O jornal Los Angeles Times publicou um longo e exclusivo artigo sobre Jornada nas Estrelas, onde o assunto não poderia deixar de ser sobre o novo filme. Numa entrevista com o diretor J. J. Abrams, este opinou a respeito da reação dos fãs mais puristas, da importância do elenco e de elementos ícones para a história, assim como as diferenças e semelhanças em relação a outra franquia.
Abrams acredita que (como foi com Harve Bennett, produtor de Jornada II: A Ira de Khan), sendo alguém fora do círculo dos fãs, ele pôde ter uma visão mais abrangente do que a franquia precisava, “Eu acho que fui beneficiado porque vim para este filme como alguém que apreciava Jornada, mas não era fanático”, afirmou o produtor. “A desvantagem é que eu não sabia tudo o que precisava saber, logo no início e tive que aprender. A vantagem ainda é que eu poderia olhar para Jornada como um todo, um pouco mais como um típico freqüentador de cinema iria vê-la. Isso me permitiu aproveitar das coisas que eu sentia que eram verdadeiramente mais icônicas e de importantes aspectos na série original. E ainda não ser fiel a cada detalhe arcano. Deixou-me olhar para as coisas que eu sabia que eram críticas”.
Que coisas críticas seriam essas? “Os personagens foram a coisa mais importante da série. Precisávamos ser fiéis ao espírito desses personagens. Houve certas coisas icônicas. Se você vai fazer Jornada, tem que fazer a Enterprise e ela tem de ser parecida com a Enterprise (da série). Você tem de fazer os figurinos parecerem com as roupas que as pessoas conhecem. Você tem que ser capaz de olhar para ela, e saber o que é isso. Mesmo o texto, a letra de “Star Trek” tem de ser parecido com o que conhece”.
“Os phasers, os comunicadores, o logotipo da Frota – existem todas estas coisas que são as pedras fundamentais, os princípios daquilo que faz Jornada. Se você vai fazer esta série são essas coisas que você não deve mexer. E, no entanto, elas precisam suportar uma resolução que Jornada nunca teve de suportar antes. E não me refiro apenas ao sistema IMAX, embora o filme venha a passar lá também, mas o que eu quero dizer é que as audiências são tão conhecedoras das coisas agora e que eles já viram cada iteração de Jornada, Guerra nas Estrelas, duas distintas versões de Battlestar Galactica, já viram Alien, eles já viram inúmeros filmes de ficção científica. Eles já viram tudo. E pior ainda, viram um filme como Galaxy Quest que ridiculariza completamente o paradigma na sua totalidade”.
Falando de coisas icônicas, em uma outra entrevista você disse algo sobre a presença dos conhecidos Pingos. Eles estarão lá? “Sim. Existe um Pingo no filme. Mas você terá de procurar por ele. E existe uma outra surpresa que eu contei para você, mas por favor não escreva sobre isso”.
Acredito que seu maior desafio tenha sido com o elenco, principalmente com Chris Pine. Como ser o capitão Kirk sem imitar William Shatner? “Penso que cada ator teve um desafio semelhante. Nós tivemos sorte, em Jornada, com o designer de produção, o designer de vestuário, os efeitos visuais, o compositor – em todos os lugares que você olha nesta produção vê a sorte que tivemos em possuirmos pessoas fazendo o melhor trabalho. Estiveram todos muito bem. Mas tenho de dizer que o lugar onde eu não poderia ser mais grato, está no elenco. Para entrar em um filme como este, onde você está lançando personagens ícones, que foram tocados por atores que os definiram e os criaram, certamente tanto quanto Roddenberry, as chances de encontrar as pessoas adequadas para preencherem os sapatos são muito pequenas. E com todas essas pessoas que efetivamente trabalham no elenco é menor ainda. Eu me sinto como se conseguisse o impossível por encontrar atores que estão tão empenhados em seus papéis e por isso são todos justos, engraçados, reais, emocionais e complicados, mas ainda assim familiares. Eles são os personagens da série e ainda assim ninguém está fazendo uma imitação de um dos originais”.
“A razão porque isso funciona ou a razão pela qual penso que funciona é que eu e as pessoas que viram o filme têm se afastado da sensação de que estes são os personagens (originais). Há uma transição que acontece. É uma coisa estranha. Não é que você nunca vai esquecer o que fez o DeForest Kelley ou o George Takei ou Shatner ou nenhum deles. É quase como se outra porta abrisse e você estivesse deixando outra coisa em um espaço que era sagrado. Isso não diminui o que veio antes, não diminui a qualidade ou o impacto do que foi. É como você olhar para James Bond. Há pessoas por aí que sentem que Daniel Craig é o que procuram. E depois há pessoas que dizem que Roger Moore era o único James Bond, que nunca iria funcionar, e há pessoas que pensam que Sean Connery é claramente um verdadeiro Bond. A questão é: o que Craig está fazendo agora que não prejudique o que os outros atores fizeram? Eles podem coexistir”.
Você disse que teve de aprender mais sobre Jornada para produzir o filme, como fez isso? “Eu olhei para um grande número de episódios das séries que vieram depois da original, mas porque estávamos centrados na série original. Eu realmente não precisava saber cada episódio de Deep Space Nine, Voyager ou mesmo Enterprise. Mas, sim, eu assisti episódios, eu li muito, eu assisti os filmes, eu falei com as pessoas, seja com nosso consultor de Jornada ou um dos dois escritores (Alex Kurtzman e Roberto Orci) sobre o que significaria fazer aquilo que queríamos fazer”.
Você aceitaria fazer uma continuação, se esse filme tiver o sucesso esperado? “Eu prefiro não ser presunçoso dizendo que isto vai continuar. Digo apenas que estamos terminando este filme. O que posso dizer é que tenho a sensação de estar no meio do almoço e alguém pergunta – “O que queres para o jantar?”- Não tenho idéia. Mas tenho que dizer que a idéia de ver este elenco e esses personagens vivendo e seguindo em novas aventuras….seria uma vergonha não fazê-lo. Existe uma grande oportunidade para novas histórias e eu com certeza gostaria de estar envolvido no processo. A Paramount tem fome de avançarmos sobre esse projeto, mas ainda estamos terminando o primeiro”.
Quanto aos fãs mais conservadores, comentou, “A chave é reconhecer que existem fãs puristas e fãs de Jornada, que vão ser muito ruidosos se verem coisas que não são aquilo que eles querem. Mas eu não posso fazer este filme para leitores de Nacelles Monthly (revista sobre naves da franquia) que estão apenas preocupados com o que os motores da nave parecem. Eles irão encontrar algo que detestam, não importa o que eu faça. E ainda, o filme, em sua essência, não é apenas inspirado naquilo que veio antes, é profundamente fiel ao que veio antes. A questão de fundo é que temos diferentes atores para tocarem esses personagens e é nesse ponto que não é literalmente o que eles viram antes. Será evidente quando as pessoas verem este filme que ele é verdadeiro para o que Roddenberry criou e o que esses incríveis atores fizeram na década de 60. Ao mesmo tempo, penso eu, o filme vai causar excitação e choque nas pessoas, pois é uma experiência completamente diferente daquilo que eles esperam”.
Sobre os níveis de humor e sexualidade no filme. Vão existir? Até que ponto? “Sim. Entre o tipo de críticas pontuais que leio online, algumas pessoas dizem “Oh, olhe para isso, elas estão tentando pôr sexo”, por termos Kirk na cama com uma garota ou Uhura tirando sua blusa, e continuam, ‘Oh isso não é Jornada“. Outras pessoas escreveram, “Há comédia nele, não é essa a Jornada que conheço”. Olha, se você realmente assistir a série, ela estava sempre provocando reação o tempo todo e foi considerada muito sexy para o seu tempo. Teve o primeiro beijo interracial na televisão, e foi uma série que foi sexualmente aventureira. Foi muito divertida. Uma das minhas coisas favoritas sobre Jornada não foi apenas a brincadeira aparente, mas o humor na medida em que revelam sobre as relações entre os personagens principais e as suas reações às situações que enfrentam. Houve muita comédia, sem nunca quebrar sua realidade. Isso é importante para nós”.
Abrams responde a grande discussão entre o fandom de que estaria seguindo o caminho de Guerra nas Estrelas, “Bem, eu sou um fã de Guerra nas Estrelas. Quando criança, Guerra nas Estrelas foi muito maior do que a minha adoração por Jornada. Se olharmos para os últimos três filmes Star Wars e a tecnologia que lhes permitiu fazer, eles percorreram muito terreno em termos de concepção, localização, personagens alienígenas, naves – tanto que o espetáculo foi feito e parece que cada aspecto tem sido coberto, quer seja na geografia ou na concepção de cultura ou sistema meteorológico ou personagem ou tipo de nave. Tudo tem sido explorado nos filmes. O desafio de fazer Jornada, apesar do fato de que existia antes de Guerra nas Estrelas, é que estamos claramente na sombra do que George Lucas fez”.
“A chave para mim é nunca tentar superá-los porque é uma situação impossível de se vencer. Esses filmes são tão extraordinariamente desenhados que senti que a chave para Jornada foi o de ir de dentro para fora, ser tão verdadeiro para os personagens quanto possível, ser tão real e emocional e tão excitante quanto possível e não ser atrapalhado por todo o espectro que o filme de Guerra nas Estrelas realizou. Por exemplo, nós necessitávamos estabelecer que houvesse extraterrestres neste universo e ainda assim eu não quero que sintam que cada cena tenha quatro novos multi-coloridos personagens. Isso é algo que Guerra nas Estrelas fez muito bem com seu design de incríveis criaturas. A questão é como fazer sutilmente introduzir a idéia de que existem diferentes espécies aqui. E também para fazê-lo de forma diferente da Jornada na TV, que basicamente tinha alguém usando uma máscara sentado em uma cadeira. Foi o equilíbrio de fazer o que a história necessitava que fizéssemos, mas também não sentir como se estivéssemos tentando enganar ou fazer o que Lucas fez”.
Sobre a cena do bar não se parecer com a da cantina de Guerra nas Estrelas, comentou, “A cena da cantina é obviamente uma das clássicas cenas de Guerra nas Estrelas, e foi essa uma excelente introdução, como forma agradável e diversificada e cheia de possibilidades, que este universo estava em vias de ser. Na sequência dos filmes, especialmente os últimos três, tantas cenas têm essa sensação, de que eles estão apenas ampliando e expandindo o universo. Isso foi definitivamente algo que eu senti, uma aflição do tipo – “Meu Deus, eles fizeram tudo isso”. E o desafio é: como é que você faz isso sentir real e significativo e não como você estivesse copiando de alguém. Isso foi apenas um dos nossos desafios”.
Fonte: Trek Movie e TrekWeb