O resort hospitalar do planeta do Dr. Moreau
Sinopse
Data estelar: 57752.6.
Depois de longo dia de trabalho, os alferes estão tão cansados que nem se importam em bancar os dorme-sujos e já vão para a cama. Contudo, Tendi apresenta para eles A Cachorra, uma labradora fêmea que consiste em seu projeto científico, criado depois de muito biotecnoblablá. Os alferes não dão muita bola e afirmam para a órion que aquilo parece ser apenas uma velha e boa vira-lata caramelo, mas basta Tendi dar as costas para os alferes aprenderem alarmados que aquela é uma Vira-lata Caramelo do Espaço, no que A Cachorra se contorce em uma sinistra pose aracnídea e sai andando pelas paredes do alojamento.
Mais tarde, Mariner fica sabendo que, depois de Freeman, Ransom e Shaxs serem designados para uma operação de forças especiais de agricultura ou coisa semelhante, a nave terá o comando temporário de um capitão visitante. Boimler se mostra animado para liderar o Cordão dos Puxa-Sacos para o novo capitão, mas ela afirma que capitães temporários são sempre uns pentelhos, pois não entendem picas das operações regulares da nave.
Boimler encontra Rutherford no muquifo onde trabalham, e o alferes lamenta não ter uma troux… digo, um voluntário para testar ajustes de teleporte que está desenvolvendo. Boimler se oferece animado, mas depois de algumas teleportadas, a mais recente delas trava nos milisegundos finais do processo, o que deixa Boimler inteiro e sólido, mas faseado em relação ao resto da nave e com o típico ruído de teleporte ecoando continuamente.
Na ponte, Mariner está entre os tripulantes que recebem o capitão visitante, e depois da equipe descer do turboelevador, a alferes se dá conta de que se trata de Amina Ramsey, uma velha parça dela dos tempos de Academia da Frota. Ramsey apresenta Mariner para a sua equipe, composta de uma trill, um rigeliano e uma vulcana, que comentam conhecer Mariner de reputação, embora se mostrem surpresos com o fato de ela ainda ser uma alferes. Boimler escolhe bem essa hora para se apresentar à ponte, mas o seu estado faseado e principalmente o irritante efeito sonoro do teleporte baratinam todos ali e Ramsey ordena Boimler a se apresentar à enfermaria, o que o deixa desapontado.
T’Ana e Rutherford trabalham para resolver o enrosco de Boimler, mas o melhor que conseguem é interromper o ruído de teleporte. T’Ana sugere que é melhor transferi-lo para a Divisão 14, especializada no estranho, no bizarro e no inesperado. Boimler fica desconfiado, mas T’Ana comenta que ele será levado a um resort hospitalar onde terá o melhor dos cuidados e aproveita para mandar junto A Cachorra, com a qual anda invocada pelo fato de o bicho não parar com suas bizarrices. Tendi vai acompanhá-los na jornada.
Enquanto Mariner fica xeretando com os cacarecos da mãe, ela e Ramsey jogam alguma conversa fora sobre o torpedo do Ransom e como capitães visitantes não são exatamente bem vistos pelas tripulações, razão pela qual Ramsey pede a Mariner para ser a primeira oficial dela. A alferes aceita animada, embora dê demonstrações privadas de dúvidas.
Depois de deixarem Boimler, Tendi e A Cachorra na USS Osler, a sinistra nave da Divisão 14 com seu sinistro comandante edosiano, a Cerritos chega em Khwopa para reparos no sistema de filtragem de água do planeta. Mariner, Ramsey e o time da capitão teleportam para o local e iniciam os trabalhos, onde Mariner se mostra atrapalhada e esquecida, além de ficar comentando bobagens sobre as quais Ramsey preferiria que seu time não soubesse. Apesar de alguns contratempos, finalizam o trabalho e seguem para um encontro com a USS Rubidoux.
Na Osler, Boimler e Mariner encontram um alferes cujo corpo está com uma metade envelhecendo e a outra metade rejuvenescendo, e ele apresenta ao grupo outros oficiais federados com inúmeras anormalidades bizarras. Ele afirma que a Frota os está mantendo na Osler para não ter de lidar com o problema e que na realidade “A Fazenda” é apenas um mito. Enquanto Tendi leva A Cachorra para passear pela nave, o alferes meio velho/meio jovem junta Boimler e os outros esquisitos para planejar um motim. Boimler, é claro, alerta o edosiano em comando e pede que ele seja compreensível com os malucos, mas o cara e seus seguranças rendem o grupo à ponta de feiser e agradecem pela ajuda de Boimler, o que não ajuda com a popularidade do alferes entre o grupo de esquisitos.
A Cerritos encontra a Rubidoux à deriva e sem energia. Ramsey, Mariner e seu time teleportam para a ponte e começam a investigar. Enquanto Durga vai reestabelecer a energia da nave, Ramsey e Mariner procuram a tripulação. Caminhando pela nave, Ramsey comenta como mal consegue reconhecer Mariner, devido às atitudes atrapalhadas dela. Elas encontram a tripulação escondida, e a capitão Dayton alerta para não reativarem a energia da nave ou o alienígena dentro dela vai acordar, o que acaba ocorrendo por Ramsey não conseguir alertar Durga a tempo.
A entidade alienígena começa a comprometer o casco da nave, e o time inicia uma evacuação, com o grupo se deslocando até a ponte para a Cerritos conseguir uma trava de teleporte. Ao ver Mariner absolutamente focada e eficiente, Ramsey se dá conta de que ela estava se fazendo de sonsa para que Ramsey não acabasse encorajada a desejá-la como primeira oficial em caráter permanente, enquanto Mariner contra-argumenta que não tem realmente tanto interesse em seguir as prerrogativas de comando, às quais a amiga galgou em sua carreira.
Enquanto isso, o grupo de esquisitos encurrala Boimler em uma comporta de ar, onde finalmente o efeito de teleporte se dissipa. Mas eles não querem nem saber e abrem a comporta para ejetá-lo da nave, e Boimler cai em um gramado, pois a Osler havia pousado na Fazenda. O endosiano os apresenta a aquele luxuoso resort hospitalar da Frota, com todos se dando conta de que estavam equivocados e o local de fato existe.
Enquanto o grupo é recepcionado pelas enfermeiras, Tendi se despede d’A Cachorra, com Boimler fazendo-a entender finalmente que não foi exatamente um cão que ela criou, por não saber nada sobre cães em primeiro lugar. No que Boimler já se preparava para curtir a companhia das enfermeiras, o alferes meio velho/meio jovem aponta que ele não é mais um esquisito e então Boimler acaba eliminado da Fazenda. Decepcionado, ele parte em uma nave auxiliar da Frota com Tendi, para retornarem à Cerritos.
Na Rubidoux, o grupo em fuga se concentra na ponte, enquanto a criatura continua a despedaçar a nave. Devido ao grande número de pessoas, o teleporte vai levar muito tempo. Vários deles lutam com a criatura e procuram se segurar o máximo que podem, o que faz Mariner exigir que Rutherford utilize o processo que usou em Boimler, e a Cerritos consegue então teleportar todos no último instante, embora todo o grupo fique faseado da mesma forma que o alferes – mas a salvo.
Algum tempo depois, o efeito do teleporte se dissipa, e Ramsey e Mariner conversam a respeito de seus prospectos para o futuro de suas carreiras, com ambas deixando as possibilidade em aberto. Depois de Ramsey lidar com um xaveco furado por parte de Ransom, as duas observam a entidade alienígena viajar pelo espaço pela vista do bar panorâmico da Cerritos.
Comentários
“Much Ado About Boimler” é um episódio que teve tramas bastante distintas, uma até razoavelmente séria considerando a proposta da série, enquanto a outra foi galhofa pura. Com ists, a série continua suas manobras para se adequar à intenção de ser uma comédia situacional no universo de Star Trek, e este episódio faz bastante disso ao adotar esses tons distintos em suas tramas da semana. O receio em um episódio nesse estilo é que isso poderia deixá-lo bem desequilibrado, mas o resultado final aqui até que foi bem redondinho.
Primeiro, tivemos a trama centrada em Mariner, com a capitão Ramsey tomando comando provisório da Cerritos e tendo que estar em comando de sua antiga colega de Academia. Aqui tivemos a trama mais séria e a que mais procura remeter ao estilo visto especialmente em A Nova Geração, particularmente “Chain of Command”, incluindo pessoal da Cerritos sendo afastado para operação especial nonsense, e Jellico é até nominalmente citado – a reputação do sujeito não deve ser das melhores na Frota.
Foi uma maneira diferente de abordar uma questão ampla sendo desenvolvida, que é o que Beckett Mariner deseja para si. “Moist Vessel” se aproximou dessa questão pelo ângulo da mãe e comandante, enquanto “Much Ado About Boimler” o faz pelo ângulo de uma amiga e colega de Academia. O aspecto de Mariner querer escapar de se compromissar com Ramsey pagando de tonta ficou transparente, é claro, dados a cena no gabinete da capitão da Cerritos e o conhecimento prévio que temos dela, mas foi nisso que a carga de piadas dessa trama surfou – Mariner “esquecer” tricorders, e a sujeirada toda que resultou disso, ficar se atrapalhando com controles etc.
Essa parte do episódio focou no desenvolvimento da alferes, fazendo elas baterem cabeça quando a chapa esquentou, e aí Ramsey ver a mudança de atitude de Mariner. Elas não pareceram curtir muito o que cada uma delas se tornou: Ramsey lamenta que Mariner se recusa a crescer e desenvolver o potencial que demonstrava, enquanto Mariner acha que Ramsey cresceu demais, no sentido de esquecer quem ela já foi um dia. No final, ambas conseguem conciliar os desejos pessoais de cada uma para com a amiga com aquilo que efetivamente elas desejam para si mesmas, deixando futuras possibilidades em aberto.
Uma colega de Academia de Mariner já atingir o posto de capitão exige alguma combinação de fatores para a conveniência da situação: digamos, elas não terem sido necessariamente graduadas no mesmo ano, Ramsey ser um prodígio e subir de posto rapidamente, a sua promoção a capitão ser recente (o que é sugerido no diálogo do episódio) etc. Dá para encaixar na suposta linha do tempo necessária para não sugerir que Mariner teria uma idade muito maior que as dos demais protagonistas.
Do outro lado do episódio, tivemos uma divertida situação de comédia absurda com a nave dos amaldiçoados, em uma coleção de bizarrices bem engraçadas e com várias referências aqui e ali. Nessa trama, a intenção não era obviamente entregar nenhum estudo de exploração da condição humana que eleve o desenvolvimento do personagem e tenha um admirável payoff idílico e paradas deste tipo – tratou-se apenas de vermos um cara e uma mina que se misturaram com uns malucos sinistros e todos acabam descobrindo que não era bem assim a coisa. The end.
Para esse fim, a trope de Jornada a ser aloprada desta vez foi a velha e boa mania de determinados departamentos da Frota adorarem um teatrinho básico, Seção 31 em particular, com Georgiou, Leland, Sloan e seus cupinchas adorando bancar os Rejeitados da Matrix com suas roupitchas de couro e pose de pimpão, por exemplo. Em relação a “ambientação” e maneira de se retratar elementos sinistros, é algo que nunca realmente encaixou como uma luva na franquia, mesmo nas ocasiões em que era feita da maneira mais “séria” possível – embora seja importante ressaltar aqui que isso se aplica à embalagem das tramas desse tipo em Jornada, não o seu conteúdo em si, pois certamente muito do que está relacionado à Seção 31 entregou grandes momentos em Deep Space Nine, claro.
Uma armadilha na qual se poderia cair durante o episódio, mesmo depois de se descobrir que a Fazenda era exatamente aquilo que prometiam ser, seria de se entrar em um modo “Ainnn mas a Frota não faria uma coisa dessas” (mesmo Tendi adianta esse questionamento no diálogo). Sim, mas a Frota (no todo ou parte dela) também não faria um monte de outras coisas: conspirar para derrubar o governo federado (“Paradise Lost”), roubar planetas na calada da noite (Jornada nas Estrelas: Insurreição), querer perpetuar guerra fria (Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida), ter exceções à Primeira Diretriz para meter o pé na porta quando bem entender (“The Omega Directive”) etc. Ela agir fora de certos critérios não é novidade, portanto.
Tudo isso até soa pior do que a Divisão 14 ter meramente falta de noção em fazer o transporte dos afetados por maluquices espaciais usando o edosiano sinistro e sua nave-batmóvel, então não acho que seja realmente tema para incomodar. Sinceramente, apesar de ser racionalizável, incomoda mais Billups e Ransom sugerirem em duas ocasiões diferentes que “alienígenas recém-descobertos estão na Federação” do que a Divisão 14 e sua nave.
O aspecto relacionado com A Cachorra foi legal na medida que era divertido ver que não havia nada que fizesse Tendi desanimar em seu compromisso com o animal. Tendi tem todo o jeitão de ser mesmo uma pessoa que adoraria cães, se ela soubesse o que um cão é, pois pareceu que tudo o que a moça aprendeu sobre cães foi através de desenhos animados terráqueos do século 20. Eu queria algo da série que invocasse sua origem órion, e, embora não tenha sido exatamente o que tivemos (algo que dizia mais respeito ao fato de ela não ser terráquea do que ser órion), podemos começar por aí.
Poderíamos imaginar que o fato de que a Federação não gosta de manipulação genética impediria a moça de criar A Cachorra, mas fora o lance de isso ser proibido em seus cidadãos, várias outras coisas parecem ser permissíveis – quadrotriticale é um grão transgênico, afinal de contas. De certa forma, os eventos vistos em “Unnatural Selection”, da segunda temporada de A Nova Geração, se relacionam com os daqui. Independentemente de ter dado errado, a prerrogativa utilizada por Sara Kingsley para criar aquela molecada pode ser a mesma usada por Tendi para criar A Cachorra: aquilo não foi manipulação genética de um ser existente, mas sim uma criação do zero através de engenharia genética. Se isso é ou não correto já são outros quinhentos créditos federados, mas Tendi teria tanto direito de realizar um experimento em si quanto Sara Kingsley teve. E sim, eu sei que aquele episódio precede vários onde explicitam que experimentação genética tem sérias restrições, mas o episódio ainda está lá no cânone e é válido.
No todo, um episódio que algumas vezes aparenta querer ficar desequilibrado e prestes a derrapar, mas conclui de maneira redondinha e nos entrega um resultado bem divertido.
Avaliação
Citações
“Wake me up if it turns into something I need to care about.”
(Me acordem se virar algo com o qual eu precise me preocupar.)
Mariner, sobre A Cachorra
“Wait, you named it ‘The Dog’?”
“Of course. Why wouldn’t I?”
(Espera, você deu o nome de ‘A Cachorra’?)
(Claro que sim. Porque não daria?)
Rutherford e Tendi, sobre o nome da criatura
“All right. Let’s do this… Number One.”
(Muito bem. Vamos fazer isso… Número Um.)
Ramsey para Mariner, sobre ela aceitar trabalharem juntas
“I must warn you, stepping aboard this vessel is consent to be surrounded by dark abnormalities and the clinically obscene.”
(Eu devo os alertar, vir a bordo desta nave é aceitar estar cercado por obscuras anormalidades e por obscenidades clínicas.)
Especialista da Divisão 14, recepcionando Boimler e Tendi
“We have two of everything.”
“Almost everything.”
(Nós temos dois de tudo.)
(Quase tudo.)
Alferes Ellis e tenente Sanderson, sobre estarem fundidos por acidente de teleporte
Trivia
- Apesar das orelhas pontudas, uma tripulante da Rubidoux e as enfermeiras da Fazenda pareciam alegres demais para serem vulcanas, o que sugeriria serem de alguma outra espécie vulcanoide.
- Este foi o quinto episódio de Lower Decks, dos sete até o momento, em que algum tripulante utilizou roupas de atividade extraveicular. Algo mais fácil de se realizar dada a natureza da mídia em que é produzida.
- Sendo da classe Califórnia, a USS Rubidoux também era batizada com o nome de cidade naquele estado dos EUA, próxima a Los Angeles. O seu número de registro ser 12109 e sem letra adicional, indica que a Frota lhe deu um número vago não utilizado no início do século 24, período o qual seria mais compatível com essa sequencia numérica para comissionamento de naves da Frota.
- O alferes meio velho/meio jovem era o único tripulante sendo transportado para a Fazenda que ainda utilizava o uniforme cinza dos filmes de A Nova Geração e final de Deep Space Nine. Considerando que ele citou que estavam havia meses na nave, e que Mariner usava o mesmo uniforme no flashback de seu período na Quito, isso sugere que a troca para o uniforme visto em Lower Decks teria apenas coisa de um ano, talvez até menos.
- Esta foi a décima-segunda ocasião em Star Trek até o momento onde o nome de um personagem consta no título do episódio ou filme.
- Você pode conferir todas as referências e easter eggs do episódio neste artigo de Maria-Lucia Racz no Trek Brasilis.
Ficha Técnica
Escrito por M. Willis
Dirigido por Barry J. Kelly
Exibido em 17 de setembro de 2020
Elenco
Tawny Newsome como Beckett Mariner
Jack Quaid como Brad Boimler
Noël Wells como D’Vana Tendi
Eugene Cordero como Sam Rutherford
Dawnn Lewis como Carol Freeman
Jerry O’Connell como Jack Ransom
Fred Tatasciore como edosiano da Divisão 14
Gillian Vigman como T’Ana
Elenco convidado
Toks Olagundoye como Amina Ramsey
Jennifer Hale como Durga e A Cachorra
Maurice LaMarche como Drew Prachett
Vanessa Marshall como Ottessa Warren
Nolan North como alferes meio velho/meio jovem