Com Picard, pela primeira vez uma série de Star Trek foi apresentada aos fãs brasileiros antes da estreia por representantes de seu elenco. Aconteceu na CCXP, grande convenção anual de cultura pop brasileira, em São Paulo, no dia 6 de dezembro de 2019. Estiveram presentes o chileno Santiago Cabrera (Cristobal “Chris” Rios), a americana Michelle Hurd (Raffi Musiker), a britânica Isa Briones (Dahj) e o uruguaio Jonathan Del Arco (Hugh). Pouco antes do painel, o Trek Brasilis teve a chance de participar de uma entrevista com o quarteto, embargada pela CBS até 13 de dezembro. Confira o vídeo da entrevista (legendado em português) ou leia logo abaixo o que de mais interessante eles disseram.
Para começar, vocês podem dar um panorama dos personagens que cada um de vocês fazem?
Jonathan Del Arco: Criei este personagem quando era muito jovem, em A Nova Geração, e agora estou tendo a chance de recriá-lo para Picard. Tem sido empolgante, porque podemos ver esta raça alienígena 20 anos depois, e muita coisa mudou.
Isa Briones: Minha personagem, Dahj, é totalmente nova para todo mundo. Ela é uma jovem entrando num capítulo empolgante de sua vida, tudo parece estar indo bem, até que essa tragédia horrível a afeta e vira o mundo dela de ponta-cabeça. E isso é o que a coloca nesta jornada para encontrar Picard.
Michelle Hurd: Eu interpreto Raffi, uma personagem deliciosa. Ela é imperfeita, como todos nós. Ela tem alguns vícios que a ajudam a atravessar os dias, como tenho certeza de que todos nós temos. Ela também tem uma história com Picard. Eles trabalharam juntos no passado e a relação deles está bem abalada. Tenho uma história bem complicada com a Federação também. Ela é um gênio de sistemas, um gênio hacker, um gênio de segurança… eu sou simplesmente um gênio. (Risos) E ela é um pouco sarcástica. (Aponta para a própria cabeça.)
Cabrera: Eu interpreto Chris Rios, ex-Frota Estelar. Ele também tem seus demônios. E é amigo da Raffi, eles têm uma longa história. Ele está muitas vezes enfiado atrás de um livro, é piloto e não conhecia Picard.
É muito legal vê-los aqui, representando quatro países. Star Trek tem tudo a ver com diversidade e com esperança. Vocês poderiam falar um pouco sobre como Picard trará esperança, ainda mais nesses tempos em que estamos vivendo?
Hurd: A coisa toda com Star Trek, desde o primeiro episódio, lá atrás com a série original, é que é sobre diversidade, esperança e inclusão. E acho que, neste momento em que estamos agora, nós realmente precisamos ter algum tipo de esperança. Porque tem muito “outroismo”, não há muito amor por aí, e acho que, com nossa história, você verá o reconhecimento da preciosidade da vida, dos relacionamentos, da humanidade, através das vozes da diversidade. Tocamos todas essas peças e tentamos trazer esperança, bondade e generosidade de volta à conversa.
Del Arco: Para mim também Star Trek sempre abordou questões globais e coisas que discutimos no passado e no presente em contexto de ficção científica. E que melhor pessoa para nos trazer esperança que Picard, que é um herói para as eras? É um mundo fascinante, empolgante e sombrio que estamos explorando. Não é lustroso, do modo que uma série de Star Trek poderia ser. Mas acho que trará esperança às pessoas. Acho que será televisão muito empolgante.
E como foi trabalhar com Patrick Stewart?
Cabrera: Ele é realmente incrível. Como ser humano, como ator. É incrível ter sua presença todos os dias. Ele é um jogador de grupo, faz nos sentirmos bem-vindos, parte da família. Entre as tomadas a gente se senta junto, conta histórias, faz piadas. Sinto-me muito afortunado por trabalhar com ele.
Hurd: No meu primeiro dia, claro, tentei ser descolada. Mas, assim que eu dei um passo na direção dele, meus joelhos começaram a tremer. E ele imediatamente me deixou à vontade. Você sabe, ele é um artista completo, um bom homem, gentil, generoso e autodepreciativo e divertido. Muitos artistas dizem que, quando fazem um trabalho, o tom e o controle do set começa com o número um, e o nosso número um é fenomenal. Assim que ele entra no set, todo mundo respira fundo, você fica meio empolgada, está meio tremendo, e ele é tão desarmante, tão calmo, só quer saber o que todo mundo está fazendo e tornar a área de atuação tão calma e criativa quanto possível.
Briones: Acho que todos nós já nos sentamos num círculo e perguntamos, qual foi sua primeira cena com Patrick? E todos tivemos basicamente a mesma história, de estarmos tão nervosos e ele imediatamente te aceita… a primeira, puff, eu poderia ter desmaiado. Mas ele segurou minha mão, e na cena tínhamos de dar as mãos, e tivemos de esperar um avião passar, e ele segurou minha mão por um minuto inteiro, enquanto esperávamos esse avião passar, e ele só me olhou nos olhos e disse: “estou com você”. Esse é quem ele é.
Del Arco: Eu era um ingênuo rapaz de 25 anos quando primeiro entrei num set de Star Trek. E lá estavam Patrick Stewart e Whoopie Goldberg. Surreal como você é ingênuo nos seus 20 e poucos anos, você pensa, “eu sou tão bom quanto todo mundo, só vou fazer meu trabalho”. Agora voltar, a grande coisa para mim foi minha amizade com ele. Porque eu não virei amigo dele quando eu tinha 24, ele provavelmente tinha uns 50, mas agora nós temos mais ou menos a mesma idade. (Risos)
A Nova Geração costumava ter um tom mais filosófico. Pelos trailers de Picard, o tom agora parece ser de introspecção. Seria justo dizer que esta será a mais íntima das versões de Star Trek?
Cabrera: Espero que sim. O que nós temos é definitivamente uma nova abordagem, no sentido de que estamos contando uma história que é um filme de dez horas. É uma grande história. Então isso a torna um material muito suculento. Eu sou meio novo nesse mundo sci-fi, e você percebe de cara que, por trás de toda a ficção científica, do futurismo, é um espelho para o presente. E isso é uma coisa muito empolgante.
Hurd: É, acho que nossa série terá uma relação muito mais íntima com os personagens, porque veremos todo mundo incrivelmente vulnerável.
Briones: Nunca há um momento em que parece que “eu sei exatamente o que fazer”. E isso é o que torna tão orientado a personagem, é que as pessoas estão tentando sacar tudo, que é como a gente no mundo real. E acho que só o fato de que tem esse formato não episódico, um filme de dez horas, você realmente mergulha nesses personagens de uma forma muito íntima.
Del Arco: Eu tive a chance de sentir coisas que os borgs nunca sentiram antes. Foi muito pessoal. É muito mais íntimo que A Nova Geração.
Picard é uma nova série, mas numa franquia com muita bagagem. Como é para vocês entrar em algo que está há tanto tempo por aí e que tem uma base de fãs tão exigente?
Del Arco: Eu posso falar o que eu sinto: não podemos ferrar com isso. (Risos) Havia uma pressão das pessoas que estavam retornando. Eu falarei por minha amiga Jeri (Ryan), eu e ela tivemos muitas conversas sobre isso, porque os personagens vão ao próximo nível, e os fãs são uma parte enorme da história de Star Trek, certo? Então, sentimos uma enorme responsabilidade de, sim, interpretar a Sete e o Hugh como eles foram escritos, mas também prestar homenagem ao legado.
Briones: Acho que é uma responsabilidade bonita. Por causa do amor que abarca tudo em Star Trek. Mas fomos imediatamente bem recebidos. Vocês não sabem quem nós somos, e já nos receberam com tanto amor, e isso nos dá um certo reconforto, porque é quase como se vocês estivessem confiando na gente para levá-los nessa jornada.
Hurd: Absolutamente honrada e humilde. Eu tive esse interessante flashback da minha juventude. Eu me lembro de ser criança no apartamento de Nova York com meus pais e meu pai (sou mestiça, minha mãe é branca, meu pai é negro), e na época não havia muita representação de nós na TV. E lembro que Star Trek era a série que meu pai encorajava a gente de ver como família, porque éramos representados. Foi a primeira série a ter um beijo interracial. Foi a primeira série a mostrar espécies diferentes, pessoas diferentes, que se parecem diferentes, juntas, e pessoas e espécies que são diferentes que são empurradas para longe e a injustiça disso, e a luta para corrigir aquilo. E eu percebi o tamanho do impacto que Star Trek tem.
Cabrera: É empolgante, as pessoas vão ver! Você sempre espera encontrar um público. Na hora tentei não pensar muito na responsabilidade, mas agora que está acontecendo, a estreia está se aproximando, você sente a responsabilidade. Claro que há um elemento de nervosismo, mas é empolgante. Sinto-me ótimo de fazer parte disso.
Temos dois latinos aqui. Isso vai se traduzir de algum modo na série?
Cabrera: Sim, estou interpretando um latino na série. Eu queria e fui encorajado a usar isso, e esse é um testamento sobre tudo que Michelle estava dizendo sobre a história de Star Trek.
Del Arco: (Em espanhol) Hugh trabalha numa churrascaria. (Risos) Não, Hugh não é latino. Mas tem sido divertido ter meu hermano [Cabrera] aqui e a multicultura que trazemos de nós mesmos. Como uma pessoa de uma cultura diferente, você sempre traz isso para seu trabalho como ator. Então, é empolgante representar a América do Sul.
Como a série está envolvida em muito segredo, quando vocês foram escalados, vocês sabiam do que se tratava?
Hurd: Eu não sabia que era Star Trek: Picard. Recebi no meu e-mail [convite para] uma audição, dizia Drawing Room, era Drawing Room?
Briones: Sim, Drawing Room.
Hurd: E eu tinha acabado de passar por uma operação e estava, ah, não vou fazer isso. Bem, “tá bom, vou ler o e-mail”, e fui ler a lista dos produtores, vi Patrick Stewart… hmm, parece interessante. E aí eu li a descrição da personagem e, não estou brincando, é uma personagem tão boa. É complexa, cheia de camadas. Ela é mais verdadeira como ser humano, tanto na descrição quanto no desenvolvimento posterior, do que qualquer outra que eu tivesse interpretado antes.
Cabrera: Eu tinha acabado de terminar uma série produzida pela Secret Hideout, produtora de [Alex] Kurtzman e Heather Kadin, chamada Salvation, então eles me chamaram cedo no processo para dizer que estavam montando isso e tinha um papel que eles queriam que eu fizesse. E eu disse: OK, posso ler? “Não, não pode, porque não temos roteiros ainda.” (Risos) Mas eu tive uma longa conversa com Alex e ele me apresentou a ideia do que queriam fazer, que seria diferente de qualquer Star Trek que tenham feito antes, e, claro, Patrick está fazendo, Michael Chabon está envolvido, e que a escrita traria aquela abordagem romancista, e uma coisa após a outra parecia, “isso vai ser bom, vai ser ótimo, vai ser diferente”. Então eu fui de não saber muito a fazer alguma pesquisa e ficar muito empolgado e dizer, “eu topo, e lerei quando estiver pronto”.
Briones: Eu descobri que era Star Trek relativamente cedo, mas sobre a personagem, eu estava tão no escuro quanto os fãs estão agora. Eu não tinha ideia de quem eu era até o primeiro dia de filmagem, realmente. O que torna tudo um pouco exasperante: quem eu sou? Mas é um daqueles projetos fantásticos.
Se vocês tivessem a chance de ser qualquer personagem de Star Trek, qual vocês escolheriam e por quê?
Hurd: Picard. (Risos) Eu gosto de ser a chefe.
Cabrera: Q, eu acho, porque ele é muito divertido. Tem muito com que brincar. Ele faz muitas coisas diferentes.
Del Arco: Para mim teria de ser Spock. O Spock original.
Briones: Eu adoro tanto a Marina Sirtis. Sempre adorei vê-la. E eu apenas queria ser aquela pessoa. Sempre que ela aparece em tela, essa deusa brilhante… Sou grande fã.