Por Nívea Doria
São 42 anos ininterruptos dando voz ao mesmo personagem. Sessenta anos de dublagem. Sessenta e oito anos de casamento. Cem anos de idade. Na mesma semana em que o Brasil comemora os 90 anos de uma de nossas maiores divas da dramaturgia, Fernanda Montenegro, comemora também um século de vida deste grande artista: Orlando Drummond. São números superlativos, tanto quanto seu enorme talento.
Não tem como passar batida uma data como esta. Seja sua voz, seja seu figurino como Seu Peru, Orlando Drummond faz parte de nossas infâncias. De várias gerações de crianças, que cresceram, tornaram-se adultas e o apresentaram para seus próprios filhos, que vão seguir fazendo o mesmo.
Em termos de Jornada nas Estrelas, não consigo imaginar outra voz no Comissário Odo. Todas as nuances de interpretação sob a máscara da maquiagem – e que René Auberjonois exprimia magistralmente – conseguiram ser captadas, adaptadas, abrasileiradas e reinterpretadas por um dos grandes mestres da dublagem brasileira. Com excelência.
Coube a Drummond também dar vida ao Scott em filmes da Série Clássica. Foi provavelmente onde tive meu primeiro contato com Jornada – ou pelo menos o primeiro contato em ver aqueles personagens, pois lembro-me de os nomes dos personagens serem mencionados desde sempre. E Scott sempre foi um dos meus favoritos! Sempre me lembro do rosto de Scott nos filmes com a voz de Orlando Drummond.
Ao sairmos de Jornada, temos Scooby Doo (por 42 anos ininterruptos!), Vingador, Alf, Popeye, Sargento Garcia e tantos e tantos outros em seis décadas dedicadas à dublagem. Tantos que apenas vou listar aqueles que me vêm facilmente à memória. Como nossa cultura pop foi enriquecida graças ao trabalho desse senhor, desse monstro sagrado!
Por que falar de dublagem quando o foco é Jornada? Porque a dublagem é uma forma de democratizar o audiovisual vindo de outros países. Não necessariamente é para pessoas analfabetas ou burras, como tanto se fala por aí. Quantas crianças pequenas e idosos assistem a TV, streaming e cinema? Eu comecei assim, pois tenho dificuldade de ler em tela. Ler legenda é uma tortura para mim até hoje! E olha que sou doutoranda em Letras e minha temática é… compreensão leitora.
Prosseguindo, foi através de Jornada nas Estrelas dublado que muitas pessoas começaram a se apaixonar pela franquia. E, por isso, devemos também falar sobre ela aqui, como já fiz em 2009 ao falar sobre a dublagem do primeiro filme do Abrams. Porque nem todo mundo assiste às mesmas coisas que nós exatamente da mesma forma a que nós assistimos. E, para mim, de quanto mais formas assistirmos as mesmas coisas mais enriquecedora será nossa experiência.
Então, tem como não falar, no Brasil, de Orlando Drummond em 18 de outubro de 2019? Que maior exemplo de “vida longa e próspera” nós temos?
A voz de Drummond está eternizada em filmes, séries, desenhos etc. Sua imagem, em programas de TV. Seu legado, além de tudo o que podemos acessar, também chega a nós através de seus netos, os talentosíssimos Alexandre, Felipe e Eduardo, dubladores competentíssimos e que vão deixando a sua própria marca além de levarem adiante esse sobrenome para novas gerações.
E inspirando pessoas, que, um dia, podem tornar-se, por si mesmas, inspiradoras para outras tantas. Assim como Drummond me inspirou e me inspira até hoje. Desculpem-me se não pude ser muito objetiva nesse texto, mas é muita emoção saber que se vive num mundo, num país, numa cidade que abriga Orlando Drummond (e Fernanda Montenegro).
Feliz aniversário, Orlando Drummond, e que ainda possamos desfrutar de muitos outros anos em sua companhia. Que sua vida seja ainda mais longa e cheia de prosperidade! Obrigada por tudo!
Nívea Doria é doutoranda em Letras, apaixonada por dublagem e colaboradora do Trek Brasilis.