DS9) e Shran (Enterprise). Ethan Phillips é o mais conhecido dos três, interpretando Neelix durante sete temporadas em Voyager.
- Cronologicamente, esse foi o primeiro encontro da humanidade com os ferengis. Tecnicamente, foi o segundo, pois em 1947, em Roswell, Novo México (EUA), uma nave ferengi com Quark, Rom e Nog a bordo teria se chocado na Terra (“Little Green Men”, de DS9). Entretanto, em nenhuma das duas ocasiões os alienígenas foram associados ao nome “ferengi”, de modo que a primeira identificação positiva coube a Jean-Luc Picard e à Enterprise-D, no episódio “The Last Outpost”.
- Segundo Krem, há nessa época 173 Regras de Aquisição. O número subiria para 285 no século 24. Aqui são mencionadas quatro:
Número 45 – Expanda ou morra (essa é conhecida pelo número 95 no século 24)
Número 06 – Nunca permita a família ficar no caminho do lucro (essa já havia sido mencionada em “The Nagus”, de DS9)
Número 23 – Nada é mais importante que sua saúde… exceto seu dinheiro
Número ? – Um homem apenas vale a soma de suas posses. - Segundo Connor Trinneer, muito de seu trabalho neste episódio foi correr de cuecas pela nave. “Literalmente, eu não digo uma palavra hoje. Estou só correndo por lá com minha roupa de baixo.”
- O produtor-executivo Brannon Braga não definiu a coisa de forma muito diferente. “Os ferengis tomam a nave e Trip passa o episódio todo com suas roupas de baixo, correndo pela nave como Bruce Willis.”
Ficha Técnica
História de Rick Berman & Brannon Braga
Roteiro de Maria & Andre Jacquemetton
Dirigido por James Whitmore, Jr
Exibido em 27 de março de 2002
Títulos em português: “Aquisição”
Elenco
Scott Bakula como Jonathan Archer
Jolene Blalock como T’Pol
John Billingsley como Phlox
Anthony Montgomery como Travis Mayweather
Connor Trinneer como Charlie ‘Trip’ Tucker III
Dominic Keating como Malcolm Reed
Linda Park como Hoshi Sato
Elenco convidado
Jeffrey Combs como Krem
Ethan Phillips como Ulis
Clint Howard como Muk
Matt Malloy como Grish
Enquete
Edição de Mariana Gamberger
Revisão de Nívea Doria