Harry Mudd volta em curta divertido, engraçado e inteligente
Sinopse
Uma transação entre caçadores de recompensa e o telarita Tevrin Krit coloca suas mãos em Harry Mudd, a quem ele pretende entregar à Federação por um prêmio de 100 mil créditos. O velho embusteiro, claro, não está nada feliz e tenta convencer seu captor de que ele tem em mãos a pessoa errada. Mas em vão: Krit tem uma rixa pessoal com Mudd, depois que ele dormiu com a irmã dele e se aproveitou da situação para roubar sua clava — um artefato de mais de cem anos passado de geração em geração.
A tentativa de convencer o telarita de que ele pegou a pessoa errada cai por terra quando Krit apresenta a “ficha corrida” de Mudd, recheada de roubos, tentativas de assassinato, uma tentativa de regicídio (imprecisa, segundo Mudd, já que se tratava de um duque) e até a acusação de ter penetrado uma baleia espacial. “Você tinha de ter estado lá”, justifica-se o vigarista.
Mudd então passa a usar todos os truques de lábia conhecidos para convencer Krit a não entregá-lo às autoridades. Propõe uma parceria, diz fazer parte de uma “resistência secreta” ao imperialismo da Federação, apela aos bons sentimentos do telarita — estratégias que já haviam falhado antes quando Mudd fora capturado por klingons, órions e por uma alienígena baixinha de espécie não identificada.
O tempo se esgota para o trapaceiro quando a nave telarita se encontra com a USS De Milo e Krit pede autorização para ir a bordo. Ele então apresenta Mudd ao oficial de segurança da Frota Estelar que, consternado, explica que ele capturou o homem errado. Aquele não é Mudd, mas um androide feito à sua imagem e semelhança. A De Milo a essa altura já abriga um punhado de “Mudds”, todos fruto da mesma história: a “venda” do prisioneiro a um caçador de recompensas por uma misteriosa alienígena alta e com um capacete que esconde seu rosto. Frustrado, Krit arranca o braço de seu “Mudd” e constata que se trata mesmo de um androide.
Enquanto isso, em sua própria nave, longe dali, o verdadeiro Harry Mudd está vestido como a “vendedora” e cercado de androides idênticos a si mesmo, preparando-se para entregar mais um falso Mudd — e quem sabe vender uma clava telarita no processo.
Comentários
Leve, divertido e extremamente inteligente, “The Escape Artist” é um ótimo cartão de visita para Mike McMahan, roteirista ganhador do Emmy com a animação Rick & Morty e contratado para desenvolver a série animada Star Trek: Lower Decks. O episódio não só faz uma bela conexão com as origens de Mudd, na Série Clássica, como entrega um texto afiado para a versão “atualizada” do personagem apresentada em Discovery — uma combinação muito charmosa e efetiva.
Rainn Wilson se mostra duplamente bem-sucedido, trazendo Mudd à vida mais uma vez de forma brilhante e também dirigindo a si mesmo em um episódio tecnicamente desafiador, com efeitos visuais, cenários aumentados digitalmente e a qualidade cinematográfica a que já estamos ficando (mal) acostumados em Discovery. Como ele mesmo confessa, teve a equipe técnica da série para lhe servir de “babá” ao longo de todo o processo, e o resultado final foi muito bom.
O curta tem um sabor atípico para Star Trek: caçadores de recompensas, trapaceiros galácticos, artimanhas espaciais… o enredo, assim como a estética, em certos momentos se aproxima mais do que se esperaria de um curta daquela outra franquia “Star”. E isso está longe de ser defeito; pelo contrário, é prova de princípio de que o universo criado por Gene Roddenberry oferece mais oportunidades narrativas do que o clássico “nave da Frota Estelar audaciosamente indo aonde ninguém jamais esteve”. O episódio envolve as autoridades federadas apenas tangencialmente, e somos apresentados a circunstâncias e contatos alienígenas não mediados pelo olhar da Frota Estelar.
E vamos combinar que o desfecho é encantador: depois de passar o episódio inteiro pensando “como Mudd vai escapar dessa?”, nos damos conta de que nós mesmos também caímos no truque dele. Escapismo, como qualquer arte mágica, é baseado em ilusão, e a forma como Mudd nos ilude — e ao final revela a ilusão — é perfeita. Não bastasse isso, há uma linda conexão entre este episódio e “I, Mudd”, segmento da segunda temporada de Jornada nas Estrelas em que a Enterprise visita o planeta dos androides de Mudd.
O encaixe entre as duas histórias é muito bom e revela que Mudd já devia conhecer (e explorar, no mau sentido do termo) aquele planeta muito antes de ser aprisionado lá por seus habitantes artificiais, conforme visto na Série Clássica. Só um profundo conhecedor faria tão bem essa ponte, e McMahan provou que é realmente um fã das antigas.
Mais uma vez, a despeito do orçamento modesto, a produção se revela muito efetiva em construir um mundo expandido. A nave telarita, embora traga pistas de que é o cenário da detenção da Discovery redecorado, é convincente, assim como as cenas de flashback de Mudd. No mesmo espírito, a USS De Milo parece ser um modelo CGI construído a partir da seção disco da Discovery combinada a naceles de outro padrão. Para os propósitos do episódio, funciona.
A música de Jeff Russo também tem uma presença efetiva, a começar pela divertida transição entre o tema dos Short Treks e uma música de discoteca, preparando nosso espírito para um episódio com tom completamente diferente dos anteriores.
”The Escape Artist” é um sucesso em todos os níveis: enredo, valores de produção, direção, música, roteiro… As falas são divertidas, a maquiagem dos alienígenas é incrível, e Rainn Wilson esbanja carisma. Esperemos que não seja a última vez que vimos Harry Mudd aprontando pela galáxia.
Avaliação
Citações
Mudd – “Your enemies will be positively green with envy… greenER… so to speak.” (“Seus inimigos com certeza ficarão verdes de inveja… mais verdes… por assim dizer.”)
Mudd – “If I had any money, I’d be sipping jippers on a beach somewhere!” (“Se eu tivesse dinheiro, estaria tomando coquetéis numa praia por aí!”)
Trivia
- Um dos androides recolhidos pela De Milo está vestindo um traje azul similar ao usado por Mudd em “I, Mudd”, da Série Clássica.
- Tevrin Krit é o terceiro telarita interpretado por Harry Judge. Eles antes havia vivido o almirante Gorch e sua contraparte do universo do Espelho na primeira temporada de Discovery.
- A acusação de “penetrar uma baleia espacial” remete ao episódio “Magic to Make the Sanest Man Go Mad”, da primeira temporada de Discovery. O capacete andoriano visto naquele episódio também aparece aqui.
Ficha técnica
Escrito por Michael McMahan
Dirigido por Rainn Wilson
Exibido em 3/1/2019
Produção: 104
Elenco
Rainn Wilson como Harry Mudd
Harry Judge como Tevrin Krit
Barbara Mamabolo como caçadora de recompensas
Jonathan Watton como oficial da Federação
Dan Abramovici como guarda órion
Myrthun Stagg como guarda órion nova