Essa resenha é livre de spoilers e vou logo ao ponto principal. Gostei muito do Além da Escuridão – Star Trek, talvez mais do que eu esperava. É um divertidíssimo filme de ficção, uma verdadeira montanha-russa, e seus 130 minutos de duração passam voando. Mas a força do novo filme não reside na trama – um tanto rasa – e nem nas supostas surpresas e reviravoltas – que só terão relevância para os fãs mais fervorosos. A força está nos personagens, com excelentes atuações de todos, especialmente Chris Pine, Zachary Quinto, Karl Urban (impressionante como McCoy; merecia mais tempo em cena), Bruce Greenwood (Pike é de longe o meu personagem favorito nessa nova cronologia) e Benedict Cumberbatch (um dos grandes novos talentos na atualidade).
Tiro o chapéu para o diretor J.J. Abrams, por ter escalado um elenco de jovens talentosos e carismáticos atores, capazes não de substituir o elenco original (isso jamais), mas sim acrescentar algo novo e moderno aos personagens, sempre de forma respeitosa. É muito gratificante ver a interação entre os personagens e como J.J. Abrams conseguiu reproduzir quase com perfeição a amizade e a camaradagem entre eles, como nos saudosos tempos da Série Clássica. Aqui reside a grande força do filme.
O resultado é um excelente e delicioso passatempo. Jamais será um clássico, mas será muito importante se as bilheterias derem confiança para a Paramount relançar Jornada novamente na televisão, lugar em que a série pertence e é o seu “habitat” natural, onde há maior tempo e espaço para os elementos que os fãs esperam: drama, exploração espacial, aventura, ação etc.
Já Além da Escuridão é um filme estritamente de ação ininterrupta, formato mais adequado para a telona do cinema para atrair a bilheteria e dar o necessário retorno financeiro para a Paramount, que gastou um fortuna na produção; e isso é evidente em cada quadro do filme. É uma verdadeira super-produção, a maior de Jornada até hoje. Como exemplo, as versões futuristas de São Francisco e Londres são de cair o queixo.
Os fãs mais exigentes não podem jamais esperar que, na atualidade, a Paramount torre uma fortuna para produzir um caríssimo filme de Jornada baseado exclusivamente em exploração espacial e descoberta de estranhos e novos mundos. Isso foi tentado no primeiro filme de cinema, de 1979, com resultado irregular e retorno financeiro insatisfatório; e isso diante de um público completamente diferente com relação ao de hoje. Naquela época o espectador tolerava 2 horas de projeção com um filme de ritmo lento, quase letárgico. Hoje geraria cochilos e, pior, saídas em massa da sala durante a projeção.
O público atual, que faz a grande bilheteria e é o alvo das grandes produções, faz questão que algo faça “boom” na telona a cada 5 minutos. O mercado atual simplesmente exige que um filme de Jornada seja um filme de ação incessante, e é exatamente isso que o J.J. Abrams entregou. Portanto, é um produto muito honesto nesse aspecto.
E é importante destacar que, no meio de tantas explosões e caos, temos Scotty e Spock discutindo sobre a infeliz tendência militarista da Frota Estelar e a necessidade de manter a instituição pacifista e exploradora. E ainda sobrou tempo para uma relevante discussão sobre a 1ª Diretriz logo no começo do filme, ardidamente defendida pelo Almirante Pike. Isso mostra que o diretor e os roteiristas de fato conhecem e reconhecem os pilares que sustentam toda a mitologia da série, na forma como idealizada por Gene Roddenberry, mas estão flexibilizando as regras para fazer um filme de ação com amplo apelo ao público geral. Se não houvesse essa preocupação com os alicerces clássicos da franquia, por certo não haveria nem mesmo essas referências no filme.
Por falar em referências, os fãs vão encontrar saborosas surpresas escondidas ou às claras durante toda a projeção, sejam elementos no cenário, sejam trechos de diálogos. Eu mesmo estou ansioso para rever o filme e tentar descobrir elementos que talvez tenham passado desapercebidos na primeira sessão.
Em suma, é um excelente filme de aventura e ficção-científica, com ritmo ágil, muito carisma, bom humor, altíssimos valores de produção, fantásticos efeitos visuais e que, assim como seu antecessor (Star Trek, de 2009), dá maior ênfase aos personagens do que ao roteiro e trama – e isso não é de todo ruim. É uma qualidade muito especial que coloca “Além da Escuridão” em um patamar muito superior em comparação a quase todos “filmes-pipoca”. Nós fãs só temos que agradecer pela nossa série preferida estar de volta ao mapa, embora com uma roupagem diferente, mas indiscutivelmente com qualidade ímpar e em sintonia com o público atual.
Mal posso esperar pelo terceiro capítulo dessa saga.