O ex-produtor e roteirista de Discovery, Bryan Fuller, começou seu trabalho em Star Trek escrevendo para a série Deep Space Nine. Mas sua contribuição maior foi em Voyager tornando-se editor executivo de histórias e mais tarde co-produtor.
Num bate-papo pelo podcast Inglorious Treksperts, Fuller comentou a respeito dos bastidores da série, onde revelou algumas diferenças criativas que teve com o produtor executivo da franquia, na época, Rick Berman.
Durante o podcast, Fuller começou dizendo que Voyager foi criada para ser “uma reação” a série Deep Space Nine, que era mais serializada e estava no ar há dois anos quando estreou a nova série.
Para Fuller, a ideia era fazer com que Voyager recuperasse a magia de A Nova Geração:
“Acho que a Voyager estava inicialmente tentando ser A Nova Geração e finalmente decidiu o que seria na quarta temporada”, disse Fuller.
O roteirista lamenta que o arco inicial do conflito com os Maquis dentro da nave tenha sido diluído para fazer a tripulação mais harmoniosa.
“Acho que parte disso de uma maneira estranha é que perdemos muito rapidamente a dinâmica do Maquis interagindo com uma equipe da Frota Estelar. Eles eram terroristas e cometeram atos terroristas e todo mundo estava tipo: “Tudo bem, vamos todos juntos.” … Isso não é bom para contar histórias. Você precisa saber que esses personagens vêm de um lugar culturalmente diferente, então eles não podem ser apenas membros regulares da equipe em que se juntaram muito rapidamente para resolver o problema de Deep Space Nine”.
Na equipe de Fuller havia dois outros roteiristas, a quem ele teceu elogios.
“Brannon Braga deveria receber muito crédito – Brannon Braga e Joe Menosky – e eram realmente as duas vozes mais comuns do que as de qualquer outra pessoa”.
Mas, segundo Fuller, ele e sua equipe não tiveram liberdade criativa suficiente para escreverem histórias mais ousadas.
“Eu testemunhei a luta criativa quando estava trabalhando lá”, revelou Fuller acrescentando. “Havia um apetite por essas histórias maiores e mais ousadas de ficção científica. E havia muita resistência do Rick Berman em abraçá-las, porque ele estava perseguindo A Nova Geração e não estava permitindo que Voyager fosse a série que poderia ser”.
Um conceito que Fuller via com animação para introduzir na sala dos roteiristas era de uma história serializada. Segundo ele, essa ideia de arco serializado criava uma possibilidade mais dramática para a tripulação da Voyager. A ideia era levar a nave a enfrentar muitas dificuldades, chegando ao ponto em que a tripulação teria que se separar, em cápsulas de fuga.
“Haveria um episódio em que você não veria Janeway e a Voyager porque estaria com as pessoas que estão nas capsulas de fuga tentando encontrar uma nova fonte de energia ou segurança. Era como uma rachadura criativa na sala dos roteiristas, porque, de repente, havia muitas oportunidades”, explicou o produtor.
Um episódio, em particular, citado por Fuller, foi “Year of Hell” (Ano do Inferno), que foi ao ar na quarta temporada da série. Escrito por Braga e Menosky, o episódio duplo trata do tema viagem no tempo, uma tecnologia usada pela raça Krenim e as consequências de se mudar a linha temporal. Fuller via essa história como um arco perfeito para percorrer uma temporada completa. Mas sua ideia foi rejeitada por Rick Berman, por não querer algo serializado:
“Year of Hell e o drama dos bastidores, não apenas para criar o episódio, mas também para a temporada, foram fascinantes porque queríamos que o “Year of Hell” durasse a temporada inteira. Nós queríamos ver a Voyager levar uma surra em todos os episódios e, durante essa temporada, seria marcada a história de Annorax e a nave do tempo que estava mudando as coisas. Então, voltávamos a fazê-lo de vez em quando para lembrar ao público que é a história maior. Mas foi rejeitado porque Deep Space Nine tornou Rick Berman alérgico a histórias em série, violentamente”.
Fuller conta como foi o caminho que percorreu para levar a ideia e decepção de vê-la prontamente rejeitada pelo produtor executivo:
“Lembro-me de Brannon indo ao escritório de Rick com todo esse entusiasmo e voltando quebrado, com a cabeça baixa e tendo que informar para a equipe de roteiristas. Todos nós sentimos que estávamos fazendo isso, estamos fazendo um ótimo Star Trek. Para ele voltar e dizer que não podemos e que só podemos fazer dois episódios em vez de vinte e dois, foi de partir o coração. Havia uma divisão interessante entre o que Rick Berman queria que o programa fosse, que era episódico e para o público sindicado, e como queríamos ser contadores de histórias criativos brincando com a caixa de brinquedos de Star Trek. “Year of Hell” é um ponto muito fascinante na história de Voyager”.
Esse mesmo problema não aconteceu com Ira Stephen Behr, que comandou Deep Space Nine. Fuller explicou que o showrunner não dava a mínima para o que Rick Berman dizia.
“O Ira sempre dizia: “Eu não ligo, é isso que estamos fazendo e se você não gostar do que estamos fazendo, me demita… Se você não estiver por trás disso, sugiro que encontre outra pessoa para fazer o meu trabalho.”. Ele era meio destemido quanto a isso. Ele era correto criativamente e sabia que essa era a direção certa para Deep Space Nine”.
Bryan Fuller escreveu 20 episódios para Voyager, além de 2 para Deep Space Nine e 3 para Discovery.
Star Trek acabaria voltando à narrativa serializada com as séries recentes Discovery e Picard.
Fonte: TrekMovie